A Magia Maior e a Magia Menor no Satanismo

Magia Maior e Magia Menor (conhecida também como Alta e Baixa Magia ou coletivamente Magia Satânica), dentro do Satanismo LaVeyano, designa tipos de crenças com o termo maior magia aplicada à prática ritual significada como catarse psicodramática para focar as emoções para um propósito específico e magia menor aplicado à prática de manipulação por meio de psicologia aplicada e glamour (ou “astúcia e malícia”) para dobrar um indivíduo ou situação à sua vontade.

TEORIA E DEFINIÇÃO:

 “A magia branca é supostamente utilizada apenas para propósitos bons ou altruístas, e a magia negra, nos dizem, é usada apenas por razões egoístas ou “más”. O satanismo não traça tal linha divisória. Magia é magia, seja usada para ajudar ou atrapalhar. O satanista, sendo o mago, deve ter a habilidade de decidir o que é justo, e então aplicar os poderes da magia para atingir seus objetivos.” – Anton LaVey.

Delineado na Bíblia Satânica, LaVey definiu a magia como “a mudança em situações ou eventos de acordo com a vontade de alguém, que, usando métodos normalmente aceitos, seria imutável”. Esta definição incorpora dois tipos amplamente distintos de magia: maior e menor. De acordo com LaVey, um dos objetivos da magia ritual é “isolar a suprarrenal dissipada e outras energias emocionalmente induzidas, e convertê-la em uma força dinamicamente transmissível”. LaVey definiu magia menor como “astúcia e astúcia obtidas através de vários dispositivos e situações inventadas, que quando utilizadas, podem criar mudanças de acordo com a vontade de alguém”. Dentro deste sistema de magia, os termos feiticeiro e bruxa são mais comumente usados ​​e para se referir a praticantes masculinos e femininos, respectivamente.

LaVey defendia a visão de que havia uma realidade objetiva para a magia, e que ela dependia de forças naturais que ainda não haviam sido descobertas pela ciência. Em vez de caracterizá-los como sobrenaturais, LaVey expressou a visão de que eles faziam parte do mundo natural. Ele acreditava que o uso bem-sucedido da magia envolvia o mago manipular essas forças naturais usando a força de sua própria força de vontade. LaVey também escreveu sobre “o fator de equilíbrio”, insistindo que quaisquer objetivos mágicos deveriam ser realistas. LaVey recusou qualquer divisão entre magia negra e magia branca, atribuindo essa dicotomia puramente à “hipocrisia presunçosa e autoengano” daqueles que se autodenominavam “magos brancos”. Tal neutralidade se correlaciona com a visão filosófica de LaVey de um universo impessoal e, portanto, amoral.

LaVey explica suas razões para escrever A Bíblia Satânica em um pequeno prefácio. Ele fala com ceticismo sobre os volumes escritos por outros autores sobre o assunto da magia, descartando-os como “nada mais do que fraude hipócrita” e “volumes de desinformação e falsas profecias”. Ele reclama que outros autores não fazem mais do que confundir o assunto. Ele zomba daqueles que gastam grandes quantias de dinheiro em tentativas de seguir rituais e aprender sobre a magia compartilhada em outros livros de ocultismo. Ele também observa que muitos dos escritos existentes sobre magia e ideologia satânicas foram criados por autores do “caminho da mão direita”. Ele diz que a Bíblia Satânica contém verdade e fantasia, e declara: “O que você vê pode nem sempre agradar a você, mas você verá!” Muitas das ideias de LaVey sobre magia e ritual são descritas na Bíblia Satânica. LaVey explica que alguns dos rituais são simplesmente psicologia aplicada ou ciência, mas que alguns contêm partes sem base científica. Os Rituais Satânicos, publicado por LaVey em 1972, descreve os rituais com mais precisão. O terceiro livro da Bíblia Satânica descreve rituais e magia. De acordo com Joshua Gunn, estes são adaptados de livros de magia ritual, como Magick de Crowley: Teoria Elementar, mais conhecido como o Liber ABA.

A MAGIA MENOR

 “O significado antiquado de ‘glamour’ é bruxaria. O trunfo mais importante para a bruxa moderna é sua capacidade de ser sedutora, de utilizar o glamour. A palavra ‘fascinação’ tem uma origem similarmente oculta. Fascinação era o termo aplicado ao mau-olhado. Fixar o olhar de uma pessoa, em outras palavras, fascinar, era amaldiçoá-la com o mau-olhado. Portanto, se uma mulher tinha a capacidade de fascinar os homens, ela era considerada uma bruxa.” – Anton LaVey.

A Magia Menor, também conhecida como magia “cotidiana” ou “situacional”, é a prática de manipulação por meio da psicologia aplicada. LaVey escreveu que um conceito-chave na magia menor é o “comando para olhar”, que pode ser realizado utilizando elementos de “sexo, sentimento e admiração”, além da utilização de aparência, linguagem corporal, aromas, cores, padrões , e odor. LaVey escreveu que os termos “fascínio” e “glamour” têm origens no mundo da magia “coercitiva”. A palavra “fascinação” vem da palavra latina “fascinare”, que significa “lançar um feitiço sobre”. Este sistema encoraja uma forma de dramatização manipulativa, em que o praticante pode alterar vários elementos de sua aparência física para ajudá-lo a seduzir ou “enfeitiçar” um objeto de desejo.

LaVey desenvolveu “O Relógio Sintetizador”, cujo objetivo é dividir os humanos em grupos distintos de pessoas com base principalmente na forma do corpo e nos traços de personalidade. O sintetizador é modelado como um relógio, e baseado em conceitos de somatótipos. O relógio destina-se a ajudar uma bruxa a se identificar, posteriormente auxiliando na utilização da “atração de opostos” para “encantar” o objeto de desejo da bruxa, assumindo o papel oposto. Diz-se que a aplicação bem-sucedida da magia menor é construída sobre a compreensão de seu lugar no relógio. Ao encontrar sua posição no relógio, você é encorajado a adaptá-la como achar melhor e aperfeiçoar seu tipo harmonizando seu elemento para melhor sucesso. LaVey explica que, para controlar uma pessoa, é preciso primeiro atrair sua atenção. Ele dá três qualidades que podem ser empregadas para esse propósito: apelo sexual, sentimento (fofura ou inocência) e admiração. Ele também defende o uso de odor.

Dyrendal se referiu às técnicas de LaVey como “Erving Goffman conhece William Mortensen”. Extraindo insights da psicologia, biologia e sociologia, Petersen observou que a magia menor combina ocultismo e “ciências rejeitadas de análise corporal e temperamentos”.

  • No MorteSubita.net há uma seção dedicada a Baixa Magia com diversas informações a respeito.

A MAGIA MAIOR:

Da esquerda para a direita: Karla LaVey, Diane Hegarty e Anton LaVey ritualizando na Casa Negra, a sede original da Igreja de Satã.

A Magia Maior é um ritual realizado para concentrar a energia emocional de uma pessoa para um propósito específico. Esses ritos são baseados em três grandes temas psicoemotivos, incluindo compaixão (amor), destruição (ódio) e sexo (luxúria). Esses rituais são frequentemente considerados atos mágicos, com o satanismo de LaVey incentivando a prática da magia para ajudar os fins egoístas. Muito do ritual satânico é projetado para um indivíduo realizar sozinho; isso ocorre porque a concentração é vista como a chave para a realização de atos mágicos. O ritual é referido como uma “câmara de descompressão intelectual”, onde o ceticismo e a descrença são voluntariamente suspensos, permitindo assim que os magos expressem plenamente suas necessidades mentais e emocionais, não retendo nada em relação aos seus sentimentos e desejos mais profundos. LaVey listou os componentes-chave para um ritual bem-sucedido como: desejo, tempo, imaginação, direção e “O Fator de Equilíbrio” (consciência das próprias limitações). Os rituais LaVeyanos às vezes incluem blasfêmias anticristãs, que se destinam a ter um efeito libertador sobre os participantes. Em alguns dos rituais, uma mulher nua serve de altar; nestes casos, fica explícito que o próprio corpo da mulher se torna o altar, em vez de tê-la simplesmente deitada sobre um altar existente. Não há lugar para orgias sexuais no ritual LaVeyano. Nem animais nem sacrifícios humanos acontecem. As crianças são proibidas de participar desses rituais, com a única exceção sendo o Batismo Satânico, que é especificamente projetado para envolver bebês.

Detalhes para os vários rituais satânicos são explicados no Livro de Belial, e listas de objetos necessários (como roupas, altares e o símbolo de Baphomet) são fornecidas. LaVey descreveu uma série de rituais em seu livro, Os Rituais Satânicos; estas são “performances dramáticas” com instruções específicas sobre a roupa a ser usada, a música a ser usada e as ações a serem tomadas. Esta atenção aos detalhes na concepção dos rituais foi intencional, com sua pompa e teatralidade pretendendo envolver os sentidos e os sentidos estéticos dos participantes em vários níveis e aumentar a força de vontade dos participantes para fins mágicos. LaVey prescreveu que os participantes do sexo masculino devem usar túnicas pretas, enquanto as mulheres mais velhas devem usar preto, e outras mulheres devem se vestir de forma atraente para estimular os sentimentos sexuais entre muitos dos homens. Todos os participantes são instruídos a usar amuletos do pentagrama virado para cima ou da imagem de Baphomet. De acordo com as instruções de LaVey, no altar deve ser colocada uma imagem de Baphomet. Isso deve ser acompanhado por várias velas, todas, exceto uma, devem ser pretas. A única exceção é uma vela branca, usada em magia destrutiva, que é mantida à direita do altar. Também deve ser incluído um sino que é tocado nove vezes no início e no final da cerimônia, um cálice feito de tudo menos ouro, e que contém uma bebida alcoólica simbolizando o “Elixir da Vida”, uma espada que representa a agressão, uma falo modelo usado como aspersório, gongo e pergaminho no qual os pedidos a Satã devem ser escritos antes de serem queimados. Embora o álcool fosse consumido nos ritos da Igreja, a embriaguez era desaprovada e o consumo de drogas ilícitas era proibido.

O livro final da Bíblia Satânica enfatiza a importância da palavra falada e emoção para a magia eficaz. Uma “Invocação a Satã” bem como três invocações para os três tipos de ritual são dadas. A “Invocação a Satã” ordena que as forças das trevas concedam poder ao invocador e lista os nomes Infernais para uso na invocação. A “Invocação empregada para a conjuração da luxúria” é usada para atrair a atenção de outro. As versões masculina e feminina da invocação são fornecidas. A “Invocação empregada para a conjuração da destruição” comanda as forças das trevas para destruir o sujeito da invocação. A “Invocação empregada para a conjuração da compaixão” solicita proteção, saúde, força e a destruição de qualquer coisa que aflija o sujeito da invocação. O resto do Livro de Leviatã é composto pelas Chaves Enoquianas, que LaVey adaptou do trabalho original de Dee. Elas são dados em enoquiano e também traduzidas para o inglês. LaVey fornece uma breve introdução que credita Dee e explica um pouco da história por trás das Chaves Enoquianas e da linguagem. Ele sustenta que as traduções fornecidas são um “desenvernizamento” das traduções realizadas pela Ordem Hermética da Golden Dawn (Aurora Dourada) em 1800, mas outros acusam LaVey de simplesmente mudar as referências ao cristianismo com as de Satã.

Ao projetar esses rituais, LaVey baseou-se em uma variedade de fontes mais antigas, com o estudioso do satanismo Per Faxneld observando que LaVey “montou rituais de uma miscelânea de fontes históricas, literárias e esotéricas”. LaVey brincou abertamente com o uso da literatura e da cultura popular em outros rituais e cerimônias, apelando assim ao artifício, pompa e carisma. Por exemplo, ele publicou um esboço de um ritual que ele chamou de “Chamado a Cthulhu”, que se baseava nas histórias do deus alienígena Cthulhu, de autoria do escritor de terror americano H. P. Lovecraft. Neste rito, programado para acontecer à noite em um local isolado perto de um turbulento corpo de água, um celebrante assume o papel de Cthulhu e aparece diante dos satanistas reunidos, assinando um pacto entre eles na linguagem da ficção de Lovecraft “Old Ones (Os Antigos)”.

  • O Morte Súbita inc tem uma seção inteiramente dedicada a Baixa Magia

RITUAIS E RITOS CERIMONIAIS:

No Livro de Belial, ele discute três tipos de rituais: rituais de luxúria que trabalham para atrair outra pessoa, rituais de destruição para destruir outra pessoa e rituais de compaixão para melhorar a saúde, inteligência e sucesso. Rituais de luxúria são projetados para atrair o parceiro romântico ou sexual desejado e podem envolver a masturbação, com o orgasmo como objetivo. Rituais de destruição são projetados para prejudicar os outros e envolvem a aniquilação simbólica de um inimigo através do uso de sacrifício humano “vicário”, muitas vezes envolvendo uma efígie personalizada representando a vítima pretendida que é então submetida a fogo ritual, esmagamento ou outra representação de obliteração . Os rituais de compaixão são projetados com a intenção de ajudar as pessoas (incluindo a si mesmo), para evocar um sentimento de tristeza ou tristeza, e o choro é fortemente encorajado.

Nos Rituais Satânicos, LaVey faz uma distinção entre o ritual e a cerimônia, afirmando que os rituais “… são direcionados para um fim específico que o performer deseja”, e que as cerimônias são “… evento, aspecto da vida, personagem admirado, ou declaração de fé (…) um ritual serve para atingir, enquanto uma cerimônia serve para sustentar”. LaVey enfatizou que em sua tradição, os ritos satânicos vinham em duas formas, nenhuma das quais eram atos de adoração; em sua terminologia, os “rituais” tinham a intenção de provocar mudanças, enquanto as “cerimônias” celebravam uma ocasião particular.

Um batismo satânico é uma cerimônia para uma criança que se destina a ser um reconhecimento simbólico da criança como tendo nascido satanista e só deve ser realizada para menores de quatro anos, pois LaVey afirmou que além dessa idade, a criança já começou a ser influenciado por ideias “alienígenas”. Os batismos de adultos servem como uma declaração de “fé”, onde “falsidades, hipocrisia e vergonha do passado” são simbolicamente rejeitadas. Em 1967, LaVey realizou o primeiro batismo satânico registrado publicamente na história para sua filha mais nova, Zeena, que ganhou publicidade mundial e foi originalmente gravado no LP, The Satanic Mass (A Missa Satânica). Os Batismos Satânicos foram escritos por LaVey e publicados em Os Rituais Satânicos.

Em fevereiro de 1967, LaVey oficiou o primeiro casamento satânico, o casamento muito divulgado de Judith Case e o jornalista John Raymond. O primeiro funeral satânico foi para o mecânico-reparador naval dos EUA, de terceira classe e membro da Igreja de Satã, Edward Olsen. Foi realizado por LaVey a pedido da esposa de Olsen, completo com uma guarda de honra com capacete cromado. Ambas as cerimônias foram escritas por LaVey, mas nunca foram publicadas oficialmente até 2007, quando As Escrituras Satânicas lançou ao público uma versão adaptada delas pelo atual Sumo Sacerdote da Igreja, Peter H. Gilmore.

Junto com as cerimônias de casamento e funeral, As Escrituras Satânicas de Gilmore também publicou um rito menor de dedicação de objetos cerimoniais, que satiriza os rituais de ‘limpeza’ de outras religiões, e o Ragnarök Rite (Rito do Ragnarök), um ritual escrito por Gilmore na década de 1980 inspirado no o antigo mito nórdico do Ragnarök pretendia expurgar seus participantes da angústia e do ódio despertados após serem vítimas do fanatismo religioso.

A MISSA NEGRA:

LaVey também desenvolveu sua própria Missa Negra, que foi concebida como uma forma de descondicionamento para libertar o participante de quaisquer inibições que desenvolvessem ao viver na sociedade cristã. Ele observou que ao compor o rito da Missa Negra, ele se baseou no trabalho de Charles Baudelaire e Joris-Karl Huysmans.

SIMBOLISMO:

Os Quatro Príncipes Coroados do Inferno:

LaVey utilizou o simbolismo dos Quatro Príncipes Herdeiros do Inferno na Bíblia Satânica, com cada capítulo do livro sendo nomeado após cada Príncipe. O Livro de Satã: A Diatribe Infernal, O Livro de Lúcifer: A Iluminação, O Livro de Belial: Domínio da Terra, e O Livro do Leviatã: O Mar Furioso. Esta associação foi inspirada na hierarquia demoníaca do Livro da Magia Sagrada de Abra-Melin, o Mago.

  • Satã (hebraico) “O Senhor do Inferno”:

O adversário, representando a oposição, o elemento fogo, a direção do sul e o Sigilo de Baphomet durante o ritual.

