Grandes Iniciados – Alan Moore

Confira abaixo um resumo dos principais fatos na vida e bibliografia do escritor e mago inglês Alan Moore. Trata-se de excertos do livro Alan Moore: Portrait of an Extraordinary Gentleman, um livro-tributo dedicado aos 50 anos do artista. São páginas recheadas de ensaios, ilustrações, artigos, fotografias, entrevistas, e opiniões sobre o mago-escritor de Northampton. Escritores, desenhistas e pessoas relacionadas aos quadrinhos comentam sua relação com Moore.

Alguns nomes presentes no livro: Michael Moorcock, Ian Sinclair, Darren Shan, Brad Meltzer, John Coulthart, Neil Gaiman, Dave Gibbons, Bryan Talbot, David Lloyd, J. H. Williams III, Kevin O’Neill, Will Eisner, Howard Cruse, James Kochalka, Adam Hughes, Peter Kuper, Jose Villarubia, Jimmy Palmiotti, Rick Veitch, Michael T. Gilbert, Steve Parkhouse, Nabiel Kanan, Bill Koeb, Rich Koslowski, Trina Robbins, Michael Avon Oeming, Sean Phillips, Jeff Smith, Sergio Toppi, Giorgio Cavazzano, Claudio Villa, Daniel Acuna, Willy Linthout, Jean-Marc Lofficier, Eduardo Risso, Dave Sim, Ben Templesmith e outros tantos.

O lançamento da editora Abiogenesis Press, do artista britanico Gary Spencer Millidge, tem caráter beneficente. Toda sua renda está destinada para o Fundos de Combate ao Mal de Alzheimer. Para mais informações, acesse www.millidge.com

Linha da Vida de Alan Moore

– Alan nasceu com pouca visão na vista esquerda e surdo do ouvido direito. Mesmo assim, ele evitou usar óculos até quinze anos. Já adulto, abandonou os óculos chegando a cogitar a possibilidade de usar um monóculo, acabando por achar essa alternativa muito kistch.

– A primeira casa do jovem escritor não tinha banheiro nem gás em sua rua.

– Em 1961, aos 7 anos, Moore descobriu os quadrinhos americanos da DC Comics.

– Moore atribui sua formação moral graças as histórias do Super-Homem.

– Padecendo de uma gripe comum, o jovem Alan Moore pediu para a mãe lhe comprar uma BlackHawk. Ao invés de trazer a HQ pedida, sua mãe o presenteou com a edição número 3 de Fantastic Four (Quarteto Fantástico). Essa revista foi o primeiro contato do escritor com os trabalhos de Jack Kirby, de quem se tornou fã imediato.

– Moore matava aulas no colegial para andar de motocicleta no pátio de um hospital para doentes mentais.

– Em 1968, Moore se tornou fã dos personagens da Charlton Comics, que mais tarde seriam os arquétipos dos personagens da maxi-saga Watchmen.

– Em 1969, ele começou a colaborar com vários fanzines, sempre como desenhista

– Aos 17, em 1970, Moore foi expulso da escola por uso de LSD. O diretor escreveu uma carta para todas as outras escolas e universidades da região, para que ele jamais fosse aceito em outro estabelecimento de ensino.

– Sem poder estudar, Alan trabalhou em um matadouro e limpou latrinas em um hotel de Northampton.

– Nessa época, ele deixou o cabelo crescer, ajudou a publicar o fanzine Embryo e conquistou sua futura esposa Phyllis lendo poesias em um cemitério. Em 1974, aos vinte anos, Moore e Phyllis se casaram.

– Em 1977, nasceu Leah, a primeira filha de Moore. Nessa época, Moore percebeu que tinha que fazer alguma coisa que gostasse logo ou então passaria a vida frustrado. O escritor começou a colaborar com jornais e revistas locais, escrevendo e desenhando tiras de humor. A mais conhecida delas foi Maxwell, the Magic Cat, uma espécie de Garfield inglês. Anos depois, Moore declarou que odiava escrever as historias de Maxwell e que se sentia envergonhado de receber dinheiro por elas. Mesmo assim, ele passou 7 anos escrevendo estas tiras. Detalhe: Moore assinava as tiras com o pseudônimo de Jill de Ray (uma alusão ao francês acusado de ter assassinado dezenas de crianças).

– A experiência com Maxwell mostrou que ele não servia como desenhista. Moore passou a dedicar “apenas” a escrever.

– Moore comecou a trabalhar com a Marvel UK (divisão anglo-saxônica da Casa das Idéias) em 1981. Aos 27 anos, Moore escrevia pequenas tramas nas revistas Star Wars e Dr. Who. Na mesma época, ele fez alguns trabalhos para a 2000AD e teve sua segunda filha: Amber.

– Em 1982, Alan recebeu sua primeira grande chance ao escrever para a recém-criada revista Warrior. Para quem não sabe, a Warrior publicava 4 a 6 histórias por edição, cada história com 6 a 8 páginas. Moore escreveu 3 sagas para a Warrior simultaneamente: The Bojeffrie’s Saga (uma família de monstros muito engraçada), Marvelman (Miracleman) e V de Vingança.

– Naquele mesmo ano, Moore começou a escrever as histórias do Capitão Bretanha. Já no primeiro capítulo, ele se livrou dos conceitos criados pelo escritor anterior e no capitulo seguinte matou o próprio protagonista da série, recriando-o totalmente reformulado na edição de número 3.

– Enquanto a fama de Moore crescia nos quadrinhos, ele encontrava tempo para se envolver em outros projetos. Ele formou uma banda chamada The Sinister Ducks, gravando um single em 1983.

– Na 2000 AD, Moore escreveu D.R. & Quinch, uma hilária saga de dois alienígenas delinqüentes. E ainda escreveu A Balada de Halo Jones e Skizz.

– Todos esses trabalhos renderam a Moore o prêmio Eagle Award de melhor escritor de 1982 e 1983. Foi quando os Estados Unidos começou a se interessar pelos trabalhos do autor.

– Em novembro de 1983, Lein Wein, criador do Monstro do Pântano, ligou para a casa de Alan perguntando se ele queria trabalhar para a DC e escrever as historias do monstro. Alan achou que era um trote e desligou na cara do escritor. É claro que depois ele viu que não era mentira e aceitou trabalhar com o personagem.

– Sob ao comando de Alan Moore, Swamp Thing passou das 17.000 cópias/mês para mais de 100.000 cópias!!!

– No período em que escreveu o Monstro do Pântano, Moore fez outros trabalhos pouco divulgados na DC, como “Tales of the Green Lantern Corps”, “Vigilante”(uma historia sobre abuso sexual de crianças) e uma historia do Batman onde ele enfrenta o Cara de Barro (publicada no Brasil na extinta SuperAmigos). Moore ainda escreveu 2 histórias memoráveis com o Homem de Aço (ambas relançadas no Brasil pela Opera Graphica). Uma delas, “For the Man who has Everything” é possivelmente uma das melhores histórias do Super-Homem.

– O próximo trabalho de Moore seria A Piada Mortal. A história foi escrita em 1985, mas devido a atrasos do desenhista Brian Bolland, a revista só foi terminada e publicada em 1988.

