Palestra de Astrologia Hermética

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Palestra aberta e gratuita sobre Astrologia Hermética, dia 02/Agosto (sábado) as 10h da manhã no Palácio Maçônico (r. São Joaquim, 457 – Liberdade – próximo ao metrô São Joaquim).

Próximos Cursos:

09/Agosto – Astrologia Hermética

10/Agosto – Chakras, Kundalini e Magia Sexual

Informações: marcelo@daemon.com.br

Bienal do Livro

De 14 a 24 de Agosto, no Pavilhão do Anhembi.

Lançamento da Enciclopédia de Mitologia dia 16 (sábado)

às 20h no stand da Daemon Editora

#Palestras

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/palestra-de-astrologia-herm%C3%A9tica

Se7en, a origem dos Sete Pecados Capitais

Os chamados “Pecados Capitais” são originários da alquimia e das tradições iniciáticas muito antigas, remontando dos antigos rituais egípcios e babilônicos. Antes de começar, vamos usar a nomenclatura certa: DEFEITOS capitais.

Os defeitos capitais são em número de sete, diretamente relacionados com o avanço espiritual e estando cada um deles associado a um Planeta, de acordo com uma estrutura denominada “Estrela Setenária”.

ORGULHO

Defeito capital relacionado com o SOL e, na minha opinião, o mais difícil de ser destruído.
Em sua síntese, Orgulho é um sentimento de satisfação pessoal pela capacidade ou realização de uma tarefa. Sua origem remonta do latim “superbia”, que também significa supérfluo.

Algumas pessoas consideram que o orgulho para com os próprios feitos é um ato de justiça para consigo mesmo. Que ele deveria existir, como forma de elogiar a si próprio, dando forças para evoluir e conseguir uma evolução individual, rumo a um projeto de vida mais amplo e melhor. O orgulho em excesso pode se transformar em vaidade, ostentação, soberba, apenas então sendo visto apenas então como algo de negativo.
Outras pessoas classificam o orgulho como “exagerado” quando se torna um tipo de satisfação incondicional ou quando os próprios valores são superestimados, acreditando ser melhor ou mais importante do que os outros. Isso se aplica tanto a si próprio quanto ao próximo, embora socialmente uma pessoa que tenha orgulho pelos outros é geralmente vista no sentido da realização e é associada como uma atitude altruísta, enquanto o orgulho por si mesmo costuma ser associado ao sentimento de capacidade e egoísmo.

O Orgulho é um defeito muito traiçoeiro, justamente porque, conforme coloquei no parágrafo anterior, a maioria das pessoas não o enxerga como um “defeito”, mas como uma “recompensa” moral ou espiritual por um trabalho que executaram. Por esta razão, é muito mais difícil livrar-nos dele, pois, ao nos acostumarmos com a recompensa, nos sentimos inferiorizados se não somos “reconhecidos” por nossos feitos.
Em minhas palestras sobre alquimia, sempre coloquei o orgulho como o último (e mais complexo) dos defeitos a serem finalmente destruídos, pois, ao contrário da preguiça ou da raiva, por exemplo, que são (na minha opinião) mais simples de serem trabalhados, o orgulho está enraizado em nosso pensamento de uma maneira intrínseca. É muito fácil cair na tentação de, ao “final” do caminho, batermos com as mãos no peito como o Fariseu da parábola de Lucas ou nos sentirmos injustiçados caso ninguém “reconheça” nossa “evolução”.

Aprender a trabalhar a via interior como algo íntimo para nós mesmos (e não para mostrarmos aos outros) certamente é o primeiro passo para o desenvolvimento espiritual.

A virtude cardeal do Sol é a MAGNANIMIDADE. A capacidade de brilhar e iluminar os outros ao seu redor. A virtude de brilhar pelo reto pensar, reto falar e reto agir. Assim como o orgulho é o pior de todos os vícios, a magnanimidade é a maior de todas as virtudes.

São Thomas de Aquino determinou sete características como inerentes ao orgulho:

Jactância – Ostentação, vanglória, elevar-se acima do que se realmente é.
Pertinácia – Uma palavra bonita para “cabeça-dura” e “teimosia”. É o defeito de achar que se está sempre certo.
Hipocrisia – o ato de pregar alguma coisa para “ficar bem entre os semelhantes” e, secretamente, fazer o oposto do que prega. Muito comum nas Igrejas.
Desobediência – por orgulho, a pessoa se recusa a trabalhar em equipe quando não tem suas vontades reafirmadas. Tem relação com a Preguiça.
Presunção – achar que sabe tudo. É um dos maiores defeitos encontrados nos céticos e adeptos do mundo materialista. A máxima “tudo sei que nada sei” é muito sábia neste sentido. Tem relação com a Gula.
Discórdia – criar a desunião, a briga. Ao impor nossa vontade sobre os outros, podemos criar a discórdia entre dois ou mais amigos. Tem relação com a Ira.
Contenda – é uma disputa mais exacerbada e mais profunda, uma evolução da discórdia onde dois lados passam não apenas a discordar, mas a brigar entre si. Tem relação com a Inveja.

ACÍDIA (Preguiça)

Isto provavelmente quase ninguém entre vocês deve saber, mas o nome original da Preguiça é Acídia. Acídia é a preguiça de busca espiritual. Quando a pessoa fica acomodada e passa a deixar que os outros tomem todas as decisões morais e espirituais por elas. É muito fácil de entender porque a Igreja Católica substituiu a Acídia pela Preguiça dentro dos “sete pecados”! trabalhar pode, mas pensar não !!!
A preguiça está ligada diretamente à LUA. Mas você já devia ter desconfiado disso… qual o dia da semana onde sentimos mais as influências destas energias? Moonday.
A virtude cardeal relacionada com a Lua é a HUMILDADE. É necessário lembrar que estamos sempre falando em termos espirituais dentro da alquimia. Em sua origem, a Humildade (Humilitas) está relacionada a “fazer o seu trabalho sem esperar reconhecimento e sem esperar por recompensas”. Humilde não é sinônimo de “coitadinho”, de “idiota”, de “pobrezinho” e outras tolices que vocês foram forçados a engolir por causa da Igreja. Uma pessoa humilde não precisa (nem deve) ser um pateta. “Cordeiro Humilde” nas palavras de Yeshua significa “Aquele que tem as características de Áries e faz o seu trabalho sem esperar reconhecimento”. Bem diferente do coitadinho medíocre que a Igreja espera que você seja.

São Thomas de Aquino determina sete características como filhas da acídia.
Desespero – quando o homem considera que o objetivo visado se tornou impossível de ser alcançado, por quaisquer meios, gerando um abatimento que domina o seu afeto.
Pusilanimidade – covardia, falta de ânimo, falta de coragem para encarar um trabalho árduo e que requer deliberação.
Divagação da mente – é quando um homem abandona as questões espirituais e se instala nos prazeres exteriores, permanecendo com sua mente rondando assuntos do âmbito material.
Torpor – estado de abandono onde a pessoa ignora a própria consciência.
Rancor – ressentimento contra aqueles que querem nos conduzir a caminhos mais elevados, o que acaba gerando uma agressividade. Está relacionado à Ira. Posso ver muito de rancor em relação aos textos ateístas e outros textos religiosos mais fanáticos..
Malícia – desprezo pelos próprios bens espirituais, resultando em uma opção deliberada pelo mal. Está ligada diretamente ao materialismo e á Luxúria. Hoje em dia tornou-se sinônimo de sexualidade explícita.
Preguiça – a falta de vontade ligada aos esforços físicos.

IRA

Defeito capital ligado diretamente a MARTE, representado acertadamente pelos Deuses da Guerra. A ira é o mal uso da energia agressiva de marte. Ao invés de direcioná-la para o sexo ou para os esportes, a pessoa canaliza este excesso de energia para a destruição. “Faça amor, não faça a guerra”. Com tantas travas e tabus sexuais, não é de se admirar que fanáticos religiosos sejam tão violentos.
A Virtude cardeal relacionada com marte é a DILIGÊNCIA, ou seja, a capacidade de guiar a energia e a capacidade de produzir de maneira efetivamente produtiva.
São Thomas de Aquino determina seis características inerentes como sendo filhas da Ira:
Insulto – uma forma de violência verbal, na qual o interlocutor visa ofender ou agredir moralmente o atacado, atingindo algum ponto fraco para humilhar o outro.
Perturbação – agitação física e psíquica produzida por emoções intensas e acumuladas. Um dos maiores problemas na psicologia, a tensão das emoções acumuladas pode gerar todo tipo de problemas no organismo.
Indignação – sentimento de ira em relação a uma ofensa ou ação injusta.
Clamor – queixa ou súplica em voz alta, reclamação, gritos tumultuosos de reprovação. Quando a Ira extravasa de uma pessoa para um grupo, como se fosse uma entidade viva (na verdade, astralmente, o Clamor É uma entidade viva, manifestada pelas Fúrias).
Rixa – briga, desordem, contestação, tumulto. A Rixa tem ligação com o Orgulho
Blasfêmia – difamação do nome de um ou mais deuses. A Ira voltada para dentro de si mesmo.

INVEJA

Defeito capital ligado ao Planeta MERCÚRIO. Hoje em dia, as pessoas utilizam-se do termo “inveja” de maneira errada. Seu sentido original quer dizer “Caminhar segundo o passo espiritual de outra pessoa”. Ter inveja de outra pessoa é tomar seu próprio caminho com base nos esforços e resultados obtidos por outras pessoas. A Inveja como a conhecemos hoje é a parte material do defeito.
Por esta razão que a Virtude cardeal associada a Mercúrio é a PACIÊNCIA. A paciência é a capacidade de caminhar (espiritualmente) no seu próprio ritmo. Não é sinônimo de “lerdeza” ou de “calma” ou de “ir devagar”… ir devagar é para gente devagar! Ter paciência é ter a capacidade de avançar nos estudos iniciáticos no seu próprio passo.
São Thomas de Aquino determina cinco características inerentes como sendo filhas da Inveja:

Exultação pela Adversidade – Diminuir a glória do próximo. Por causa do sentimento de inveja, a pessoa tenta de todas as maneiras diminuir o resultado do trabalho e das glórias das pessoas ao redor.
Detração – Significa falar mal às claras. Possui os efeitos semelhantes aos do murmúrio, com as mesmas intenções, mas mais abertamente. A diferença entre os dois é que a detração está maculada pelo Orgulho de se mostrar como causador do dano.
Ódio – o efeito final da inveja: o invejoso não apenas se entristece pelas conquistas do outro e deseja o fim das glórias e objetivos alcançados pelo próximo, mas passa a desejar o mal sob todos os aspectos para aquela pessoa também.
Aflição pela Prosperidade – A tristeza pela glória do próximo. Ocorre quando não se consegue de nenhuma maneira diminuir as realizações da outra pessoa, então passa a se entristecer com o resultado das conquistas alheias.
Murmuração – Também conhecido como fofoca, consiste em espalhar mentiras, meias-verdades, distorções, mentira (associada à Avareza) ou fatos embaraçosos ou depreciativos em relação a outra pessoa, com o intuito de prejudicar o próximo.

GULA

A gula, como já era de se esperar, era uma característica do Planeta JÚPITER. Júpiter, como o benfeitor da astrologia, rege a fartura e a prosperidade. O defeito é a gula e a virtude é a caridade.
Oras… estamos lidando com Excessos. A Gula é absorver o que não se necessita, ou o que é excedente. Pode se manifestar em todos os quatro planos (espiritual, emocional, racional e material). Claro que a igreja distorceu o sentido original da alquimia, adaptando-a para o mundo material, então hoje em dia, gula é sinônimo apenas de “comer muito”.
A virtude relacionada a Júpiter é a CARIDADE. A caridade lida com a maneira que tratamos nossos excessos. Ao invés de consumi-los sem necessidade, os doamos para quem não os possui. A caridade não está relacionada apenas a dinheiro, mas também aos 4 elementos da alquimia (espiritual, emocional, racional e material). Esta coluna, por exemplo, faz parte dos meus projetos de caridade intelectual.

São Thomas de Aquino determina cinco características inerentes como sendo filhas da gula:
Loquacidade Desvairada – a desordem no falar, o excesso de palavras atrapalhando e causando confusão mental. Está relacionada ao elemento Ar.
Imundície – aparência desleixada devido à falta de higiene por estar preocupado em demasia com a obtenção de excessos. Não tem o mesmo significado desta palavra em nosso vocabulário moderno, onde imundície quer dizer apenas “excesso de sujeira”, mas sim uma imundície espiritual, ligada à falta de cuidado com o corpo físico por conta dos excessos.
Alegria Néscia – desordem do pensamento e das emoções através do descontrole da vontade, muito associada ao ato de beber. Ligada ao elemento Água.
Expansividade Debochada – O excesso de gesticulações e movimentos do corpo ao comunicar, causando tumulto e desordenação.
Embotamento da inteligência – obstrução da razão devido ao consumo desordenado de alimentos.