  • Lúcifer (romano) “A Estrela da Manhã”:

O portador da luz, representando orgulho e iluminação, o elemento ar, a direção do leste e velas durante o ritual.

  • Belial (hebraico) “O Sem Mestre”:

A baixeza da terra, independência e autossuficiência, o elemento terra, a direção do norte e a espada durante o ritual.

  • Leviatã (hebraico) “A Serpente do Abismo”:

O grande dragão, representando o segredo primordial, o elemento água, a direção do oeste e o cálice durante o ritual.

Frases:

Hail Satan (Salve Satã)” uma saudação comum e termo ritual na Igreja de Satã, tanto em sua forma inglesa, Hail Satan, bem como na versão original em latim, Ave Satanas. Quando Ave Satanas é usado, muitas vezes é precedido pelo termo Rege Satanas (“Satã Reina”). (Rege Satanas pode ser ouvido no vídeo de um casamento amplamente divulgado da Igreja de Satã realizado por LaVey em 1º de fevereiro de 1967.) A combinação “Rege Satanas, Ave Satanas, Hail Satan!” é encontrado como uma saudação na correspondência inicial da Igreja de Satã, bem como em sua gravação de 1968, The Satanic Mass (A Missa Satânica) e, finalmente, em seu livro de 1969, A Bíblia Satânica. A frase é usada em algumas versões da Missa Negra, onde muitas vezes acompanha a frase Shemhamforash e é dita no final de cada oração. Este rito foi realizado pela Igreja de Satã aparecendo no documentário Satanis em 1969.

***

Principais fontes:

Aquino, Michael (2002). The Church of Satan.

Barton, Blanche (1992). The Secret Life of a Satanist: The Authorized Biography of Anton Lavey. Feral House. p. 86. ISBN 978-0-922915-12-5.

Gilmore, Peter H. (2007). The Satanic Scriptures. Baltimore (MD): Scapegoat Publishing. pp. 131–182.

Gunn, Joshua (2005). “Prime-time Satanism: rumor-panic and the work of iconic topoi”. Visual Communication. 4 (1): 93–120. doi:10.1177/1470357205048939. S2CID 144737058.

LaVey, Anton (1969). The Satanic Bible. Avon.

LaVey, Anton, The Satanic Mass, LP (Murgenstrumm Records, 1968)

Melech, Aubrey (1985). La Messe Noire (PDF). London: Sui Anubis. p. 52. ISBN 0-947762-03-5.

Mortensen, William; Dunham, George (2014). The Command to Look: A Master Photographer’s Method for Controlling the Human Gaze. p. 203.

***

Texto adaptado, revisado e enviado por Ícaro Aron Soares.

Postagem original feita no https://mortesubita.net/baixa-magia/a-magia-maior-e-a-magia-menor-no-satanismo/

A importância do ocultismo em ‘Frankenstein’ de Mary Shelley

Irving H. Buchen

As civilizações não podem evoluir mais até que o “oculto” seja dado como certo no mesmo nível da energia atômica.
(Colin Wilson, O Oculto [1971])

Há períodos na história em que os extremos se tornam normas. O interesse pelo passado se converte em uma preocupação apaixonada com o antigo. A especulação sobre o que está por vir se transforma na descontinuidade do futurista. Quando tais contrários coexistem com igual força e defesa, o presente parece alternadamente pronto para uma regressão intensa ou um salto quântico adiante. A cultura, por sua vez, se esforça para dar sentido às suas contracorrentes históricas. Uma investigação sobre como tudo começou está inextricavelmente entrelaçada com como tudo pode terminar; e perfeição e catástrofe aparecem como versões igualmente viáveis ​​uma da outra. Tais preocupações com gênese e término muitas vezes convergem utopia e distopia, uma imagem não imprecisa de Frankenstein que simboliza um modo híbrido que sacrifica a cura catártica da tragédia pelos insights cósmicos da blasfêmia. Não é por acaso que no processo o oculto vem à tona para registrar o alcance e a profundidade da fissura, pois o oculto é sintomático da ausência de unidade ou da quebra do círculo. Certamente, o ocultismo muitas vezes é revivido em parte por um desejo desesperado de substituir a liberdade da confusão pela clareza do determinismo externo; mas também é chamado genuinamente a redescobrir as forças essenciais do universo e a trazer harmonia à infinita multiplicidade. No processo, defensores e detratores da manobra oculta se posicionam historicamente.

Os devotos do ocultismo sustentam que ele foi co-presente com a criação original e ocupa uma linha histórica ininterrupta de períodos pré-registrados no passado até uma extensão inacabada no futuro distante. Em outras palavras, os mistérios sagrados são eternos e o ocultismo expressa o inconsciente coletivo do cosmos. Além disso, sua longevidade e sua preocupação com o segredo dos segredos ao longo dos tempos defendem sua universalidade e justificam sua pretensão de obter um status igual ao da ciência teórica. Acima de tudo, o ocultismo traz à ciência o que lhe falta – a estrutura do ritual – e assim fornece a religião e a arte da ciência. Oponentes ou céticos reconhecem livremente as origens antigas do ocultismo e ainda admitem que então – mas só então – ele de fato gozava do status de ciência. Mas as artes obscuras passaram a ser cada vez mais contestadas por praticamente todas as grandes religiões como espúrias ou heréticas e, como resultado, o ocultismo foi forçado a se tornar basicamente um movimento subterrâneo ou periférico cuja longa história de fracassos sensacionais e enganos escandalosos exigia o obscurecimento de uma série de gerações antes que pudesse ser ressuscitado com alguma credibilidade.

Como uma declaração geral das alegações e contra-alegações, o que foi dito acima talvez seja um resumo tão preciso das atitudes predominantes em relação ao ocultismo no tempo de Mary Shelley quanto hoje.[1] Mas o que é instrutivo é que tal formulação é totalmente rejeitada por Mary. Shelley em pelo menos três maneiras principais. Primeiro, nem o ocultismo nem a ciência são favorecidos por Mary Shelley. Através de uma elaborada série de polarizações ela aplica tanto a carícia quanto o porrete para ambos os lados, e através da educação de Victor Frankenstein toma a medida de ambos para indicar os elementos essenciais que faltam a cada um. Em outras palavras, o que fica eminentemente claro mesmo em uma pesquisa superficial é que o romance não aceita, mas procura ir além da oposição como uma posição final. Em segundo lugar, Mary Shelley introduz o mito de Prometeu por uma série de razões,[2] uma das quais é transmitir ao sonho alquímico de animar o inanimado as dimensões míticas de uma história da criação. De fato, sem mito, que goza da facilidade especial de síntese ou transcendência, é questionável se Mary Shelley poderia de fato ir além de uma mera afirmação de polarização. Terceiro, Victor Frankenstein, como seu colega mais jovem, Robert Walton, o explorador polar, anseia rapsodicamente por uma relação metafísica e religiosa com o cosmos em um momento em que a religião e a ciência parecem desprovidas de qualquer alcance ou fogo metafísico. Assim, pelo menos para Victor Frankenstein, a alquimia preenche um vazio da alma; e qualquer outra coisa que ele acrescente ou subtraia, o que Mary Shelley parece estar sugerindo é que o ocultismo é ressuscitado periodicamente ao longo da história sempre que as ideologias reinantes se tornam excessivamente voltadas para dentro ou presas à terra.[3]

A atitude de Mary Shelley em relação ao oculto, portanto, não parece ser nem de endosso nem de condenação, mas de profunda hesitação. Para ela, a questão não é que os alquimistas estejam certos e os cientistas errados ou vice-versa. De fato, perceber a situação nesses termos é perder o pivô diagnóstico-chave inerente a todas as condições de contracorrentes históricos. Em vez disso, o conflito – se é que pode ser chamado assim – assemelha-se ao de uma conquista trágica: um conflito de direitos. Por seu lado, o ocultismo é sempre presunçosamente total e mítico em seu escopo. A obsessão por essências unificadoras está no auge de suas três atividades favoritas: a pedra filosofal, o elixir vitae e a animação da natureza inanimada.

Necromantes consistentemente imitaram o exagero de Prometheus, entregando sua própria versão do fogo à humanidade. Em suma, há regularmente sobre o oculto uma insistência fanática de que nada menos que a essência será suficiente – um absolutismo ideológico que inevitavelmente é desafiador e potencialmente sempre blasfemo. Por seu lado, a ciência é gradual e cumulativa. O objetivo de suas metodologias precisas é produzir resultados verificáveis. A ciência assume que o mundo é ordenado e compreensível; se não fosse, não poderia haver ciência, e o mundo teria permanecido nas mãos de primitivos que celebram mistérios. Assim, a ciência cresce por acréscimo – peça por peça é meticulosamente colocada em prática, mas, de acordo com Frankenstein e pelo menos um de seus professores, com tamanha miopia que poucos percebem que o limiar para um salto quântico pode ter sido alcançado. Em suma, o fogo que a ciência oferece foi domado em etapas para ser manejável e utilizável, mas no processo nunca é oferecido como dom de Deus. Dito de outra forma, se Victor Frankenstein tivesse percebido o conflito entre o ocultismo e a ciência como um conflito entre o certo e o errado, ele nunca teria percebido a possibilidade de que cada um possuísse o que faltava ao outro, e tentou casar as visões da alquimia com o metodologia da ciência. Certamente, ao longo do romance, muitas vezes é levantada a questão de saber se essa aliança é profana e os resultados imorais. Mas a resposta a essa pergunta envolve a distinção se os resultados terríveis são culpa da convergência inicial da alquimia e da ciência ou, mais precisamente, da divergência subsequente de outros contrários. E essa resposta depende do reconhecimento de que o romance é realmente dois romances.

O que é razoavelmente claro, então, é que o que Shelley procurou explorar não é a oposição, mas a relação entre alquimia e ciência. Isso, por sua vez, seria seguido por um exame das consequências dessa relação na e na sociedade humana. O romance, portanto, tem como questão maior a relação entre mito e história – entre a natureza de uma força criativa cósmica e uma força evolutiva humana. Como resultado, há duas histórias principais no romance e não uma. A primeira gira em torno de Victor Frankenstein e constitui uma história de criação em que a ênfase está na fusão mítica da alquimia e da ciência e sua marca na natureza humana. A segunda gira em torno do ser criado e constitui uma história evolutiva em que a ênfase está nos arquétipos do desenvolvimento humano. Os gênios que presidem a história da criação são os alquimistas, Cornelius Agrippa, Paracelsus e Albertus Magnus, e os cientistas, Newton, Davy, Galvani e Erasmus Darwin; o da história evolucionária, Locke, Rousseau, Mary Wollstonecraft e Godwin.[4]

Estruturalmente, Frankenstein é sustentado pela simetria. Ele se divide em dois contos principais; o primeiro sobre Victor Frankenstein, o segundo sobre sua criação. O último terço do romance, que como um todo estruturalmente está em desacordo com as partições ditadas pelo comercial de três andares,[5] une os dois personagens principais, mas em uma atuação sombria e mecanizada por vingança, retaliação e perseguição. Cada conto principal, por sua vez, está ligado a um subconto apropriado. A história de Victor é misturada e estendida com a de Robert Walton, que em virtude de estar envolvido em um empreendimento de intensa auto-absorção, é o alter ego mais jovem de Victor e preserva por todo o romance a virtude redentora de uma advertência moral. A história da criatura envolve significativamente as fortunas da família DeLacey que, como uma imagem da família humana, fornece à criatura um modelo crucial para imitar.

O denominador comum em que todos os contos maiores e menores giram variações é a fome de conclusão. No caso de Victor e da criatura, a busca paralela toma um rumo destrutivo e vingativo: cada um mata o companheiro do outro. Espera-se que Robert Walton seja poupado de tal destino ao encontrar um amigo como Henry Clerval ou ao se casar; e apesar da pobreza, o jovem Felix DeLacey finalmente se reencontra com sua amada noiva árabe. De qualquer forma, o tema do casamento liga o romance ao Ancient Mariner de Coleridge, especialmente a ênfase no convidado do casamento e os terrores do isolamento polar; assim como o Paraíso Perdido de Milton e a preocupação de Adão em ter uma Eva. Mas o rendimento crucial da estrutura é a extensão em que as numerosas dualidades dramatizam abismos em vez de vínculos. Mais dramaticamente, há a lacuna estrutural entre as duas histórias principais, que assume uma penúltima forma no abismo permanente entre criatura e criação, à medida que estão trancadas no que parece, por causa da paisagem, ser uma busca eterna.

A incessante estrutura dualista da separação repousa em uma suposição filosófica crucial que Victor Frankenstein torna explícito em uma conversa inicial com Robert Walton. Walton acaba de confessar seu isolamento e sua apaixonada necessidade de um amigo. Victor reconhece o desejo e explica: “‘somos todos criaturas fora de moda, mas meio feitas…’”6 [Carta 4.7]. Como seu marido, especialmente em Epipschychidion, Mary Shelley sustenta que os seres humanos, ao contrário dos deuses, nascem incompletos. A necessidade do outro é de fato a expressão de nossa humanidade e nos impele a buscar nossa alteridade, nosso gêmeo, nossa alma gêmea. Isso, claro, é a doutrina platônica básica e, como tal, poderia ter sido adquirida diretamente ou sob a influência de Percy, como parece mais provável. Mas a distinção de Mary Shelley e de seu romance aparece nas permutações metafísicas e históricas dessa noção de incompletude humana, especialmente no que diz respeito à personalidade e à educação de Victor Frankenstein.

A primeira observação a fazer sobre Victor Frankenstein é que ele já tem o que todos os outros personagens anseiam. Ele já possui um amigo querido e próximo, Henry Clerval; e está noivo de uma mulher que ama. O que assim fica rapidamente claro é que a condição de inacabado pode ser satisfeita de diferentes maneiras e em diferentes níveis. Em outras palavras, parece haver uma hierarquia de conclusões possíveis. Robert Walton, Henry Clerval, Felix DeLacey e até mesmo a criatura têm fontes mais básicas de conclusão. Tampouco são apenas egocêntricos, pois Walton e Clerval têm fortes compromissos em beneficiar a humanidade. Ironicamente, nesse contexto, as esperanças da criatura são as mais modestas e rústicas. Mas Victor sozinho também busca uma realização metafísica – um fechamento mítico de proporções prometéicas que tem precedência sobre o humano e o histórico. Em outras palavras, o que é crucial ressaltar é que para Victor a alquimia é ciência metafísica – ela, mais do que ciência, liga a terra ao cosmos. Além disso, em sua obsessão por causas e princípios primários, somente a alquimia fornece a Victor o mesmo acesso puro aos primórdios e mistérios das coisas que estão no centro de suas sondagens nas origens de sua própria alma. Em suma, a alquimia é a outra metade de Victor; é o meio pelo qual ele busca alcançar a completude individual e cósmica. Apesar de todas as suas devoções a Henry Clerval, seu pai, noiva e família, uma vez que Victor se compromete com a criação de uma pessoa artificial, ele fica tão absorto que parece não precisar de ninguém. Não é que eles não sejam importantes, mas sim em sua própria hierarquia de completude eles não ocupam o ápice. Nesse sentido, é extremamente significativo que, dos três objetivos alquímicos clássicos, ele escolha a animação em vez de transformar metais comuns em ouro ou descobrir o elixir da imortalidade. A pedra filosofal participa de um certo tipo de utilidade manipuladora; e a imortalidade é mais extensão quantitativa. Somente a criação, não a produção ou a extensão, evidentemente pode fornecer a Victor o tipo adequado de alteridade para simular a auto-suficiência ou servir como substituto para realizações mais obviamente humanas ou históricas. Em outras palavras, na percepção de Victor, a criação sozinha, quaisquer que sejam seus resultados e recepção, é essencialmente focada no criador, não na criatura – no que ela oferece a Victor, não em sua criação.

Para Mary Shelley, então, o apelo do oculto não é necessariamente peculiar ou exótico. Certamente, sua linguagem e seus modos podem ser estranhos, mas ele fala da condição humana básica de incompletude, e fornece, reconhecidamente, a alguns indivíduos especiais em épocas históricas especiais a possibilidade de alcançar a totalidade cósmica – um estado de misticismo científico. Tais estados de consciência inebriantes e prometeicos não impedem a realização de versões humanas de perfeição na Terra, embora claramente compitam com elas e as coloquem em perigo. De fato, a perspectiva de substituição é intensificada quando a ânsia pelo estado mais alto de completude é amparada por uma situação histórica que fornece a correspondência e o alcance dessa presunção. É a convergência da educação de Victor com o Zeitgeist que ocupa o foco de Shelley.

