As HQs como parte da Humanidade

Por Vagner Abreu

Desde o inicio dos tempos o homem com o poder da imaginação, vem desenvolvendo, em sua própria Mente, Histórias sobre Heróis capazes de feitos que beiram o inacreditável. Heróis capazes de proezas épicas que incluem: matar monstros de sete cabeças, caçar muitos animais para alimentar uma tribo inteira, desafiar os mortos em busca de um ente querido.

Esse mesmo homem também criou um meio de passar para os demais de sua espécie a originalidade de sua história. Com o advento da Linguagem, o homem agora poderia contar a seus irmãos como se desenvolve a saga de seu próprio herói.

Ao se acender uma fogueira, tinha-se ali o riscar de fósforo para a aventura começar. O humano primitivo agora conta, em meio às labaredas, uma jornada que transcende da sua mente para a Imaginação de seus ouvintes. Usando a Linguagem e a, embora precária, Narrativa, ele criava imagens mentais de fatos de um mesmo personagem que o tornaria cada vez mais ligado com a realidade.

A aceitação do público fez com que, cada vez mais, o homem contasse a mesma história ouvida na última fogueira. De pessoa a pessoa, de uma família a família, de uma tribo a tribo. Era dada cada vez mais importância aos acontecimentos de uma determinada história, levando o nosso contador a passar para a próxima geração quais eram os tais feitos de seu herói de fogueira. Deste modo nasceu a escrita em cavernas.

Através de desenhos de parede, os narradores, agora contavam seus mitos que seriam reinterpretados por seus demais – em sua comunidade ou em milhares de anos no futuro. Essa, talvez fosse, a primeira vez que fora usado o desenho para se criar uma história. Mas, um mero rabisco rupestre não diria muita coisa a alguém, a menos que se inclua narração e palavras em cada imagem. Nascia, assim, o desenho que ilustrava uma narrativa.

Esse modo de contar histórias tornou-se um sucesso. Qualquer espectador agora tinha uma imagem um pouco mais palpável do épico narrado. De uma caverna a outra, de uma região a outra, o desenho narrativo transcendia qualquer reino, qualquer tempo, criando estilo que levaram o homem a criar seus próprios meios de desenhar, narrar e interpretar suas Aventuras.

Dizem ter começado pelos antigos babilônicos, onde os muros de da cidade de Ur traziam jornadas inteiras de Reis Heróis capazes de terem o amor de deuses ou enfrentarem o próprio dilúvio. A famosa epopéia de Gilgamesh – o talvez primeiro Herói mitológico – está totalmente gravada “cuneiformemente“ nestas paredes. As paredes da Babilônia deram origem a Arte Sequencial.

Da Babilônia para as margens do Nilo, onde os desenhos narravam os mitos dos próprios deuses. Toda a classe nobre e sacerdotal do Egito usava os Hieróglifos (imagens no papel ou papiro) para obter e passar informações sobre ritos religiosos, modos de comportamento do faraó, fatos históricos.

O desenho não só contava histórias, como também ditava a cultura de uma das mais prósperas civilizações do mundo antigo. Ele fazia parte do cotidiano de todos.

Tão poderosa é a história narrada com desenhos que tal costume chegara até os dias modernos, nossos próprios mitos de nossos próprios tempos são narrados usando textos e imagens, deuses dão lugar para Homens com super força, Homens destemidos como Odisseu passam a ser vigilantes com trajes de morcego, deusas do mundo antigo recebem vestes modernas.

Claro, amigo leitor que você já deve ter “sacado” que é de Histórias em Quadrinhos de que iremos falar neste artigo.

Tão poderosa é essa forma de narração que, desde a década de 80, sabe-se através de estudos do Pentágono que a narrativa em quadrinhos é a melhor maneira para se compreender e reter informações. Palavras trabalhando com o lado esquerdo de nosso cérebro e a arte seqüencial interagindo com o lado direito, que é pouco racional, sendo pré-verbal. Ou seja, durante uma leitura de quadrinhos estamos colocando os dois lados do cérebro para trabalhar.

Com capacidade Dualcore de processamento acredita-se que o leitor freqüente possa ser capaz de ativar entre 20 e 30 porcento da capacidade cerebral. Essa teoria não é um fato concreto, de modo que é apenas uma especulação de uma entidade governamental de um país que “não dá muita importância” ao assunto. Não é mesmo?