WATCHMEN

Ainda em 1986, a DC concordou em deixa-lo produzir sua própria série. Com o artista britânico Dave Gibbons, Moore sugeriu o projeto de uma série chamada WATCHMEN. A história, como Weaveworld de Clive Barker, é uma epopéia sobre um mundo fictício – embora o mundo que Moore inventou seja de várias maneiras igual ao mundo real de hoje.

Começando em uma Nova Iorque durante os anos 80, Watchmen descreve uma América como poderia ter sido se realmente tivesse testemunhado o surgimento de fato dos “super-heróis” – isto é, seres que possuem habilidades super-normais ou que se apresentam como vigilantes idealistas. Assim como a América nunca teria sofrido uma divergencia política progressiva dos Anos sessenta, imagina Moore, também nunca teria perdido a Guerra de Vietnã, e teria achado um modo para manter Richard Nixon como Presidente. Já no início de Watchmen, dificilmente as coisas são sublimes: alguém decidiu eliminar ou desacreditar os poucos super-heróis remanescentes enquanto que, em uma série de eventos aparentemente não relacionados, os Estados Unidos e a União soviética desenham um crescente conflito nuclear por causa de uma disputa na Ásia.

No centro da consciência desta história, de olho na (e tentando desafiar a) maneira de como o mundo está desmoronando, está um incomum herói criado por Moore: um mascarado, horrendo e transtornado vigilante direitista conhecido como Rorschach. Rorschach fala para o psiquiatra sobre a noite em que ele cruzou a linha da brutalidade:

“Me senti limpo. Senti o sombrio planeta girando sob os meus pés e descobri o que faz os gatos gritarem como bebês durante a noite. Olhado para o céu através da espessa fumaça de gordura humana, e Deus não estava lá. A escuridão fria e sufocante, continua para sempre, e nós estamos sós. Vamos viver nossas vidas na falta de qualquer coisa melhor para fazer. Deixemos a razão para depois.

Nascemos para o esquecimento; agüentando crianças destinadas para o inferno, nós mesmos; caminhando para o esquecimento. Não há nada mais. A existência é fortuita. Nenhum padrão seguro imaginado por nós depois de encarar isto por muito mais tempo. Nenhum significado seguro além do que nós escolhemos impor. Este mundo sem direção não é moldado por vagas forças metafísicas. Não é Deus que mata as crianças. Não é o destino que as abate ou que as dá de alimento para os cachorros. Somos nós. Somente nós… Estava renascido então, livre para rabiscar meu próprio desígnio neste mundo moralmente vazio..”

O assustador Rorschach

“Aquela foi uma história terrivelmente depressiva para se escrever,” disse Moore, “em parte porque Rorschach em nada se parece comigo: Eu não compartilho a sua política, e nem compartilho a sua filosofia. Ele é um homem aterrorizado e, em minha visão, ele acaba se rendendo ao horror do mundo.

Mas eu penso que o fundo do poço dos medos e ansiedades de muitas pessoas pode ser igual ao do Rorschach. As coisas que uma vez usamos para nos abrigarmos da escuridão – como Deus, a rainha, o país, e a família – foram se distanciando de nós. Em muitos casos, temos esmagados a nós mesmos, e agora nos deixamos tremendo na chuva, olhando para o mundo e vendo um obstáculo preto que não tem nenhum significado moral, afinal”.

Até que alcance seu devastador mas reafirmado fim, é evidente que, acima de tudo o mais, Watchmen é uma história de como as pessoas encaram a perplexidade do mundo de hoje: como alguns se movem furiosamente e de maneira fatal contra ele e de como outros, heroicamente, reúnem forças até mesmo em face ao Armageddon.

“Enquanto estava trabalhando em Watchmen,” conta Moore, “eu tive que me perguntar, O que é que mais me assusta? E percebi que a verdade é que quando o mundo acabar, não haverá nenhum aviso de quatro minutos, não haverá nenhum conflito nuclear de baixa escala. A verdade é que os mísseis poderiam estar no ar em cinco minutos. E se houver um Armageddon nuclear, não iremos retirar o pó de nós mesmos e nem reinventar os valores humanos. Não poderia haver nenhum valor humano após uma guerra nuclear porque não haveria nenhum humano.

Nosso passado seria erradicado. Nosso futuro seria erradicado. Nosso presente seria erradicado. E eu me achei pensando, Quando as crianças foram para escola esta manhã, eu gritei com elas ou lhes falei que eu as amo?”.

Os roteiros de Moore para essa saga viraram uma lenda pela riqueza de detalhes. O primeiro capítulo, por exemplo, tinha mais de 100 páginas e foi entregue ao desenhista Dave Gibbons sem parágrafos.

Com Watchmen, Moore virou uma celebridade do mundo dos quadrinhos, mas não estava feliz com isso. Certo dia, em uma convenção sobre HQ´s em San Diego, ele foi cercado por dezenas de fãs que o imprensaram contra uma escadaria na tentativa de agarrá-lo e conseguir um autógrafo. Moore decidiu que jamais participaria de convenções novamente.

A Casa do Trovão, em Twilight of the Superheroes

O próximo projeto de Moore na DC seria Twilight of the Superheroes, mas por razões desconhecidas, esse projeto não foi adiante. Anos depois, muitas das idéias de Moore para essa série seriam reaproveitadas na aclamada saga “Kingdon Come”(Reino do Amanhã) de Mark Waid e Alex Ross. A dupla nega qualquer reciclagem dos conceitos de Twilight.

Moore, que já não trabalhava para a Marvel desde a época de Capitão Bretanha, tambem passou a não trabalhar mais para a DC, pois discordava sobre os royalties de Watchmen e principalmente com o fato da DC adotar o código “for mature readers” (própria para leitores maduros/adultos) nas suas revistas.

A última colaboração de Moore para a DC foi o final de V de Vingança, que havia ficado incompleta apos a falência da Warrior. A série foi reeditada nos EUA e se tornou outro best-seller.

Miracleman

Na mesma época, ele voltou a escrever Miracleman (agora para a editora Eclipse). Além de tudo o que já havia sido escrito para a Warrior, Moore criou novas historias, entre elas a maravilhosa saga Olympus. Depois disso, ele passou os direitos autorais do personagem para Neil Gaiman (que mais tarde resultou naquele pega ´pra capar entre Gaiman e a cria do inferno, Todd McFarlane. O embate jurídico dura até os dias de hoje).

Moore recusou varios trabalhos nessa época, inclusive o roteiro de Robocop 2 (que assumiu a criança foi Frank DKR Miller). Seus próximos trabalhos foram o livro “Brought to Light”, com ilustrações de Bill Sienkieckz e a graphic novel “A Small Killing”.

Em 1989, Moore decidiu colaborar com a recém-criada revista “Taboo” de Stephen Bissete (parceiro de Moore em Swamp Thing). Para a Taboo, ele escreveu a espetacular “From Hell” – fruto de mais de 8 anos de pesquisa, e “Lost Girls”.

Ainda naquele ano, Moore passou a viver um triângulo amoroso com sua esposa e sua namorada Deborah Delano. Irritado com a intolerância do governo de Margareth Tatcher com os homosexuais, Moore colaborou com entidades GLS, publicando a história “Mirror of Love”, pela editora Mad Love, propriedade do próprio autor e de sua esposa.