Em nenhum momento da educação de Victor Frankenstein ele endossa totalmente a alquimia. De fato, o que Mary Shelley estabelece é que em relação ao oculto, a ciência assumiu o papel de ceticismo anteriormente desempenhado pela religião. Assim, embora a primeira introdução de Victor ao ocultismo evoque rapidamente a forte desaprovação de seu pai, o que já levou ao seu descontentamento foi sua medida cientificamente aplicada de que os meios necessários para alcançar visões nobres eram mesquinhos e beiravam o hocus-pocus da magia. Especificamente, o que o levou a essas conclusões foi ironicamente o que o levaria de volta à alquimia – sua compreensão básica dos princípios do galvanismo e da eletricidade. Essa primeira exposição assumiu a forma de um conflito de certo e errado; e a ciência emergiu como correta. O segundo encontro se assemelhava ao primeiro, mas aqui o confronto foi tão ultrajante que dramatizou a necessidade de síntese.

Na Universidade de Ingolstadt, Victor encontra duas posições extremas: a do professor Krempe que exalta as virtudes da ciência, mas ridiculariza as pretensões dos alquimistas; e a do professor Waldman que exalta as virtudes da ciência, mas elogia as visões dos alquimistas. A situação é, portanto, diferente. Primeiro, tanto Krempe quanto Waldman são cientistas, não alquimistas. Em segundo lugar, Waldman elogia as visões alquímicas, mas não seus meios. Terceiro, Victor está aprendendo as metodologias básicas da ciência, os meios. Em outras palavras, o que Victor gradualmente percebe é um conflito de direitos que é acompanhado pelo reconhecimento de que, enquanto a ciência era analítica e básica, não era holística e cósmica. A necessidade de curar a divisão, bem como a forma que ela pode tomar, surge na decisão que Victor tomou para seu projeto.

Victor elege das três opções a animação da matéria inanimada. Ele então debate sobre que tipo de criação, e decide criar um “ser humano”. A decisão de não criar nem uma criatura inferior nem uma criatura superior (seu tamanho maior foi apenas uma concessão à manipulação de partes microscópicas e intrincadas) é crucial para a compreensão da natureza do casamento de alquimia e ciência de Victor e da condição histórica particular do dia dele. Victor procura não substituir, mas contornar Deus. O objetivo não é montar um experimento humilhante para criar um robô nem um experimento arrogante para criar um super-homem. Em vez disso, ao contornar o natural para o alquímico-científico e eliminar o papel de uma mulher (ou do outro) na criação de um novo ser, Victor Frankenstein está presidindo aquela transição crucial do século XIX de induzida pela natureza para induzida pelo homem. criação e evolução. Erasmus Darwin havia esboçado o que Charles Darwin mais tarde conquistaria: a saber, que, exceto por alguns pequenos detalhes, a evolução física humana estava essencialmente completa; apenas uma mutação importante e abrupta poderia alterar isso e, mesmo assim, seriam necessárias várias gerações para determinar se a mutação ocorreu. De qualquer forma, o que foi enfatizado foi o domínio da evolução cultural e social como a direção futura da história humana. Mary Shelley valorizou esse último foco futuro, mas o abordou, por assim dizer, de frente e não de trás – antes e não depois do fato. Sua perspectiva sobre a evolução não era retroativa ou reativa, mas criativa. Especificamente, através de Victor Frankenstein, ela buscou identificar um ponto seminal para explorar uma intervenção no processo criativo que por sua vez reiniciaria e tornaria mais disponível para exame o processo evolutivo subsequente. Mas o ponto central de seu foco não era mera repetição; não há evidências que indiquem que seu trabalho serviria como uma versão literária daquele dos Darwins. Em vez disso, no cerne de seu esforço estava o reconhecimento de que um ponto de virada havia sido alcançado no início do século XIX, e que o Prometeísmo moderno tinha como razão e novo ponto de partida a consciência de que o homem não deveria mais ser percebido única ou principalmente como um objeto de evolução. A ciência gradualmente forneceu os meios para uma mudança de objeto para sujeito, mas não tinha a vontade nem a visão de tornar possível o sonho alquímico da intervenção criativa. Assim, a fusão de alquimia e ciência de Victor Frankenstein produziu um todo cósmico que, por um lado, forneceu um análogo metafísico à condição básica da incompletude humana; e isso, por outro, sinalizava a independência do homem em relação à Natureza, um exagero que encontrou sua contrapartida apenas no desafio de Prometeu aos deuses. No momento em que a criatura ganhou vida, a história humana atravessou uma divisão histórica de proporções míticas.

No processo, esse ato ousado de autonomia ignorou não apenas Deus, mas também um parceiro humano, uma mulher. Em termos de busca de alteridade, essa substituição, por sua vez, conferiu a toda a aventura as dimensões potencialmente diabólicas da autocriação em que Frankenstein aparece como o pai de si mesmo. Certamente, é este último exagero que leva à ruína de Victor e à criação da segunda história do romance. Significativamente, ali os alquimistas e cientistas estão dramaticamente ausentes, uma desapropriação que ironicamente significa sua miopia. Igualmente impressionante é a quase total ausência de figuras maternas ao longo de todo o romance. A mãe de Victor Frankenstein morre cedo; Elizabeth é órfã; Clerval fala apenas de seu pai; apenas o pai está vivo na família DeLacey; e Robert Walton escreve apenas para sua irmã. Mas talvez a versão mais sensacional desse mundo sem mãe apareça logo após o recuo de Victor da primeira visão do olho lacrimejante amarelo da criatura. Victor tem um pesadelo em que ele beija sua noiva apenas para que suas feições de repente mudem com o tom da morte. E então, para seu horror, ele se vê segurando, quase à maneira de Poe, o cadáver em decomposição de sua mãe morta em seus braços. Quaisquer que sejam os elementos sexuais ou edipianos que possam ou não estar em ação aqui, o que está claro é que Victor está reagindo ao seu próprio ato de criação como aquele que desapropria a mulher-mãe de todo o processo. O sonho é, portanto, potencialmente profético e constitui um aviso que Victor ignora.

O eclipse da figura mulher-mãe constitui um pecado histórico de omissão e estigmatiza a fusão de alquimia e ciência de Frankenstein como tendo ocorrido em um vácuo histórico. O mito original da criação foi seguido pela expulsão de Adão e Eva, mas eles foram expulsos para a história e, assim, receberam um futuro de duração. Não tão a criatura de Frankenstein. Em outras palavras, embora Mary Shelley nunca questione Victor Frankenstein como criador, ela enfatiza severamente suas falhas pós-criação. Basicamente, são dois. A primeira é o desgosto de Frankenstein por sua criação. Ele imaginou algo glorioso ou obediente ou transcendente. Em vez disso, ele criou uma criatura com necessidades; isto é, ele criou uma criatura que era como todos os seres humanos – inacabada. Ironicamente, seu sucesso foi maior do que ele imaginava. Com certeza, o tamanho enorme da criatura o impedia de reconhecer que havia criado uma criança, dependente dele para o desenvolvimento humano e até mesmo competindo com ele por atenção. Em outras palavras, a limitação de Victor deriva da concepção de que sua criação inicial foi um ato final. A criatura era percebida como uma criação terminal – um ser autônomo – e, portanto, absolvida de uma versão recorrente da doutrina da incompletude: as crianças não nascem, mas são educadas para serem humanas.

O segundo fracasso se origina do primeiro, mas é ironicamente voltado para a ênfase prometéica na premeditação. Ao não antecipar as consequências de seu ato, Victor Frankenstein, sem saber, deu origem ao mito da criação de um Frankenstein e assim resumiu o que é agora o dilema clássico da ciência: as consequências imprevistas e não examinadas de certos tipos de investigação científica. Muitos exemplos poderiam ser citados, mas o que mais se assemelha ao problema com o qual Mary Shelley se preocupa e que ultimamente tem despertado considerável controvérsia e até proibição é a experimentação genética, especialmente com DNA. Isso, como o experimento de Frankenstein, representa a mesma preocupação com um ponto de acesso para intervir e direcionar a evolução humana. Além disso, para que a falha de antecipação não seja perdida por meio de avisos vagos, Mary Shelley documenta em grande detalhe até que ponto os modernos Prometheans falham em ministrar às suas criações. No processo de criação de uma segunda história da criação – a evolução da criatura em ser humano – Mary Shelley fornece o compromisso maternal e feminista que falta na história da primeira criação.

Apesar da reação de Frankenstein, o monstro no momento do nascimento não é um monstro. Esta não é uma distinção pequena, pois nela repousa todo o impulso da segunda história do romance. Como muitos antes e depois dela, Mary Shelley ficou claramente fascinada pela questão de qual era a natureza essencial da natureza humana. O que era inato e o que era adquirido? O que era original com o Adão original? O homem era basicamente bom ou mau, altruísta ou egoísta? A diferença dramática da investigação de Mary Shelley é sua estrutura científica. Seu ponto de partida não é um nobre selvagem em um país distante, mas uma pessoa artificial colocada em um laboratório fictício para explorar sob condições controladas e observáveis ​​o desenvolvimento de uma criatura como uma versão individual da raça humana. A documentação do processo passo a passo pelo qual o mobiliário da mente é construído e a tabula rasa é escrita é apresentada, por um lado, com todo o cuidado de um experimento clínico e, por outro, com toda a abrangência de um modelo arquetípico. No processo, Mary Shelley indica que a criatura – na verdade, todos os seres humanos e civilizações – passam por três estágios principais.

O primeiro estágio, embora primariamente instintivo e primitivista, surpreendentemente envolve uma resposta inata à beleza (p. 99). Mas essa sensibilidade estética não é acompanhada por um desejo igualmente inato de companhia humana. De fato, Mary Shelley ressalta escrupulosamente a ausência da faculdade do tato neste primeiro estágio. O que emerge então é a evolução limitada de um animal humano que existe apenas no selo hermético de sua individualidade dentro de um ambiente natural, não humano, e cujas emoções, exceto por respostas ocasionais a belas “formas radiantes” [2.3.3], são natimortos. O segundo estágio apresenta a família DeLacey, cujas relações emocionalmente carregadas desbloqueiam as da criatura. O que Mary Shelley deixa claro então é que o desenvolvimento humano depende do exemplo humano. O processo de humanização, diferentemente do processo de sobrevivência da primeira etapa, é bilateral, não unilateral. A descoberta da fala humana e da palavra escrita são percebidas pela criatura como o meio estético e até mesmo divino pelo qual as emoções são compartilhadas e os relacionamentos são estabelecidos. A etapa final que eleva o processo humanizador ao processo civilizatório começa com o aparecimento de Safie. O que a criatura descobre é que o único antídoto para a mortalidade é o amor, e a única salvação é o conhecimento de “todas as várias relações que unem um ser humano a outro em laços mútuos” (p. 115). Agindo pateticamente nessa esperança, a criatura procura efetuar precisamente essa relação com a família DeLacey. Quando esse esforço falha, a criatura fica perigosamente equilibrada entre o ser humano e o monstro.

Frankenstein não criou um ser humano; ele criou um ser que tinha o potencial de ser humano. Mary Shelley documenta a realização desse potencial nas mãos da Natureza e dos DeLaceys e, no processo, estabelece que o próprio processo de humanização é uma ponte de dois mundos – o da Natureza e do instinto e o da sociedade e relacionamentos humanos. Somente a fusão de ambos resulta na criação de um indivíduo que depende de outros para se completar. Se a família DeLacey tivesse aceitado a criatura, a história teria tomado a direção diferente e não mítica de criar um estranho homem-criança. Ou se a família DeLacey não estivesse disponível como exemplo, a criatura teria aguçado seus instintos e vivido exclusivamente na selva ocasionalmente atacando aldeias. Mas, em ambos os casos, ele não teria chegado ao ponto de ser capaz não apenas de ler o Paraíso Perdido, mas também de reconhecer até que ponto sua criação divergia da de Adão. Adão, embora sozinho, pelo menos foi criado perfeito e teve a atenção do ser superior que o criou (p. 124). Mas a criatura está tão desprovida de um senso de paternidade, família e humanidade que sente pela primeira vez no romance um parentesco maior com Satanás do que com Adão. Em última análise, então, a criatura sozinha apresenta a acusação mais mordaz de seu criador. Além disso, neste ponto a criatura passou do ponto sem retorno. Apenas dois caminhos estão abertos para ele: aceitar a identificação de Satanás e tornar-se mau ou persuadir Frankenstein a criar uma companheira para ele. As alternativas são sugestivas: a ausência de um companheiro cria a condição para o demoníaco.

Nesta conjuntura, o que deve ser observado é o que geralmente é negligenciado: ou seja, o próprio Victor Frankenstein não é estático, mas também evolui. Além disso, a direção e o estágio dessa evolução contrapõem a da criatura ao ponto em que os dois se tornam cada vez mais imagens espelhadas um do outro. De fato, traçar o desenvolvimento de Frankenstein, às vezes paralelamente ao da criatura, fornece a pedra de toque mais abrangente e perspicaz para compreender a última parte do romance.

O desenvolvimento de Victor Frankenstein até e incluindo a criação da criatura foi singularmente obsessivo ao ponto, como observado, onde ele parecia ser uma lei e um mundo para si mesmo. Mas seu desenvolvimento depois de deixar Inglostadt e retornar a Genebra é caracterizado por uma série múltipla de compromissos e uma mistura de estados de degradação e nobreza. A primeira delas ocorre após a morte de William e Justine. Uma distinção deve ser feita aqui. Enquanto ele é indiretamente responsável pela morte de William, ele é diretamente responsável pela morte de Justine, que é injustamente considerada culpada e morta pelo assassinato de William. Seus gritos de piedade são, portanto, suspeitos, pois, ao não falar e confessar o que suas mãos fizeram, ele é culpado de cumplicidade na morte de Justine. Como resultado, há uma terrível simetria: a criatura é responsável pela morte de William, Frankenstein é responsável pela morte de Justine.

Quando a criatura subitamente confronta Frankenstein e lhe implora para ouvir sua história, Frankenstein evidencia uma atitude paterna totalmente ausente antes: “Pela primeira vez, também, senti quais eram os deveres de um criador para com sua criatura, e que eu deveria para torná-lo feliz antes que eu reclamasse de sua maldade” (p. 97). Depois que Frankenstein ouve a história da criatura, ele conclui “que a justiça devida tanto a ele quanto a meus semelhantes exigia de mim que eu cumprisse seu pedido” (p. 141). Pela primeira vez, Frankenstein confessa que a justiça existe do lado de sua criação; e pela primeira vez reconhece que também tem uma dívida com o bem-estar e a segurança da sociedade. Além disso, ele adia o casamento com Elizabeth até que possa completar a tarefa de criar uma companheira para acompanhar a criatura no exílio, um reconhecimento das necessidades comuns que cada um compartilha.

Se alguém concorda ou discorda com a decisão posterior de Frankenstein de não criar o companheiro, o que é crucial notar é que todas as razões que ele fornece são evidências de um tipo de premeditação que ele deixou de exercer antes. Ele contempla a perspectiva de que a fêmea não esteja vinculada ao juramento que a criatura jurou; ela pode vir a odiar a criatura e abandoná-lo e causar estragos nos outros; eles podem ter filhos que, por sua vez, podem se recusar a permanecer no exílio; etc. Em suma, a capacidade prometéica o faz tremer pelo futuro da humanidade, e ele destrói sua segunda criação. Nesse momento, Frankenstein e sua criação estão presos em destruição comum. A criatura agora chama Frankenstein de seu escravo e afirma que, embora ele tenha sido seu criador, o monstro agora é seu mestre (p. 160). Tendo destruído a companheira do monstro, o monstro põe em movimento a destruição de Clerval e, finalmente, de Elizabeth. A imagem final do romance é, portanto, ironicamente substitutiva, pois, presos na busca eterna, os dois agora servem como companheiros um do outro, as duas metades de um todo que nunca será unido, exceto em aniquilação mútua.

Um pós-escrito — principalmente para Mary Shelley. A criação de Victor Frankenstein é uma realização incrivelmente brilhante e em nenhum momento da primeira parte do romance Mary Shelley questiona a substância e o significado dessa conquista singular. Sua acusação final – se é que pode ser chamada assim – não é que Frankenstein presumiu ser mais do que deveria ser, mas que ele não presumiu o suficiente – ele prematuramente deixou de ser homem e mulher, cientista e humanista , divino e humano. Ele curou uma brecha, mas abriu outra. Ele uniu eternidade e tempo com o mito da criação, mas falhou em vincular eternidade à história com o arquétipo do desenvolvimento humano. Indiretamente, Mary Shelley forneceu o modelo para aqueles que no futuro aspirariam a ser deuses inexperientes. Visto de outra maneira, no entanto, as limitações de Victor Frankenstein acentuam a abrangência de Mary Shelley, pois através de sua criação romanesca ela sozinha abrangeu e ministrou as duas esferas. No processo, ela aceitou a inevitável persistência das aspirações alquímicas e científicas, mas também reconheceu que até que mito e história se unam, até que o ato de criação seja acompanhado pelo processo de humanização, o resultado final será a expropriação de um ser humano e centro holístico por extremos polares, quer o drama se desenrole na Terra ou no espaço sideral.