LUXÚRIA

Defeito capital ligado ao Planeta VÊNUS, quer dizer em seu sentido original “deixar-se dominar pelas paixões”. Em português, luxúria foi completamente deturpado e levado apenas para o sentido físico e sexual da palavra, mas seu equivalente em inglês (Lust) ainda mantém o sentido original (pode-se usar expressões como “lust for money”, “lust for blood”, “lust for power”). A melhor tradução para isso seria “obsessão”. A luxúria tem efeito na esfera espiritual quando a pessoa passa a ser guiada pelas suas paixões ao invés de sua racionalidade. Para chegar ao auto-conhecimento, é necessário domar suas paixões (vide a representação do Arcano da Força no tarot!).
A virtude associada a Vênus é a TEMPERANÇA (do latim temperatia), ou a virtude de quem é moderado.

São Thomas de Aquino determina 8 características inerentes como sendo as filhas da Luxuria:
Cegueira da Mente – é aquela que nos impede de ver os acontecimentos, situações e ações ao nosso redor. A pessoa fica tão entregue às suas paixões que não consegue raciocinar nem intuir a respeito do mundo ao seu redor.
Amor de Si – faz com que a pessoa feche seus sentimentos para dentro de si mesmo, gerando um amor egoísta que segundo Thomas de Aquino é a origem de todos os outros pecados.
Ódio de Deus – com a vontade dominada pelas paixões, o indivíduo abandona a busca espiritual para se dedicar aos afazeres prazerosos mundanos, esquecendo sua busca por Deus no processo. Do esquecimento, estas paixões acabam se tornando ódio ao criador e a todo o mundo espiritual.
Apego ao Mundo – Os vícios e as paixões criam no indivíduo um apego ao mundo e aos seus desejos e ambições, desviando totalmente o foco espiritual de sua missão.
Inconstância – deixar-se dominar pelas paixões faz com que o indivíduo se torna inconstante, balançando sua dedicação à Grande Obra para dedicar-se às perseguições dos prazeres mundanos.
Irreflexão – Quando as paixões cegam o indivíduo, ele fecha-se a todo estímulo externo ou interno, procurando apenas satisfazer seus instintos, sem refletir nas conseqüências de seus atos.
Precipitação – da mesma forma, a urgência em saciar seus apetites e prazeres gera no indivíduo uma precipitação em agir sem pensar, tomando ações e atos sem o devido pesar.
Desespero em relação ao mundo futuro – os atos mal pensados ou não-pensados causam tantos problemas ao indivíduo que o levam a uma situação de desespero em relação ao seu futuro, quando se vê obrigado a encarar os resultados de suas ações.

AVAREZA

A Avareza (avaritia) é o defeito capital relacionado ao planeta SATURNO. Caracteriza-se pelo excesso de apegos pelo que se possui. Normalmente se associa avareza apenas ao significado materialista, de juntar dinheiro, mas sua manifestação nos outros elementos (espiritual, emocional e mental) é mais sutil e perniciosa. A avareza é a origem de todas as falsidades e enganações.
A virtude associada ao planeta Saturno é a CASTIDADE, ou a pureza dos costumes. Do latim Castitas, quer dizer “de sentimentos puros”. Normalmente a associação errada de “sentimentos puros” com a palavra “castidade” usada da maneira incorreta leva à associação de “abstinência sexual feminina” com “pureza”, esquecendo que esta pureza é Espiritual. A Mãe de Jesus que o diga.

São Thomas de Aquino determina sete características inerentes como sendo as filhas da Avareza:
Mentira – Ao procurar para si coisas que não lhe pertencem, o avaro pode se servir do engano. No desespero para não perder o que possui ou adquirir mais coisas que realmente não necessita, o avaro pode apelar para a falsidade. Se este se verificar através de simples palavras, caracteriza-se a mentira, mas se for através de juramento, então está classificada como Perjúrio.
Quanto ao engano em si: se for aplicado contra outras pessoas, classifica-se como Traição, se for em relação a coisas, classifica-se como Fraude:
Inquietude: Excesso de afã para juntar para si gera excessivas preocupações e cuidados.
Violência: Ao procurar para si bens alheios, o indivíduo pode se servir da violência, tamanha a ganância que possui, ao ver seus desejos negados pelo outro. O sentido esotérico se perdeu e violência hoje em dia é sinônimo de agressão, descaracterizando a razão causadora da agressão.
Dureza de Coração: O excesso de apegos pelo que se tem produz a dureza no coração, pois não permite à pessoa usar de seus bens para socorrer aos irmãos. Para se ser misericordioso, é necessário saber gastar seus bens excedentes.

Lição de Casa:
Utilizando-se da estrela Setenária, São Thomas de Aquino afirma que a bondade divina era tão grande que para cada Defeito Capital existiam DUAS virtudes que poderiam ser utilizadas para combatê-lo. Assim sendo, basta seguir as pontas da estrela para as virtudes associadas dos planetas opostos e meditar sobre quais virtudes podem ser utilizadas para combater os sete pecados capitais.

#Alquimia #hermetismo

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/se7en-a-origem-dos-sete-pecados-capitais

[parte 4/7] Alquimia, Individuação e Ourobóros: A arte Alquímica

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“Tudo vai, tudo volta; eternamente gira a roda do ser. Tudo morre, tudo refloresce, eternamente transcorre o ano do ser. Tudo se desfaz, tudo é refeito; eternamente constrói-se a mesma casa do ser. Tudo se repara, tudo volta a se encontrar; eternamente fiel a si mesmo permanece o anel do ser. Em cada instante começa o ser; em torno de todo o “aqui” rola a bola “acolá”. O meio está em toda parte. Curvo é o caminho da eternidade.”

– Nietzsche

Alquimia

Esta é a quarta parte da série de sete artigos “Alquimia, Individuação e Ourobóros”, que é melhor compreendida se lida na ordem. Caso queira acompanhar desde o começo, leia as parte 1, 2 e 3.

No post anterior, vimos que, o arquétipo de Hermes, juntamente com o simbolismo do caduceu, serve como organizador e centralizador da psique, atuando no “caos primordial”, estruturando-o e elevando seu potencial. Este caos primordial é análogo ao conceito de prima matéria dos alquimistas. Ambos os conceitos se apresentam como uma fonte de energia desordenada, cuja harmonização permite a obtenção de um potencial incalculável.

“Nasce como uma ciência natural que busca a compreensão da própria natureza a partir de uma especulação filosófica, como se pode ver já na filosofia pré-socrática no século VI a C. É dela que nasce o conceito de prima matéria a partir da crença de que o mundo tinha origem em uma única substância que era subdividida nos quatro elementos terra, ar, fogo e água, os quais, segundo diferentes recomposições faziam surgir todos os objetos físicos existentes no universo. Esta idéia, a prima matéria, teve sua evolução chegando com Aristóteles a ser considerada como pura potencialidade, que em seguida adquire forma, quando é atualizada na realidade.” (SANTOS, 2013)

Para Jung (2008), a manipulação da prima matéria, correspondente aos aspectos inconscientes dissociados. O alquimista tem que realizar a Opus Alquimica, que corresponde ao processo de individuação, transformando seus conteúdos internos e os trazendo a luz da consciência. Esse processo acontece através de três (podem ser quatro) momentos alquímicos e psíquicos: nigredo, albedo, rubedo. Vale a pena frisar que as metáfora alquímicas compreendem um vasto simbolismo, que varia entre os alquimistas e pesquisadores, porém todos resultam no mesmo objetivo: a obtenção da pedra filosofal.

Dentro destes momentos, pode-se dividir a Opus em diferentes estágios, que variam dentro do arcabouço alquímico, mas que neste trabalho, será utilizado as definições de Hauck (1999), podendo ser resumidas em sete estágios de transformação: calcinação, dissolução, separação, conjunção, fermentação, destilação e coagulação.

Esta imagem mandálica é um clássico da alquimia medieval, ela foi primeiramente publicada em 1959 pelo alquimista alemão Basil Valentine, e representa o conceito de Azoth:

“Azoth era considerado como um remédio universal, ou solvente universal utilizado na alquimia. Seu símbolo era o caduceu; o termo, que foi originalmente um nome para uma fórmula oculta necessária para os alquimistas parecida com a pedra filosofal, se tornou uma palavra poética para o elemento mercúrio, o nome é proveniente do Latim Medieval, uma alteração de “azoc”, sendo originalmente derivado do árabe “al-zā’būq”, que significa “o mercúrio”.” [tradução livre] http://en.wikipedia.org/wiki/Azoth

Esta imagem irá nos guiar frente ao simbolismo utilizado na metáfora alquímica. No centro da imagem temos o homem, alquimista. A sua direita, um rei, princípio masculino, solar, a sua esquerda uma rainha, princípio feminino, lunar. A dicotomia já nos é evidente, sugerindo que a integração destes aspectos seriam necessários para atingir a Opus.

Podemos notar a presença dos quatro elementos, como manifestação quaternária do todo, associados à tipologia junguiana. Vemos na imagem, o pé direito do homem na terra, seu pé esquerdo na água, sua mão direta segurando uma tocha, associada ao fogo, e sua mão esquerda segurando uma pena, associada ao elemento ar. Há também os triângulos adjacentes a roda, representando a manifestação trina do corpo, alma e espírito.

Na parte superior da figura, é possível ver uma estranha figura alada, que pode ser associada com o disco solar egípcio ou o topo do caduceu de Hermes (Mercúrio), analisado anteriormente. Exstem uma série de simbolismos na imagem, como por exemplo o leão sob o rei, a salamandra em chamas e os pássaros da roda, porém seria necessário um outro post apenas para interpretá-los.

Por fim, temos a circular dos raios, associados com diferentes cores, que representam os estágios alquímicos. Estes estágios serão nosso foco daqui pra frente.

As etapas Alquímicas

O primeiro raio está associado à calcinação, ou calcinato, intrínseca ao elemento fogo. Para Hauck, esta etapa está psicologicamente associada a morte do ego e destruição dos mecanismos de defesa, a extinção do interesse no mundo material, e as respectivas ilusões associadas a este. Inicia-se o processo de enegrecimento, podemos citar como ilustração desta etapa, “escuro e nebuloso é o início de todas as coisas, mas não o seu fim”, frase de autor desconhecido.

Para Masan (2009), esta operação é realizada na Sombra, onde permanecem os desejos instintivos e não integrados. O fogo é está ligado com a frustração dos desejos, aspecto natural do processo de desenvolvimento associado ao Si-mesmo.

“Os aspectos do ego identificados com as energias transpessoais da psique (Self ou mesmo, o fogo Divino) e utilizados para fins pessoais, sejam de poder ou de prazer, serão calcinados. Quanto maior a dicotomia entre bem e mal, certo e errado, ou seja, quanto maior a polarização desses aspectos neuróticos, mais longa será a calcinação desses elementos, até que o fogo da própria culpa esvazia a balança do julgamento por essa imagem punitiva e compensatória, representada pela ira divina, enquanto imagem arquetípica constelada no psiquismo”(MASSAN, 2009, 26).

O segundo raio está associado com a etapa de dissolução, ou solutio, representada pelo elemento água. Psicologicamente dizendo, está atrelada com a quebra das estruturas artificiais da psique, através da imersão no inconsciente, ou das partes irracionais e rejeitadas. O elemento água como uma abertura das comportas, e inundação de energias pessoais antes cristalizadas, dissolução de aspectos fixos da personalidade.

“A operação apresenta, no aspecto negativo e sombrio, um sentido de dissolução da matéria diferenciada ou conteúdo do ego […]. Por outro lado, em seus aspectos superiores, onde ocorre à transposição de opostos, consolida-se o espírito, ou seja, os aspectos transpessoais da pisque objetiva, o Si-mesmo. É o encontro com o Numinoso, que reestabelece a saúde da relação ego-Self, salvando apenas o que vale ser salvo, os conteúdos realmente alinhados com o Si-mesmo, e redimindo os conteúdos comprometidos, derretendo-os ou reordenando-os em novas estruturas”.(MASAN, 2009, 14)

O terceiro raio diz respeito à separação, ou separatio. É o momento de captar tudo aquilo que sobrou das etapas anteriores e selecionar. É recuperar a energia congelada dos hábitos e pensamentos cristalizados (pré-conceitos, crenças, fobias). Refere-se à essência e energia separada das amarras da matéria. Esta psicologicamente associada à escolha dos aspectos dissolvidos anteriormente, desapegando daquilo que não mais apresenta valor psíquico, explicitando a essência e valores espirituais, portanto, associado ao elemento ar.

“Surge aí à necessidade de dissecar esses conteúdos do inconsciente pessoal e coletivo e realizar a escolha, a separatio, trazendo a consciência, através do ato de julgar, uma vinculação com o Self. Isso requer um poder para arcar com o ônus dessa escolha, uma desvinculação da necessidade de atender aos critérios do outro, mas sim de ser fiel àquilo para o que aponta o Si-mesmo, da mesma forma como não se pode servir a dois senhores, só que sem o domínio neurótico da unilateridade” (MASAN, 2009, 25).