Big Numbers

O próximo projeto era a serie Big Numbers, projetada para 12 capítulos e mais de 500 páginas. Somente 3 edições foram lançadas, 2 com desenhos de Sienckwiecz e uma com os traços de Al Columbia. Ninguém sabe ao certo porque o projeto nao foi adiante, mas especula-se que a complexidade do texto de Moore foi demais para os desenhistas que nao conseguiram dar conta do recado.

Nessa época teve início o inferno astral de Alan Moore: a Mad Love faliu e seu casamento terminou. A Taboo também chegou ao fim, deixando sagas como From Hell para serem completadas anos depois.

Em 1993, Moore tomou uma decisão que desapontou muitos de seus fãs. Aceitou trabalhar para a Image Comics escrevendo títulos como Spawn, Supreme, Glory, Youngblood, Wild C.a.t.s. Moore desabafou que aquilo não era um retrocesso ou que ele estava vendendo sua alma para os demônios Rob Liefeld e Jim Lee, e sim um desejo de escrever histórias mais simples, para garotos de 14 anos e não para adultos de 30. Ainda pela Image, ele participou do projeto 1963. Este ultimo projeto acabou gerando uma briga entre ele e Stephen Bissette. Até hoje eles não se falam.

Moore passou a morar com uma nova companheira: Melinda Gebbie. No dia em que completou 40 anos, Moore decidiu se tornar um mago. Ainda em 1993, ele praticou performances teatrais como “Snakes and Ladders” e “BirthCaul”. Mais tarde essas performances foram adaptadas para HQ´s por Eddie Campbell, seu companheiro de trabalho em From Hell.

Algumas conclusões de Moore em relação à magia foram adaptadas para histórias como Supreme, Glory e mais tarde Promethea. Em Supreme, Moore explorou o conceito do IDEASPACE, um mundo de arquétipos, semelhante ao Mundo das Idéias de Platão. Supreme vai investigar uma estranha cidade no alto do Tibet, encontrando uma paisagem desnorteante, formada por um grande número de paisagens diferentes fundidas numa só. Há partes dela que parecem como um bairro decadente durante a Depressão de 1930, onde ele conhece uma gangue de crianças e um herói fantasiado.

O Grande Criador

Supreme continua a vagar pela estranha paisagem até encontrar uma trincheira de um campo de batalha, onde há uma infinidade de soldados de várias etnias: Um irlandês, um judeu, um negro, tudo muito parecido com o Sgt. Fury e toda uma enorme linha de heróis patrióticos.

Isto continua até Supreme conhecer o criador supremo deste mundo, que se mostra ser Jack Kirby. Isto é muito difícil de explicar porque leva uma história inteira para ser contada, mas é basicamente uma gigantesca cabeça flutuante, que se altera sob uma fotomontagem da cabeça de Kirby em transmutação; ela sempre é apresentada no estilo dos desenhos de Jack Kirby. Esta entidade gigantesca explica a Supreme que ele foi um artista de carne e osso e sangue, mas agora ele está completamente no reino das idéias, que é muito melhor porque a carne e os ossos e o sangue tem suas limitações, já que ele podia fazer somente quatro ou cinco páginas em um dia de trabalho; mas agora ele existe puramente no mundo das idéias. As idéias só podem fluir sem interrupções. Ele fala sobre todo um conceito de um espaço onde idéias são reais, que é o tipo de lugar onde, de algum modo, todos os criadores de quadrinhos trabalham durante toda a sua vida, talvez Jack Kirby mais do que a maioria. É como se uma idéia se tornasse livre do corpo físico, e este artista pode então explorar os mundos infinitos da imaginação e das idéias.

Em 1996, Moore escreveu seu primeiro romance, intitulado A Voz do Fogo. Foram 5 anos para escrever este livro, um tratado de 5 mil anos da sua cidade natal, Northampton. O primeiro capítulo é narrado em primeira pessoa (de forma muito singular) por um personagem que vive numa Northampton paleolítica, quando a cidade tinha duas a três cabanas de barro e uma ponte. O segundo é narrado em primeira pessoa por um personagem totalmente desligado do primeiro que vive em Northampton durante a Idade de Bronze, em uma comunidade que começou a crescer, se desenvolvendo através das eras. Lentamente, nós movemos através dos séculos, até o décimo primeiro capítulo, que é narrado pelo próprio autor na Northampton do presente.

Trabalhando para a editora Wildstorm (que acabou sendo posteriormente vendida para a DC) Moore criou uma nova linha de HQ´s, a America’s Best Coomics (ou ABC), onde surgiram as aclamadas séries: Top Ten, Tom Strong, League of Extraordinary Gentlemen, Promethea e Tomorrow Stories.

Aos 50 anos, Moore anunciou que pretende se aposentar dos quadrinhos. Será?

Liga dos Cavalheiros Extraordinários

Se você assistiu LXG, a dica de leitura é um antídoto para a pataquada que você viu na telona. Leia a edição especial A Liga Extraordinária da Devir. Apesar do preço salgado (R$ 45,00), você pode encontrar esse lançamento na FNAC por R$ 36,00. Preço justificado pela luxuosa edição de 192 páginas repleta de material inédito, incluindo o tão aguardado conto “Allan e o Véu Rasgado”, no melhor estilo das obras de H.P. Lovecraft.A Liga de Moore não tem nada a ver com aquela versão X-Men Vitorianos. As Aventuras da Liga dos Cavalheiros Extraordinários é o fanfict definitivo: Imagine uma força-tarefa formada por personagens da literatura inglesa, mas com uma pitadinha do tempero de Alan Moore: Então o Capitão Nemo é uma figura intrigante, um fanático cheio de equipamentos misteriosos. Hyde é de uma complexidade assustadora. Mina Murray não é uma vampira anabolizada e o decadente Alan Quatermain passa longe da interpretação impecável de Sir Connery. Só para você ter uma idéia, o Quatermain da HQ é viciado em ópio! Leia o mais rápido possível e fique aguardando ansiosamente o volume dois, ainda “inédito” aqui no Brasil.

Entrevista com Alan Moore

Apresento-vos uma entrevista com o escriba, realizada por Alan David Doane. A tradução é de David Soares (Portugal)

Eu soube que este “Quiz de 5 perguntas” seria um esforço maior que os anteriores, excedendo certamente esse número de questões, quando o homem que eu considero ser o melhor escritor de banda desenhada de sempre deteu-se, pensativamente, durante oito minutos para responder à minha primeira interrogação (envisionando e esclarecendo, em conjunto, as seguintes). Olhando a isso, abandonei a fórmula inicial; que outra escolha tinha? Durante a década de 80, Alan Moore recriou a banda desenhada por imprevisto, como irão ler adiante, e, desde a sua estréia, uma engenhosidade e paixão superlativas constantes são as características reconhecidas no seu trabalho. Conversar com Alan Moore, mais que uma honra, foi uma aventura e é meu dever agradecer ao autor a sua disponibilidade, mas, também, a Chris Staros, da Top Shelf Productions, por apadrinhar este encontro. Esta editora publica muitos dos melhores trabalhos de Moore, como o seu romance “Voice of the Fire”.