Notas
1. Na edição de 29 de maio de 1976 da Science News, apareceu um artigo sobre pseudociência, paraciência e o estabelecimento de um grupo científico para analisar criticamente as alegações paranormais de ocultistas de várias convicções. O próprio artigo, juntamente com a forte e extensa resposta do leitor, geralmente seguiu as linhas de conflito descritas aqui (ver Science News, 109 [19 de junho de 1976], 397-98).
2. A diferença mítica é enfatizada particularmente por Harold Bloom “Frankenstein, or the Modern Prometheus” PR, 32 (1965), 611-18; e por Irving Massey The Gaping Pig: Literature and Metamorphosis (1976).

3. De acordo com Robert Philmus, as aspirações de Victor Frankenstein fazem parte da síndrome faustiana geral (Into the Unknown: The Evolution of Science Fiction from Francis Godwin to H. G. Wells [1970]).

4. A esta última lista deve ser acrescentado Thomas Paine, de acordo com M. A. Goldberg “Moral and Myth in Mrs. Shelley’s Frankenstein”, K-SJ, 8 (1959), 27-38.

5. O volume I termina com o capítulo 7 e a morte de Justine, um ponto prematuro, pois não inclui os restantes elementos cruciais da história de Victor; O Volume II termina com a promessa de fazer uma companheira para a criatura; e o Volume III conclui o conto.

6. Todas as referências de página são para a edição de 1831 produzida por Henry Colburn e Richard Bentley em formato de um volume, e agora facilmente disponível na edição da New American Library (1965) com um “posfácio” de Harold Bloom. James Rieger reproduziu recentemente o texto original de 1818, que geralmente não está disponível, juntamente com várias leituras variantes. O excelente esforço de Reiger presta atenção especial à extensão e substância das contribuições de Percy Shelley e conclui que seu papel foi mais importante na preparação e produção final do trabalho do que até agora foi reconhecido. Escolhi seguir a edição de 1831 por dois motivos: primeiro, é aquela que incorpora as revisões posteriores de Mary Shelley, não Percy Shelley; e segundo, todas as citações diretas que usei e todas as passagens que considerei centrais, quando comparadas com a edição de Rieger, mostram pouca ou nenhuma dívida para com Percy Shelley. Em suma, é minha opinião que o romance é essencialmente o trabalho de Mary, não Percy, uma noção que é confirmada quando colocada no contexto de suas outras obras (ver especialmente Charles E. Robinson, ed., Mary Shelley: Collected Contos e Histórias [1976]). Finalmente, sem ceder à psicanálise, acredito que uma compreensão da biografia de Mary Shelley e uma análise de suas cartas sugerem que suas acusações dos fracassos de Victor como figura paterna não são uma referência muito disfarçada a Percy, embora indiretamente também possa se aplicar a Godwin.

7. Um caso sensacional de desenvolvimento humano interrompido ocorreu em 1800, quando Mary Shelley era jovem; e embora não seja possível reivindicar conhecimento direto, é tentador pensar que Mary Shelley pode ter lido algo sobre o assunto e que, por sua vez, influenciou a segunda parte do romance. Em 1800, Jean-Marc, um médico francês de 26 anos, foi convidado a tratar de um menino de 13 anos que foi encontrado vagando nu nas florestas de Aveyron. O menino não podia falar, às vezes parecia surdo, comia apenas nozes e batatas, era indiferente à atenção solidária e era dado a acessos de raiva violentos. A história inteira recentemente foi compilada por Harlan Lane, The Wild Boy of Aveyron (1976).

 

Postagem original feita no https://mortesubita.net/popmagic/maryshelley/

A Alma é a Alma do Negócio

“Um corpo vivo e um corpo morto contém o mesmo número de partículas. Estruturalmente não há diferença discernível. Vida e morte são abstrações não quantificáveis, por que deveria me importar?”

– Dr. Manhatan, Watchmen

Basta olharmos para um corpo “morto” e percebemos de cara duas coisas: ele é exatamente igual a um corpo vivo, não há uma diferença entre alguém que acabou de falecer e alguém vivo; ao mesmo tempo ele é completamente diferente de um corpo vivo, algo estava lá, agora não está mais.

Essa diferença é percebida inclusive por animais, quem já conviveu com bichos sabe como eles lidam com a morte, podem não fazer funerais, ou passar a vida em preces ou homenageando o “colega que se foi”, mas eles sabem dizer quando o companheiro não está mais lá. Existem até mesmo relatos de que os elefantes africanos possuem uma espécie de rito fúnebre no qual se alinham e guardam silêncio frente a um companheiro morto.

Esse tipo de metáforas, inclusive, é curioso. “Não está mais lá”, “Foi desta para uma melhor”, etc. O que não está mais lá? Obviamente um corpo morto não está realmente morto, cabelos e unhas crescem. Ele pode ter convulsões, arrotar, peidar. Você pode massageá-lo e fazer com que ele se mova sozinho, assuma novas posições. O chamado Sinal de Lázaro pode fazer um paciente com morte encefálica mover os braços e o tronco via estímulo medular.

Segundo a polêmica pesquisadora Mary Roach, o mesmo princípio poderia, ao menos teoricamente, ser usado para dar um orgasmo ao cadáver, embora até hoje nenhum cientesta tenha passado pelo comitê de ética em pesquisa para provar isso experimentalmente. O fato é que o corpo não é como uma fotografia do corpo vivo, ele é dinâmico, continua mudando. Dê tempo e nova vida brota dele, vermes, fungos, etc. Talvez isso tenha sido o que primeiro fez com que as pessoas, muito tempo atrás, pensassem em algo que havia abandonado aquele corpo. Nada tão complexo quanto uma personalidade, ou um conjunto de conhecimento, mas a vida que habitava aquele invólucro de carne e o fazia se mover.

Esse algo foi identificado pela primeira vez pelos egípcios que lhe deram o nome de “Ka”. Mais tarde os hebreus o chamara de “nephesh”, ambos os termos podem ser traduzidos aproximadamente como sopro de vida. Quando perdemos esse sopro, nos tornamos apenas adubo. Esse termo, apesar do que possa parecer, não chegava a ser religioso, já que haviam outras palavras para espírito, como por exemplo “ruah”. Nephesh era algo muito mais etéreo, mais sutil, muito mais fundamental. Os gregos usavam a palavra “psyche”, derivada do verbo soprar, para nomear este princípio que animava os humanos e outros animais. A versão latina da palavra era “anima”. Nos povos de língua barbara a palavra usada era “sáwol”, derivada do gótico “saiwala”, do alemão antigo “sêula”, do antigo saxão “sêola”; os nórdicos diziam “sála” enquanto os lituanos a chamavam “siela”, dando origem ao “soul” moderno em inglês. Os gregos antigos usavam a mesma palavra para indicar algo vivo e algo que possuia uma “alma”, isso já nos mostra que a origem da vida estava ligada de forma inseparável a este “sopro”.

Com a evolução do pensamento a alma não era apenas mais a origem da vida, mas um princípio maior que nos ligava a um mundo do qual estávamos conscientemente separados. O antigo poeta grego Pindarus (522-443 a.C.),  afirmou que a alma não tem vida alguma enquanto nossos membros estão ativos, mas quando dormimos, e a alma desperta, nos revela em sonhos, “uma recompensa de alegrias ou tristezas que se aproximam”. Logo que a alma se tornou uma constante na filosofia muitos acreditavam que ela não possuia vida por si própria, era apenas um princípio, assim que abandonava o corpo ia para o sub-mundo, o Hades, onde ficava presa sem chance de retornar ao corpo. Com Sácrates e Platão, ou o que Platão nos diz que Sócrates dizia, a alma se tornou a essência da pessoa, sendo a responsável pela maneira como a a pessoa se comportava, ela era considerada incorpórea e eterna, ocupando nosso ser, quando um corpo morria a alma pulava para outro.

Ainda na Grécia antiga a alma passou a ser, de acordo com Aristóteles, a primeira atualidade de um corpo organizado, o primeiro momento da formação de um corpo e não acreditava que ela tivesse uma existência independente do corpo.

Então a alma fugiu do controle. Passando por mulçumanos, cristãos, filósofos iluministas e psicólogos a alma foi se metamorfoseando, passando de algo real para um mero conceito. Mas será que essa metamorfose tem fundamento?

Basicamente a crença de cada geração é julgar que a geração passada pecava em sua inocência, ignorância e crença. Em qualquer momento presente a regra é acreditar que por sermos mais evoluidos, tecnologicamente ou socialmente, aquilo que sabemos no momento está muito mais próximo dos fatos, da verdadeira Verdade, do que as superstições que nossos antepassados criavam para explicar o que desconheciam. Esse é um comportamente até certo ponto sadio, o próprio Freud afirmava que o assassinato do pai fazia parte do desenvolvimento do filho, algo claramente, ou nem tão claramente assim, mostrado no mito de Édipo. Mas esse “assassinato” é uma fase, não um fim em si mesmo. Devemos avoluir, não enterrar qualquer coisa que não tenha sido defendida em nossa época, temos que ter em mente que seres humanos adora re-inventar a roda.

Com a atual moda de ateismo/agnosticismo/ceticismo mesmo as pessoas de mente mais aberta costuma ficar reticentes quando o assunto passa para o etéreo. Dificilmente alguém colocaria o próprio nome na reta ao se defender algo que não pode ser engarrafado ou não tem nem cheiro. Um peido é o resultado da formação de gases que sai pelo único caminho que tem acesso. E uma alma? De onde vem, onde fica? Para onde vai? Por onde sai?

Na era do animismo a alma era parte real e fundamental do mundo, um ingrediente que permeava não apenas seres vivos, mas tudo o que era real, quando foi substituído pela religião a alma passou a ser um elo com a força criadora do universo, o sopro da vida que nos distinguia de pedras e dos elementos. Quando surgiu a psicologia, a alma passou a ser parte de nossa mente, um aspecto do cérebro. No mundo moderno científico a alma assumiu o posto de mera superstição, mas podemos dizer que isso acontece simplesmente porque, em tese, ela não pode ser detectada. Isso mostra, talvez, mais a incapacidade de nossa tecnologia do que a comprovação da existência ou inexistência de algo, afinal ondas de rádio sempre existiram, mas nós só pudemos comprová-las quando inventamos aparelhos que as captassem e as traduzissem para uma “linguagem” que pudéssemos compreender, quando passamos a vê-las e ouvi-las. Assim talvez o que precisemos para comprovar a existência da alma são engenhocas que a percebam e a mostrem para nós de uma forma que possamos vê-la e ouví-la.

Diga “X”

Hipólito Baraduc, o médico francês do século XIX, afirmava que os campos magnéticos do corpo humano poderiam ser impressos em uma placa fotográfica sem a ajuda de uma câmera. Influenciado pelo Barão Dr. Karl Ludwig von Reichnbach, o típico gênio de época – era químico, geólogo, metalúrgico, naturalista, industrial e filósofo, membro conhecido da Academia Prussiana de Ciências – Baraduc acreditava ter descoberto evidências de uma força vital misteriosa dentro do corpo humano que ele descreveu como um tipo de névoa fluida. Reichnbach, nos seus últimos anos de vida, estava pesquisando um campo de energia que combinava eletricidade, magnetismo e calor, que emanava de todos os seres vivos que ele batizou de força Ódica. Inspirado pelo trabalho de Reichnbach e pelo próprio, Baraduc afirmou ser capaz de detectar cientificamente essa “força sutil” que ele afirmou emanar da alma humana.

Baraduc então criou um biômetro, um aparelho que poderia medir essa radiação causada pela alma. Seu aparelho foi confeccionado de materiais não magnéticos isotérmicos e isolantes, para descartar qualquer influência magnética, elétrica e térmica. Uma linha, dentro de um containar isolado, era ligada a uma agulha, feita de material que não seria afetoda por essas forças, e colocadas sobre uma tábua com graduações. Quando determinada pessoa colocava a mão sobre o container a agulha se movia e ele podia medir a intensidade do campo da alma da pessoa. Mas apenas medir a radiação e vibrações da alma não era o suficiente, por isso ele foi além. Em 1907 sua esposa, Nadine, adoeceu. Ele então passou a colocar chapas fotográficas e câmeras junto ao leito de sua esposa e a registrar o que quer que houvesse para ser registrado. Logo após a morte da esposa ele tirou fotos e conseguiu registrar três aglomerados nevoentos flutuando acima de Nadine. Quinze minutos após, Baraduc tirou outra foto e viu que as três formas de névoa haviam se aglomerado em uma grande bola branca luminosa – que não era visível aos nossos olhos. Logo em seguida a bola não estava mais presente.

Baraduc afirmou então que “não existe razão, a priori, para a alma não ser um corpo que ocupa um lugar no espaço, a não ser na tradição teológica. Até onde sabemos, a alma pode ser um ponto de força, que existe dentro e anima algum tipo de corpo etéreo, que corresponde, em tamanho e forma, a nosso corpo material”. Se Baraduc estivesse certo, ao ocupar um corpo etéreo nossa alma teria ao menos uma certa massa, algo que pudesse ser medida e quantificada,  ela poderia, livre do corpo, não ter exatamente nossa forma, seria como um gás que assume o tamanho e a forma do container que o contêm, mas teria um peso. Veremos na próxima seção, que ele estava certo.

Outro médico, desta vez um russo, Dr. Konstantin Korotkov sentiu-se obrigado a desenvolver sua própria tecnologia para estudar a alma, na mesma medida em que Galileu inventou o telescópio para estudar os planetas. As fotos Kirliam já eram amplamente conhecidas, mas ele decidiu que iria examinar suas manifestações em uma linha do tempo. Para isso ele e sua equipe desenvolveram uma câmera e um software que não apenas consegue fotografar campos de energia em plantas e animais, mas faz isso de maneira serial de modo que, segundo ele, pode ser usada como uma ferramenta de e feedback quanto à eficiência de remédios e tratamentos em condições específicas. O Chamado GDV faz as antigas fotos Kirlian parecer uma carroça comparada a uma bicicleta, e realmente foi criado a partir de vinte anos de pesquisa em cima desta tecnologia.

Em suas pesquisas para evitar cair em discussões religiosas, Dr. Karatkov chama o que suas câmeras registram de “Campo Biológico”. Ele os define nos seguintes termos: “Uma estrutura energética e informacional complexa composta por diferentes campos de diferentes naturezas e possivelmente diferentes origens. Incluindo os  campos eletro-magnéticos e gravitacionais, assim como campos para os quais não temos nenhum parâmetro conhecido. Assim, o Campo Biológico pode ser definido como uma campo ou aura que  envolve as coisas vivas, ele é invisível em sua estrutura e sua atividade é correlata ao comportamento de um sistema vivo único.”

A maior vantagem do sistema GDV sobre os sistemas anteriores, é a possibilidade de fazer registros e medições em tempo real. isso permitiu que o software desenvolvido pelo Dr. Korotkov registra-se em 2010 a primeira evidência em tempo real de uma “alma” ou “campo biológico” sumindo de um corpo no exato momento de sua morte.

Os instantes registrados na foto acima, foram retirados do monitoramento feito pelo sistema DGV e revelam dois momentos distintos: o primeiro imediatamente após a morte clínica do paciente e o segundo cerca de um minuto depois. Em um corpo vivo e saudável a área azul é dominante. No entanto no momento da morte há uma grande perda na região do abdômen. Essa perda súbita é seguida de uma gradual diminuição energética na região cerebral. por fim, o coração e a virilha são as ultimas partes a se apagarem.

 

Eu Fico Gorda Neste Corpo?

Em 1901 o Dr. Duncan “Om” MacDougall, médico na cidade de Haverhill, Massachusetts EUA, fez uma experiência interessante. Ele pegou uma balança industrial capaz de pesar até os gramas de objetos e sobre ela colocou uma cama. Nesta cama ele colocou pacientes que estavam no estágio final de tuberculose e esperou. Assim que o paciente morreu, a balança registrou uma perda no peso, muito pequena, mas perceptível. MacDougall repetiu o experimento com outro paciente, e novamente, no momento da morte, uma perda ocorreu. Ele repetiu a experiência mais quatro vezes e em todas elas a balança acusava a perda de peso.

O doutor então anotou os resultados, a variação de peso nos seis casos, e desenvolveu a hipótese de que a alma humana de fato tinha uma massa, e essa massa tinha um peso médio de 21 gramas. Ele partiu então para experimentos com animais, ratos e ovelhas, todos mostrando essa perda após a morte. É preciso destacar que está é uma perda súbida, onde o peso cai rapidamente, não podendo portando ser comfundida com a perda lenta e gradual causada pela evaporação que ocorre tanto nos vivos como nos mortos. MacDougall publicou o resultado de seus experimentos no Jornal da Sociedade Americana de Pesquisas Médicas em 1907, seguido por uma publicação no jornal Medicina Americana; não demorou muito até que ele se tornasse notícia no New York Times.