Com base de todas estas informações, chego ao ponto de que o quadrinho não apenas é uma das melhores maneiras de se contar uma história (tanto que influencia até mesmo a grande mídia de massa, com filmes campeões de bilheteria) como também um hábito comum a humanidade. De tal forma que cada país tem seus próprios meios de trabalhar desenhos e narrações. Isso sem contar que em cada período de nossa história como seres deste planeta tivemos formas diferentes de ilustrar nossa mitologia. O que os Gregos faziam em vasos ou os egípcios em papiro, nós fazemos hoje dentro de quadrados com balões (sejam eles impressos ou digitais).

Sabem quem mais utiliza o método palavras e imagens para difundir informação? A mídia impressa; jornais e revistas todos se apropriando de métodos que o homo sapiens já conhecia a muito tempo.

Assim, o gibi, tal como a narrativa em desenhos do passado, trás temas que envolvem públicos específicos. Temos histórias destinadas a pessoas bem instruídas, histórias que fisgam adolescentes, história para o público infantil; a arte seqüencial é uma Linguagem Universal não tendo idade para se perder o interesse por sua apreciação e merecendo muito mais respeito do que ele realmente tem hoje em dia. Ora, se os povos antigos (e até mesmo homens das cavernas) valorizavam desenhos com narração, o que dizer de nós Homens Modernos.

Ref. Bibliográfica

As Obras que me inspiram a escrever esse post foram:

MOORE, Alan – Promethea

CAMPBELL, Joseph – O Herói de Mil Faces

#AlanMoore #Ocultismo #Quadrinhos

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/as-hqs-como-parte-da-humanidade

Referencias Herméticas em Promethea – Parte 2

Por Octávio Aragão

Leia primeiro Referencias Hermeticas em Promethea – Parte 1

As raízes e as ramificações de todos os mundos possíveis
O conceito da “árvore da vida” que serve como esteio do mundo é uma constante em várias mitologias e, além disso, um dos conceitos básicos da cabala. Yggdrasil, a árvore nórdica cuja seiva alimenta os deuses e que sustenta Asgard sobre seus ramos [9], é o conceito sobre o qual Alan Moore estruturou a série Glory, originalmente desenvolvida para a Awesome em 1997, mas apenas publicada em 2001, pela Avatar Press.

A princesa Glorianna, filha da deusa grega Deméter, nada mais era que um clone indisfarçado da Mulher Maravilha, da DC Comics, com sua ilha povoada apenas por mulheres e poderes muito semelhantes à personagem original. Moore repetiu a fórmula bem sucedida com Supreme, assumindo a semelhança entre as duas, mas transcendendo a mera cópia ao acrescentar elementos mitológicos, mais ou menos como Stan Lee e Jack Kirby fizeram em Thor, durante a década de 60. Glory passou a ter uma vida dupla: de dia garçonete de beira de estrada; à noite, princesa guerreira trajando uma escandalosa roupa-armadura colante. Mas a obviedade termina por aí, já que Gloria West, a garçonete, acredita que “sonha” ser Glory, a deusa.

Nada de identidades secretas ou cabines telefônicas para essa heroína, mas a constante dúvida a respeito da própria sanidade. Glory surge quando necessitada e trata Gloria como uma casca, um disfarce útil para seus momentos na Terra, quando não está no reino de sua mãe Deméter ou visitando o pai, o demônio Silverfall.

Moore estabelece Ultima Thule, o reino de Deméter, Ceres, Geb e outras divindades ligadas ao elemento terra, no patamar inferior da árvore da vida, como se Yggdrasil fosse um edifício onde cada andar abrigasse uma esfera de influência elemental relativa aos vários níveis de percepção da realidade. Imediatamente acima de Ultima Thule, está a Esfera Lunar, relativa à inconsciência, aos sonhos, à fantasia, governada por Selene, Diana, Ártemis e outras deusas ligadas à Lua, e logo seguida pela Terra da Magia, da linguagem, da ciência, da comunicação, sob a batuta, mais uma vez, de Hermes, Thot e Odin. Na seqüência, vem o Reino do Amor e das Emoções, território de Vênus, Afrodite, Nike e todas as divindades oriundas da paixão dos sentidos; sucedido pelo lar de Apolo, Horus, Baldur, Osiris e Jesus, as divindades solares. Trata-se do Reino do Espírito, da Unidade, sobreposto pela morada de Marte, Ares e Tyr, os deuses da guerra e do conflito, e pelas terras gerenciadas Júpiter, Thor, Indra e Jove, o território das figuras paternas, do casamento bem-sucedido entre matéria e espírito.