A conjunção, ou coniunctio, é análoga ao quarto raio da figura. Conjunção é a grande guinada do opus alquímico. Notemos que na figura, através do movimento circular, existe o deslocamento das forças da alma (na direita), para o espírito (na esquerda). Em nível pessoal, a conjunção é o fortalecimento do nosso verdadeiro Self, a união dos aspectos masculinos e femininos de nossa personalidade em um novo sistema psíquico. Esta etapa corresponde à ‘pequena pedra’, ou o primeiro esboço do que seria a pedra filosofal atingida no final da operação.

“Conjunção pode ser vista com a criação de um self superior e a conquista do que Carl Jung nomeou de individuação, no qual o self fragmentado é reunido à um todo original. A criação desta pessoa completa e harmoniosa significa que atingimos nosso máximo no plano terrestre”. (HACUK, 1999, 162)

Associada então com o elemento terra, a conjunção pode ser divida em duas sub-etapas, segundo Masan: coniunctio inferior e superior. Na primeira, a união dos opostos separados de forma imperfeita, resulta em algo que deverá ser submetido a novos procedimentos.

Masan define que a coniunctio inferior acontecerá sempre que o ego identificar aspectos inconscientes, como a sombra, anima, ou mesmo o Si-mesmo (Self), através de uma perspectiva introvertida ou coletiva. Essa identificação deve ser ‘purificada’, ou seja, eliminada, redimida, para dar continuidade ao processo de individuação. A coniunctio superior representa a conjunção mor dos aspectos previamente impossíveis de serem integrados. Após passar pelos estágios anteriores da Opus, a prima matéria pode finalmente ter seus opostos complementados.

“Assim como na alquimia, a psique, dentro do processo analítico, vai transformando-se, ora dispondo-se num lado e ora de outro, no sentido das suas polaridades, até que lhe seja capaz a absorção de uma terceira figura, gradativa e construída, surgida de dentro da sua própria alma que lhe traduz essa expressão de convivência com o dual. A dissolução do conflito, gerado pelas dicotomias neuróticas, concebe o cenário onde essa pedra, em cujo seio se fixa o espírito, se manifesta. […] O casamento Divino, que somente existirá se ali houver o Amor, sua causa e seu efeito.

Enquanto na coniunctio inferior o amor é concupiscente, aqui, na coniunctio superior, esse amor é transpessoal. Revela-se no mundo como o altruísmo em seu sentido extrovertido e na psique, como a conexão com o Si-mesmo, gerando a unidade” (MASSAN, 2009, 34).

Masan apresenta o Amor como uma das chaves para a integração psicológica dos opostos. Seria insensato pensar em amor se associá-lo com o coração. A simbologia do coração é estudada no livro “A Psique do Coração”, de Denise Ramos. A autora apresenta mitos e imagens de culturas americanas que tinham como centro o coração, sendo ele, em quase todas as histórias um ícone do sagrado ou oferecido ao sagrado.

No capítulo “Elegias Para Acalmar o Coração”, é somado às ideias de rezas para ‘abrir’ o coração e permitir o esvaziamento do sofrimento com o preenchimento de Deus. No capítulo “O Coração em Julgamento” é recapitulado toda a simbologia do coração no antigo Egito, como este sendo um exemplar da alma do indivíduo.

Ainda nesse mito egípcio, ao morrer, o coração era pesado numa balança, onde na contraparte ficava a pena de Maat. Neste julgamento especial, se o coração fosse mais pesado que a pena, ou seja, estivesse carregado das impurezas do ego, não era permitido ao falecido integrar-se a completude.

No sub-capítulo “O Lugar Secreto” é destacado o valor simbólico do coração na tradição hindu, e como o coração está associado nestas culturas como o ‘lugar da consciência”, sendo o Self em si, o lugar que o homem emana a si mesmo, um guia de luz.

Ainda segundo a autora, Anãhata é a representação do chakra cardíaco no Tantra Yoga, que une os chakras superiores com os inferiores, o Tantra Yoga tem como objetivo alinhar e equilibrar as polaridades masculinas e femininas. Tal equilíbrio acontece no coração, e quando acontece, o praticante da técnica consegue ouvir o som ‘hum’ (ॐ), do vazio, que emana por todo o tempo e espaço.

Essas informações aparecem no sub-capítulo “O Lugar do Som Universal”. Uma frase que pode exemplificar o amor como via de integração das polaridades é a de Nietzsche: “Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal”.

Hauck (1999) sincretiza o processo alquímico da conjunção da seguinte forma: “Psicologicamente, Conjunção é usar a energia sexual dos corpos para transformação pessoal. Conjunção se ocupa no corpo no nível do coração”

A próxima figura, é uma foto tirada no dia 06/06/2013 no Elevado Presidente Costa e Silva, São Paulo, conhecido também como “Minhocão”:

É possível perceber inúmeras analogias com os temas tratados neste trabalho. A expressão artística urbana expressando a angústia de uma sociedade doente, cindida. Amor e Ourobóros como resoluções arquetípicas coletivas. Apesar de toda a fertilidade do tema social em questão, voltemos a descrição das etapas alquímicas.

Podemos perceber, portanto, que apesar de todo o processo alquímico estar intimamente ligado ao processo de individuação, a etapa de Conjunção é a que representa o ápice do processo, que é a integração dos aspectos complementares.

A quinta etapa do processo alquímico descrito por Hauck, observado na imagem é a fermentação. É a introdução de uma nova perspectiva de vida, resultado da etapa anterior – Conjunção – que é a ascensão para um novo estado de consciência, a transição para um estado mental elevado. Nesta etapa, existe a transição da nigredo para a leukosis, resultando no aparecimento da cauda pavonis, metáfora para imaginação ativa e ‘coloração da vida’, alguns autores definem esse amarelamento (leukosis) e o aparecimento da “cauda pavonis” como uma quarta etapa, entre o nigredo e albedo, enquanto outros, definem apenas como um aspecto transitório entre estas duas etapas. Representa psicologicamente a transição da psique para um estado mais conectado com o espírito, ou na nomenclatura junguiana, Si-mesmo (Self).

O penúltimo raio é análogo à etapa de destilação, ou destilatio. Neste estágio a metáfora que se apresenta é o aumento da pureza, associado com a cor branca, ou albedo. Psicologicamente, representa o esforço para que as impurezas do ego e do id não sejam incorporadas no último estágio. Representa a eliminação dos sentimentalismos e emoções, ou ainda melhor, das paixões egoístas e infantis, aspectos que na manifestação do verdadeiro Self, não são pertinentes, uma vez que se procura um estado pleno de espiritualidade.

“Seus pensamentos e sentimentos são os sentimentos e pensamentos do Universo inteiro”, Esta declaração descreve o processo de destilação, onde [o alquimista] se tornou muito mais interessado no bem maior do que apenas em seu próprio. É a fase de transformação onde estamos espiritualmente e emocionalmente maduros o suficiente para fundir-nos com o inconsciente coletivo sem sermos devastados pelo o que encontramos lá. A razão pela qual nós podemos manter o nosso equilíbrio, depois de ter chegado à fase de destilação é que o ego não nos controla e, portanto, podemos apreciar os mistérios do coletivo – e pessoal – material da sombra, sem a intromissão do ego.

Destilação traz o criativo fora de nós. Ela incentiva tudo o que somos se manifestar em formas equilibradas e serenamente poderosas. Ele anuncia a entrada da influência das forças superiores e do equilíbrio dessas forças com os inferiores, que fornecem firmeza, tão crucial para a totalidade” (SHANDERÁ, 2002).

O sétimo e último estágio é chamado de coagulação, ou coagulatio. Representa a ressurreição do espírito, materializado no corpo.

“A Coagulatio é uma operação que expressa, pelas suas imagens, o processo de formação do ego e sua ligação com os aspectos da vida, as forças ctônicas, através da vivência da carnalidade no seu sentido mais amplo, construindo, pelas experiências, a terra onde se lastreia o ego em seu caminhar e, logicamente, configurando, por essas mesmas vivências, a relação do eixo Ego-Self” (MASSAN, 2009, 34)

É a representação da pedra filosofal, ou Grande Pedra, antes anunciada pela coniunctio. O alquimista adentra o estágio de rubedo, e pode “curar-se de todas as feridas e enfermidades” (HAUCK, 1999, 140). Esta etapa é utilização da libido dentro de sua forma plena, integrada com a impulsão da consciência para os estados mais elevados do vir-a-ser.

“Vale ressaltar que o desejo é o agente da coagulatio. Esta operação é necessária não para aqueles que já se movimentam adequadamente dentro de sua libido, mas para aqueles outros com uma inconsistência em seu querer e o temor de colocar os pés na vida, com dificuldade, inclusive de sorver os cálices que ela dispõe. O desenvolvimento do ego nestes casos passa pelo lugar dessa consciência e realização do desejo, a fim de que haja a movimentação da energia psíquica” (MASSAM, 2009, 22).

Neste estágio, para Hamilton (1985), é manifestada, no alquimista a vontade de encarnar na terra o estado de consciência iluminado na mente e no corpo. É como se uma alma desejasse ser ‘encorpada’ sem o senso de separação do seu estado puro original. Só quando a alma está encarnada na psique que pode ser vivenciado o estado espiritual de completude. A psique pode agora expressar as qualidades da alma e da natureza. A frase “assim na terra como no céu” ilustra com perfeição este estado.

“Esta união do espírito / alma com o corpo / mente representa o final e mais importante casamento alquímico. Agora a anima torna-se a Mãe de Deus, ou a Consorte de Deus, o objeto do amor místico. As figuras de animus correspondentes são Os Iluminados – Cristo, Buda, Santos, etc. Isto significa que a consciência de Deus, ao nascer no mundo da terra, percebe sua natureza divina conscientemente – como um indivíduo transcendental e iluminado, num estado de unidade com o todo cósmico. Isso, então, é a pedra filosofal que o alquimista procurava. É o grande ponto culminante da Grande Obra” (HAMILTON, 1985, 8).

Ainda para o autor, o equivalente terapêutico é fácil de ser percebido, uma vez que o paciente transcendeu a natureza de seus dilemas e conflitos, e isso envolve uma mudança de personalidade que vai acomodar e manter essa realização. O paciente percebe que sua vida tem sido uma imposição que resultou numa série de problemas, e agora inicia um processo de mudança para uma sustentação mais pertinente a sua verdadeira natureza.

Hauck (1999) define que, ao atingir este estágio, o raio de transformação se volta a terra, e é iniciado novamente o ciclo previamente proposto, indicando que os estágios e transformações são processos eternos e constantes, assim como a lapidação do Self, ou o processo de individuação proposto por Jung, fazendo com que o alquimista volte à etapa de nigredo, e continue seu processo.

“Tudo o que coagula está sujeito a transformar-se. Dai decorre que após a coagulatio, os processos de putrefactio e mortificatio se realizam também, até porque, o fim da encarnação é o desencarne, visto que está sujeito às injunções do tempo e do espaço” (MASSAN, 2009, 27).

Percebemos que o processo alquímico é cíclico, e, assim como o processo de individuação, exige um constante processo de atuação do indivíduo para com seus conteúdos, processo este que Jung define acontecer por toda a vida.

A mesma metáfora pode ser utilizada para definir o Ourobóros, um processo cíclico e constante, que representa a integração de opostos e a volta para a unidade. No capítulo seguinte iremos analisar a figura arquetípica do Ourobóros e avaliar suas correspondências com o processo alquímico e o de individuação.

Referências Bibliográficas:

HAMILTON, Nigel. The Alchemical Process of Transformation. Disponível em: http://www.sufismus.ch/assets/files/omega_dream/alchemy_e.pdf. 14/05/2013

HAUCK, Dennis Willian. The Emerald Tablet: Alchemy for Personal Transformation. Arkana. Ed.Pengun Group. 1999.

MASSAN, Francisco. Opus Alquímica e Psicoterapia. Disponível em: www.clinicapsique.com/doc/opus.doc. 14/05/2013

RAMOS, Denise Gimenez. A Psique do Coração: Uma Leitura Analítica de seu Simbolismo. São Paulo. Cultrix. 1990.