Curiosamente quando repetiu a experiência com cães, incluindo um pesado São Bernardo, a perda de peso não se mafestou, o que o levou a concluir que animais não tem alma. Contudo, pouco depois o professor La V. Twining, chefe do Departamento Científico da Escola Politécnica de Los Angeles, fez experimentos semelhantes com ratos e gatos, que encerrou em frascos de vidro hermeticamente fechados. Suas balanças eram as mais sensíveis de sua época, e comparativamente muito mais precisas que a usada por MacDougall, além disso foram colocadas dentro de uma grande câmara de onde foi extraída toda umidade. Observou-se então que todos os animais perdia peso quando morriam, embora numa escala bem menor que os humanos. Um rato pesando 12,886 gramas perdeu subitamente 3,1 gramas. Um gatinho perdeu 100 miligramas ao agonizar e mais 60 miligramas em seu momento final. Estes experimentos indicariam que a Alma, ou “Corpo Vital” dos animais é proporcionalmente mais leve do que a do ser humano.

Agora, se de fato a alma é um corpo com certa massa e ela “deixa” nosso corpo quando morremos, onde exatamente ela está localizada? Durante eras essa pergunta permaneceu sem resposta. Acreditava-se que a alma ocupava todo o espaço do corpo, ou que existia no coração. Mas com o tempo começaram a se questionar. Se uma pessoa perde um braço, ela perde parte da alma? O coração deixou de ser o receptáculo dos sentimentos e foi rebaixado a mero músculo que bombeia o sangue. E a mente ganhou um súbito destaque dentro do corpo. Logo o cérebro se tornou o lar de tudo o que nos torna únicos, nossa identidade, nossa personalidade, nosso conhecimento… nossa psiquê. Assim como o umbigo é o que nos liga a nossas mães através do cordão umbilical, nossa alma se tornou o umbilical que nos liga, através do cérebro, à vida.

 

É um Pássaro? Um Avião? Não! É o Último Filho de…

Cripton, ou criptônio é um dos elementos químicos presentes em nossa tabela periódica desde 1898, quando foi descoberto por William Ramsay e Morris Travers em resíduos da evaporação do ar líquido. Seu símbolo químico é Kr, possui 36 prótons, 36 elétrons e tem massa atômica igual a 83,8u. Como todo gás nobre ele possui uma baixa reatividade e não combinam com outros elementos. Também é usado principalmente na fabricação de lâmpadas incandescentes e fluorescentes. Outra característica do criptônio é que foi encontrado dentro do cérebro humano.

No córtex do terceiro ventrículo de nosso cérebro, na região exatamente sob nosso tálamo, forma detectados praticamente por acaso, átomos de criptônio, ao todo foram mapeados 86 conjuntos biatômicos – cada um formado por dois átomos – que giravam em órbitas comuns. Seus planos orbitais dispunham de um eixo comum que descrevia um movimento vibratório harmônico. Em uma temperatura ambiente de 35C graus centígrados, apresentava uma frequência e amplitude de 0,2 megaciclos. Encontrar tal gás no cérebro não é algo absurdo, já que desde que começaram a realizar experimentos de fecundação in vitro, muitos laboratórios encontraram o gás no interior de óvulos, na desoxirribose, nos extremos da cadeia helicoidal do ácido desoxirribonucleico. Assim a presença do gás não foi exatamente surpreendente, mas quando decidiram analisar a distribuição dos elétrons nos átomos as surpresas surgiram.

Para prosseguir vamos a uma brevíssima aula para relembrarmos como átomos funcionam. Elétrons são pequenas partículas atômicas que orbitam ao redor do núcleo do átomo, eles tem massa extremamente menores do que a dos prótons e tem carga elétrica negativa. Não é possível se saber onde os elétrons se encontram com precisão, eles ocupam posições instantâneas cuja função probabilística se rege pelo acaso. Esse é o princípio da incerteza da física quântica, o indeterminismo.

Agora, os átomos de criptônio apresentaram um sincronismo desconcertante.

Até então, tais séries ordenadas de átomos só tinham sido detectadas nas células germinais de homens e animais pluricelulares, embora, com o passar do tempo, a descoberta se alargasse ao resto das células. Os átomos homólogos nas cadeias do criptônio dos vários espermatozóides investigados apresentavam uma distribuição semelhante e sincrônica, como se fossem relógios que funcionassem sincronizados, ligados, aparentemente, por algum tipo de emissão até então não detectadas que estimulassem esse comportamento. Era como se um misterioso fenômeno de ressonância obrigasse todos os elétrons a regerem-se seguindo o mesmo padrão. A princípio pensaram-se que era a proximidade das células em estudo que estavam provocando tal efeito de ressonância. Mas então descobriram, com idêntica surpresa, que todos os seres vivos se comportavam nas suas cadeias de átomos de criptônio de maneira idêntica.

Chega a parecer que este fenômeno é universal e que o código genético encerrado no DNA não é mais que um dos elos dessa cadeia de fatores que explicam o comportamento da matéria animada pela vida. Em um experimento buscando observar possíveis alterações quânticas por prováveis transferências energéticas outra descoberta foi feita. Um dos voluntários estudados jazia numa câmara especialmente preparada da qual tinham sido eliminados todos os resíduos do gás nobre.

Ele tinha uma série de sondas fixadas na zona parietal direita de seu crânio e embora tivesse sido submetido a anestesia local, os seus mecanismos reflexos e conscientes não se encontravam inibidos. Em um computador colunas com cifras e parâmetros com as leituras era mostrada em um monitor. Cada um desses dígitos refletia a situação probabilística de cada elétron. Quando uma cifra saltava de uma coluna para outra registrava-se um salto quântico para outro nível energético. De repente notaram que os dígitos mantinham uma relação sequencial, ou seja, apresentavam-se distribuídos harmonicamente, segundo uma função periódica. Os elétrons que deveriam se localizar nos seus níveis energéticos de um modo anárquico pareciam ultrapassar o teórico e obrigatório caos, regulando a sua função probabilística e rompendo assim com a suposta lei imutável do referido indeterminismo quântico. Repetiram a experiência em inúmeros outros voluntários, o resultado foi sempre o mesmo: os movimentos harmônicos dos elétrons corticais coincidiam com os impulsos nervosos emitidos pelo córtex cerebral dos voluntários, ou seja com os movimentos conscientes dos seus braços, pés, mãos, fala, etc. Por outro lado, o mesmo não acontecia com os movimentos chamados reflexivos ou com os impulsos emitidos pelo sistema neurovegetativo. Um ano mais tarde verificaram uma nova descoberta: aqueles movimentos harmônicos PRECEDIAM a conduta voluntária dos homens e mulheres sujeitos à experiência, o avanço, em questão oscilava à volta de um milionésimo de segundo sobre as reações neurofisiológicas do organismo.

Era como se aqueles elétrons ditassem as ordens e nosso corpo as obedeciam.

Os experimentos foram repetidos então em outros seres orgânicos unicelulares e pluricelulares, incluindo-se vírus e compostos orgânicos auto-reproduzíveis, mas os resultados foram negativos. Detectaram-se átomos isolados de néon e xenonônio em muitos seres vivos e milhões de átomos de gás hélio nos sinais dotados de estruturas nervosas superiores. Mas as suas nuvens, de criptônio moviam-se segundo a função probabilística habitual no resto dos átomos na Natureza.

 

Quem Enxerga Aquilo que Seus Olhos Vêem?

Os experimentos de Baraduc, Twining e MacDougall – assim como toda a filosofia metafísica sobre a alma – apontam para algo que apesar de estar, de certa forma, preso ao corpo físico, também pode se desprender dele. Se a evidência coletada a partir da observação dos átomos de criptônio do cérebro aponta para o seu cérebro “saber” que você vai fazer algo mesmo antes que você faça não pode indicar que na verdade a alma é apenas algum efeito colateral neurológico? Apenas uma ilusão causada graças ao próprio comportamento do cérebro?

Bem, existem inúmeros relatos de indivíduos em determinadas situações que falam de uma percepção de consciência existindo àparte do cérebro e do corpo físico. Geralmente este tipo de relato está associado com duas experiências distintas as Experiências de Quase-Morte (EQM) e Experiências Fora do Corpo (EFC). A ciência moderna não tem como explicar este tipo de fenômeno e acaba o classificando como delírios, alucinações ou simplesmente como mentiras, o problema é que a ciência moderna também não sabe como explicar a consciência “normal” “dentro” do cérebro. Hoje temos uma compreensão detalhada de como funcionam nossos neurônios e nossas transmições sinápticas relativas a funções cognitivas não relacionadas à conciência, mas nada que diga respeito a uma consciência de nossa consciência ou livre arbítrio ou seja lá como você queira chamar. Não sabemos nada sobre a neurologia das percepções experienciadas, como a vermelhidão, a textura e a fragrância de uma rosa. E é essa incapacidade de encontrar o foco de nossa consciência que faz com que a ciência moderna simplesmente ignore qualquer tipo de experiência que não envolva o corpo, inclusive rejeitando a possibilidade de sua realidade.

Mas a ciência possui algumas ferramentas para medir atividades de nosso cérebro que se correlacionam com a consciência, um exemplo é a eletroencefalografia sincronizada de alta frequência (EEG) do padrão gama (sincronia gama). Um uso desse processo é garantir que um paciente anestesiado não esteja apenas paralisado mas consciente da operação, ou seja, consciente do que estão fazendo com seu corpo. São utilizados monitores “BIS” que registram e processam a eletroencefalografia (EEG) frontal e produzem um “index bi-espectral”, também chamado de número BIS, em uma escala entre 0 e 100. Um BIS 0 significa silêncio no EEG e um BIS 100 é o valor esperado de um adulto completamente alerta e consciente. Os valores recomendados que indicam um bom nível de anestesia geral está entre 40 e 60. Como era de se esperar, recentemente, esses monitores passaram a ser usados para outras coisas além de auxiliar anestesistas. Começaram a ligá-los a pacientes que estavam para morrer ou naqueles que já se encontravam em um processo irreversível de morte. Os resultados foram surpreendentes, para dizer o mínimo.

Em um estudo publicado no Jornal de Medicina Paliativa foram descritos 5 experimentos onde 7 pacientes em estado crítico tiveram seus sistemas de prolongamento artificial de vida desligados, permitindo que morressem em paz. Por causa do protocolo todos eles foram monitorados com um monitor cerebral BIS. Antes do suporte ser desligado os pacientes estavam neurologicamente intactos, mas sob sedação pesada, seus números BIS próximos de 40. Assim que foram desconectados os números BIS dos pacientes caiam, indo para menos de 20 e se mantinham nesse nível por vários minutos, até o momento que a morte cardíaca ocorria – marcada pela completa ausência de pressão sanguínea ou inexistência de batimentos cardíacos. Então após a confirmação da morte cardíaca nos sete pacientes houve uma explosão de atividade no cérebro, fazendo o número BIS pular para 60, 80 e em alguns casos mais. Os períodos desta atividade duravam entre um e vinte minutos e então os números caiam para quase 0.

Em um dos pacientes a análise dos dados coletados revelou que a explosão de atividade cerebral pós morte cardíaca, apresentava sincronia gama, o que indica o surgimento de uma consciência. Isso fez com que os médicos levantassem a possibilidade de que a atividade mental pós morte cardíaca possam se relacionar com as experiências de EQM e EFC. Infelizmente como os pacientes morreram não há como confirmar se eles tiveram consciencia de algo.

Outro estudo, publicado no Jornal de Anestesia e Analgesia, descreve três pacientes que sofreram lesão cerebral que também tiveram o apoio médico removido e suportes artificiais de vida desligados, suas famílias autorizaram a doação de seus órgãos e nesses casos o suporte é removido para que os pacientes morram de morte natural e então tenham os órgãos removidos. Seus cérebros estavam irremediavelmente danificados, mas não estavam mortos. Antes de desligarem os aparelhos, os números BIS dos pacientes estavam abaixo dos 40, um deles próximo de 0. Após a retirada dos equipamentos, quando estavam próximos do momento da morte cardíaca o número BIS disparou para aproximadamente 80, nos três casos, e permaneceram lá por um tempo que variou de 30 a 90 segundos e então abruptamente retornaram para quase 0, quando foram levados para a remoção dos órgãos.

Que conclusões podemos tirar dessas experiências? Não há como afirmar que esse pico de consciência dentro do cérebro tem algo a ver com as EQM e EFC, nem que isso indique que a alma deixou o corpo. Nem mesmo podemos afirmar com que frequência isso ocorre, apesar de ter ocorrido em dez dos dez casos estudados. Mas podemos tentar entender o que dispara essa atividade no cérebro. Como essa atividade de fim-de-vida pode ocorrer em um tecido cerebral que está metabolicamente morto, um tecido que já não recebe mais sangue ou oxigênio. Os números BIS, que indicam o nível de consciência estão próximod do 0 e então uma explosão de atividade bi-frontal cerebral coerente e sincronizada acontece, aparentemente com sincronia gama – um indicador de auto-consciência (perceber conscientemente algo, não apenas estar “desperto”). Os números chegam próximos do 80 ou mais e então, abruptamente, caem para quase 0.

Foi proposto que a atividade de fim da vida cerebral é não funcional, generalizada e despolarizada. O primeiro estudo sugere que o excesso de potássio extra-celular causam o último pico de espasmos dos neurônios através do cérebro. Mas isso não explica a coerência global, a sincronia e a organização. Também foi sugerido que a indução com cálcio de morte dos neurônios poderia causar a disrupção dos micro-túbulos cistoesqueletais dentro dos neurônios e isso seria um dos fatores que causariam o fenômeno. Mas novamente, como explicar a coerência da sincronia bifrontal?

Talvez essa atividade de morte cerebral tenha relação com as EQM e EFC conscientes, uma consciência que habita o nosso corpo mas não está presa a ele, mas nos casos documentados a parte “quase”, de quase morte, foi removida, os pacientes não foram ressuscitados. Assim as descrições de flutuar para longe do corpo, de observar tudo ao redor, túneis de luz, paz interior, presença de entes queridos mortos seriam experiências reais da consciência, que neste caso não puderam ser recontadas. Existem os céticos – sempre existirão – que sugeram que essas experiências são alucinações ou ilusões, manifestação de um cérebro sofrendo isquemia ou hipoxia, o problema é que pacientes isquêmicos ou hipóxicos, se conscientes, se encontram em um estado de confusão, de agito e não conseguem criar memórias.

Algo que deve ser considerado é porque esse tipo de atividade ocorre quando o corpo está morto e o cérebro pára de funcionar. Uma possibilidade é que a consciência humana seja um processo de baixa energia quântica e neste caso uma dinâmica molecular muito baixa pode limitar uma descoerência térmica criando assim uma janela para um aumento de estados quânticos coerentes e uma explosão de consciência aprimorada. E uma base quântica para a nossa consciência cria a possibilidade científica de um pós vida, de uma alma real abandonando o corpo e persistindo como emaranhados de flutuações na geometria do espaço-tempo quântico.

Suzan McPussy

[…] Postagem original feita no https://mortesubita.net/espiritualismo/a-alma-e-a-alma-do-negocio/ […]

Postagem original feita no https://mortesubita.net/espiritualismo/a-alma-e-a-alma-do-negocio/

A Greve dos Signos

Por Carlos Hollanda

Num dado momento da Eternidade, os signos do Zodíaco se reuniram perante o Ser Supremo. Sentados em torno de sua távola de estrelas, reclamavam que, apesar de conferirem ao Homem seus atributos (conforme o Ser assim havia dito), a espécie, a máxima criação divina, não se harmonizava e não estava conseguindo chegar ao ponto de relação com a Fonte de Luz. Um signo acusava o outro de impedir a harmonia e a felicidade humana. Cada um achava ser o senhor da verdade e que a humanidade deveria agir conforme seu padrão. A discussão aumentou até que o Ser Supremo, com infinita sabedoria, sugeriu: “Façam uma greve.” Todos ficaram estupefatos. Silêncio total na Eternidade. O Ser continuou: “Aqueles cuja ausência puder ser equilibrada pelos outros serão retirados do Zodíaco e passarão a fazer parte das outras constelações. A greve será para um de cada vez, de forma que todos vejam os efeitos. Para que a vida no Universo não sofra as conseqüências, vamos fazer isso no plano das idéias. Se vocês acharem que tudo estará bem, faremos no plano físico logo em seguida”.

Todos se aprumaram, prontos para começar nessa empreitada do “o que aconteceria se?”.