Sobre todos esses feudos espirituais vem o Abismo, e após, as últimas três esferas, sendo que a mais alta de todas é a morada de Yaveh, do Allah islâmico, de todas as divindades supremas, os Deuses Vivos das religiões monoteístas. A árvore da vida ainda abrigaria sobre suas raízes, as terras das sombras, os Hades/Infernos/Submundos, de onde veio o pai de Glory, Silverfall. O governo deste mundo que não é necessariamente ‘mau’, ficaria sob o encargo de Plutão, Hades e outras divindades sombrias, e margeando tudo ainda haveria lugar para um imenso corpo de água, “Chromoceano’, rio de luz presente em várias culturas.

Esse cenário amplo e detalhado serviria como manancial quase inesgotável para várias histórias de Glory, mas, infelizmente, a série foi interrompida no número três, sem previsão de continuidade por causa das baixas vendas. Moore, porém, não abandonaria um trabalho tão complexo que, obviamente, exigiu muita pesquisa e concentração, guardando-o para o futuro. Esse futuro chegou em 1999, encarnado em Promethea.

A outra volta do caduceu
Com a falência definitiva de Liefeld e da Awesome em 1998, Alan Moore descobriu-se cheio de novos conceitos, projetos inéditos e cercado por jovens ilustradores ansiosos para trabalhar em parceria, mas sem um meio para desagüar tantas idéias represadas. Entra em cena Jim Lee, artista contemporâneo de Rob Liefeld na Image Comics, com outra proposta faustiana: Moore teria carta branca para criar os títulos que quisesse, para que fossem englobados num selo próprio, o America’s Best Comics, e publicados pela WildStorm, de Lee, na época ainda sócio da Image. Moore aceitou e começou a trabalhar imediatamente, mas logo o projeto pareceu ameaçado com a venda da WildStorm para a DC Comics, para quem Moore havia jurado nunca trabalhar outra vez.

Desta vez, as condições de trabalho oferecidas a Moore pela DC eram extremamente positivas, mantendo o escritor como detentor dos direitos de todos os personagens concebidos e com uma boa percentagem de retorno advindo de qualquer projeto derivado das séries, tais como produções cinematográficas ou linhas de brinquedos. Era uma proposta irrecusável e o roteirista lançou cinco títulos em 1999: The League of Extraordinary Gentlemen, uma brincadeira steampunk [10] sobre os personagens da literatura vitoriana; Tom Strong, que reaproveitava vários conceitos originalmente pensados para Supreme; Top Ten, uma série policial misto de Hill Street Blues com super-heróis; Tomorrow Stories, uma antologia de várias HQs de estilos diferentes e independentes entre si sob o mesmo título, e Promethea; o título mais ambicioso dos cinco, que Moore utilizaria como palco para uma aula de esoterismo, usando a cabala como vertente principal.

Alexandria, 411 A. D. Uma menina foge de padres fanáticos que acabaram de chacinar seu pai, acusando-o de feitiçaria. Ele, para surpresa de seus algozes, morre feliz, agarrado a seu bordão em forma de caduceu[11].

Nova York, 1999 (não exatamente a Nova York de nossa realidade, mas um lugar onde discos voadores são um meio de transporte trivial, juntamente com táxis munidos de dispositivos antigravitacionais e outros aparelhos nada comuns aos habitantes de qualquer megalópole). Sophie Bangs, jovem estudante, prepara uma pesquisa sobre uma figura folclórica chamada Promethea. Sophie descobriu que o mesmo personagem, em várias épocas diversas que abrangem um período entre 1780 e 1999, foi tema de obras diferentes, em diversas mídias tais como poemas, romances, pulp fiction e até fotonovelas, por autores que nunca se conheceram e agora conseguiu marcar uma entrevista com a viúva do último artista a trabalhar no conceito. A reunião, porém, termina precocemente com um aviso da mulher:

“Listen, kid, you take my advice. You don’t wanna go looking for folklore. And especially don’t want folklore to come looking for you.” [12]

Mas certas palavras já foram ditas, certos nomes pronunciados. O mal está feito e a roda do universo gira em velocidade tal que logo Sophie Bangs é apresentada pessoalmente ao objeto de sua pesquisa: uma mulher obesa e decadente, porém poderosa, que a salva do ataque de um Smee, entidade fantasmagórica e letal enviada para evitar que a pesquisadora vá mais fundo em seu trabalho.

A narrativa dá um salto de volta a Alexandria, em 411 A.D. Vemos a criança fugitiva do início da história, perdida no deserto, confrontando as figuras colossais de Thot, deus egípcio da comunicação, cuja cabeça tem a forma de um pássaro, o íbis, e Hermes, que porta um imenso caduceu ornado por serpentes vivas. Thot, por sua vez, traz na mão um Ankh, símbolo egípcio do deus único Aton. Eles são a encarnação de uma divindade dupla, Thot-Hermes, e oferecem abrigo e segurança à menina, contanto que ela atravesse com eles o véu que separa o mundo físico de seu reino, um lugar chamado Immateria, onde “ela viverá eternamente, como as histórias”.