Alan David Doane – O que te inspirou a escrever um romance com a profundeza de “Voice of the Fire”?

Alan Moore – Sempre vivi em Northampton, como os meus pais, talvez tenha sido isso. Somos todos descendentes uns dos outros nesta única grande família que são os seus cidadãos. “Nascidos de fresco com sangue em segunda-mão”, como gostamos de dizer por cá. Esta cidade fascina-me e saber que a sua história, tão singularmente rica, é completamente ignorada sempre se me apresentou contra-sensual. A maioria dos ingleses é capaz de identificar Northampton apenas como uma mancha indistinta a meio da M-1, entre Birmingham e Londres, mas quando comecei a investigar as suas origens na altura em que me lembrei de escrever este livro encontrei matéria convincente o bastante para concluir que Northampton é, mesmo, o centro do universo. No mínimo, eu fiquei convencido.

Penso que a sua é uma história esplêndida que remonta desde a Idade da Pedra quando caçadores de mamutes, e os próprios mamutes obviamente, ainda caminhavam sobre estas ruas, atravessando a Idade do Bronze e as migrações dos povos Celtas, prosseguindo pela Idade do Ferro e as invasões romanas e, ainda, parece-me ser uma cidade que assumiu sempre uma importãncia central, de um modo mais complexo que a sua simples localização geográfica. Lembro-me, se me encontro sem erro, que os avós de George Washington, e de Benjamin Franklin, habitavam duas pequenas aldeotas vizinhas durante os anos da Guerra Civil Inglesa. Os pais de Washington moravam aqui, os pais de Franklin moravam em Ekton e ambos os casais abandonaram Northampton após a guerra civil que terminou nesta cidade (provavelmente, o local mais desconfortável para comprar uma casa durante o séc. XVII) e emigraram para a América. De acordo com aquilo que sei, a própria bandeira norte-americana é baseada no seu, agora esquecido, brasão de família, tradicional de Northampton.

O tipo que descobriu o ADN, Francis Crick, viveu aqui e foi aluno na mesma escola que eu frequentei com apenas algumas décadas de intervalo entre os seus anos lectivos e os meus e ia semanalmente à catequese na igreja que ainda se encontra no fim da minha rua. Muitos episódios da história inglesa também circulam Northampton, como a Guerra das Rosas que também conheceu o seu fim neste lugar, simetricamente à nossa Guerra Civil, como já te contei, e a Conspiração da Pólvora que foi urdida nesta cidade e pretendia rebentar a sede do parlamento, em Londres, em 1605. Pensamos, inclusive, que o empreendimento foi um fracasso e é por essa razão que o tornámos numa festa anual, mas os conspiradores não se saíram, realmente, mal.

Também foi nesta cidade que a rainha Mary, da Escócia, foi decapitada e é avaliando esse conjunto de acontecimentos que te digo que existe muita história aqui, nem sempre agradável, admito, mas está presente uma força nuclear para a vida humana e que influenciou de certeza a evolução do modo de vida inglês, e, em última análise, possivelmente outros modos de vida em outros lugares.

A génese do livro nasceu dessa fé que me diz que, sim, Northampton é, na verdade, o centro do universo. Acredito nisso, assim como acredito que é esta é uma cidade despida de características especiais. Posso dizer-te que qualquer pessoa, habitante de qualquer lugar sobre o globo, pode desenterrar uma mão-cheia de maravilhas da terra do seu próprio quintal, se tiver feito uma pesquisa paciente sobre esse local e se for engenhosa o bastante para as encontrar. Demasiadas vezes caminhamos pelas nossas ruas, a pé ou de automóvel, e não compreendemos que sob as fachadas descaracterizadas se pode esconder o antigo cárcere de algum poeta ou um sítio reservado ao homicídio, o sepulcro oculto de alguma rainha lendária e é o somatório destas pequenas histórias que enriquecem um lugar: de repente, não te encontras simplesmente a passear numa cidade comum, aborrecida e homogénea, mas numa aventura em avenidas prodigiosas recheadas de histórias fantásticas. Na minha opinião, viver é uma experiência muito mais recompensadora se conhecermos intimamente a parte do mundo que nos foi destinada como casa e esta é a melhor resposta que te posso dar sobre a tua pergunta.

ADD – Bom, na verdade já respondeste às primeiras quatro perguntas.

AM – A sério? (Risos) Estou em forma.

ADD – (Risos) Sendo assim, vamos à última. Imagino que durante a criação das histórias deste livro, à medida que ias desenvolvendo a tua pesquisa e estruturando a narrativa, foste apanhado de surpresa por algumas coisas acidentais que não estavam previstas quando iniciaste o empreendimento.

AM – Fui surpreendido por uma grande quantidade de coisas. Repara que uma das minhas premissas iniciais era a de não querer escrever um trabalho histórico, por que não queria abdicar da liberdade que um trabalho de ficção me oferece, como, por exemplo, entrar na personalidade das pessoas sobre quem eu pretendo escrever e o sentido dessas vidas, pois acredito que dessa forma o resultado final é mais verdadeiro, mais humano. Contudo, mesmo conjurando todas estas vozes fictícias do passado queria que o seu discurso se baseasse em fatos reais e circunstâncias possíveis e comecei com esse objetivo em mente para, em seguida, compreender que determinados temas, determinadas imagens, estavam a emergir da minha narrativa.

Aparentemente, a maioria dos episódios ocorrem em Novembro, no dia do meu aniversário,e, paralelamente a isso, outros elementos estavam a manifestar-se repetidamente em diferentes histórias e indicavam-me uma espécie de padrão: pessoas com membros amputados; matilhas de cães pretos espectrais; cabeças decepadas e outros ícones de natureza igualmente inquietante.

O desafio de “Voice of the Fire”, se eu queria realizar esse livro de acordo com a minha ideia original, era ter um narrador diferente para cada uma das doze histórias, alguém que pertencesse a esse espaço-tempo e que relatasse na primeira pessoa. Para o último capítulo, que tem lugar nos dias de hoje, o único narrador possível só poderia ser mesmo eu próprio. Contar essa história com a minha voz, debruçando-me sobre os meus assuntos particulares sem inventar pormenores sobre o que estaria a acontecer durante essa altura e, coincidentemente, quando finalmente comecei a fazê-lo, descobri que já me encontrava em Novembro, mais uma vez… Iniciei a escrita desse capítulo com a esperança que a própria cidade me sugerisse um final que amarrasse todas as pontas e todas as hipóteses que fui deixando por rematar ao longo dos capítulos anteriores sem saber se isso iria acontecer ou se, pelo contrário, os últimos cinco anos da minha vida tinham sido um logro e que não deveria ter começado o livro, em primeiro lugar.

Sempre acreditei que existem momentos na vida de um escritor em que ele, ou ela, é confrontado com a noção de que as fronteiras entre a ficção e a vida real são, muitas vezes, inexistentes e isso é frequente em trabalhos nos quais optamos por um registro auto-referencial. Esses dois universos inclinam-se para um maior cruzamento à medida que te aproximas de casa o que pode ser desconfortável, no mínimo. Por isso não foi surpreendente, mas ainda assim bizarro, quando sucessivas ocorrências se conjugaram para satisfazer as necessidades do meu texto. Coisas sobre e com cabeças cortadas e enormes cães pretos que me mostraram que enquanto ações mirabolantes têm lugar na ficção, outros movimentos igualmente mirabolantes, e perigosos, acontecem na vida real; experiências que são simétricas. Por mais que as esperes, são sempre perturbantes.