SANTOS, Vitor P. Calixto. Jung e a Metáfora Alquímica. Disponível em http://www.symbolon.com.br/artigos/jungeameta.htm. 14/05/2013

SHANDERÁ, Nanci. The Alchemy in Spiritual Progress – Part 7: Distillation. Disponível em: http://alchemylab.com/AJ3-1.htm. 14/05/2013

Imagens:

“Nigredo, Albedo e Rubedo” de Thomas Norton em ‘Ordinal of Alchemy’, 1477

“Azoth” de Basil Valentine

“Calcinato Angelus” de Suanne Iles

Trecho do filme “Elena” de Petra Costa, 2013

“Artodyssey” de Tomasz Alen Kopera

A interação das polaridades (sol e lua). “Rosarium Philosophorum”, Séc XVI

Andrógino, representando a natureza dual. “Rosarium Philosophorum”, Séc XVI

“Heart Chakra” de Ormus Oils

Coração e pena na balança em hieróglifo egípcio

“Mais amor por favor” (ygormarotta.com/mais-amor-por-favor)

Pavão em tecido

Gravura representando a destilação, capa do livro “O Museu Hermético” de Alexander Robb

“Aquamarine Muse” de Philip Rubinov Jacobson

A natureza de Buddha

Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br

#Alquimia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/parte-4-7-alquimia-individua%C3%A7%C3%A3o-e-ourob%C3%B3ros-a-arte-alqu%C3%ADmica

O Afogado Mais Bonito do Mundo

Os primeiros meninos que viram o volume escuro e silencioso que se aproximava pelo mar imaginaram que era um barco inimigo. Depois viram que não trazia bandeiras nem mastreação, e pensaram que fosse uma baleia. Quando, porém, encalhou na praia, tiraram-lhe os matos de sargaços, os filamentos de medusas e os restos de cardumes e naufrágios que trazia por cima, e só então descobriram que era um afogado.Tinham brincado com ele toda a tarde, enterrando-o e o desenterrando na areia, quando alguém os viu por acaso e deu o alarme no povoado. Os homens que o carregaram à casa mais próxima notaram que pesava mais que todos os mortos conhecidos, quase tanto quanto um cavalo, e disseram que talvez tivesse estado muito tempo à deriva e a água penetrara-lhe os ossos. Quando o estenderam no chão viram que fora muito maior que todos os homens, pois mal cabia na casa,mas pensaram que talvez a capacidade de continuar crescendo depois da morte estava na natureza de certos afogados. Tinha o cheiro do mar e só a forma permitia supor que fosse o cadáver de um ser humano, porque sua pele estava revestida de uma couraça de rêmora e de lodo.Não tiveram que limpar seu rosto para saber que era um morto estranho. O povoado tinha apenas umas vinte casas de tábuas, com pátios de pedra sem flores, dispostas no fim de um cabo desértico. A terra era tão escassa que as mães andavam sempre com medo de que o vento levasse os meninos, e os poucos mortos que os anos iam causando tinham que atirar das escarpas. Mas o mar era manso e pródigo, e todos os homens cabiam em sete botes. Assim, quando encontraram o afogado, bastou-lhes olhar uns aos outros para perceber que nenhum faltava.Naquela noite não foram trabalhar no mar. Enquanto os homens verificavam se não faltava alguém nos povoados vizinhos, as mulheres foram cuidando do afogado. Tiraram-lhe o lodo com escovas de esparto, desembaraçaram-lhe os cabelos dos abrolhos submarinos e rasparam a rêmora com ferros de descamar peixes. À medida que o faziam, notaram que a vegetação era de oceanos remotos e de águas profundas; e que suas roupas estavam em frangalhos, como se houvesse navegado entre labirintos de corais. Notaram também que carregava a morte com altivez, pois não tinha o semblante solitário dos outros afogados do mar, nem tampouco a catadura sórdida e indigente dos afogados dos rios. Somente, porém, quando acabaram de limpá-lo tiveram consciência da classe de homens que era, e então ficaram sem respiração. Não era só o mais alto, o mais forte, o mais viril e o mais bem servido que jamais tinham visto, senão que,embora o estivessem vendo, não lhes cabia na imaginação.

Não encontraram no povoado uma cama bastante grande para estendê-lo, nem uma mesa bastante sólida para velá-lo. Não lhe serviram as calças de festa dos homens mais altos, nem as camisas de domingo dos mais corpulentos, nem os sapatos do maior tamanho. Fascinadas por sua desproporção e sua beleza, as mulheres decidiram então fazer-lhe umas calças com um bom pedaço de vela carangueja e uma camisa de cretone de noiva, para que pudesse continuar sua morte com dignidade. Enquanto costuravam, sentadas em círculo, contemplando o cadáver entre ponto e ponto, parecia-lhes que o vento não fora nunca tão tenaz nem o Caribe estivera tão ansioso quanto naquela noite, e supunham que essas mudanças tinham algo a ver com o morto.Pensavam que, se aquele homem magnífico tivesse vivido no povoado, sua casa teria as portas mais largas, o teto mais alto e o piso mais firme, e o estrado de sua cama seria de cavernas mestras com pernas de ferro, e sua mulher seria a mais feliz. Pensavam que tivera tanta autoridade que poderia tirar os peixes do mar só os chamando por seus nomes, e pusera tanto empenho no trabalho que fizera brotar mananciais entre as pedras mais áridas, e semear flores nas escarpas. Compararam-no, em segredo, com seus homens, pensando que não seriam capazes de fazer, em toda uma vida, o que aquele era capaz de fazer numa noite, e acabaram por repudiá-los, no fundo de seus corações, como os seres mais fracos e mesquinhos da terra. Andavam perdidas por esses labirintos de fantasia, quando a mais velha das mulheres, que por ser a mais velha contemplara o afogado com menos paixão que compaixão, suspirou: __ Tem cara de se chamar Estêvão.Era verdade. À maioria bastou olhá-lo outra vez para compreender que não podia ter outro nome.As mais teimosas, que eram as mais jovens, mantiveram-se com a ilusão de que, ao vesti-lo,estendido entre flores e com uns sapatos de verniz, pudesse chamar-se Lautaro. Mas foi uma ilusão vã. O lençol ficou curto, mal cortadas e pior costuradas, ficaram apertadas e as forças ocultas de seu coração faziam saltar os botões da camisa. Depois da meia noite diminuíram os assobios do vento e o mar caiu na sonolência da quarta feira. O silêncio pôs fim às últimas dúvidas:era Estêvão. As mulheres que o vestiram, as que o pentearam, as que lhe cortaram as unhas e barbearam não puderam reprimir um estremecimento de compaixão quando tiveram de resignar-se a deixá-lo estendido no chão. Foi então quando compreenderam quanto devia ter sido infeliz com aquele corpo descomunal, se até depois de morto o estorvava. Viram-no condenado em vida a passar de lado pelas portas, a ferir-se nos tetos, a permanecer de pé nas visitas, sem fazer o que fazer com suas ternas e rosadas mãos de boi marinho, enquanto a dona da casa procurava a cadeira mais resistente e suplicava-lhe, morta de medo, sente-se aqui Estêvão, faça-me o favor, e ele encostado nas paredes, sorrindo, não se preocupe senhora, estou bem assim, com os calcanhares em carne viva e as costas abrasando de tanto repetir o mesmo, em todas as visitas,não se preocupe senhora, estou bem assim, só para não passar pela vergonha de destruir a cadeira, e talvez sem ter sabido nunca que aquele que lhe diziam não se vá, Estêvão, espere pelo menos até que aqueça o café, eram os mesmos que, depois, sussurravam já se foi o bobo grande,que bom, já se foi o bobo bonito. Isto pensavam as mulheres diante do cadáver um pouco antes do amanhecer.

Mais tarde, quando lhe cobriram o rosto com um lenço para que não o maltratasse a luz, viram-no tão morto para sempre, tão indefeso, tão parecido com seus homens, que se abriram as primeiras gretas de lágrimas nos seus corações. Foi uma das mais jovens que começou a soluçar. As outras, consolando-se entre si, passaram dos suspiros aos lamentos, e enquanto mais soluçavam, mais vontade sentiam de chorar, porque o afogado estava se tornando cada vez mais Estevão, até que o choraram tanto que ficou sendo o homem mais desvalido da Terra, o mais manso, o mais serviçal, o pobre Estêvão. Assim que, quando os homens voltaram com a notícia de que o afogado também não era dos povoados vizinhos, elas sentiram um vazio de júbilo entre as lágrimas. __ Bendito seja Deus __ suspiraram: __ é nosso!Os homens acreditaram que aqueles exageros não eram mais que frivolidades de mulher.Cansados das demoradas averiguações da noite, a única coisa que queriam era descartar-se deuma vez do estorvo do intruso, antes que acendesse o sol bravo daquele dia árido e sem vento.Improvisaram umas padiolas com restos de traquetes e espichas, e as amarraram com carlingas de altura, para que resistissem ao peso do corpo até as escarpas. Quiseram prender-lhe aostornozelos uma ancora de navio mercante para que ancorasse, sem tropeços, nos mares mais profundos, onde os peixes são cegos e os búzios morrem de saudade, de modo que as más correntes não o devolvessem à margem, como acontecera com outros corpos. Porém, quanto mais se apressavam, mais coisas as mulheres lembraram para perder tempo.

Andavam como galinhas assustadas, bicando amuletos do mar nas arcas, umas estorvando aqui porque queriam pôr no afogado os escapulários do bom vento, outras estorvando lá para abotoar-lhe uma pulseira de orientação; e depois de tanto sai daí mulher, ponha-se onde não estorve, olhe que quase me faz cair sobre o defunto, aos fígados dos homens subiram as suspeitas e eles começaram a resmungar, para que tanta bugiganga de altar-mor para um forasteiro, se por muitos cravos e caldeirinhas que levasse em cima os tubarões iam mastigá-lo, mas elas continuavam ensacando suas relíquias de quinquilharia, levando e trazendo, tropeçando, enquanto gastavam em suspiros o que poupavam em lágrimas, tanto que os homens acabaram por se zangar, desde quando aqui semelhante alvoroço por um morto ao léu, um afogado de nada, um presunto de merda. Uma das mulheres, mortificada por tanta insensibilidade, tirou o lenço do rosto do cadáver e também os homens perderam a respiração.Era Estêvão. Não foi preciso repeti-lo para que o reconhecessem. Se lhe tivessem chamado SirWalter Raleigh, talvez, até eles ter-se-iam impressionado com seu sotaque de gringo, com sua arara no ombro, com seu arcabuz de matar canibais, mas Estêvão só podia ser único no mundo e ali estava atirado, como um peixe inútil, sem polainas, com umas calças que não lhe cabiam e umas unhas cheias de barro, que só se podia cortar à faca. Bastou que lhe tirassem o lenço do rosto para perceber que estavam envergonhado, de que não tinha culpa de ser tão grande, nem tão pesado, nem tão bonito, e se soubesse que isso ia acontecer, teria procurado um lugar mais discreto para afogar-se, de verdade, me amarraria eu mesmo uma âncora de galeão no pescoço e teria tropeçado como quem não que nada nas escarpas, para não andar agora estorvando comeste morto de quarta-feira, como vocês chamam, para não molestar ninguém com esta porcaria de presunto que nada tem a ver comigo. Havia tanta verdade no seu modo de estar que até os homens mais desconfiados, os que achavam amargas as longas noites no mar, temendo que suas mulheres se cansassem de sonhar com eles para sonhar com os afogados, até esses, e outros mais empedernidos, estremeceram até a medula com a sinceridade de Estêvão.

Foi por isso que lhe fizeram os funerais mais esplêndidos que se podiam conceber para um afogado considerado enjeitado. Algumas mulheres, que tinham ido buscar flores nos povoados vizinhos, voltaram com outras que não acreditavam no que lhes contavam, e estas foram buscar mais flores quando viram o morto, e levaram mais e mais, até que houve tantas flores e tanta gente que mal se podia caminhar. Na última hora, doeu-lhes devolvê-lo órfão às águas, e lhe deram um pai e uma mãe dentre os melhores, e outros se fizerem seus irmãos, tios e primos, de tal forma que, através dele, todos os habitantes do povoado acabaram por ser parentes entre si.Alguns marinheiros que ouviram o choro à distância perderam a segurança do rumo, e se soube de que um se fez amarrar ao mastro maior, recordando antigas fábulas de sereias. Enquanto se disputavam o privilégio de carregá-lo nos ombros, pelo declive íngreme das escarpas, homens e mulheres perceberam, pela primeira vez, a desolação de suas ruas, a aridez de seus pátios, a estreiteza de seus sonhos, diante do esplendor e da beleza do seu afogado. Jogaram-no sem âncora, para que voltasse se quisesse, e quando o quisesse, e todos prenderam a respiração durante a fração de séculos que demorou a queda do corpo até o abismo. Não tiveram necessidade de olhar-se uns aos outros para perceber que já não estavam todos, nem voltariam a estar jamais. Mas também sabiam que tudo seria diferente desde então, que suas casas teriam as portas mais largas, os tetos mais altos, os pisos mais firmes, para que a lembrança de Estevão pudesse andar por toda parte,

sem bater nas traves, e que ninguém se atrevesse a sussurrar no futuro já morreu o bobo grande, que pena, já morreu o bobo bonito, porque eles iam pintar as fachadas de cores alegres para eternizar a memória de Estêvão, e iriam quebrar a espinha cavando mananciais nas pedras e semeando flores nas escarpas para que, nas auroras dos anos venturosos,os passageiros dos grandes navios despertassem sufocados por um perfume de jardins em alto-mar, e o capitão tivesse que baixar do seu castelo de proa, em uniforme de gala, astrolábio, estrela polar e sua enfiada de medalhas de guerra, e, apontando o promontório de rosas no horizonte doCaribe, dissesse em catorze línguas, olhem lá, onde o vento é agora tão manso que dorme debaixo das camas, lá, onde o sol brilha tanto que os girassóis não sabem para onde girar, sim, lá é o povoado de Estêvão.