Immateria, segundo as entidades, não é muito longe, mas está sempre “onde você se encontra” e, uma vez lá, a criança deixará de ser um ser humano e passará a ser uma “história” eterna e que, possivelmente, dentro de determinadas condições, poderá transpor o portal para o mundo físico, pois, afinal, “algumas vezs, se uma história é muito especial, ela pode arrebatar as pessoas”. Só então as divindades gêmeas se lembram de perguntar o nome da criança. “Promethea”, ela responde, antes de desaparecer no ar[13].

Se ela não existisse, teríamos de inventá-la
Podemos ver claramente a conexão entre Glory e Promethea. Immateria nada mais é que a Terra da Magia descrita anteriormente, reino da linguagem, da ciência, da comunicação, governado por Thot-Hermes. A partir daqui, Moore irá aprimorar os conceitos cabalísticos apresentados anteriormente, adaptando-os à genealogia de Promethea numa evolução do que concebeu para Glory, sem medo de utilizar uma linguagem menos acessível ao grande público e distanciando-se cada vez mais da iconografia super-heroística. Assim como o caduceu que herdou de Thot-Hermes, Promethea é uma personagem transcendente e, em conseqüência, rebela-se contra gêneros e catalogações.

O primeiro arco de histórias da série, que vai do número 1 ao 6, além de apresentar Sophie Bangs e o elenco de coadjuvantes, inicia, a partir do terceiro fascículo, a viagem de auto-conhecimento de Promethea, explorando o reino de Immateria. No arco seguinte, as várias esferas já apresentadas na sinopse de Glory serão visitadas. A peregrinação durará até o final do terceiro arco, no episódio 23, mas os primeiros seis números estarão focados nos diversos aspectos da entidade. O primeiro termina explicitando que Sophie é a nova encarnação de Promethea, em substituição à personagem obesa que confronta o Smee. Essa mulher, Barbara Shelley, explica à estudante quem realmente foi a Promethea original, a filha de um acadêmico hermético egípcio – ou melhor, um sacerdote de Hermes – que viveu no século V, e dá os nomes de cinco artistas que serviram como veículo para a conjuração da divindade.

Esses criadores, um poeta, uma cartunista, uma ilustradora, um quadrinista e um romancista, foram o canal por meio da qual a entidade atravessava até o mundo físico, mas o “combustível” que a alimenta é o amor. “Qualquer um com imaginação e entusiasmo suficiente pela personagem pode trazê-la de Immateria, apenas pensando em si próprio ou em outra pessoa encarnando o papel”[14], diz Barbara, viúva do último artista a conjurar Promethea, deixando claro que a mistura de imaginação, talento artístico e amor é o gatilho capaz de materializar um sonho.

Avatares desbocados
Maurice Merleau-Ponty afirma que, diferente da crença geral, a linguagem vira as costas à significação, não se preocupa com ela. Ou seja, há uma independência subjacente à comunicação, cuja característica principal é uma diferenciação e sistematização de signos, seja nos fonemas, nas palavras ou em toda uma estrutura linguística. Uma coisa até pode levar à outra, mas isso não quer dizer que a função primordial dos signos seja estar à disposição dos significados. Os signos, ao que parece, têm uma agenda própria.

“Num certo sentido, a linguagem jamais se ocupa senão de si mesma. Tanto no monólogo interior como no diálogo não há ‘pensamentos’: trata-se de palavras suscitadas por palavras, e, na medida mesmo em que ‘pensamos’ mais plenamente, as palavras preenchem tão exatamente nosso espírito que nele não deixam um canto vazio para pensamentos puros e significações que não sejam de linguagem”[15]

Essa independência entre signo e significado parece ser a mola motriz da série como um todo e aparece muito claramente quando, no terceiro número da série, no capítulo intitulado Misty Magic Land, ao visitar pela primeira vez o reino de Immateria, Promethea encontra uma encarnação física de Chapeuzinho Vermelho, que, apesar de aparecer como uma doce e angelical menina loura de dez anos de idade, fuma muito e fala palavrões como uma prostituta de beira do cais.