Áries tomou a dianteira e declarou: “Sem mim, nada no Universo poderá ser iniciado”.

E assim começou um período onde crianças permaneciam presas no útero, nenhuma semente brotava e nem surgia nas plantas, ninguém saía mais de suas casas, não havia mais nada que interessasse na Terra, pois sem a energia e a iniciativa de Áries a realidade se tornara estagnada, sem movimento. Além disso, não era possível decidir coisa alguma, tal era a dificuldade de optar por um caminho a seguir. Todos esperavam a aprovação de todos, o que levava a mais e mais estagnação. Ninguém conseguia sacrificar-se o suficiente para reverter a situação, não havia mais honestidade nem nobreza para enfrentar as vicissitudes. A falta de energia era tão grande que os planetas pararam de se movimentar. Na Terra, em um dos hemisférios só havia dia e calor causticante. No outro só a noite e o frio congelante. A locomotiva do Zodíaco parara.

Com o mundo à beira da destruição devido à inatividade total, os arquétipos se reuniram e decidiram afagar o ego do Carneiro pedindo-lhe para retornar a seu posto. Orgulhoso, ele atendeu o pedido.

“Que Touro se apresente”, disse o Ser em sua voz de mil trovões.

Touro então inicia sua greve. Logo tudo passa a cheirar mal, a terra seca e as pessoas empobrecem. Miséria espalhada por todo canto, colapso econômico, ganância e falta de contenção de impulsos geraram ondas de violência sem igual. A paz taurina havia sido banida. Todas as coisas mudavam repentinamente e sem parar. Não se podia mais esperar nada do futuro. As crianças nasciam e morriam logo em seguida, devido à dificuldade de manter as coisas por um certo período. Aliás, os organismos perdiam a resistência tão rapidamente que qualquer alteração (e haviam muitas), provocava uma catástrofe.

Os arquétipos, convencidos do problema, pediram o retorno de Touro, que recusou-se a fazê-lo. Depois de muitas vezes e com muita insistência, os arquétipos se reuniram e pediram o retorno de Touro, que, relutante, sentou-se em seu lugar.

Chegou a vez de Gêmeos. Todos sentiram o ar ficar rarefeito, houve silêncio novamente, mas tal silêncio era involuntário e sepulcral. Ninguém mais concatenava as idéias, nada podia ser dito e quando era dito se tornava dogma, sem lógica, sem flexibilidade, sem humor. As coisas se repetiam infinitamente, pois nunca houve tanta falta de variedade no Universo. Se alguma coisa era ensinada de um jeito, ninguém mais podia ter outra opção. A falta de comunicação, com as pessoas não querendo mais ouvir e muito menos ponderar questões mesmo as simples, estava criando o ambiente perfeito para a guerra, isso sem falar nos problemas respiratórios e de sistema nervoso que afetaram a todos.

Após uma série de controvérsias, discussões, mudanças de assunto e muito falatório, Gêmeos resolveu voltar ao seu lugar.

A primeira medida de Câncer foi extingüir todos os alimentos. Isso por si só já acabaria com toda a vida existente, mas Câncer, como sempre, nunca deixa as coisas pela metade. Além da ameaça de morte por inanição, as mães largavam seus filhos a esmo, mesmo os recém-nascidos. Não havia mais famílias. Todas as pessoas decidiram ser independentes demais, apesar de a maioria estar despreparada para enfrentar a vida sem apoio emocional, um lar e gente que nos quer bem por perto. Todos esqueceram o passado, portanto nem mesmo sabiam porque estavam fazendo tudo aquilo e porque tudo estava horrível.

Assim, a pedidos imersos em lágrimas e com um pouco de chantagem emocional, Câncer retornou ao seu lugar.

Leão não se manifestou. Por causa disso, todos estavam se perdendo na animalidade, sem contato consigo mesmos. Ninguém queria mais saber o impacto que tinha sobre as outras pessoas, daí que nem valia a pena viver. Suicídios. Não havia mais nenhuma procriação, nenhum auto-respeito e muito menos personalidades integradas. Esquizofrenia geral, frieza nas relações. Todos os seres vivos pereciam devido à isenção de contato e à inexistência de vontade de se sentir vivo. Tudo estava se perdendo numa horrenda rotina, com sistemas para tudo, sem participação do indivíduo naquilo que deveria trazer satisfação. A incidência de enfartes aumentou 1000% a cada dia. O Sol começava a perder seu calor, e o sistema solar entrava na era da escuridão e do frio eternos.

Para evitar isso, Leão, exprimindo seu desejo de ser apreciado e de demonstrar sua importância, por vontade própria, voltou a ocupar seu lugar.

Virgem não gostou muito da idéia de interromper suas atividades, mas seguiu as ordens. Sem ele, todas as ações terminavam em obras extremamente mal feitas, perigosíssimas para a saúde e integridade física de todos no Universo. Ninguém mais se importava se havia necessidade de trabalhar, todos só queriam as coisas boas sem nenhum sacrifício. Isso gerou sérios problemas, pois novamente não havia comida. As pessoas ficaram doentes e não havia médicos. As crendices sem sentido imperavam. O caos tomou conta de tudo e nenhum ser existente conseguia mais digerir o que restou dos alimentos, que por sinal estava muito sujo e estragado. Nenhum conhecimento era aprofundado, tudo era fútil e sem sentido. Não se estabelecia rotinas nem mesmo no corpo dos seres viventes, pois a química do organismo estava suspensa. Houve mortalidade sem igual pela falta de higiene.

Terrivelmente arrependido pelo engano, resmungando muito e se criticando (e também ao Supremo, por fazer as coisas de um jeito que ele não achava certo), Virgem voltou correndo a seu lugar.

Libra não sabia se entrava na greve ou se permanecia no lugar onde estava. Com muito custo e chateado por ser desagradável, retirou-se. Num instante tudo perdeu o brilho, as pessoas ficaram horripilantes, os animais, tudo. Nem mesmo a vegetação era verde, mas de uma cor desbotada, indefinível. Guerra por todos os lados, ninguém mais tinha vontade de unir e reunir, somente os egos eram importantes e a vontade de cada ente tinha de prevalecer. Ninguém tinha mais medo de nada, mas também não tinha bom senso, que é um tipo de medo. Não se podia mais usar roupas, porque elas feriam a pele, o chão feria os pés, o sol queimava sem trégua e até os planetas perderam o rumo de suas órbitas, chocando-se uns com os outros, tal era a falta de equilíbrio. Divórcios eram tão comuns que as pessoas nem mesmo se casavam mais – até porque todos estavam horríveis.

Após um diálogo com contrato assinado dividindo as responsabilidades de tudo, Libra concordou em retornar.

Escorpião saiu e com ele saíram todas as possibilidades de reciclagem do Universo. As coisas apodreciam, mas não se desintegravam. Nada morria. Cadáveres andavam pelas ruas putrefatos, sem alma, mas com os corpos funcionando tal como máquinas ligadas indefinidamente. As emoções mais primitivas desapareceram também, mas com elas se foi tudo o que a vida tem de importante. Não havia mais intensidade de propósitos e tudo se tornou rotina pura, sem sentido. Todos os seres agiam como autômatos e os dias, horas, minutos, etc., tudo era o mesmo. O Universo não mais se destruiria, devido à falta de Escorpião, mas também não mais seria reconstruído e melhorado. Tudo passou a ser superficial e falso, apenas cascas sem vida com movimento. Nos seres humanos todo o processo orgânico de excreção foi interrompido, gerando grande sofrimento.

Satisfeito com a lição que dera, mas já entrando em depressão, Escorpião voltou a seu lugar.

Repentinamente as coisas diminuíram de tamanho e a desesperança tomou conta de todos os seres. EraSagitário entrando em greve. As mentalidades se tornaram tacanhas, regionalistas, sem o mínimo senso de amplitude. Nada no Universo se expandia ou crescia mais. A humanidade definhava, emagrecia, como que acometida por mil e uma doenças e isso acontecia mesmo com aqueles que ainda podiam conseguir alimentos. O ceticismo imperava a tal ponto que não se acreditava mais nem mesmo que a pessoa ao lado respirava também. Tudo tinha de ser comprovado cientificamente, o que gerava muita confusão, pois não havia tempo para ter certeza de tudo nos mínimos detalhes. Não havia mais significado em nada, tudo era aleatório. Quanto mais banal o conhecimento e quanto menos ele levasse a alguma coisa melhor. Estava instaurada a era da futilidade total, enquanto que o mundo se destruía pelo descaso e pela falta de pessoas dedicadas a ensinar.

Sagitário rapidamente voltou ao convívio daqueles que considerava o que de melhor o Universo poderia oferecer, pois não agüentava mais estar perdendo as novidades do high society celestial.

Chegando a vez de Capricórnio, toda a ordem cronológica das coisas perdeu o sentido. Coisas que deveriam acontecer em seqüência, tinham sua lógica alterada. Morria-se antes de nascer, os jovens se tornavam velhos aos 20 anos e quem chegava aos 50 anos estava à beira da morte ou já estava reencarnando, não importava se houvesse problemas de saúde ou não. Não havia mais sistema e ordem. Não bastasse isso, em todos os outros pontos do Universo a irresponsabilidade tomava conta. Tudo era feito de forma passional, sem ponderação. Depois de tudo isso a destruição final seria fazer tudo o que era sólido se tornar líquido, até mesmo as rochas e os esqueletos.

Os arquétipos precisaram intervir, “depondo” Capricórnio de seu “status” de grevista. Só assim ele retornou a seu lugar.

Aquário em greve resultou em perda total da liberdade. Todo o fluxo e refluxo universal cessara e todas as pessoas passaram a pensar, agir, sentir e viver do mesmo jeito. A preocupação maior de cada um era consigo mesmo, nada era feito em prol da comunidade. Alguns conseguiram viver durante um tempo em castelos feitos de ouro, mas em volta desses castelos havia um oceano de excrementos, lixo humano e devastação. A conseqüência foi a destruição gradativa desses monumentos ao egoísmo pela própria ignorância de seus donos a respeito da necessidade de disseminar recursos para que pudessem tê-los de volta. Todos esqueceram do ciclo da vida, da Lei do Retorno. A palavra amizade foi banida de todos os dicionários. Não chovia mais em lugar nenhum, pois a chuva distribui água para todos sem exceção, portanto as nuvens desapareceram. A humanidade quase se extinguiu, pois Aquário é o signo da Humanidade. Até mesmo as estrelas pararam de emitir luz, uma vez que ela banha a todos e isso faz farte da tarefa de Aquário.

Cansado da rotina de nada fazer, Aquário voltou repentinamente ao seu lugar, pois estava bolando uma revolução para modificar tudo o que se julgava bom até aquele momento.

Peixes, retirado como de costume, simplesmente deixa de se importar com o sofrimento humano. As crueldades infligidas são incontáveis. Não há mais compaixão no Universo, apenas regras rígidas. Qualquer desvio, por mínimo que seja, é punido com severidade sem igual. A Graça Divina deixa de descer sobre a Criação, pois preza-se sobremaneira a execução exata das tarefas e rotinas (orgânicas, sociais ou cósmicas), não havendo lugar para o incognoscível ou para a possibilidade de adequar qualquer anomalia à vida cotidiana. Por causa disso, as formas viventes são violentamente forçadas a desenvolver-se dentro dos padrões de perfeição absoluta. O resultado foi a extinção da maioria dos seres , inclusive os humanos, pois nenhum ser vivente é uma cópia fiel do protótipo do Criador, daí que fez-se necessária a interrupção desta última greve o quanto antes.

Após o retorno lacrimejante de Peixes, que, por sinal, sentia muita piedade e auto-piedade daquilo que só aconteceu na imaginação, ouviu-se a pergunta do Ser Supremo: “Então? Já decidiram quais são os signos que podem ser retirados? Há algum que não tenha feito falta?”

Os doze entreolharam-se cabisbaixos e, agora mais sábios, responderam em uníssono: “Senhor, percebemos que somos partes de um imenso mecanismo cósmico que jamais sobreviveria desfalcado, mesmo de apenas um de nós. Pedimos perdão por nossa ignorância. Decidimos, portanto, dar como missão ao Homem a mesma tarefa que deste a nós, fazendo com que ele, a cada geração, harmonize nossos aspectos dentro de si mesmo. Dessa maneira, concedemos a ele, Senhor, aquilo que recebemos de Ti: o Livre-Arbítrio e a capacidade de superar até mesmo o que nós, como símbolos, representamos. O Homem jamais será uma marionete das estrelas se não quiser sê-lo.”

Satisfeito, o Ser deu por concluída sua obra e irradiou sua energia divina à espera daqueles que por ela procuram.

#Astrologia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/a-greve-dos-signos

A Autoridade das Puranas

Por Srila Jiva Gosvami

Srila Jiva Gosvami, um filósofo preeminente na linha de Caitanya Mahaprabhu explica porque, nesta época, os Puranas são essenciais para o acesso à Verdade Absoluta.

Sri Tattva-sandarbha é o primeiro do Bhagavatasandarbha de Srila Jiva Gosvami, ou saṭ-sandarbha, seis tratados que estabelecem firmemente a filosofia do Gaudiya Vaisnavismo. Nos textos que conduzem a esta seção, o autor desacreditou a percepção direta e a inferência como meios válidos para a aquisição de conhecimento perfeito. Ele concluiu que somente os Vedas eternos podem preencher esse papel. Agora ele argumenta a necessidade de recorrer aos Puranas para compreender a mensagem unificada dos Vedas. Para economizar espaço, omitimos os textos em sânscrito de Sri Jiva, traduzidos aqui em tipo negrito.

TEXTO 17.3

Como diz o Matsya Purana, “Um texto histórico é um Purana se tiver as cinco características que o definem; outras histórias são conhecidas como akhyanas”. Puranas que descrevem os dias de Brahma no modo de bondade glorificam principalmente o Senhor Supremo Hari. . . .”1

“Puranas que descrevem os dias no modo de paixão glorificam especialmente Brahma. Puranas que descrevem os dias no modo de ignorância contam as glórias de Agni e siva. E aqueles que descrevem dias mistos discutem as glórias de Sarasvati e dos Pitas “2.

TEXTO 17.4

Aqui a glorificação “de Agni [o deus do fogo]” significa glorificação dos sacrifícios védicos feitos com ofertas em vários fogos sagrados. Na frase “e de siva também” a palavra “também” implica a esposa de siva. “Durante dias mistos” significa durante os muitos dias de Brahma em que a bondade, a paixão e a ignorância são todas proeminentes. “De Sarasvati” refere-se indiretamente a vários semideuses, uma vez que Sarasvati é a divindade presidente de vários tipos de linguagem védica. “Dos Pitas [antepassados celestiais]” significa os rituais que levam à realização dos antepassados, de acordo com a declaração sruti “Por rituais védicos se alcança o mundo dos Pitas”. 3

Comentário: Em Kali-yuga não se pode compreender corretamente os Vedas sem recorrer à autoridade dos Puranas. Além dos Puranas existem outras escrituras smṛti, como a Manu-smṛti e outras dharmasastras, destinadas principalmente a especialistas em brahmana em rituais e tarefas de varnasrama. Mas somente a apresentação clara dos Puranas permite às pessoas confusas da era moderna o acesso definitivo à eterna sabedoria védica.

Mesmo supostos líderes religiosos desta época são geralmente vítimas de ilusão e hipocrisia. Vemos esta tendência em todo o mundo. Mesmo na Índia, muitos brahmanas aparentemente bem educados e estritamente religiosos estão confusos sobre o propósito da vida e os meios de alcançá-la, principalmente porque não conseguiram se aproximar das fontes certas de conhecimento. Embora estes brahmanas, através dos comentários de seus professores, presumam ter acesso direto aos Vedas, os frutos manifestos de sua chamada educação védica parecem ser arrogância, ateísmo e emaranhado de gratificação no sentido.

Alguns destes brahmanas, afirmando serem puramente védicos, negam a autoridade dos Puranas, que dizem ensinar a idolatria sentimental e fanática. Entre estes brahmanas estão os ritualistas do primeiro milênio AD que seguiram a interpretação de Jaimini-mimaṁsa de Kumarila e Prabhakara, e os mais recentes defensores do arya Samaj.

Assim, os Vedas, como nos diz a Skanda Purana, têm justo motivo para temer abusos às mãos dos brahmanas de nossa época. Ouvindo o pedido de ajuda dos Vedas, os Puranas vieram para ajudar. As instruções dos Puranas são tão dignas de confiança quanto as palavras originais dos Vedas. Que necessidade há então de comentários especulativos sobre os Vedas, já que o comentário natural sobre os Vedas já está disponível nos Puranas?