ADD – Esse capítulo final, acredita, foi uma das coisas mais perturbantes que já li.

AM – Pois. Obrigado.

ADD – Existe uma frase nesse capítulo… Tu sabes qual: “O Homem escreve.”, “O Homem escreve.”…

AM – Sim

.

ADD – Essa tua frase que aparece repetidas vezes e que parece tão absurda consegue reunir toda a informação do livro e fazer sentido no final, quando todas as centenas de páginas e todas as centenas de anos que assimilaste acabam por nos conduzir à tua casa, ao teu quarto, não é verdade?

AM – É quase isso. Não és conduzido ao meu quarto, felizmente para ti, mas à minha mente. Até esse ponto exato, ainda poderias pensar que “Voice of the Fire” é composto por uma série arbitrária de histórias suavemente associadas em órbita da minha cidade e nesse capítulo quis fundir tudo isso: as histórias, a minha vida, a minha mente e as vidas e as mentes dos leitores. Aparentemente, para surpresa de todos, o livro acaba mesmo por ser sobre mim. Pode ser sobre mim, sentado a escrever o próprio livro. Ou ser sobre o processo criativo de se escrever outro livro. Ou sobre outro assunto qualquer. É isso. E fico contente que tenhas reagido bem à frasezinha, por que ela arrepiou-me um bocadinho quando a escrevi. Lembro-me que pensei: “-Isto está a ficar sinistro, por isso devo estar a criar algo interessante”.

ADD – A frase não é sinistra, em si, mas consegue impressionar-te dessa forma.

AM – Obrigado.

ADD – É perturbante, como já te disse. Aliás, já li o teu “From Hell” e senti em algumas passagens dessa história que ultrapassaste a barreira entre autor e leitor. Uma barreira que não tinha sido ultrapassada em nada que já tivesse lido.

AM – Isso é maravilhoso…

ADD – Não tenho a certeza de qual dos livros foi editado em primeiro lugar, mas o efeito que “Voice of the Fire” me provocou pareceu-me uma ampliação do que senti em segmentos de “From Hell”, naqueles momentos em que tu, como acabaste de explicar, penetras, e nós contigo, na mente da personagem, que neste caso és tu. Não tinha pensado nisso, mas o leitor acaba por se transformar em Alan Moore.

AM – Pois… é possível. Penso, inclusive, que um ingrediente que pode ajudar a cozinhar esse efeito é o facto de que no último capítulo de “Voice of the Fire” não possuo um conhecimento “in loco” do meu consciente não-autónomo, ou seja: o meu “eu” pensante. Falando nisso, nunca utilizo a palavra “eu”, entendes? Acaba por funcionar como uma narração na primeira pessoa do singular, mas sem uma pessoa. Não sei se era a isto que fazias referência, mas eu também não compreendo muito bem o que me leva a escolher uma determinada forma de fazer as coisas. Na altura, pareceu-me que funcionava.

Pareceu-me que deixava o leitor respirar, sem estar constantemente a ser confrontado com a noção de que é um… deixa-me pensar… um ego de outra ordem que fala com ele. Fico satisfeito pela tua reacção a esta experiência.”Voice of the Fire” e “From Hell” nasceram mais ou menos na mesma altura, talvez com um ano de diferença, e isso acaba por estabelecer uma comunicação entre os dois, por que têm algumas afinidades, como, por exemplo, o facto de partilharem um momento da minha vida em que decidi tornar-me um ocultista e estudar a fundo matérias que estão imersas num mundo à parte às quais, vulgarmente, chamamos magia. No “From Hell” isso está explícito nos diálogos de William Gull quando ele nos descreve as suas crenças e que os deuses existem realmente, em majestade e monstruosidade, na nossa mente. Escrevi isso quase por acidente e compreendi depois que tinha escrito algo mais profundo, algo significante que, eventualmente, acabou por introduzir o meu interesse pela magia.

Certamente, esta inclinação coloriu com outros tons o final de “From Hell”, e a conclusão de “Voice of the Fire”. Este título reservou-me outra surpresa: comecei o livro contando a história de um xamã que procura um código de palavras, uma ladainha, um conjunto mnemónico para aglutinar o seu povo e na última história, eu sou esse xamã, inconscientemente, milénios depois, realizando a mesma rotina. Não a mesma, claro, pois os meus métodos não envolveram nenhum sacrifício humano. Podes dormir sossegado.

ADD – A mensagem de “From Hell, bom, pelo menos a que eu retirei da minha leitura e que, infelizmente, não é expressa pela sua adaptação cinematográfica…

AM – Tens de compreender que estás em vantagem sobre mim nesse tópico, por que não vi o filme.

ADD – Tudo bem. Penso que na melhor das hipóteses representar todas as preocupações do teu trabalho, já por si bastante extenso, num filme de duas horas é uma tarefa impossível de concretizar. Mas falava-te do que retirei do livro, a tal mensagem que é a de que a arte tem o poder de transformar o artista, até divinizá-lo, e no decurso da minha leitura percebi que ambos os livros, “From Hell” e “Voice of the Fire”, partilham essa preocupação. Não sei se foi intencional, mas a verdade é que quando se chega ao fim desses livros essa mensagem é, de facto, sugerida.

AM – A magia tem o poder de mudar a relação que tens com o mundo que te rodeia e isso aconteceu comigo. Comecei a olhar as coisas de outra forma, com um sentido, felizmente, mais útil, até, e considerando tudo isso, o que dizes sobre os dois livros pode ser verdade. Através deles, apresento uma visão alternativa da nossa história e das nossas experiências, mesmo que em “From Hell” a minha intenção principal fosse contar uma história sobre um crime, um homicídio. Nessa altura, nem pensei nos crimes de Jack, o estripador. Era, apenas, o uso de um crime como uma experiência avassaladora que me norteava. Felizmente, um homicídio, no contexto de uma vida, é uma experiência bastante improvável. Repara que o número de pessoas que acabam por morrer dessa forma é, ainda assim, muito reduzido.

Essa raridade sugeriu-me a idéia de falar sobre o homicídio de uma forma particular. Porquê abordar apenas a identidade do autor, que parece ser o motor constante de tantos romances policiais? Essa é uma alusão quase tão redutora como um vulgar jogo de salão. Como o CLUEDO, por exemplo, onde só precisas de descobrir quem foi o assassino, a arma que usou e em que local a vítima foi abatida. Com “From Hell” quis esclarecer, também, as variáveis sociais e culturais que permitiram a práctica desse crime, muito mais que, somente, especular sobre a identidade do homicida. Queria ver como um crime poderia agir sobre a sociedade e estudar todas as hipóteses de desenvolvimento que poderiam florescer posteriores a essa ação.