Moore parece fascinado por essa contradição já que esta é apenas a primeira de uma série de guias que Promethea irá encontrar em suas diferentes jornadas pelos planos cabalísticos. Esses avatares desbocados serão, em diferentes momentos, velhos feiticeiros garanhões, anjos em forma feminina e roupas masculinas, doces travestis transsexuais e até as duas serpentes do caduceu trocam gracinhas pouco condizentes com sua condição de entidades cósmicas. No capítulo seguinte, A Faerie Romance, somos apresentados às quatro últimas versões de Promethea, todas vivendo em Immateria e cada uma representando uma característica da personagem: musa, guerreira, amante e professora, todas passando a Sophie uma diferente significação para o uso do “verbo” como instrumento transformador. Se brandidas como lâmina, palavras cortam, separam os corpos dos homens de suas cabeças; por outro lado, durante as guerras, palavras podem ser a última inspiração, uma taça de esperança. Mas palavras também pertencem ao mundo material, são moedas para troca, compra, liberação de prazer físico e, finalmente, palavras podem ser um bastão, símbolo fálico masculino, varinha mágica, poder. Lâminas, taças, moedas e varas. Espadas, copas, ouros e paus. As cartas estão na mesa e, a partir do episódio 12, o jogo cósmico começa.

Anagramas arcanos
Depois de dois números, respectivamente 8 e 9, onde combate as forças combinadas do inferno num clima ‘super-heroístico’ – quase como um lembrete aos leitores de que, no fundo, a revista faz parte dessa tradição – , Promethea dá uma guinada sem precedentes nos quadrinhos comerciais publicados nos Estados Unidos. Moore dedica uma revista inteira a uma cena de sexo tântrico entre a heroína e o vilão Jack Faustus na história entitulada Sex, Stars and Serpents. Não que isso fosse alguma novidade para o autor: quem lembra de sua fase áurea em Swamp Thing, da DC, nos anos 80, sabe que ele já havia abordado o tema ‘sexo entre diferentes’ de forma bastante ousada para a conservadora mídia estadunidense, com sucesso. Mas dessa vez Moore, com o auxílio do ilustrador J. H. Williams III, foi bem mais longe, com cenas explícitas de cunilíngüus, variações de posições e orgasmo, sem, contudo, escorregar no mau gosto pornográfico. Essa edição, que narra passo-a-passo um intercurso sexual pautado sobre citações mais ou menos óbvias tais como a serpente kundalini, o poder simbólico de camas e cavernas e como a humanidade pode comungar através do ato, foi indicada ao Eisner 2001 como melhor história individual.

Após a pausa para descanso, temos mais uma aventura do tipo “heroína-derrota-o-vilão-do-mês”, no número 11, que serve de preparação para a grande jornada que virá a seguir, com Promethea percorrendo todos os 12 reinos que congeminam as casas do zodíaco e os arcanos maiores do tarô, um por mês, durante um ano.

Logo no primeiro número da saga, Moore utiliza um artifício para relacionar a personagem a cada carta do tarô, produzindo anagramas com a palavra Promethea relacionados às 21 imagens ou aos conceitos inerentes durante as 24 páginas da edição.Assim, Metaphore é o termo representativo do Louco; Pa Theorem remete ao Mago; Mater Hope é a Sacerdotisa; A Pert Home casa com a Imperatriz e Rope Thema é o Imperador; Ape Mother é o Hierofante; Me Atop Her é a carta dos Amantes; O Mere Path, o Carro; A Pro Theme vem com a Temperança; Here Tempo, o Eremita; Eh, Tempora é a Roda da Fortuna; A carta Força corresponde a O Harem Pet; Hm Operate é oEnforcado, enquanto a Morte é O Reap Them; A Arte é Emote Harp, o Diabo é The Mop Era, a Casa de Deus é Metro Heap; A Estrela é Map O Ether, a Lua, Earth Mope, e o Sol é Meth Opera; O Julgamento é Meet Harpo, e, finalmente, o Mundo é Heart Poem.

Cada uma dessas reescrituras do nome “Promethea” descortina um dos sentidos dos arcanos e ajuda a traçar um resumo da história da humanidade desde seus primórdios até o fim inadiável – que, segundo as serpentes do caduceu, ocorrerá no ano 2017 – até o recomeço, quando o a carta do Louco mais uma vez for descartada do baralho. Sophie, assim como o leitor, tem agora um panorama, um mapa do futuro. Basta decidir que caminho seguir.