Mas vivemos em tempos de corrupção, quando as pessoas precisam de orientação mais definida para encontrar o caminho correto de progresso espiritual. Mesmo os Puranas, fáceis de entender em épocas anteriores, muitas vezes desconcertam os leitores modernos desorientados. Porque a adoração de semideuses gradualmente purifica aqueles que são muito materialistas para ter interesse em serviço devocional puro, os Puranas, para apelar para pessoas de muitas naturezas diferentes, encorajam a adoração de semideuses ao lado da adoração do Senhor Supremo.

O universo passa por ciclos variados, “dias de Brahma”, durante os quais os modos materiais inferiores, os modos de paixão (rajas) e ignorância (tamas), são às vezes proeminentes. Durante esses períodos, o Senhor Supremo graciosamente permite que tais servos Seus como Senhor siva O derrotem em competição e de outra forma pareçam superiores. Puranas que descrevem os eventos desses kalpas rajásicos e tamásicos parecem assim superficialmente elevar os semideuses à posição de Deus. Não é de se admirar que estudantes imperfeitamente informados dos Puranas não possam discernir a unidade da mensagem Purânica subjacente: que os poderosos controladores e as maravilhosas opulências deste universo são todas energias da suprema energia, a Personalidade da Divindade. Tais leitores não conseguem captar esta afirmação da Hari-vaṁsa Purana:

vede ramayane caiva
purane bharate tatha
adav ante ca madhye ca
hariḥ sarvatra giyate

“Ao longo dos Vedas e em todos os lugares do Ramayana, Puranas e Mahabharata, do início ao meio e ao fim, são cantados os louvores do Senhor Hari”. (Hari-vaṁsa 3.132.95)

Como fonte de mais confusão, porções dos Puranas estão agora faltando e em alguns casos foram até substituídos por substitutos espúrios. Nos últimos séculos, a comunidade brahmínica tem se tornado cada vez menos familiarizada com vários dos Puranas mais raramente preservados.

Assim, escribas inescrupulosos são agora capazes de distorcer os textos sem serem detectados. Os comentários de autoridades confiáveis fornecem a única proteção segura contra tais textos adulterados. Há mais de seiscentos anos, Srila Sridhara Svami comentou tanto o Srimad-Bhagavatam quanto o Visnu Purana, tendo o cuidado especial de certificar a redação de quase todos os versos. Para os outros Puranas, no entanto, não há comentários versos por versos por acaryas padrão, apenas citações de passagens isoladas.

Os versos de Matsya Purana citados acima listam as divindades tipicamente promovidas por cada categoria de Purana. Teoricamente, a palavra kalpa poderia ser traduzida como “trabalho escrito”, se não fosse pelo verso na mesma passagem que mostra claramente “dias de Brahma” como o significado pretendido:

yasmin kalpe tu yat proktaṁ
puranaṁ brahmana pura
tasya tasya tu mahatmyaṁ
tat-svarupena varnyate

“A grandeza de cada Purana é descrita em termos da natureza do kalpa em que Brahma o falou há muito tempo”. (Matsya Purana 290,15) É ilógico traduzir yasmin kalpe como “o texto em que”, porque a palavra puranam segue, no caso do assunto, referindo-se a um tipo específico de texto. Isto também é confirmado pelo uso da palavra kalpa na próxima anuccheda (texto 18.1).

Suta Gosvami falou todos os dezoito principais Puranas em Naimisaranya, e os sábios presentes os aceitaram como autênticos. No entanto, três grupos de seis Puranas cada um são destinados a três audiências diferentes, dependendo de qual dos três modos da natureza predomina cada audiência. Mas para cada Purana individual, a situação é mais complexa porque a maioria dos Puranas exibe alguma mistura dos modos. Por exemplo, os passatempos do Senhor Kṛsna e os do Senhor Ramacandra, que estão no modo de pura bondade, são descritos até certo ponto na maioria dos Puranas.

No Padma Purana (Uttara 236.19-21, 18) o Senhor siva descreve quais Puranas pertencem a cada modo:

vaisnavaṁ naradiyaṁ ca
tatha bhagavataṁ subham
garudaṁ ca tatha padmaṁ
varahaṁ subha-darsano
sattvikani puranani
vijñeyani subhani vai

“Ó belo, o Visnu Purana, o Narada Purana, o auspicioso Bhagavata Purana, e os Garuda, Padma e Varaha Puranas, todos pertencem ao modo de bondade. Todos eles são considerados auspiciosos.”

brahmandaṁ brahma-vaivartaṁ
markandeyaṁ tathaiva ca
bhavisyaṁ vamanaṁ brahmaṁ brahmaṁ
rajasani nibodhata

“Saiba que os Brahmanda, Brahmavaivarta, Markandeya, Bhavisya, Vamana e Brahma Puranas pertencem ao modo de paixão.”

matsyaṁ kaurmaṁ tatha laingaṁ
saivaṁ skandaṁ tathaiva ca
agneyaṁ ca sad etani
tamasani nibodhata

“E saiba que estas seis Puranas pertencem ao modo de ignorância: a Matsya, Kurma, Linga, siva, Skanda, e Agni Puranas”.

Os cinco tópicos que cada Purana deve incluir serão discutidos mais tarde em Sri Tattva-sandarbha (61.2).

TEXTO 18.1

Sendo estes os fatos, podemos entender que as Puranas mencionadas na Matsya Purana se enquadram em categorias naturais de acordo com a natureza dos dias de Brahma dos quais cada Purana fala. Mas como podemos definir uma hierarquia destas categorias para determinar qual é superior? Uma sugestão é classificá-las por seus modos de natureza – bondade, paixão e ignorância. Podemos então concluir que Puranas e outras escrituras no modo de bondade têm a maior autoridade para nos ensinar sobre a realidade transcendental. Isto podemos concluir raciocinando a partir de afirmações como “Do modo de bondade se desenvolve o conhecimento “4 e “No modo de bondade se pode perceber a Verdade Absoluta “5.

TEXTO 18.2

Mesmo assim, existe um único padrão que possa conciliar todos esses Puranas, que se desacreditam mutuamente com opiniões divergentes mesmo quando se fala da mesma Verdade Absoluta? Alguém poderia sugerir que o poderoso santo Sri Vyasa escreveu o Vedanta-sutras para fazer exatamente isso: determinar o propósito de todos os Vedas e Puranas. Portanto, essa pessoa dirá que se deve determinar o significado de todas essas escrituras, referindo-se aos Vedanta-sutras. Mas então os seguidores de sábios que escreveram outros sutras não respeitarão nossas conclusões. Além disso, alguns sábios podem interpretar os aforismos terríveis e altamente esotéricos dos Vedanta-sutras de uma forma que distorce seu significado. Que autoridade, então, pode verdadeiramente conciliar tudo isso?

TEXTO 18.3

Teríamos a base de tal reconciliação, alguém poderia comentar, se houvesse uma escritura que se encaixasse na definição de um Purana, tivesse autoridade apauruseya, contivesse as idéias essenciais de todos os Vedas, Itihasas e Puranas, fosse fiel aos Brahmasutras, e estivesse presente na Terra por inteiro. Bem dito, porque você chamou a atenção para a autoridade que mais preferimos: o imperador das pramanas, Srimad-Bhagavatam.

Comentário: Diante da desconcertante complexidade dos Puranas – a cronologia não linear que atravessa milênios e universos, os milhares de personalidades pré-históricas e o panteão das divindades – muitos descartam todo o corpo de literatura como uma incoerente coleção de mitos sectários concorrentes. As pessoas que optam por pensar de tal forma podem considerar até que ponto a natureza material controla sua suposta liberdade de julgamento. A forma como tais especuladores filtram o que vêem, a forma como formam opiniões e a influência que têm sobre o público são, de fato, parte do arranjo da natureza para manter os segredos da transcendência escondidos das intrusões da inteligência mundana. Somente aceitando os meios de sabda-pramana em seus próprios termos, qualquer um pode começar a penetrar nesses segredos.

yasya deve para bhaktir
yatha deve tatha gurau
tasyaite kathita hy arthaḥ
prakasante mahatmanaḥ

“Se alguém tem uma devoção desvinculada ao Senhor Supremo e igual devoção a seu próprio mestre espiritual, sua inteligência se torna ampla, e para ele tudo descrito nestes textos se revela claramente”. (svetasvatara Upanisad 6.23)

Como já discutido, Srila Jiva Gosvami, em seu Sandarbhas, não está interessada em responder ao ceticismo dos estudiosos críticos. Ele assume que seus leitores aceitam a autoridade e a consistência da literatura védica, uma atitude mais provável de se desenvolver a partir da honestidade e humildade do que da análise minuciosa das massas de informação.

Agora, uma vez que assumimos que os Puranas têm um propósito coerente, o problema prático em mãos é como descobrir esse propósito. Precisamos identificar uma autoridade principal que possa conciliar todos os outros textos. Na anuccheda em discussão, Srila Jiva Gosvami primeiro limita os candidatos à primazia aos Puranas sáttvicos, que se dirigem às pessoas no modo de bondade. Estas Puranas glorificam o Supremo Senhor Visnu e Suas encarnações.

Mas no mundo material é raro encontrar o modo de bondade não misturado com os modos inferiores, e este estado de coisas é refletido nos Puranas. Vários dos Puranas sáttvicos descrevem a adoração a Deus em modos mistos, em vez de em puro serviço devocional. Depois de ler todos os Puranas sáttvicos, portanto, ainda se pode ter dúvidas se o Senhor Visnu é, em última análise, uma pessoa com qualidades tangíveis, uma entidade impessoal e sem forma, ou uma manifestação da mente universal, ou mesmo um produto da matéria.

Os leitores que não olham suficientemente fundo vêem os Saṁhitas dos quatro Vedas como um sortimento desorganizado de elogios e apelos oferecidos a um grande número de semideuses. Muitas dessas deidades parecem nada mais do que personificações convenientes das forças da natureza, com personalidades muitas vezes sobrepostas, na medida em que suas identidades separadas são difíceis de distinguir. Cada Veda, no entanto, tem Upanisads que corrigem este mal-entendido. Nos Upanisads, as várias divindades e as energias da natureza honradas nos Vedas são mostradas como sendo todas integralmente relacionadas à única Verdade Absoluta, Brahman, como expansões que simplesmente emprestam os próprios nomes, formas e funções de Brahman:

seyaṁ devataiksata hantaham imas
tisro devata anena jivenatmananu
pravisya nama-rupe vyakaravani.
tasaṁ tri-vṛtaṁ tri vṛtam ekaikaṁ karavaniti.

“Aquele Senhor olhou e disse: ‘De fato, junto com a alma jiva, deixe-me entrar nestes três elementos da criação e expandir nomes e formas’. Eu trarei à tríplice natureza de cada elemento”. (Chandogya Upanisad 6.3.2- 3) Os três elementos (devatas) aqui indicados são os elementos básicos da criação – terra, água e fogo. Entrando na substância primordial destes elementos da criação, o Supremo distribuiu Seus próprios nomes e formas. Sri-narayanadini namani vinanyani rudradibhyo harir dattavan:

“O Senhor Hari deu Seus próprios nomes a Rudra e outros, com exceção de certos nomes como Sri Narayana”. (Madhvacarya, Brahma-sutra-bhasya 1.3.3) Em uma fase posterior da criação, o semideus Brahma usa periodicamente os Vedas eternos como um projeto para completar esta obra em nome de seu criador:

nama-rupaṁ ca bhutanaṁ
kṛtyanaṁ ca prapañcanam
veda-sabdebhya evadau
devadinaṁ cakara saḥ

“No início, a partir das palavras dos Vedas Brahma expandiu os nomes, formas e atividades de todas as criaturas”. (Visnu Purana 1.5.63)

Como os Upanisads fornecem tal visão sobre o significado essencial dos Vedas, eles são chamados de Vedanta, a culminação dos Vedas. Kṛsna Dvaipayana Vyasa comentou sobre os principais Upanisads, conciliando suas aparentes contradições, em seus Vedanta-sutras, que estabelecem a escola Vedanta de teologia Védica para nossa era. Os fundadores das filosofias brahmínicas ortodoxas escreveram em sutras concisos, com a intenção de que seus discípulos explicassem os sutras para as gerações futuras. Ainda assim, comparado ao nível relativamente mundano do discurso encontrado em outros sutras, como o Nyaya-sutras de Gautama Ṛsi sobre epistemologia e lógica, o conteúdo dos sutras Vyasadeva Vedanta são particularmente difíceis de explicar. Seus aforismos são praticamente impossíveis de decifrar sem um comentário e, portanto, também fáceis de interpretar erroneamente. Anteriormente em Kali-yuga havia uma forte tradição de interpretação teísta de Vaisnava dos Vedantasutras, liderada por vários professores proeminentes como Bodhayana, que agora são conhecidos apenas por fragmentos citados por Ramanuja acarya e outros em seus comentários de Vedanta. A principal razão pela qual os comentários anteriores foram esquecidos é que eles foram completamente eclipsados pela popularidade do sariraka-bhasya de Sankaracarya.

Escrito por volta de 700 d.C., o Sariraka-bhasya de Sankara, seu comentário sobre o Vedanta-sutras, fala do ponto de vista monístico Advaita, que relativiza o conceito pessoal de divindade, considerando-o como um aspecto inferior de um Supremo final além do nome e da forma. o comentário do sankara monopolizou a escola do Vedanta por alguns séculos, até que o grande Vaisnava acaryas Ramanuja e Madhva responderam com seus próprios comentários nos séculos XI e XII. Eles e outros Vaisnavas como Nimbarka criticaram vigorosamente a interpretação de Sankara como sendo infiel à intenção dos Upanisads. Entre os seguidores de Sankara e todos os quatro sampradayas Vaisnava, até os tempos modernos, a principal atividade filosófica de ambos os autores explicativos e polêmicos tem sido apresentar subcomentários atualizados sobre os Vedanta-sutras. Desta forma, o debate entre os acampamentos Advaita e Vaisnava vem ocorrendo há mais de mil anos.

Quando o Senhor Caitanya Mahaprabhu estabeleceu a filial Gaudiya do sampradaya de Madhva, no entanto, Ele escolheu renunciar a ter um comentário Vedanta escrito como a pedra-chave de sua nova escola teísta. Ele preferiu concentrar-se no Srimad-Bhagavatam, o que considerou o comentário natural do autor do Vedantasutras. Só no início do século XVIII é que Baladeva Vidyabhusana foi encomendada por Srila Visvanatha Cakravarti para compor um comentário Vedanta para responder às reclamações dos críticos que exigiam que os Gaudiya Vaisnavas se defendessem sobre as provas dos Vedanta-sutras.

Srila Jiva Gosvami propõe que o Srimad-Bhagavatam é o único Purana que concilia todas as escrituras e representa perfeitamente a filosofia do Vedanta. Ele irá agora revelar as glórias do Bhagavatam no resto deste Sandarbha e nos outros.

***

Fonte:

GOSVAMI, Srila Jiva. The Autority of the Puranas. In. Back to Godhead, 2015. Disponível em: <https://www.backtogodhead.in/the-authority-of-the-puranas-by-srila-jiva-gosvami/>. Acesso em 6 de março de 2022.

***

Texto adaptado, revisado e enviado por Ícaro Aron Soares.

Postagem original feita no https://mortesubita.net/yoga-fire/a-autoridade-das-puranas/

A cultura do Caos

A ficção de Lovecraft expressa um “primitivismo futuro” que encontra sua expressão esotérica mais intensa na Magia do Caos, um estilo contemporâneo eclético de ocultismo sinistro que deriva da Thelema, do Satanismo, de Austin Osman Spare e da metafísica do Oriente, bases para a construção de um sistema mágico completamente pós-moderno.

Para os magos do caos de hoje, não existe uma “tradição”. Os símbolos e mitos de inúmeras seitas, ordens e religiões, são tratados como construtos, ficções úteis, “jogos”. Os trabalhos mágicos não dependem da “realidade” da magia e sim da vontade e experiência do mago. Reconhecendo a possibilidade de que podemos estar à deriva em cosmos mecânico sem sentido em que a vontade humana e a imaginação são falhas vagamente cômicas (o “indiferentismo cósmico”, como o próprio Lovecraft professop), o mago aceita sua falta de fundamentos e abraça o vazio caótico criativo que é ele mesmo.
Assim como acontece com os cultos e grimórios ficcionais de Lovecraft, os magos do caos se recusam a aceitar qualquer forma de hierarquia, simbolismo e vieses monoteístas do esoterismo tradicional. Como a maioria dos magos do caos, o ocultista britânico Peter Carroll gravita em direção às Trevas, não porque ele deseja uma simples inversão satânica do cristianismo, mas porque ele busca pelo núcleo amoral e xamânico da experiência mágica – um núcleo que Lovecraft evoca com suas orgias de ritmos, tambores, cantos guturais e cornetas estridentes. Ao mesmo tempo, os magos do Caos, como Carroll, também sondam a ciência estranha da física quântica, teoria da complexidade e prometeísmo eletrônico. Alguns magos negros acabam sendo consumidos pelas forças atávicas que liberaram ou se tornam viciados na imagem do anti-herói satânico. Mas o mago mais sofisticado adota um modo equilibrado de existencialismo gnóstico que questiona todos os construtos, enquanto rejeita tanto o conforto frio da razão e do ceticismo quanto o suicídio nihilista, um xamã pragmático e empírico que consegue entrar em sintonia tanto com o materialismo cabeça dura de Lovecraft quanto com seus horrores.