Prosseguindo nessa óptica, se estás a falar sobre um crime, essa experiência avassaladora que pode acontecer na nossa vida, tomas consciência que és capaz, inclusive, de ir mais longe e ter alguma coisa a dizer sobre a grandiosidade da própria condição humana. Podes dirigir este ponto de vista para “Voice of the Fire”, claro, mas desviado suavemente, já que a intenção desse livro não é provar-te que Northampton é o núcleo do universo, mesmo tendo fé absoluta na verdade dessa afirmação, como já te disse, mas mostrar-te que qualquer local, onde quer que te encontres, é muito mais rico, muito mais exótico e prodigioso do que parece à primeira olhadela, entendes? No primeiro livro, procurei mostrar um ponto de vista crítico sobre a condição humana e a cultura, neste caso a cultura e a sociedade inglesas, usando um crime como casa de partida, mas com “Voice of the Fire”, as minhas ambições estavam à solta, a pensar em outras paisagens e para onde a nossa evolução nos conduz. Penso que o que estabelece a comunicação entre os dois livros é mesmo o meu interesse pela magia, que influencia o meu modo de olhar as coisas e de as contar.

ADD – Gostaria que falasses do modo como vê a tua carreira na banda desenhada e a forma como as obras que tu escreveste, como “From Hell”, mas também “Watchmen” e “The League of Extraordinary Gentlemen”, mudaram o comportamento da indústria da publicação de comics.

AM – Posso dizer-te que a minha ambição foi sempre ganhar a vida como cartunista e nem pretendia ser famoso. O problema foi quando descobri que nunca seria um artista bom e rápido o suficiente para aguentar uma carreira nessa atividade.

Lembrei-me, então, da hipótese de me concentrar na escrita, por que senti que poderia fazer um trabalho melhor como escritor e que desenhando os storyboards para as histórias a minha ligação com o desenho continuaria. Investi com essas premissas e compreendi logo no início que seria incapaz de escrever uma história de encomenda. Se uma idéia sugerida não fosse aquilo que eu tinha em mente, invertia-a para a transformar em algo que me desse prazer escrever ou que fosse, no mínimo, um desafio. Penso que o método que desenvolvi me salvou de muitos compromissos e sempre me providenciou com a motivação necessária para realizar um bom trabalho.

Comecei a ser requisitado aos poucos, para ali e para acolá, em resultado dele e apliquei-o, concisamente, quando a DC me engajou para escrever o “Swamp Thing”. Na minha lógica, o leitor nunca se irá interessar em ler uma história escrita por mim, se eu próprio não estiver interessado em escrevê-la. Isso pressente-se, não te parece? Penso que os leitores são muito bons em descobrir se o autor gostou realmente de fazer o seu trabalho.

Tive de tornar o material mais arrojado, mais destemido, para o forçar a ser interessante. Pensei que fosse arranjar uma porção de problemas por causa disso, mas não. Os leitores compreenderam as minhas escolhas e eu, encorajado por eles, inovei mais ainda, sempre com o apoio da Karen Berger, claro, a minha editora da DC na altura, e, também, por outras pessoas que apreciaram muito a subida das vendas do título, sempre maiores a cada mês. Todo esse conjunto de situações fez nascer uma relação de confiança mútua na qual os editores perceberam que se eu tivesse controlo sobre as minhas decisões criativas nunca lhes iria apresentar um trabalho inteiramente despropositado e foi essa credibilidade que me permitiu ir sempre mais longe, por vezes a locais perturbadores ou tétricos, mas sempre interessantes. De que forma é que isso influenciou a indústria? Não te posso oferecer uma explicação clara. Depende da minha disposição, se queres mesmo saber. Se eu me sentir deprimido penso que a minha influência foi terrível e que os autores que cresceram a ler o “Swamp Thing” ou “Watchmen” só foram capazes de imitar a violência desses trabalhos, e a sua pose intelectualista, sem a suportarem com a ingenuidade e a aventura que também lá se encontram. Sinto que ignoraram completamente a minha vontade de romper os limites da própria fórmula de contar histórias em BD e contentaram-se em produzir uma série de livros tristes e penosos. Como te disse, esta visão desconsolada da realidade depende muito da minha má-disposição e hoje tiveste azar.

A sério que gostava mesmo de acreditar que, em vez de tudo isto que contei, consegui realmente mostrar com o meu trabalho que a banda desenhada permite inúmeras possibilidades aos seus autores e que estão para nascer livros fabulosos com contornos que somos incapazes de imaginar neste momento. Que podes fazer tudo com algo tão simples como palavras e imagens se as abordares sensivelmente e se fores inteligente, diligente e virtuoso no teu esforço. Talvez esteja a ser brusco, lamento, mas queres afirmar que existe uma influência minha na indústria? Então, por favor, coloca-a aqui em vez de encorajares a minha percepção de que a minha herança será invariavelmente composta por psicopatia e sarcasmo.

ADD – Sou capaz de regressar mais longe que os anos oitenta, quando o teu “Watchmen” e o “The Dark Knight Returns”, do Frank Miller, foram publicados. Na minha opinião, o que poderá ter iniciado a redefinição das personagens, dos super-heróis, poderá muito bem ter sido aquela história que escreveste no “Swamp Thing” na qual representaste os membros da Liga da Justiça, o Batman, o Super-Homem e os outros, como se fossem novos deuses, curiosos em relação à humanidade. É um segmento de quantas páginas? Duas? Contudo, penso que a mudança começou nesse momento.

AM – Quem sabe se a razão está do teu lado… Lembro-me que foi a primeira vez que escrevi sobre super-heróis, no mínimo, os americanos. O Swamp Thing não conta, por que, na altura, era refugo. Para mim, escrever essa história foi voltar a divertir-me com os brinquedos da minha infância, o Flash, o Super-Homem e sentá-los todos no seu grande gabinete cósmico e devolver-lhes o carisma que eles costumavam ter para mim e que, infelizmente, se tinha transformado num sentimento mais próximo de casa. Fi-lo usando pequenos ardis, como nunca os chamar pelo nome verdadeiro e ocultá-los na penumbra. Podes ver uma insígnia pelo canto do olho ou uma silhueta, mas isso é tudo. Sobretudo, quis fazer poesia com estas personagens.

Dizer que uma personagem consegue ver o que acontece no outro lado do globo ou que é capaz de aquecer a antracite o suficiente para a transformar em diamante, como fiz para o Super-Homem, ou que se move a uma velocidade tão intensa que a sua vida se assemelha a uma visita numa galeria de estátuas, como escrevi para o Flash. Falei em poesia e isto, de fato, não é um exemplo de boa poesia, mas constitui um novo olhar sobre estas personagens que temos inclinação a desdenhar, ou a esquecer, por que se tornaram, com o passar dos anos, demasiado familiares e a aproximação que nos liga às coisas e aos assuntos tende, por vezes, a criar essa desilusão. Só pintei uma maquilagem nova sobre o encanto que já existia. O Frank Miller fez a mesma coisa nas páginas do “Daredevil”, não? Quando introduziu outras personagens da Marvel nessa cronologia.