Notas
9. “Supunha-se que todo o universo era sustentado pelo gigantesco freixo Yggdrasil, que nascera do corpo de Ymir – o gigante do gelo -e tinha raízes imensas, uma das quais penetrava em Asgard, outra no Jotunheim (morada dos gigantes) e a terceira no Niffleheim (regiões das trevas e do frio). Ao lado de cada raiz havia uma fonte que a regava. A raiz que penetrava em Asgard era cuidadosamente tratada por três Norns, deusas consideradas como donas do destino. Eram Urdur (o passado), Verdande (o presente) e Skuld (o futuro). A fonte ao ldao de Jotunheim era o poço de Ymir, no qual se escondiam a sabedoria e inteligência, mas a do lado de Niffleheim alimentava Nidhogge (escuridão), que corroía a raiz perpetuamente. Quatro veados corriam sobre os ramos da árvore e mordiam os brotos; representavam os quatro ventos. Sob a árvore, ficava estendido o Ymir e, quando ele tentava livrar-se de seu peso, a terra tremia.” BULFINCH, Thomas. O Livro de Ouro da Mitologia, Histórias de Deuses e Heróis. Rio de Janeiro: Ediouro Publicações, 2000 – 9ª edição, p.
381/382

10. Steampunk é um derivado da ficção científica literária, geralmente ligado ao subgênero da história alternativa, que tem como características os cenários vitorianos e as tecnologias de caráter retrô, tais como locomotivas e dirigíveis, geralmente ligadas ao uso do vapor e da eletricidade como fonte de energia. Tem como alguns expoentes literários os autores Tim Powers (The Anubis Gates), Kim Newman (Anno Dracula) e a dupla William Gibson e Bruce Sterling (The Difference Engine), que foram considerados os inventores do Cyberpunk. Já nos quadrinhos, além de Moore, temos Joe Kelly e Chris Bachallo (Steampunk), Boaz e Erez Yakin (The Remarcable Works of Professor Phineas B. Fuddle), Randy e Jean-Mark Lofficier (Robur) entre muitos outros.

11. O caduceu, varinha portada por Hermes em torno da qual duas serpentes aparecem enroladas, é um símbolo de transcendência e terapêutica, tanto que até hoje é considerado um representativo da classe médica, já que Asclépius, filho de Apolo e deus da medicina, também a utilizava como instrumento de cura. O caduceu, ou herma, também é considerado como um símbolo de fertilidade, sendo constantemente associado a falos eretos, mas também à fertilidade do espírito, da transcendência. A mescla da serpente, animal rasteiro, com o capacete e as sandálias aladas ajudam a compreender o caráter composto da divindade Hermes, que faz a comunicação das coisas terrenas com a esfera superior.

12. “Olha, garota, siga o meu conselho. Você não quer ir atrás de folclore. E de preferência não queira que o folclore venha procurar por você.” In: MOORE, Alan. Promethea #1: The Radiant Heavenly City. USA: America’s Best Comics, 1999 – 1ª edição, p. 9.

13. O cerne da lenda de Prometeu, o titã que ousou roubar o fogo celeste e terminou acorrentado e com o fígado picado por uma éguia eternamente, manteve inalterado durante séculos, mas certas evoluções concernentes à personalidade do mito foram notadas a partir do Prometeu Acorrentado, de Ésquilo, escrito entre 467 e 459 A. C. O dramaturgo helênico foi o primeiro a emprestar ao titã transgressor uma característica civilizatória: ele haveria roubado o fogo de Zeus para cedê-los aos homens, para dar-lhes oportunidade de evolução. Parece-nos que foi esse o viés escolhido por Alan Moore ao construir sua Promethea, que também é portadora de um caduceu, cujas serpentes vivam e convolutas resplandecem com brilho interior. Uma entidade que, apesar de fisicamente superior ao homem comum, se manifesta por meio do princípio criador da humanidade, a chama artística, e se levanta contra o obscurantismo, as forças do caos desordenado, caixa de Pandora representada por vários personagens vilanescos, principalmente o enlouquecido ‘omnipata’ andrógino Painted Doll e o prefeito da cidade, Sonny Baskerville, cuja mente é lar de toda uma comunidade infernal. Ao combater essas forças, a Promethea de Moore não apenas aproxima os céus do homem, mas funciona como termômetro para o caminho contrário, evidenciando a evolução constante da humanidade em direção ao divino.

14. MOORE, Alan. Promethea #1: The Radiant Heavenly City. USA: America’s Best Comics, 1999 – 1ª edição, p. 24

15. MERLEAU-PONTY, Maurice. O Algoritmo e o Mistério da Linguagem, in A Prosa do Mundo. São Paulo, SP: Cosac & Naify Edições, 2002 – 1ª edição, p. 147

#HQ #Kabbalah

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/referencias-herm%C3%A9ticas-em-promethea-parte-2

Lúcifer Estrela-da-Manhã

Lúcifer ficou conhecido pelo leitores de quadrinhos em Sandman de Neil Gaiman como senhor do inferno junto de Azazel e Beelzebub, um local de autopunição dos pecadores que já morreram e lar dos seres chamados de demônios , um lugar também conhecido pelos nomes de Hades, Abaddon, Sheol, Avernus, Reflexo Negro do Cêu entre outros nomes.