Gabriel Garcia Marques
“A incrível e triste história da Cândida Erêndira e sua avó desalmada”, pág. 46 – 55.
Tradução de Remy Gorga, Filho
Editora Record, 22 edição.

Que as vossas Rosas floresçam na tua Cruz.

Sérvio Túlio é estudante de Letras, membro do Projeto Mayhem e autor do blog Jedi Teraphim.

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E que a Força esteja com vocês.

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/o-afogado-mais-bonito-do-mundo

[parte 2/7] Alquimia, Individuação e Ourobóros: Psicologia Analítica

“Só o que está separado pode ser devidamente unido.”

– Alquimista desconhecido

Esta é a segunda parte da série de sete artigos “Alquimia, Individuação e Ourobóros”, que é melhor compreendida se lida na ordem. Caso queira acompanhar desde o começo, leia a introdução.

Individuação

Na escola analítica, compreende-se que a psique seja maior que a consciência em si, ou seja, a existência de todo um campo inconsciente que interfere e interage com a mente consciente. Além do inconsciente pessoal, Jung (2011) defende a existência de um inconsciente coletivo, um plano de consciência no qual ficariam armazenados toda a herança cultural da sociedade, acessível ao nível consciente, cujo encontro, através de arquétipos, acrescentam e expandem a consciência.

Arquétipos podem ser definidos como temas típicos que aparecem em toda forma de sociedade e cultura, que abriga um significado primordial de estruturas psíquicas, os quais os indivíduos experienciam em níveis pessoais. Em Os arquétipos e o Inconsciente Coletivo (JUNG, 2011), o autor define que “O arquétipo representa essencialmente um conteúdo inconsciente, o qual se modifica através de sua conscientização e percepção, assumindo matrizes que variam de acordo com a consciência individual na qual se manifesta” (JUNG, 2011).

De acordo com Jung (1998), apesar da expressão social e coletiva de imagens e energias ligadas à ideia de divino, em nível individual, é necessário que o ser humano permita-se atravessar por tais ideias, pois isso ajuda sua natureza no processo de transcendência e auto-conhecimento – processo chamado de individuação. Em “O Poder do Mito” (CAMPBELL, 1999), o autor cita Nietzsche e toda sua teoria do eterno retorno, para demostrar a existência humana como cíclica. Nesta teoria, há a defesa de que as vivências humanas se dão através da polarização complementar dos aspectos pessoais que se repetem interminavelmente ao longo da existência, demarcando também a noção de infinito, porém ligada a psique humana e não em alguma entidade fora dela.

“Podemos dizer que a personalidade humana é constituída de duas partes: a primeira é a consciência e tudo o que ela abrange; a segunda é o interior de amplidão indeterminada da psique inconsciente. A personalidade consciente é mais ou menos definível e determinável. Mas, em relação à personalidade humana, como um todo, temos de admitir a impossibilidade de uma descrição completa dela. Em toda personalidade existe inevitavelmente algo de indelineável e de indefinível, uma vez que ela apresenta um lado consciente e observável, que não contém determinados fatores, cuja existência, no entanto é forçoso admitir, se quisermos explicar a existência de certos fatos. Estes fatores desconhecidos constituem aquilo que designamos como o lado inconsciente da personalidade” (JUNG, 1989, 47).

Realizar a síntese destes opostos no Si-mesmo é a meta do processo de individuação. Isso ocorre com a discriminação e a consequente integração de conteúdos inicialmente inconscientes e que fazem parte de um processo de transição da consciência comum (vigília) para um estado psíquico mais amplo, na busca do homem consciente, o homem total.

Evidentemente, esta é uma experiência incomum e vivida por poucas pessoas geralmente não antes da segunda metade da vida. A Individuação é um processo que ocorre durante toda a vida, mas, às vezes, há uma intensificação antes da maturidade da idade adulta e, quando isso acontece, há uma mudança na forma da pessoa encarar sua vida, fazendo-a manifestar, às vezes, alguns “comportamentos místicos”, num sentimento de comunhão e harmonia com a vida.

É de suma importância que as pessoas consigam refletir e entrar em contato com tais aspectos de suas personalidades, uma vez que, compreendendo-as, é possível integrá-las, tendo como consequência uma existência mais saudável e prazerosa, transcendendo a patologia e permitindo que suas verdadeiras essências venham à tona e se transformem.

Os Arquétipos Complementares

Jung descreve alguns arquétipos, universais e necessários para a compreensão da vida psíquica do homem. Alguns básicos discutidos pelo autor são os arquétipos da anima, animus, persona e sombra. A integração destes são de suma importância para o processo de individuação.

Ele consegue perceber a natureza polarizada na psique humana, e admite no homem uma natureza feminina, dando ao nome de anima, e seu complementar, a natureza masculina na mulher, de animus. “[…] Desde tempos imemoriais, o homem nos mitos, sempre exprimiu a ideia da coexistência do masculino e do feminino num só corpo” (JUNG, 1989, 38).

“O homem é composto biológica, e psicologicamente, de aspectos masculinos e femininos, para se desenvolver plenamente deve passar por fases: infância, adolescência, idade madura e velhice. Neste processo precisa integrar partes essenciais de sua personalidade como seu lado guerreiro, seu lado sensível, seu lado legislador e líder. A este processo de ir à busca da totalidade, Jung denominou individuação, e implica num grau de diferenciação de seus aspectos masculinos e femininos” (ULSON, 1997, 76).

A ideia andrógina de Deus faz com que, na busca pelo divino (individuação), a psique humana precise vivenciar, mesmo que em planos oníricos, personalidades complementares, cujas orientações muitas vezes sejam contrárias àquelas conscientes, trazendo ao sonhador, novos e diferentes pontos de vista que facilitam uma compreensão mais panorâmica de si mesmo.

Anima e animus seriam então os aspectos complementares de gênero na psique, personalidades inferiores que habitam a mente e são necessários para a dialética das polaridades consciente e inconsciente.

Persona pode ser definido como o arquétipo social. Aquele que abrange o tato das relações interpessoais e coletivas, e relação com o outro. É um conjunto de normas e condutas culturais que o indivíduo assimila e constrói uma identidade complementar.

“A partir de Jung, o conceito de ‘persona’ significa mais precisamente o eu social resultante dos esforços de adaptação realizados para observar as normas social, morais e educacionais de seu meio. A persona lança fora de seu campo de consciência todos os elementos – emoções, traços de caráter, talentos, atitudes – julgados inaceitáveis para as pessoas significativas do seu meio. Esse mecanismo produz no inconsciente uma contrapartida de si mesmo que Jung chamou de ‘sombra”. (OCANÃ, 2008, 04)

A sombra pode ser caracteriazada como o arquétipo da negação. Na sombra é personificado tudo aquilo que se tem resistência ou dificuldade para assimilar como próprio. A sombra é o amargurado ou reprimido que clama por expressão. Não só se opõe a persona, no constructo social, mas também em nível individual do sujeito e seus instintos e potenciais negligenciados pela sociedade.

“Diversas pessoas que trilham o caminho do aperfeiçoamento individual acreditam que completaram o processo, mas são incapazes de enxergar a verdade sobre si mesmas. Muitos de nós almejam ver a luz e viver na beleza do seu eu mais elevado, mas tentamos fazer isso sem integrar nosso ser. Não podemos ter a experiência completa da luz sem conhecer a escuridão. O lado sombrio é o porteiro que abre as portas para a verdadeira liberdade. Todos devem estar atentos para explorar e expor continuamente esse aspecto do ser. Quer você goste ou não, sendo humano, você tem uma sombra.” (FORD, 1998, 23).

A integração desses aspectos psicológicos inicialmente opostos seria, portanto a chave da chamada individuação. Através destes, seria possível atingir um estado psicológico centrado, no qual o maniqueísmo neurótico não mais afetaria negativamente a vida dos indivíduos.

“É de suma importancia que um indivíduo se relacione com esses aspectos nebulosos de sua psique e possa, no encontro com esses arquétipos, canalizar sua energia psíquica a fim de construir uma identidade plena, consciente de si-mesmo. Essa construção de identidade é um processo chamado por Jung (1986) de individuação. É um fenômeno que ocorre em todo o decorrer da vida, quando um sujeito ascende a níveis menos infantis de funcionamento em busca da integração de sua personalidade. A matriz dessa personalidade individual provém do conceito junguiano de self ou si-mesmo que pode ser definido como o arquétipo da totalidade e centro regulador da psique, oculto por trás da personalidade total e encarregado de levar à prática o projeto de vida e de guiar o processo de individuação. Por isso, Jung dizia que sua vivência poderia sentir-se psicologicamente como o “Deus dentro de nós” (SHARP apud JUNG, 1994,181).

O processo de individuação tem como finalidade paradoxal aproximar o homem da ideia de divino através da aproximação do homem com sua própria natureza.

A individuação, portanto, diz respeito ao processo cíclico de integração dos opostos psíquicos para transcender e atingir um contato mais significativo com suas essências e se aproximar do arquétipo divino, o Si-mesmo (Self), e está intimamente ligada com os processos e etapas alquímicas.

“A serenidade no velho e o estar consciente dos problemas à sua volta é a melhor maneira de se aferir seu processo de amadurecimento se completou. A total entrega e submissão aos designíos da natureza, do Self, ou de Deus, é objetivo e fim de todos aqueles que conseguem harmonizar os pares de opostos internos. É o coniunctio oppostorium dos alquimistas, ou a pedra filosofal, o lápís, ou tantos outros nomes que eles criaram para expressar o estado de totalidade e plenitude que apenas os sábios, santos e heróis conseguem atingir de uma forma mais intensa e duradoura” (ULSON, 1997, 79).

A alquimia, como veremos posteriormente, é um antigo método para a obtenção desse re-ligare com o Self e permitir o amadurecimento da psique através de metáforas que permitam a integração de opostos complementares.

Referências Bibliográficas:

BOECHAT, Walter. O Masculino em Questão. Petrópolis. Ed. Vozes. 1997.

CAMPBELL, Joseph. O poder do mito. São Paulo. Ed. Palas Athena, 1990.

FORD, Debbie. O Lado Sombrio dos Buscadores da Luz. Disponível em: http://dharmalog.com/2013/02/19/7-trechos-de-o-lado-sombrio-dos-buscadores-da-luz-de-debbie-ford-1955-2013-sobre-a-aceitacao-plena-de-nos-mesmos/. 14/05/2013

JUNG, C.G Psicologia e Religião Oriental. Petrópolis: Vozes. 1989.

JUNG, Carl Gustav. A Vida Simbólica. Obras Completas. Vol. XVIII/I. Petrópolis. Ed. Vozes. 2 Edição 1998.

JUNG, Carl Gustav. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Obras Completas. Vol. IX/I. Petrópolis. Ed. Vozes. 2011.

OCAÑA, Emma Martinez. A sabedoria de integrar a sombra. Disponível em: http://www.fundacao-betania.org/biblioteca/cadernos/pdf/Caderno_13_A_Sabedoria_de_Integrar_a_Sombra_Emma_Ocana.pdf. 14/05/2014

SHARP, Daryl. Léxico Junguiano. São Paulo: Cultrix, 1997.

Imagens:

Gravura de Camille Flammarion, da obra “L’atmosphère, météorologie populaire” de 1888

Aquarela do manuscrito “Aurora Consurgens” de autor desconhecido, representando a dialética entre as polaridades masculina (sol) e feminina (lua)

“Union” arte de Android Jones

“DreamCatcher” arte de Android Jones

Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br

#Alquimia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/parte-2-7-alquimia-individua%C3%A7%C3%A3o-e-ourob%C3%B3ros-psicologia-anal%C3%ADtica

Ser Gente Nunca Sai de Moda

A necessidade de andar na moda, a aflição inconsciente de estar em sintonia com o que se imagina ser moderno, revela uma busca por identificação e aceitação, uma vontade, em geral não percebida, de encontrar um lugar para se viver em paz. A moda nasce da necessidade cultural das pessoas de entender quem são e aonde caminham. Roupas, acessórios, carros, ideias enlatadas, maneiras de agir e falar tentam desesperadamente rotular o ser na tentativa de fazê-lo acreditar que pela casca se reconhece o valor da fruta. Em vão.

Perde-se a beleza de inventar a si próprio e a força de ser único. A moda traz consigo o perigo de projetar um suposto ideal que com certeza não somos.

O limite da forma estabelece fronteiras. Qualquer modelo pronto a ser usado rouba a originalidade do indivíduo, a beleza dos voos solos em altitudes inimagináveis, onde, só então, se defrontará com mundos e possibilidades apenas acessíveis a quem ousa ir além da normalidade e das permissões mundanas. O exercício da criatividade desenvolve as asas da liberdade.

Nada contra a indústria de consumo, como roupas, carros ou entretenimento que precisa produzir e vender para gerar riqueza e empregos que movimentam o planeta. Beleza e conforto, quando atingidos e usufruídos de maneira digna, são bem-vindos. Para ser feliz não é preciso ser um asceta no sentido original da palavra. Porém, há que se entender o limite de todas as coisas e o sentido da busca de cada um.