O primeiro ocultista que realmente pôs em prática essas noções foi Aleister Crowley, que destruiu os receptáculos da tradição oculta ao mesmo tempo em que, criativamente, extendia o reino sombrio da magia para o século XX. Com sua imagem extravagenta, textos malandros e sua famosa Lei de Thelema (“Faze o que tu queres deverá ser o todo da lei”), Crowley questionou as certezas esotéricas de revelações “verdadeiras” e linhagens “legítimas” e foi o primeiro mago que deu para o antinomionismo oculto um toque decididamente nietzschiano.
Irrestrita, esta vontade oculta de potência pode facilmente se degenerar em um elitismo impiedoso, e as dimensões fascistas e racistas do ocultismo do século XX e do próprio Lovecraft não deve ser esquecido. Mas esta vontade criativa e auto geradora é expressa de forma mais exuberante como uma Vontade de Arte.
De muitas maneiras, o ocultismo fin de siècle, que explodiu durante o tempo de Crowley foi um esoterismo essencialmente estético. Um bom número de magos do século XIX que nos inspiram hoje são os grandes poetas, pintores e escritores do Simbolismo e Romantismo Decadente, muitos deles curiosos ou adeptos do Satanismo, do Rosacrucianismo e das sociedades herméticas. A Ordem Hermética da Aurora Dourada foi infundida com pretensões artísticas. Arthur Machen membro da Golden Dawn e escritor de literatura fantástica foi um das mais fortes influências de Lovecraft.
Mas foi Austin Osman Spare quem dissolveu de forma definitiva a fronteira entre a arte e a magia. Apesar de trabalhar de forma independente dos surrealistas, Spare também baseou sua arte nas erupções sinistras e autônomas de material do “subconsciente”, embora em um contexto mais abertamente teúrgico. Os magos do caos de hoje tem em Spare sua maior influência e seus ritos Lovecraftianos expressam essa dissolução que é simultaneamente criativa e niilista.

por Shub-Nigger, A Puta dos Mil Bodes

[…] Postagem original feita no https://mortesubita.net/lovecraft/a-cultura-do-caos/ […]

Postagem original feita no https://mortesubita.net/lovecraft/a-cultura-do-caos/

Rituais Egípcios

Texto de Helena Petrovna Blavatsky, Ísis Sem Véu

“No Ritual Funerário dos egípcios, encontrado entre os hinos do Livro dos Mortos, e que é chamado por Bunsen de “esse livro precioso e misterioso”, lemos um discurso do defunto, agora sob a forma de Hórus, que detalha tudo e que ele realizou para seu pai Osíris. Entre outras coisas, a divindade diz:

“30 Dei-vos Espírito.

31 Dei-vos Alma.

32 Dei-vos poder.

33 Dei-vos [força]”.

Em outro lugar, a entidade, chamada de “Pai” pela alma desencarnada, representa o “espírito” do homem; pois o versículo diz: “Fiz minha alma falar com seu Pai”, seu Espírito.

Os egípcios consideravam o seu Ritual como uma inspiração essencialmente Divina; em síntese, o mesmo que os hindus modernos em relação aos Vedas e os judeus modernos quanto aos livros mosaicos. Bunsen e Lepsius mostram que o termo hermético significa inspirado, porque é Thoth, a própria Divindade, que fala e revela ao seu eleito entre os homens a vontade de Deus e os arcanos das coisas divinas. Nesses livros há passagens inteiras que se diz terem sido “escritas pelo próprio dedo de Thoth, são obras e composição do grande Deus”. “Num período posterior, o seu caráter hermético ainda é mais distintamente reconhecido e, num ataúde da 26º Dinastia, Hórus anuncia ao morto que ‘o próprio Thoth lhe trouxe os livros das suas obras divinas’, ou escritos herméticos”.

Dado que sabemos que Moisés era um sacerdote egípcio, ou pelo menos ele era versado em toda a sua sabedoria, não devemos nos espantar que ele escrevesse no Deuteronômio (IX, 10) que “E o Senhor me entregou duas tábuas de pedra escritas pelo dedo de DEUS”; ou que leiamos no Êxodo, XXXI, 18 que “E Ele [o Senhor] deu a Moisés (…) duas tábuas do testamento, tábuas de pedra, escrita pelo dedo de Deus”.

Nas noções egípcias, como nas de todas as outras fés fundamentais na filosofia, o homem não era apenas, como afirmam os cristãos uma união de alma e corpo; ele era uma trindade de que o espírito fazia parte. Além disso, aquela doutrina o considerava composto de kha – corpo; khaba – forma astral, ou sombra; ka – alma animal ou princípio vital; ba – a alma superior; e akh – inteligência terrestre. Havia ainda um sexto princípio chamado sha – ou múmia; mas as suas funções só tinham início após a morte do corpo. Após a devida purificação, durante a qual a alma, separada do seu corpo, visitava com freqüência o cadáver mumificado do seu corpo físico, essa alma astral “tornava-se um Deus”, pois ela era finalmente absorvida na Alma do mundo”. Transformava-se numa das divindades criadoras, “o deus do Phtah”, o Demiurgo, um nome genérico para os criadores do mundo, traduzido na Bíblia como Elohim.

No Ritual, a alma boa ou purificada, “em conjunto com seu espírito superior ou não-criado”, é mais ou menos a vítima da influência tenebrosa do dragão Apophis. Se chegou ao conhecimento final dos mistérios celestiais e infernais – a gnoses, isto é, reunião completa com o espírito -, ela triunfará dos seus inimigos; se não, a alma não pode escapar à sua segunda morte. Essa morte é a dissolução gradual da forma astral nos seus elementos primários, aos quais já aludimos diversas vezes ao longo desta obra. Mas essa sorte terrível pode ser evitada pelo conhecimento do “Nome Misterioso” – a “Palavra”, dizem os cabalistas.

Mas, então qual a pena vinculada à negligência do seu conhecimento? Quando um homem leva uma vida naturalmente pura e virtuosa, não há castigo algum, exceto uma permanência no mundo dos espíritos até que se encontre suficientemente purificado para recebê-la do seu “Senhor” Espiritual, um da Hoste poderosa. Por outro lado, se a “alma” *, enquanto um princípio semi-animal queda-se imóvel e cresce inconsciente de sua metade subjetiva – o Senhor – e proporcionalmente ao desenvolvimento sensual do cérebro e dos nervos, ela mais cedo ou mais tarde se esquecerá da sua missão divina na Terra. Como o Vurdalak, ou Vampiro, do conto sérvio, o cérebro se alimenta e vive e se fortifica às expensas do seu parente espiritual. Então, a alma já semi-inconsciente, agora completamente embriagada pelos vapores da vida terrena, perde os sentidos e a esperança de redenção. É incapaz de vislumbrar o esplendor do espírito superior, de ouvir as admoestações do “Anjo guardião” e de seu “Deus”.

Ela só pretende o desenvolvimento e uma compreensão mais completa da vida natural, terrena; e, assim, só pode descobri os mistérios da natureza física. Suas penas e seus temores, sua esperança e sua alegria – tudo isso está estritamente ligado à sua existência terrestre. Ela ignora tudo o que pode ser demostrado pelos órgãos de ação ou sensação. Começa por se tornar virtualmente morta; morre completamente. Está aniquilada. Tal catástrofe pode ocorrer, muitas vezes, muitos anos antes da separação final do princípio vital do corpo. Quando chega a morte, seu férreo e perigoso domínio se debate com a vida; mas há mais alma a liberar.

A única essência dessa última já foi absorvida pelo sistema vital do homem físico. A morte implacável libera apenas um cadáver espiritual; no melhor dos casos, um idiota. Incapaz de se elevar para regiões mais altas ou de despertar da letargia, ela se dissolve rapidamente nos elementos da atmosfera terrestre.

Os videntes, homens corretos que lograram a ciência mais elevada do homem interior e do conhecimento da verdade, têm, como Marco Antônio, recebido instruções “dos deuses”, em sonhos ou por outros meios. Auxiliados pelos espíritos mais puros, aqueles que moram nas “regiões da bem-aventurança eterna”, eles observam o processo e advertiram repetidamente a Humanidade.

O ceticismo pode provocar com zombarias; a fé, baseada no conhecimento e na ciência espiritual, acredita e afirma. No século atravessamos amiúdam-se os casos dessas mortes de almas. A todo momento tropeçamos com homens e mulheres desalmados. Não é estranho, portanto, no presente estado de coisas, o gigantesco fracasso dos últimos esforços de Hegel e Schelling no sentido de elaborar a construção metafísica de um sistema. Quando os fatos, palpáveis e tangíveis do Espiritismo fenomenal, acontecem todo o dia e a toda hora e, não obstante, são negados pela maior parte das nações “civilizadas”, existe pouca chance para a aceitação de uma metafísica puramente abstrata por parte dessa massa sempre crescente de materialistas.”

#Teosofia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/rituais-eg%C3%ADpcios

O dia em que Richard Dawkins (quase) encontrou Deus

Neste vídeo vamos tentar entender o que diabos é o “capacete de deus”, e porque um experimento científico pode ser arruinado pelas próprias expectativas dos cientistas em relação ao seu resultado. Teria o célebre ateu, Richard Dawkins, encontrado a Deus em um capacete que irradia ondas eletromagnéticas? Seriam as experiências místicas e religiosas tão somente “devaneios” do cérebro? Faz sentido a existência de uma “neuroteologia” na Academia?

Se gostaram, não esqueçam de curtir, compartilhar e se inscrever no canal!

#Ceticismo #Ciência #Deus #neurologia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/o-dia-em-que-richard-dawkins-quase-encontrou-deus

A Crença do Espiritualista

Através de diálogos pela internet uma vez fiquei sabendo de uma história, conforme contada por um amigo cético. Ele dizia que um amigo a quem admirava a inteligência sofreu um acidente de carro e ficou alguns dias desacordado. Ao recobrar a consciência, consta que ele perguntou “se ainda estava vivo, ou se já estava do outro lado”. Seu amigo era espírita e acreditava em vida após a morte (na realidade, em vida após a vida), e ele se perguntou: “mas como uma pessoa tão inteligente pode crer numa coisa dessas?” – Esta é uma excelente pergunta…

Muitos céticos e aqueles classificados como “eruditos ou intelectuais” parecem não conseguir resolver tal enigma. É que eles esbarram em duas interpretações algo preconceituosas: a primeira é a de que a fé não pode ser racional, e a segunda é a de que a grande maioria dos espiritualistas e religiosos é alienada da realidade. Este artigo tentará abrir os olhos dessas pessoas, para que possam analisar aos espiritualistas pelo que eles realmente são: pessoas como qualquer outra, mas que consideram a possibilidade da existência do espírito.

Fé e Razão
A etimologia da palavra “fé” nos traz duas origens não necessariamente complementares. A primeira deriva do grego pistia e quer dizer “acreditar”. Este é o significado mais usual, entretanto ainda incompleto, pois não basta crer, é necessário também compreender a razão pela qual se crê. Esta é a chamada fé raciocinada. Antes de ser uma contradição, como podem pensar alguns, o uso da razão solidifica a fé, pois ao analisarmos o objeto de nossa fé, compreendo-o e aceitando-o, estamos criando alicerces que tornarão nossa fé inquebrantável, fortalecendo-nos frente aos desafios mais árduos. Por outro lado, a fé sem a razão é frágil, está sujeita a ser desfeita e pode, frente ao menor abalo, desmoronar. Ou ainda pior, esta fé irracional pode nos conduzir ao fanatismo, a negação de tudo que seja contra o nosso ponto de vista. Por não ser oposta a razão, a pistia é por si mesma não dogmática e, portanto, perfeitamente compatível com o ceticismo.

Mas temos uma outra origem da palavra “fé”, derivada do latim fides, que também possui o sentido de acreditar, mas agrega a este o conceito de fidelidade, ou seja, é necessário que sejamos fieis ao objeto de nossa fé. Falando em fé religiosa, estamos falando em Deus, portanto é preciso que sejamos fieis a Deus e isto só é possível seguindo os seus preceitos: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao nosso próximo como a nós mesmos”.

No entanto, é preciso tomar muito cuidado na definição deste Deus, pois muitas vezes as pessoas de fé seguem o deus definido pelo discurso eclesiástico, quando o caminho da espiritualidade nos leva a busca de nossa própria definição de Deus. E isso nos leva ao contraponto do segundo tipo de interpretação preconceituosa…

O Deus de cada um
Cada doutrina religiosa traz sua própria concepção de Deus, e na maioria das vezes elas são conflitantes. Isto, por si só (e não sem razão), já soa absurdo para aqueles que cultivam um pensamento mais cético e racional. Não é a toa que muitos acabam taxando a maioria dos teístas de alienados: se não chegam a um acordo sequer sobre a natureza de Deus, como podem querer ditar regras de conduta a serem seguidas?

Essa pergunta é pertinente porque toca no cerne da religiosidade. O verdadeiro religioso não é aquele que se inscreveu em uma comunidade dos escolhidos de Deus (a origem de “igreja”, do grego ekklesia), mas aquele que pratica uma comunhão com Deus ou com o Cosmos, um caminho de retorno a compreensão de sua própria origem (do latim re-ligare, origem de “religião”). Desnecessário seria dizer que são definições bastante distintas, e que embora todo seguidor de igrejas possa ser religioso, nem todo religioso é seguidor de igrejas. Mas, ainda mais profundo do que isso: a todo verdadeiro espiritualista parece mesmo óbvio que a forma de comunhão com Deus (ou o Cosmos) é própria de cada um, pessoal e intransferível. Não serão livros nem padres nem gurus espirituais quem poderão lhe ensinar – todos esses ajudam, mas cada um aprende por si próprio, e na prática.

Uma comparação pertinente pode ser feita entre aprender espiritualidade e aprender a nadar: de nada adianta ler extensos manuais sobre natação, ou infindáveis palestras de grandes nadadores – você só irá se tornar um grande nadador se tomar coragem de mergulhar e enfrentar as ondas por si próprio.

O verdadeiro espiritualista não é, portanto, um alienado da realidade. Ele apenas mergulhou na própria consciência, enquanto outros (não sem razão) preferiram abster-se da aventura.

Navegar é preciso
Para o espiritualista em constante estudo e deslumbramento perante o infinito do Cosmos, a razão e a fé andam lado a lado com a moral e o amor, e ele encontra na religião, assim como na filosofia e na ciência, preciosos instrumentos para sua longa caminhada…

Nada pode ter contra o cético. Se este ainda não acredita, é por dois motivos: ou porque ainda não passou pela mesma experiência religiosa – e, portanto, subjetiva – que o espiritualista; ou porque simplesmente o espírito realmente não existe, e todas as questões espirituais se resumem a questões psicológicas, a serem analisadas conforme o avanço da ciência. Em ambos os casos, não há razão para nenhuma inimizade entre o espiritualista e aquele que não crê.

Na verdade, se alguém tem o dever moral de evitar brigas e permanecer em postura apaziguadora e amorosa, este é o espiritualista – que bem ou mal, assumiu a responsabilidade de assim o ser, um ente amoroso e equilibrado. Os outros não têm responsabilidade alguma, tampouco Deus algum para lhes inspirar temor, e não há nenhum problema nisso.

Pois que se o caminho espiritual foi trilhado apenas por medo de punições divinas, por barganhas ridículas em troca de um céu para poucos, então ele já se iniciou na direção errada. Que aquele que ainda não compreendeu que todos os seres do infinito são filhos da mesma substância, e que entrarão todos no céu de mãos dadas, é porque ainda está no início da trilha.

Então, perdoai-vos, pois eles não sabem o que fazem. E perdoai-nos, pois nós também não. Mas dos confins do Cosmos uma ponta da longa teia é puxada, e todos somos impelidos em sua direção… quer compreendamos, quer não.

***

Crédito da foto: 21guilherme

O Textos para Reflexão é um blog que fala sobre espiritualidade, filosofia, ciência e religião. Da autoria de Rafael Arrais (raph). Também faz parte do Projeto Mayhem.

» Ver todos os posts da coluna Textos para Reflexão no TdC

#Espiritualidade #Deus #Ceticismo #Religiões #Preconceito

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/a-cren%C3%A7a-do-espiritualista