Nesse capítulo Morpheus foi lá em busca do seu elmo que perdeu durante o período que esteve preso e que agora está em posse do demônio Choronzon.

Depois que Morpheus consegue recuperar o seu elmo, Lúcifer decide não deixar ele ir, ai ocorre o diálogo.

Lúcifer : “Com ou sem o seu elmo , você não tem poder nenhum aqui… que força tem os sonhos no inferno?”

Morfheus : “…que poder teria o inferno se os prisioneiros daqui não fossem capazes de sonhar com o cêu?”

E assim de certo modo Morpheus sai ganhando e vai embora , e Estrela-da-Manhã jura vingança pela humilhação .

Dois anos depois desse acontecido Morpheus precisa voltar ao inferno para resgatar uma antiga amada sua que ele deixou no inferno por milhares de anos , após ela cometer suicídio.

Desta vez o anjo caído está um pouco diferente com asas de demônio , (antes estava com asas de anjo) ao invés da esperada vingança Lúcifer faz algo diferente do esperado , apenas dizendo que esta cansado do inferno depois de 10 bilhões de anos e gostaria de ser livre , e depois de um longo diálogo enquanto fecha as portas do inferno , pede para Morpheus cortar suas asas e dá para ele a chave do inferno.

Algo muito inteligente , quem sabe seria a esperada grande vingança afinal muitos gostariam de serem donos do inferno e poderiam fazer de tudo para serem.

Lúcifer se apresenta como um homem alto , loiro de aparência jovem e é conhecido por vários nomes , Lord Lúcifer , Estrela-da-Manhã , Aquele que traz a luz , O primeiro entre os caídos , Senhor do Inferno, Samael , Anjo das trevas entre outros nomes.

Esse é um diálogo interessante extraído de Sandman :

Porque eles culpam a mim pelos seus defeitos ?

Usam meu nome como se eu passasse o dia inteiro instingando-os a cometerem atos que , de outra forma achariam repulsivos.

“O demônio me forçou a isso.” Nunca forcei ninguém a fazer nada. NUNCA.

Eles falam de mim como se eu andasse comprando almas na feira , sem jamais se perguntassem por quê.

Não preciso de almas.

E como alguém pode comprar uma alma?

Passando alguns anos Lúcifer ganha sua própria revista , assim como ocorreu com Constantine que nasceu coadjuvante em O Monstro do Pântano no inglês Swamp Thing, na época que Alan Moore assumiu a revista.

Em sua revista , depois de tudo ele cria o bar noturno chamada Lux em Los Angeles e fica lá com Mazikeen , uma filha de Lilith fiel a ele desde o inferno.

Lúcifer é considerado um dos seres mais poderosos do universo DC , após Deus e Miguel.

Foi difícil achar um escritor para Lúcifer , quem sabe o nome assustava os escritores , o próprio Neil Gaiman sempre indicou ele para outros escritores mais por anos ninguém pegou o “trampo” e não sei porque Gaiman não fez isso também.

Mas em 2000 Mike Carey resolveu escrever Lúcifer , usando como base Paradise Lost de John Milton e nasceu um grande sucesso.

Em sua revista conhecemos melhor esse anjo , que se mostra extremamente inteligente , informado , cheio de ironia e raramente apelando para força bruta usando sempre perspicácia , neutro e agindo apenas conforme o seu favor, estando além do “bem” e do “mal”.

Entre as centenas de temas que são tratados temos : Deuses , Magia , Runas , Bíblia , Xamanismo , Anjos , Demônios , Mitologia , Lilith , Tarot , Literatura , Filosofia , Mediunidade , Livre Arbítrio entre outros assuntos..

Assim como Sandman , Lúcifer teve 75 edições em 6 anos de 2000 até 2006.

Texto Sobre Neil Gaiman

 Texto Sobre Os Perpétuos de Sandman

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Outros Textos da Coluna de Quadrinhos

#Quadrinhos

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/l%C3%BAcifer-estrela-da-manh%C3%A3

Hellboy

Hellboy é jovem em relação a outros quadrinhos e, apesar disso, conseguiu muito destaque e fama.