ADD – Tens razão, mas repara que ele não se desviou dos padrões instituídos e nunca nos fez olhar uma personagem conhecida de um modo singular. A mesma acusação é válida para a maioria dos criadores posteriores. É mesmo como dizes: se tivessem considerado a face mais experimental dos vossos trabalhos em vez de se concentrarem no sensacionalismo as coisas poderiam, certamente, ter conhecido outra evolução.

AM – Não duvides e essa face mais arriscada é o que existe de atraente no trabalho do Frank, essa sua mestria narrativa e a inovação constante que ele introduziu no género através das histórias do Demolidor e do Batman, muito mais que o desalento e a testosterona. Seria tão bom se a sua influência penetrasse mais fundo que a camada superficial feita de sexo e violência.

Não vamos dizer, todavia, que tudo o que apareceu depois de “Watchmen” e “The Dark Knight Returns” se encaixa nessa pobre categoria e posso dizer-te que na periferia do mainstream encontras grandes trabalhos que não são clones de nenhum destes títulos, mas ainda assim penso que a nossa herança é maldita e uma péssima desculpa para oportunidades perdidas, o que não desvirtua a qualidade do trabalho do Frank e do meu, obviamente.

ADD – Esta conversa sobre herança vem mesmo a propósito. O teu amigo Neil Gaiman já tornou público o que ele diz ser “a conclusão, ou o fim eminente, de um episódio interminável com um editor desonesto, desleal até ao limite do imaginável”, aludindo ao desfecho do processo que levantou contra Todd McFarlane pela posse dos direitos que envolvem parte do franchise do personagem Miracleman, que tu próprio resgataste e ressuscitaste nos anos oitenta. Passados todos estes anos, o que é que tu gostaria de ver feito com essas histórias que escreveste e qual é a tua opinião sobre o processo-crime?

AM – Estou muito contente pelo Neil, como podes imaginar. Ainda bem que acabou, por que deve ter sido um pesadelo moroso. É sempre ridículo que alguém que não seja o criador venha exigir direitos sobre um trabalho e custa-me a entender essa falta de ética, ou melhor, compreendo-a, mas não posso pronunciar-me sobre ela sem dizer um ou dois palavrões. É algo embaraçoso, seboso até, que acaba por nos sujar a todos e que não oferece uma boa imagem da indústria da banda desenhada, por culpa dela própria, também, já que, infelizmente, casos semelhantes a este são frequentes. Penso que o Neil, chegando impoluto à outra margem desse lodaçal para onde irrefletidamente o quiseram arrastar, comportou-se como um verdadeiro super-herói.

Seria divertido ver reimpressões do Miracleman, para que os leitores não estivessem a pagar preços proibitivos por edições raras guardadas religiosamente desde a sua publicação original. Algum do material apresentado nessas histórias era realmente fantástico, como o escrito pelo Neil, por exemplo, e era bom que ele, em algum momento, tivesse oportunidade para lhe dar continuidade. Ele já me propôs há uns tempos uma parceria com vista à realização de uma conta em que todos os royalties derivados das vendas das reimpressões fossem guardados para serem distribuídos com justiça aos autores que trabalharam na série, como nós ou como o Mark Buckingham.

Parte desse dinheiro podia ir, também, para o Comic Book Legal Defense Fund e se houvesse a infelicidade de um ou outro filme aparecer o dinheiro, os meus royalties pelo menos, poderiam ir diretamente para esse fundo ou ficar no estúdio para serem partilhados pelos criadores envolvidos no projeto, por que eu não quero receber um único centavo de mais um filme adaptado de um dos meus livros, nem desejo ver o meu nome associado a um empreendimento desse género. O ideal era que não se fizessem mais filmes inspirados em livros do Alan Moore. Em vez disso, era mais agradável ver bons trabalhos serem reimpressos por um bom editor, sob uma boa política editorial.

Isso seria uma excelente premissa para o futuro e não digo isto motivado pela ganância de ganhar mais uns tostões com o meu material antigo, mas com a intenção de garantir que criadores como eu e como o Neil não tenham de atravessar campos minados no percurso das suas carreiras, por que, na verdade, temos assuntos muito mais importantes com que nos preocupar.

de http://www.mortesubita.org/

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/grandes-iniciados-alan-moore

Os Habitantes do Plano Astral

Este é um texto básico, mas muito importante, escrito por Beraldo Lopes Figueiredo, que eu considero um dos maiores especialistas em Projeção Astral do Brasil. Não é fácil classificar e ordenar os seres astrais, tal sua variedade e complexidade, mas podemos nos esforçar para isso, começando a dividi-los em 3 grandes categorias: Humanos, os não-humanos e os artificiais.

01.2.1 – HUMANOS:

Os cidadãos humanos do mundo astral, separam-se naturalmente em dois grupos: Os vivos e os Mortos.

01.2.1.1 – VIVOS:

01 – Adeptos e seus discípulos: São os humanos evoluídos, instruídos que operam tanto com o corpo mental como astral, mas muito mais com mental, pertencentes as Lojas, escolas orientais e algumas ocidentais.

02 – Indivíduos Psiquicamente adiantados: Esses não estão sob orientação de um Mestre (amparador), em geral são conscientes fora do corpo físico, mas por falta de necessário treino e experiência estão sujeitos a enganos e apreciação do vêem. Sua lucidez é variável , variam de acordo com seu grau de desenvolvimento e em muitos casos quando voltam ao corpo físico não lembram de sua experiência.

03 – A pessoa Vulgar: Não possuem maturidade astral, flutuam perto do corpo físico durante o sono., num estado mais ou menos inconsciente, em alguns casos numa semi-adormecido, vagueia daqui para ali, deitado seguindo algumas correntes astrais passando por toda espécie de aventuras, umas agradáveis outras desagradáveis. Quando menos evoluído for uma pessoa, mal definida será suas formas astrais, sem contornos definidos, devido a alta densidade do seu duplo etérico.

04 – O mago negro e seus discípulos: É semelhante a primeira, porém voltada para o mal. As ordens que lidam com essas forças ocultas poderosas são várias, mas podemos citar: Dügpas Europeus, Vodoo, Obeah, Magia Negra, etc.

01.2.1.2 – MORTOS:

01 – Os Nirmânakáyas: Seres elevados, no entanto por qualquer necessidade de missão que se julgue necessário descem para o plano Astral.

02 – Discípulos a espera de Reencarnação: Esse não é um habitante comum do mundo astral e sim do mundo mental, mas ocasionalmente pode-se encontrar um ocasionamente por isso é uma população muito reduzida.

03 – Os mortos Vulgares: É uma classe cuja população são de milhares e milhares de almas, também complexa limitar sua estadia no mundo astral, varia de algumas horas, dias, semanas, meses, anos e até séculos.

Todos sem exceção tem que passar por todos as subdivisões do plano astral no seu caminho para o mundo-céu, algumas percorrem essas subdivisões inconscientes, para as pessoas evoluídas com várias reencarnações, essa passagem é extremamente rápida.