A moda costuma servir de referência para o sujeito se situar em determinado grupo social seja atrás de aceitação ou destaque. Um jeito ingênuo de imaginar quem é ou gostaria de ser, um lugar na tribo que admira, na tentativa de se impor e encontrar o seu canto no mundo. Em suma, a moda tenta acomodar nos porões da mente as mitológicas indagações de quem somos e para aonde vamos. Mas de que adianta um espelho se não se quer ver? De que serve mapa e bússola se não se sabe para aonde ir? Pode a forma ganhar mais importância do que a essência?

Inconscientemente a moda ilude o consciente, vendendo o que não pode entregar.

Ainda que não esteja claramente decodificado no entendimento de cada indivíduo, caminhamos, invariavelmente, em busca da plenitude do ser, onde, só então, conseguiremos encontrar toda a paz que precisamos e, em análise honesta, é o que importa. Entretanto, chegar até esse paraíso é a pergunta que não se cala.

Por ainda não terem decodificado o processo, muitos ainda procuram desesperadamente na moda signos de identificação, na ilusão de não se sentirem perdidos, como se a felicidade estivesse disponível na vitrine ou na prateleira das lojas ao alcance do cartão de crédito. É bem mais simples e confortável trabalhar a forma do que a essência. Porém, o resultado nunca será o mesmo. Trocar de vestido não cicatriza as feridas do coração; o brilho de uma jóia não ilumina os vãos escuros da tristeza; um belo e caro carro pode despertar admiração dos outros e te levar a um confortável passeio, mas as angústias mal resolvidas te acompanharão por toda a parte; o acesso as modernas tecnologias não te dão resposta às questões profundas da alma. Adiar o mergulho no autoconhecimento é ficar sentado na estação vendo passar o trem da plenitude. É necessário coragem de se ver e entender quem realmente é, encarar as próprias dores e frustrações, assumir as responsabilidades, lamber as feridas para curá-las. E, então, se transformar. A busca é árdua, mas o encontro é mágico. Extrair e vivenciar o que há de melhor em si, como diamante que precisa lapidar o cascalho até refletir perfeita luz, define a sua roupa.

Na medida que vamos nos conhecendo e transmutando sombras em luz, trocamos o paletó da inteligência, o vestido do coração, o guarda-roupa da alma. Saber quem somos é fundamental para entender os outros e o mundo. Se a vida oferece andrajos ou prêt-à-porter, lembre-se que somos os nossos próprios alfaiates. Cabe a cada um escolher os tecidos do amor, costurar com as linhas da compaixão, abotoar com sabedoria, vestir com a paciência da eternidade. Depois basta distribuir os lenços da alegria por onde passar, a qualquer um, sem distinção. Encontrar brilho na trajetória de todas as pessoas revela a luz que há em ti. A beleza de suas novas vestes vai encantar inimagináveis passarelas e todos desejarão estar por perto, desfilar ao seu lado, independente da cor da calça, do modelo do carro ou da marca do sapato. A elegância não está na grife, porém no estilo.

Não é o que se usa, mas um jeito de ser.

Ser gente nunca sai de moda.

Publicado originalmente em http://yoskhaz.com/pt/2015/06/26/ser-gente-nunca-sai-de-moda/

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/ser-gente-nunca-sai-de-moda

Casamento Alquímico e Taoísmo: A Síntese Perfeita

“Assim, eles já não são dois, mas sim uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, ninguém separe”
– Mateus 19:6

Na primeira parte deste artigo, entendemos um pouco sobre o simbolismo alquímico e vimos algumas correlações com a psicologia analítica de Jung. Os arquétipos Solar e Lunar, tanto para Jung quanto para os alquimistas, deviam ser integrados para sintetizar uma consciência mais equilibrada, que permitisse um diálogo saudável com o inconsciente. Através do conceito de Anima e Animus apresentados, compreendemos a natureza bipolar da psique. Bipolaridade esta que não deve ser confundida com estigmas de diagnósticos, mas aquela dualidade primordial que nos habita, que é convidada a se harmonizar para acessar uma unidade ainda mais primordial.

No entanto, não é exclusividade de Jung apresentar esse tipo de conceito. No livro “O Caibalion”, um clássico de literatura hermética, são apresentados sete princípios chaves para o funcionamento da realidade e do universo. Vejam só o que dizem os princípios 4 e 7:

Quarto Princípio, da Polaridade: Tudo é Duplo; tudo tem polos; tudo tem o seu oposto; o igual e o desigual são a mesma coisa; os opostos são idênticos em natureza, mas diferentes em grau; os extremos se tocam; todas as verdades são meias verdades; todos os paradoxos podem ser reconciliados. Este Princípio encerra a verdade: tudo é Duplo; tudo tem dois polos; tudo tem o seu oposto […] A Tese e a Antítese são idênticas em natureza, mas diferentes em grau; os opostos são a mesma coisa, diferindo somente em grau; os pares de opostos podem ser reconciliados; os extremos se tocam; tudo existe e não existe ao mesmo tempo; todas as verdades são meias-verdades; toda verdade é meio-falsa; há dois lados em tudo, etc., etc. Ele explica que em tudo há dois pólos ou aspectos opostos, e que os opostos são simplesmente os dois extremos da mesma coisa, consistindo a diferença em variação de graus.

Sétimo Princípio, do Gênero: “O Gênero está em tudo; tudo tem o seu princípio masculino e o seu princípio feminino; o gênero se manifesta em todos os planos. Este princípio encerra a verdade que o gênero é manifestado em tudo; que o princípio masculino e o princípio feminino sempre estão em ação. Isto é certo não só no Plano físico, mas também nos Planos mental e espiritual. Todas as coisas e todas as pessoas contêm em si os dois Elementos deste grande Princípio. Todas as coisas macho têm também o elemento feminino; todas as coisas fêmea têm o elemento masculino.

Percebemos, portanto, que a dualidade nada mais é do que uma questão de perspectiva, e que a integração dos paradoxos se mostra altamente necessária para obtenção de uma perspectiva mais aproximada da natureza real das coisas. Vale a pena frisar que tudo isso é de caráter psicológico e simbólico, de forma alguma a orientação sexual ou a identidade de gênero deve ser interpretada frente estes vieses. A presença desses arquétipos serve para contrapor a consciência e apresentar alternativas visando ampliar a percepção da mesma quanto a sua própria natureza, além de produzir novas ferramentas para lidar com suas próprias contradições.

“A Anima como a contraparte interna da personalidade do homem visa dar um equilíbrio a personalidade, pois compensa o intelectualismo racional do mesmo com um eros compreensivo, assim como o Animus da mulher equilibra sua personalidade com o saber sobre o que se quer realmente do outro clivando seu caos de estados afetivos em uma ideia diretora com um estatuto de subordinação das emoções, no caso a transformação de impulsos afetivos em sentimentos racionais” (JUNG, 2011).

A psique busca de forma tão intensa a união dos opostos e a integração que quando ficamos ‘polarizados’ demais, ou seja, quando manifestamos apenas uma polaridade e negligenciamos outra, ela tende a nos forçar a manifestar o lado reprimido num processo chamado ‘enantiodromia’. Apesar de o nome ser complicado, este termo criado pelo filósofo Heráclito nada mais é do que a ideia de que quando uma grande força é gerada numa direção, uma força de mesmo valor é criada na direção oposta. Ninguém menos do que Jung, reutilizou este termo para definir o fenômeno de forças compensatórias entre o consciente e o inconsciente.

“O velho Heráclito, que era realmente um grande sábio, descobriu a mais fantástica de todas as leis da psicologia: a função reguladora dos contrários. Deu-lhe o nome de enantiodromia (correr em direção contrária), advertindo que um dia tudo reverte em seu contrário” (JUNG, 1987)

Agora que começamos a entender melhor como funciona a psique, e percebemos que nela habitam ambas as energias, masculina e feminina, que necessitam de harmonia, é possível deslocarmos ligeiramente nosso enfoque. Quando pensamos em duas energias a princípio conflitantes, mas cujo fluxo e interação é harmônico, facilmente visualizamos este símbolo:

O Yin e Yang é o símbolo que mais representa toda essa dinâmica de polaridades que estamos discutindo. Veja só o que Jung tem a dizer sobre este símbolo milenar:

“Não há positivo sem sua negação. Apesar da extrema oposição, ou por isso mesmo, um termo não pode existir sem o outro. É exatamente como formula a filosofia chinesa: yang (o princípio luminoso, quente, seco e masculino) contém em si o geme do yin (o princípio escuro, frio, úmido e feminino), e vice-versa” (JUNG, 2007)

Herder Lexicon (1990) assinala que “a mútua dependência de ambos os princípios, às influências de yin-yang nunca se opõe como princípios inimigos, pelo contrário, acham-se em uma contínua relação de influências mútuas”. É mister compreender que os aspectos paradoxais da psique se completam, e não se excluem. A dinâmica, que a priori pode aparecer um conflito, talvez seja melhor entendida como uma dialética.

“Segundo a lei da enantiodromia, dos fluxos contrários, tão bem interpretada pelos chineses, com o final de um ciclo dá-se o início de seu oposto. Assim, Yang em seu limite transforma-se em Yin, e o positivo, em negativo” (JUNG, 1986)

A unilateralidade é, eventualmente, prejudicial a nossa psique, sendo responsável por diversos problemas, tanto enfermidades de natureza psicológica quanto somatizações físicas. Além disso, o problema não se limita a natureza individual, um exemplo do dano causado pela unilateralidade da consciência, expressado na esfera social, é bem elaborado por Robert Johnsson, quando este afirma que:

“O homem tem visto seu lado sombrio como feminino e, ao empurrá-lo cada vez mais para as profundezas do seu ser, acabou por transformá-lo numa bruxa. Grande parte da escuridão do elemento rejeitado durante a idade média era feminino – daí a caça às bruxas e as fogueiras. E isso não se constituiu apenas de incidentes isolados que ganharam muita notoriedade. Estima-se que quase quatro milhões de mulheres foram queimadas nos patíbulos no auge da contra-reforma na Europa” (JOHNSSON, 1993)

Como podemos ver, o exagero da parcialidade é extremamente perigoso e prejudicial, tanto individualmente quanto socialmente. Mas por que a psique apresenta todos estes mecanismos para incentivar o diálogo entre as diferentes polaridades que nos habitam? Pura e simplesmente para nos ajudar a superar a nós mesmos. Para nos possibilitar transcender o maniqueísmo estático que parece tanto nos agradar. A totalidade é o objetivo final dessa luta constante das polaridades, permitir que atinjamos a plenitude, a consciência, que nos aproximamos cada vez mais da onisciência divina, ao menos à onisciência de nós mesmos.

“Após uma vivência de muitos anos no rico mundo da psique, aprendendo suas leis, Jung notou uma enorme força evolutiva atuando no universo psíquico. Ele percebeu que a psique humana desenvolve um esforço constante em busca da totalidade um esforço no sentido de se completar e se tornar mais consciente. O inconsciente procura transferir o seu conteúdo para o nível da consciência, onde pode ganhar existência e ser assimilado, formando uma personalidade consciente mais completa. A psique de cada indivíduo tem um estímulo inerente para evoluir, para integrar os elementos do inconsciente, juntando as partes que ainda faltam ao indivíduo total para formar um self completo, pleno e consciente” (JOHNSSON, 1993)

Como dito no início do texto, Jung deslocou alguns conceitos originais da Alquimia, adaptando-os a um sistema de compreensão psicológica. Os antigos alquimistas já sabiam há tempos dessas leis que governavam a mente, suas polaridades e interações. Não à toa que uma operação alquímica essencial pra a obtenção da pedra filosofal era a Coniunctio, ou Casamento Alquímico. Esta operação era quase sempre representada pela união de uma figura masculina, como um Rei ou o Sol e outra feminina, como uma Rainha ou a Lua, mas também como Hauck aponta “um coração pegando fogo, um terra frutífera, casamentos, hermafroditas, galos e galinhas” entre outros.

Esse casamento é a grande chave para a integração dos opostos complementares, com ele, é possível transcender o maniqueísmo, e através de uma interação de tese e antítese, permitir o nascimento de uma síntese. Novamente, conseguimos perceber o nascimento deste terceiro elemento quando analisamos figuras alquímicas que representam o casamento alquímico. Na imagem seguinte, vemos com exatidão a união simbólica do Rei (Sol) e da Rainha (Lua) obtendo como resultado ao criança, que na alquimia é representada como andrógina e perfeita.