O gênio por traz dele é Mike Mignola , que fez algo totalmente original , colocando um ser que sempre é ligado ao “mal” (demônio) fazendo o “bem” , tendo uma vida dedicada a ser herói e resolver casos ligados ao sobrenatural ao redor do mundo.

A história começa em 1944 , Hellboy era um pequeno demônio , filho de um dos príncipes do inferno com uma bruxa , ele veio para terra quando o Monge Rasputin abriu um portal para o inferno perto do final da Segunda Guerra Mundial , com o objetivo de dar início ao projeto Ragnarock para usar magia negra para ganhar a guerra.

Metade demônio e metade criança , com cauda , pequenos chifres , pele vermelha e um braço direito enorme a pequena criaturinha é encontrada pelos aliados nas ruínas de um local longe do ritual dos nazistas e ganha o nome de Hellboy.

Mesmo sendo “diferente” é adotado pelo professor Trevor Bruttenholm , estudioso de paranormalidade , membro da sociedade paranormal britânica e conselheiro de assuntos desse tipo do presidente Roosevelt.

Por ser um demônio ele se tornou adulto rápido e depois se torna um agente da Bureau de Pesquisas e Defesa Paranormal , organização do governo fundada pelo Professor Trevor na mesma época em que Hellboy é encontrado , o objetivo era combater os planos dos nazistas ocultistas e posteriormente resolver casos paranormais ao redor do mundo.

Lá ele trabalha com diversos agentes , alguns bem singulares como Abe Sapien um homem anfíbio com poderes telepáticos , Liz Sherman uma mulher que possui a capacidade de produzir fogo , Roger o homúnculo e Johann Kraus um homem que possui apenas o corpo ectoplasmico.

Mas chega de spoiler né???

Mike Mignola escreve um tanto devagar o que faz existir uma quantidade não muito grande de edições de Hellboy e no Brasil menos ainda , mas uma quantidade até razoável , algumas bem curtas, fora as histórias solo da Bureal.

Cada edição é uma obra de arte , principalmente as capas , fora os traços de Mignola um estilo muito original.

As histórias de Hellboy giram em torno de contos , lendas urbanas ou não , folclores , mitologias , fatos históricos e ocultismo , tudo isso de várias partes do mundo .

Hellboy também é um “Ocultista Fodão” pois nem sempre resolve as coisas com porrada , mas também com magia.

Como foi dito essa hq envolve fatos históricos , como ter como personagem o monge Rasputin que realmente existiu entre outras personagens.

Baba Yaga , bruxa do folclore russo aparece em algumas histórias , também aparecem lobisomens , vampiros , zumbis , demônios , humúnculos , fantasmas , dragões e outros diversos tipos de criaturas.

Além disso também temos um assunto muito explorado , os nazistas e ocultismo , a sociedade Thule(que realmente existiu/existe) e que Hitler patrocinava pesquisas relacionadas a ocultismo.

Também explorando lendas urbanas como foi dito por exemplo a existência de uma área do governo especializada em assuntos paranormais , uma base militar estilo área 51.

Misturando suspense , aventura , terror e ficção científica Mike Mignola cria Hellboy , mostrando que ele entende de ocultismo também.

Também não podemos esquecer os dois filmes dirigidos Guillhermo del Toro (Labirinto do Fauno) ,Hellboy e Hellboy II e o Exército Dourado e também tem animações e aparentemente o terceiro filme está sendo produzido.

Quem interpretou Hellboy foi Ron Perlman , uma escolha muito boa e quem interpretou Abe Sapien foi Doug Jones que também se encaixou muito bem no papel.

#HQ

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O Vampiro na literatura, filmes e na cultura pop – Lorde A

Bate-Papo Mayhem #028 – gravado dia 06/06/2020 (sabado) Marcelo Del Debbio bate papo com Lorde A – O Vampiro na literatura, filmes e na cultura pop. Os bate-Papos são gravados ao vivo todas as 3as e 5as com a participação dos membros do Projeto Mayhem, que assistem ao vivo e fazem perguntas aos entrevistados.

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#Literatura #vampiros

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Mito e Sagrado nas Historias em Quadrinhos – O aspecto religioso dos Super-herois

Bate-Papo Mayhem #043 – gravado dia 11/07/2020 (sabado) Marcelo Del Debbio bate papo com Felipe Cazelli – Mito e Sagrado nas Historias em Quadrinhos – O aspecto religioso dos Super-herois Os bate-Papos são gravados ao vivo todas as 3as e 5as com a participação dos membros do Projeto Mayhem, que assistem ao vivo e fazem perguntas aos entrevistados.

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#Batepapo #HQ #Mitologia

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