“Jung constatou que a psique é andrógina: ela contém componentes masculinos e femininos. Assim homens e mulheres vêm equipados com uma estrutura psicológica que em sua totalidade inclui a riqueza de ambos os lados, de ambas as naturezas, de ambos os conjuntos de capacidades e forças. A psique espontaneamente se divide em opostos complementares e os representa como uma configuração masculina-feminina. Ela assinala algumas características como sendo “masculinas” e outras, como “femininas”. Como o yin e o yang, na antiga psicologia chinesa, estes opostos complementares se equilibram e se completam mutuamente. Nenhum qualidade ou característica da personalidade humana é completa em si: cada um deve se fazer acompanhar de seu “par” masculino ou feminino, numa combinação consciente, se quisermos alcançar equilíbrio e totalidade” (JOHNSSON, 1995)

E essa ideia da criança andrógina, representando simbolicamente a inocência e a pureza, não é exclusiva do pensamento alquímico, como vemos no Evangelho de Tomé, capítulo 22:

“Jesus viu crianças de peito a mamarem. E ele disse a seus discípulos: Essas crianças de peito se parecem com aqueles que entram no Reino. Perguntaram-lhe eles: Se formos pequenos, entraremos no Reino? Respondeu-lhes Jesus: Se reduzirdes dois a um, se fizerdes o interior como o exterior, e o exterior como o interior, se fizerdes o de cima como o de baixo, se fizerdes um o masculino e o feminino, de maneira que o masculino não seja mais masculino e o feminino não seja mais feminino – então entrareis no Reino”.

Apesar da representação sexual nas pranchas alquímicas, é sabido que tais experiências refletem experimentos interiores, subjetivos e que a relação sexual deve ser encarada com temperança. Além de técnicas antigas como o sexo Tântrico, que visa harmonizar as energias masculinas e femininas através da troca de energias ao longo do ato sexual, existe um conceito na alquimia taoísta chamado “Cultivação Dual”, na qual, em suma, os homens desenvolvem técnicas para interagir e absorver a energia feminina, sem desperdiçar a sua própria, acumulando assim ambas. Evidentemente essas técnicas orientais estão muito distantes da nossa realidade, e acredito que devemos sim estudar e nos aprofundar nas diferentes práticas, afinal, unir oriente e ocidente nada mais é que um reflexo da harmonia dos opostos que tanto discutimos ao longo do texto. Além disso, a meditação e análise psicológica podem ser ferramentas que realmente ajudam no autoconhecimento.

Mas acredito que para nós, ocidentais, existe algo que é uma chave igualmente efetiva, e mais próxima para nosso entendimento: o Amor. Quando abrimos nosso coração e permitimos essa força incrível da natureza se manifestar, podemos atingir patamares inimagináveis. O amor é transformador e é um ingrediente indispensável.

“Assim como na alquimia, a psique, dentro do processo analítico, vai transformando-se, ora dispondo-se num lado e ora de outro, no sentido das suas polaridades, até que lhe seja capaz a absorção de uma terceira figura, gradativa e construída, surgida de dentro da sua própria alma que lhe traduz essa expressão de convivência com o dual. […] O casamento Divino, que somente existirá se ali houver o Amor, sua causa e seu efeito. […] Revela-se no mundo como o altruísmo em seu sentido extrovertido e na psique, como a conexão com o Si-mesmo, gerando a unidade” (MASSAN, 2009)

Na imagem acima vemos o deus Marte (Animus) e a deusa Vênus (Anima) e seu filho Cupido, também conhecido como Eros e Amor. Coincidência?

Na Tábua de Esmeralda encontramos a seguinte inscrição:

“E assim como todas as coisas vieram do Um, assim todas as coisas são únicas”.

Concluímos então que existe uma aproximação muito evidente entre conceitos da alquimia e da psicologia analítica, e que ensinamentos antigos de filosofia grega e da sabedoria taoísta são fontes ricas de informações que podem nos ajudar a fortalecer a reflexão e, literalmente, integrar ideias. No final, nosso objetivo principal é voltar a Unidade, e dissolver todos os conflitos neuróticos e polarizados que nos impedem de ver as coisas como realmente são. Devemos buscar sempre fazer as coisas com o coração e amor, pois só assim podemos ter empatia e perceber os ‘dois lados das coisas’ e unir os paradoxos. Nem cara, nem coroa, somos todos moedas rodopiando.

Referencias Bibliográficas:

CAMAYSAR, Rosabis. O Caibalion. São Paulo Editora Pensamento. 2000

Evengelho de Tomé traduzido por Huberto Rohden

HAUCK, Dennis Willian. The Emerald Tablet: Alchemy for Personal Transformation. Arkana. Ed.Pengun Group. 1999.

JOHNSON, Robert A. HE: A Chave do Entendimento da Psicologia Masculina. São Paulo: Mercúrio, 1993

JOHNSON, Robert A. WE: A Chave da Psicologia do Amor Romântico. São Paulo: Mercúrio, 1995

JUNG, C. G. Fundamentos de Psicologia Analítica. OC XVIII/I. Petrópolis: Vozes, 1987a.

JUNG, C. G. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. OC IX/1. Petrópolis: Vozes, 2007.

JUNG, C. G. Psicologia do Inconsciente. OC VII/1. Petrópolis: Vozes, 1987b.

JUNG, C. G. Psicologia e Alquimia. OC XII. Petrópolis: Vozes, 1991b.

JUNG, C. G. Psicologia e Religião. OC XI/1. Petrópolis: Vozes, 1987c.

JUNG, Carl Gustav. Civilização em Transição. Petrópolis. Vozes. 2011.

LEXICON, Herder. Dicionário de Símbolos. São Paulo. Cultrix. 1990

MASSAN, Francisco. Opus Alquímica e Psicoterapia. Disponível em: www.clinicapsique.com/doc/opus.doc. 14/05/2013

VON FRANZ, Marie Louise. A Alquimia: Introdução ao Simbolismo e a Psicologia. São Paulo. Ed. Cultrix. 1993.

Tábua de Esmeralda – Tradução de Isaac Newton , 1680 , encontrada em seus textos alquímicos. Folger, Washington 1988

Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano, Mestrando em Ciências da Religião e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br ou envie um e-mail para contato@antharez.com.br

Imagens:

‘Philosophical Mercury’. Itália. Século XV.
Perspectivas circulares de Luz e Sombra, imagem encontrada na internet.
Yin-Yang.
“Spirals” de M. C. Escher (1953).
Cena de uma bruxa na fogueira (Série “American Horror Story: The Coven”)
Princípios Alquímicos do Masculino e Feminino.
Gravuras Alquímicas de “Donum Dei”.
“Mars, Venus and Cupid”. 1808, Leopold Kiesling.

#Alquimia

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Os Alquimistas e a Ciência

Com a ramificação, deteriorização e alienação dos conhecimentos da fonte, muitas coisas foram  levadas ao extremo do egoísmo, fazendo com que essas verdades fossem encobertas por fantasias daqueles que não queriam procurar a legitima essência a partir de analógias precisas.

Eis que conseqüentemente surgiu uma manifestação predominante da razão sectária credológica. Nisto, em muitos dos casos, aos leigos principalmente, foi imposta uma lei de aceitação inquestionável das teses teogônicas, onde a primordial ciência tinha sido subjugada pelos dogmas das formalizadas instituições que assumiram o termo de religião.

Com o ocorrido, muitos se revoltaram e, consequentemente, problematizaram e elaboraram uma base de estudos separados do sagrado e espiritual; confundiram a essência do saber com as cascas dogmáticas e fantasiosas dos credos ideológico. Com isso, essas pessoas voltaram-se para uma razão e supervalorização de uma lógica empírica, materialista e, em determinados caos, fanática.

Então, eis que surgiu a era da critica da razão pura, o iluminismo e o apreço há um materialismo que naquele momento (e em outros) mostrava mais coisas óbvias e palpáveis do que a religiosidade que oprimia, condenava, e matava em nome de um deus.

A ciência que surgia nesse período foi se formulando e tornando-se mais separada ainda do meio transcendente. Nessas transformações, de um lado prevaleceu a lógica material, e de outro ficou em seu canto a razão espiritual.

Com a repercussão dessa cisão, predominou as partes palpáveis e quantificáveis dessa ciência, ocorrendo isso com a astrologia que deu nascimento a astronomia (provavelmente com sua cisão no século XVII) e da alquimia que gerou a química. Hoje boa parte, com algumas exceções, das ditas ciências estudadas nas academias e escolas são de cunho limitados aos aspectos fatídicos do dia a dia.

Dentro desse contexto e, levando em conta a figura do Alquimista ou estudante de Alquimia, temos que ele é, em sua natureza, um cientista, pois o mesmo precisa entender o processo de transmutação física/química e elemental para que com isso venha tirar proveito desse conhecimento e utilizar isto em seu processo de transmutação interior para a tão almejada obtenção da Grande Obra, que só poderá ser obtida através da harmonia entre o que esta em cima (O interior, logos superior) com o que esta embaixo (O exterior, o mundo fatídico e a natureza).

Já o cientista, quando somente se reporta à dita ciência limitada, é somente um cientista, pois ao aceitar o limite cientifico, e somente seu caráter positivista, estará se tornando apenas um físico ou um químico, geneticista, etc. Mas, se o mesmo é aderente a essa união que antes era inseparável, ele se enquadra há uma condição de estudante ou ao nível dos assim chamados alquimistas adeptos.

Temos como exemplo de Alquimista cientista o célebre Isaac Newton. O mesmo transitou pelas ditas ciências ocultas, mas com objetivos bem pragmáticos e com instrumental digno de um pesquisador sério. Suas investidas pela alquimia levaram a importantes descobertas para a química moderna. Mas tudo que foi apresentado por Newton foi exposto sob um ponto de vista lógico em seus resultados mas não deixam de ser conteúdos embasados em teorias alquímicas e transcendentais. Porém, a ciência dita limitada de hoje, em muito dos casos, teve (tem) a intenção de somente expor aquilo que pode ser usado como algo de valor desde que possa ser separada de seus aspectos mau compreendido pelas massas.

Newton, em seus estudos da astrologia, reconheceu o seu valor e auxílio em relação a capacidade de enxergar o universo de forma mais aberta, culminando em conclusões importantes para a astronomia.

Em parte, sofremos a influencia do iluminismo de Voltaire (que segundo alguns era ligado ao  Rosacrucianismo), que nos deu em destaque e visibilidade somente o teor racionalista de Isaac  Newton. O outro lado da questão é devido à ultra-especialização de nossa cultura – o físico  detém-se apenas à sua formação para compreender Newton, o químico idem, já o estudante ou  o próprio alquimista sabe que para compreender a verdadeira forma de como obter a Magnus  Opus é priori se impor acima de todas essas bases e unificá-las juntamente com o  Transcendental, desde que esse não seja em totalidade algo dogmático.

 Por isso que em muitos círculos Herméticos onde o Mestre instruía seu discípulo nas artes  Alquímicas prevalecia a seguinte prelazia:

“ORA, LEGE, LEGE, RELEGE, LABORA ET INVENIER”

(ORE, LÊ, LÊ, RELÊ, TRABALHE E ENCONTRARÁS) 

Podemos conferir em pesquisas que grandes cientistas foram exímios alquimistas, e que suas descobertas por terem tido uma grande importância para a evolução da ciência moderna, só foram expostas e reconhecidas em aspectos e funções que condiziam com ao que era aceito pela massa cientifica e limitada.

Dentre esses sábios, temos não somente Newton, mas também…

Santo Alberto Magno: 1193 – 1280 – conseguiu preparar o hidróxido de potássio e descreveu a composição química de diversos compostos, como o cinábrio, o alvaiade e o mínio;

Paracelso: 1493 – 1541- o primeiro a se referir a luz astral nos meios alquímicos, chegou a identificar o zinco como um novo metal, com propriedades diferentes das até então conhecidas, pioneiro na utilização medicinal dos compostos químicos e, além disso, descobriu varias formas de tratar doenças que assolavam a Europa no século XVI;

Roger Bacon: 1214 – 1294 – Pioneiro em enfatizar a possibilidade de utilização de lentes ópticas para aumentar objetos pequenos;

Raimundo Lúlio: 1233- 1316 – Alquimista que com maestria preparou o bicarbonato de potássio;

Giambattista della Porta: 1535- 1615 – preparou o óxido de estanho II

Abu Musa Jabir ibn Hayyan: 721– 815 – também conhecido pelo nome latino Geber, o primeiro a desenvolver um processo de destilação perfeito, alquimista islâmico proeminente, além de farmacêutico, filósofo, astrônomo, e físico. Ele também foi chamado de “o pai de química árabe” pelos europeus.

Maria, a Judia (ou Maria, a Profetisa): uma antiga filósofa grega e famosa alquimista que viveu no Egito por volta do ano 273 a.C.. dizem que viveu na época de Aristóteles (384–322 a.C.); suposta criadora do banho-maria;

Carl Gustav Jung: 1875 – 1961 – Incorporou os conceitos e simbologia da alquimia a psicologia analítica, comprovando a relação entre a arte da transmutação com a constituição da psique humana, através de seus arquétipos em interação com um inconsciente coletivo.

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Gustav Holst e “Os Planetas”

Esta alusão ao mapa astral tem tudo a ver com a vida e a obra do compositor inglês. Ele mesmo era um entusiasta do assunto e chegou a confeccionar diversos mapas para seus amigos. Sua principal obra, Os Planetas, é resultado dos seus estudos místicos e astrológicos.

Influências Musicais

O Crepúsculo dos Deuses, a quarta ópera da tetralogia O anel dos Nibelungos, de Richard Wagner, impressionou os ouvidos de Holst. Mais tarde, sentiu-se elevado ao “reino dos céus” ao ouvir a Missa em Si menor de Johann Sebastian Bach. As influências de Arnold Shoenberg, Stravinsky, Richard Strauss, Debussy, e sua amizade com o compositor Ralph Vaughan Williams, encerram o arco musical dentro do qual Holst se desenvolveu como compositor.

Apesar da sua formação no Royal College of Music, Holst foi um grande autodidata. Evitava sistemas acadêmicos e estruturas musicais pré-concebidas. Não dava tanto crédito aos livros, mas no lema “aprenda fazendo”. Seguiu seu próprio caminho, e como num laboratório alquímico, realizou inúmeras experiências buscando constantemente as notas certas para suas obras.

Espiritualidade

Holst acreditava nas forças supra-humanas, foi muito influenciado pelas religiões orientais, especialmente nas doutrinas do dharma e reencarnação. Trabalhou na composição de diversos hinos para coral e orquestra sob inspiração de um dos escritos religiosos mais antigos do mundo, o Rig Veda. Escrito na linguagem sânscrita, é um verdadeiro compêndio de hinos, rituais e oferendas às divindades.

Como um bom virgiano, era perfeccionista e tinha o dom para dedicar-se em trabalhos cansativos e minuciosos. Portanto, não satisfeito com as traduções do Rig Veda decidiu aprender sânscrito e traduziu as palavras conforme sua interpretação.

Além dos Choral Hymns, compôs uma ópera chamada Sita, inspirada no épico indiano Ramayana, levou sete anos para sua conclusão, sem jamais encená-la! No caso de Holst, esse dom analítico e a capacidade para empenhar-se em grandes trabalhos, coincidem exatamente com as características de quem possui a lua em virgem no mapa astral.

Com base nos evangelhos apócrifos, escreveu The Hymn of Jesus (Parte I, Parte II, Parte III) Com seu rigor habitual, aprendeu o grego para ler os originais. Além do empenho para conservar o espírito do texto original, combinou em sua música o canto gregoriano, ritmos irregulares, harmonia colorida e uma orquestração grandiosa.

A astrologia e “Os Planetas”

“Os planetas” não se trata de uma obra ortodoxa, sua estrutura não obedece aos padrões convencionais. Não é uma sinfonia, nem poema sinfônico, nem fantasia. Mas sim, uma série de perfis sonoros dos planetas. Nas palavras de Holst: “as sete influências do destino e componentes de nosso espírito.“

Além das referências astrológicas, esta obra nos remete ao conceito de música das esferas, amplamente pesquisada por Pitágoras, Kepler, Kircher, dentre outros. Visto que Holst dedicou sete anos de sua vida nesta obra, vale a pena dedicar alguns minutos para ouvi-la e compreende-la.

Os Planetas

I. Marte, O Portador da Guerra

As cordas, percutidas com a parte de madeira do arco apresentam o motivo marcial onde a música irrompe em ondas orquestrais com intensidade crescente. Este clima bélico e enérgico da música caracteriza o perfil astrológico de Marte: coragem, poder, pioneirismo e o instinto lutador para enfrentar os desafios com bravura. Se estas energias não forem devidamente controladas seu resultado é desastroso: violência, assassinato e todos os subprodutos do defeito relacionado a Marte, a Ira.

Marte, O Portador da Guerra foi composto no início de 1914, antes do começo da Primeira Guerra Mundial. Seus sons militares soaram como uma premonição do conflito mundial que estava por vir.

II. Venus, O Portador da Paz

Fornece uma espécie de resposta para Marte. Contrasta pela placidez e pelo andamento lento. As harpas, madeiras e a celesta realçam a delicadeza desta obra, que nos passa a sensação de harmonia, equilíbrio e paz.

Alan Leo descreve este contraste entre Marte e Venus da seguinte forma: “Marte é o representante da alma animal no homem e Venus da alma humana, em certo sentido, um é o complemento do outro. Mercúrio o mensageiro alado dos deuses voa entre os dois como memória e é, portanto, a alma espiritual humana.”

III. Mercúrio, O Mensageiro Alado

De forma alegre, uma extensa e contínua linha melódica passeia pelos diversos naipes orquestrais transmitindo de instrumento para instrumento a mensagem vinda de outros mundos. Mercúrio, o mensageiro alado dos deuses representa a consciência humana, o intelecto, a aptidão para nos comunicarmos e a nossa busca pelo saber.

IV. Júpiter, O Portador da Jovialidade

Com base numa linha de acompanhamento na região aguda dos violinos, as trompas apresentam o tema enérgico do movimento, é o impulso para a introspecção a nível intelectual, filosófico e religioso, um dos aspectos de Júpiter. Em suma, Júpiter representa a “mente superior” no homem, não como razão pura, mas como sabedoria inata.

V. Saturno, O Portador da Velhice

Começa sombrio, segue com uma marcha nos metais e retorna à serenidade no final. Harpas e flautas estabelecem um padrão de acompanhamento sobre o qual cordas e outros instrumentos de madeira apresentarão breves fragmentos melódicos.

Saturno no horóscopo mostra onde podem ser encontrados os maiores desafios e onde podem ser aprendidas as lições mais difíceis. Segundo alguns biógrafos, Saturno é também a representação do sofrimento de Holst, que devido a sérios problemas na articulação de seu braço, teve que abandonar o piano e o violino.

Alan Leo descreve Saturno como sendo um dos responsáveis por todos os casos de degradação, degenerescência, humilhação e vergonha. Nos aspectos positivos representa a verdadeira humildade, perseverança, sacrifício, entrega e serenidade.

VI. Urano, O Mágico

É um scherzo com uma melodia ágil no fagote que se desenvolve em uma intrincada teia orquestral. O início da música representa o impulso para ser único, para chocar e surpreender. Mais a frente, o som pesado dos metais nos remetem aos acontecimentos repentinos e imprevisíveis. O grandioso tutti representa o que talvez seja a maior influência de Urano: o despertar da consciência.

Em seu livro Art of Synthesis, Alan Leo chama o capítulo sobre Urano de “Uranus, the awakener”. Este, representa a originalidade de pensamento, a independência de espírito, o gênio criador, as avançadas formas de pensamento, a intuição e a capacidade de trazer conhecimento através da consciência desperta adquirida nas esferas internas do ser.

VII. Netuno, O Místico

Aqui Holst explora o pianissimo com enorme habilidade. Harmonias misteriosas e um coral de vozes femininas fazem parecer “música de outro mundo”. Esta obra nos transmite claramente a representação astrológica de netuno: as influências não materiais, os sonhos, o espiritualismo, a teosofia, a dedicação pelo misticismo e a abertura para o divino.

Ele também é o responsável pelo gosto por artes ocultas, habilidades para o mesmerismo, telepatia e sonhos lúcidos. O planeta é muito musical e conduz à composição inspirada em melodias ouvidas em sonhos. Pelo teor, esta obra pode tranquilamente servir como música de fundo para breves meditações.

Epílogo

Holst utilizou-se da música tanto para o seu trabalho profano como para a construção da “grande obra”. Ao mesmo tempo em que compunha melodias “mundanas” para manter-se financeiramente estável, dedicava-se a trabalhos chamados “sérios”, sem qualquer sentimento de incoerência. O único inconveniente é que a maioria de suas obras ficaram ofuscadas devido ao grande sucesso de Os Planetas.

Em maio de 1933, Holst foi internado às pressas devido a uma hemorragia causada por uma úlcera no duodeno. Outro dado curioso é que fisicamente o signo de virgem, possui relações com o aparelho digestivo e há quem diga que os intestinos são o ponto fraco físico dos virgianos. Coincidência ou não, logo após uma cirurgia a fim de erradicar a úlcera no duodeno, Holst não resistiu e deixou este mundo no dia 25 de maio de 1934 aos 59 anos.

Curiosidades

Marte, O Portador da Guerra é amplamente utilizado no cinema, principalmente em filmes que envolvem grandes batalhas. Além disso, é a maior referência musical para os compositores “hollywoodianos” em suas obras bélicas.

Em 2006, a banda inglesa Iron Maiden utilizou a música de Marte para abertura dos seus shows na turnê A Matter of Life and Death.

O tema central de Júpiter tornou-se um hino patriótico inglês.

O ritmo brincalhão de Urano é muito semelhante ao da obra O aprendiz de Feiticeiro de Paul Dukas, do qual Holst certamente recebeu influências.

Referências

Holst Biography, Ian Lace.
Astrologia, Wikipedia de Ocultismo
Art of Synthesis, Alan Leo.
Música Clássica, John Burrows.
Grandes Compositores, João M. Coelho.

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Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/gustav-holst-e-os-planetas

A Suástica

A suástica é um dos símbolos mais difundidos e antigos. É encontrado do Extremo Oriente à América Central, passando pela Mongólia, pela ìndia e pelo norte da Europa. Foi conhecido dos Celtas, dos Etruscos, da Grécia antiga; o ornamento chamado grega deriva da suástica. Alguns quiseram remontá-lo aos atlantes, o que é uma maneira de indicar sua remota antiguidade.

Qualquer que seja sua complexidade simbólica, a suástica, por seu próprio grafismo, indica manifestamente um movimento de rotação em otrno do centro, imóvel, que pode ser o ego ou o pólo. É portanto símbolo de ação, de manifestação, de ciclo e de perpétua regeneração. Neste sentido, muitas vezes acompanhou a imagem do salvador da humanidade: o Cristo, das catacumbas ao ocidente medieval e ao nestorianismo das estepes: Os Cristos romanos são geralmente concebidos em tornod e uma espiral ou de uma suástica: essas figuras harmonizam a atitude, organizam os gestos, as dobras das roupas. Por aí se vê reintroduzido o melhor símbolo do turbilhão criacional em torno do qual estão dispostas as hierarquias criadas que dele emanam… ; o Buda, pois dele representa a Roda da Lei (Dharmachakra) girando em torno do seu centro imutável, centro qeu frequentemente representa Agni.

A simólica dos números ajuda a comprender melhor o sentido de força totalizadora deste emblema: a suástica é feita de uma cruz, cujas hastes – como nas orientações vetoriais que definem um sentido giratório e em seguida o enviam de volta ao centro – são quadruplicadas. O seu valor numérico é, portanto, de quatro vezes quatro, i.e., dezesseis. É o desenvolvimento da força da Realidade, ou do Universo. Como desenvolvimento do universo criado, associa-se a essas grandes figuras criadoras ou redentoras invocadas acima; como desenvolvimento de uma realidade humana expressará o extremo desenvolvimento de um poder secular, o que explica as suas atribuições históricas, de Carlos Magno a Hitler. Aqui, o sentido da rotação intervirá, igualmente, que se trate do sentido direto astronômico, cósmico e, portanto, ligado ao transcendente – é a suástica de Carlos Magno; ou do sentido inverso, dos ponteiros de um relógio, querendo colocar a infinitude e o sagrado no temporal e no profano – é a suástica Hitleriana. Guénon interrpeta esses sentidos contrários como a rotação do mundo visto de um e de outro pólo; os pólos aqui, são o homem e o pólo celeste, e não os pólos terrestres.

Considerando-se sua acepção espiritual, a suástica às vezes simplesmente substitui a roda na iconografia hindu, por exemplo, como emblema dos nagas. Mas é também o emblema de Ganeça, divindade do conhecimento e, às vezes, manifestação do princípio supremo. Os maçons obedecem estritamente o simbolismo cosmográfico, considerando o centrod a suástica como a estrela polar e as quatro gamas que a constituem como as quatro posições cardeais em tornod a Ursa Maior, o que pode ajudar a interpretar a reflexão de Guénon mencionada acima. Há ainda formas secundárias da suástica, como a forma com os braços curvos, utilizada no País Basco, que evoca com especial nitidez a figura da espiral dupla. Como também é da suástica clavígera, cujas hastes constituem-se de uma chave: é uma expressão muito completa do simbolismo das chaves, o eixo vertical correspondendo aos solstícios, o eixo horizontal, à função real e aos equinócios.

Nos Estados Unidos a suática foi muito utilizada antes do nazismo. Além da Sociedade Teosófica, fundada em Nova York, e das tribos nativas, como os Navajos, até a década de 1930 a suástica era frequente no Sudoeste americano em suvenires, como mantas, medalhinhas e outras lembranças.

Suástica é o nome de uma pequena comunidade do norte de Ontário, no Canadá, situada a aproximadamente 580 quilômetros ao norte de Toronto, e 5 quilômetros de Kirkland Lake, cidade à qual pertence. A vila de Suástica foi fundada em 1906. Ouro foi descoberto perto dali e a Swastika Mining Company foi formada em 1908. O governo de Ontário tentou mudar o nome da cidade durante II Guerra Mundial, mas a população resistiu.

No Brasil, o uso da suástica para fins nazistas constitui crime, de acordo com a lei 9.459, de 1997, como dispõe o parágrafo primeiro do seu artigo 20:[3]

§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo.

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

Fontes:

Wikipédia: Suástica

CHEVALIER, Jean, Dicionário de Símbolos

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/a-su%C3%A1stica