04 – As Sombras: Quando a extinção de um indivíduo é completa é sinal que acabou sua vida Astral, ele passa para o plano Mental (Plano Devachânico). Mas, assim como ao passar para o plano físico para o Astral há um abandono do corpo físico, assim também na passagem do corpo astral para o mental, o invólucro astral é abandonado e também irá se desintegrar, neste caso o corpo astral abandonado, é um verdadeiro cadáver. Infelizmente o homem vulgar deixa-se dominar por todos os desejos inferiores, que uma parte da mente inferior se funde com o corpo dos desejos, essas partículas da matéria astral possuem vida própria e animam esse cadáver, gerando uma classe chamada: Sombras Essa sombra não é o indivíduo real, mas conserva hábitos, semelhança física, memória mas sua inteligência é limitada, pois é um farrapo de suas piores qualidades. A duração de uma sombra varia segundo a qualidade da mente inferior que a anima, mas apesar desta astúcia que engana alguns médiuns despreparados em sessões espíritas, na medida que o tempo passa ela vai perdendo a vitalidade e se degradando até cair na classe seguinte: Os invólucros (Cascões Astrais).

05 – Os invólucros (Cascões Astrais): São os cadáveres astrais, o corpo astral abandonado e em estado de desintegração, são desprovidos de qualquer espécie de consciência e de inteligência, vagueiam nas correntes astrais como nuvens impelidas por ventos contrários. {b]Não pode ser confundido com o Duplo Etérico que conserva-se a poucos metros post-mortem do cadáver físico, se desintegrando lentamente são vistos nos cemitérios essas formas azuladas com aparência de vapores, flutuando nos túmulos dos cemitérios daqueles que recentemente deixaram o mundo físico, não é um espetáculo agradável de ver. Mas os Cascões Astrais, que vagam, podem ser usados e manipulados por meio de Magia Negra.

06 – Os invólucros vitalizados: Alguns elementais artificiais, as vezes entram dentro destas cascas astrais e dão uma vida aparente a eles. Geralmente o usam de uma forma malévola,

07 – Vitimas de Morte Súbita e os Suicidas: Todo o indivíduo que for arrancado de sua vida terrena repentinamente, em pleno gozo de sua saúde e energias, vai se encontrar no mundo astral numa situação diferenciada dos demais seres que morreram por doença. No caso de suicídio ou de morte por acidente, desastre, não se realizando os preparativos naturais e graduais, compara-se como retirar o caroço de uma fruta quando esta fruta estiver verde, grande quantidade de perietérico (combustível vital), duplo etérico, alta densidade desta matéria é pertubadora para o indivíduo recém morto, esta alta densidade vibratório levará o indivíduo a cair na sétima zona astral conhecido por baixo astral (Umbral). Porém se o indivíduo for de boa índole ficará insconsciente e por pouco tempo neste mundo trevoso. O fato do suicida, é bem mais difícil, porque interromperam sua vida através do livre arbítrio, embora cada caso tem suas variantes e nem todos os suicídios são consideráveis condenáveis, como o caso de Sócrates.

08 – Vampiros e Lobisomens: É a entidade mais cruel e repelente, mas felizmente muito raras são essa criaturas, essas relíquias horrorosas de um tempo em que o ser humano era mais animalesco, são considerados fábulas da Idade Média, pertenciam a Quarta Raça da terra, como na Rússia e Hungria, apesar das lendas exageradas, no fundo tem uma verdade inquestionável. Essas criaturas apegadas ao extremo a vida terrena usavam seu corpo astral para manter íntegro seu corpo físico, roubando sangue dos vivos com seu corpo astral semi materializado, existindo casos registrados na Europa Central de aberturas de caixão encontrava-se o corpo fresco e sadio, muitas vezes mergulhado num sangue fétido.

Já os lobisomens, também de extrema raridade, nos dias de hoje, eram de uma raça extremamente carnívora que se alimentava de animais vivos, numa extrema violência, quando mortos esses indivíduos semi materializados numa espécie de Lobo e Homem atacavam nas matas outros animais.

Portanto aos estudiosos de Viagens Astrais, não se preocupem pois esses tipos são de extrema raridade nos dias de hoje e geralmente os que existem ainda, agem próximos ao seu corpo físico.

09 – Magos Negros e seus Discípulos: Pertencem ao outro extremo da escala, são espíritos desencarnados, tendem a manter-se o maior tempo possível neste plano, renegando o plano mental, são criaturas extremamente hábeis com os poderes do mundo astral, violam a lei natural da evolução , pois mantém-se no mundo astral pela manipulação de artes mágicas: MAGIA NEGRA. Deve-se frisar que para se conseguir isso, é a custa de outras vidas, roubando de outrem o tempo de vida legítimo.

01.2.2 – NÃO HUMANOS:

01 – Corpos Astrais dos Animais: Apesar de extraordinariamente numerosa, esta classe ocupa um lugar subalterno no plano astral, visto ser muito curta a permanência neste plano dos membros que a compõem. Os animais em sua grande maioria ainda não adquiriram ainda uma individualização permanente e quando morrem a essência monádica que os animava volta ao stratum especial donde vieram. Geralmente essa existência não passa de uma espécie de sonho inconsciente impregnado, ao que parece de uma perfeita felicidade. Quanto aos animais domésticos que já atingiram a individualidade, o caso de alguns gatos e alguns cachorros, esses tem uma vida astral mais longa e mais ativa, mas caindo por fim num estado passivo subjetivo que dura pouco. Dos animais selvagens os que já atingiram a individualização encontra-se os Macacos Antropóides, que forma uma classe interessante, visto que se aproximam de reencarnarem como seres humanos.

02 – Os espíritos Naturais: Compreende-se esta classe subdivisão tão numerosa e tão variada que pode-se dizer não serem totalmente conhecidas em sua integralidade. Classificadas por alguns escritores como ELEMENTAIS, são espíritos da natureza, tendo os da terra, do ar, da água e fogo. São entidades astrais dotadas de inteligência, definidas, que habitam e funcionam cada um desses meios. Na linguagem popular tem uma grande variedade de nomes: Fadas, pixies, brownies, salamandras, duendes, trolls, sátiros, faunos, sacis, etc. São em forma reduzida ou de baixa estatura.

Em geral são invisíveis para a visão física mas alguns possuem a propriedade de se materializarem quando lhes convém.

Em sua maioria evitam os seres humanos, visto não gostarem das emanações fluídicas humanas, os vícios e desejos desordenados põem em ação correntes astrais que os pertubam. Os períodos de vida desses seres variam muito, alguns muito curtos, outros maiores que as nossas vidas.

03 – Os Devas: O mais alto sistema de evolução que tem relação com a terra, são seres que os hindus chamam de Devas, no Ocidente Anjos, “Filhos de Deus”, amparadores, são considerados um reino acima do humano, assim como os animais irracionais um reino inferior aos humanos, chamados também de Regentes da Terra, Anjos Celestiais, são eles agentes do Karma do ser humano. Poucas vezes se manifestam no mundo astral, estão mais presentes no mundo mental, mas quando o fazem são notáveis pela beleza e luz que irradiam, parecendo possuírem asas tal beleza de suas auras, parecem possuir uma aureola tal é a luz do seu chakra coronário.

01.2.3 – ARTIFICIAIS:

01 – Elementais criados inconscientemente: A essência elemental nos rodeia por todos os lados. É flagrante o efeito produzido por um pensamento que quando apodera-se da matéria plástica astral, ele molda instantaneamente um ser vivo, ser que uma vez criado não fica de forma nenhuma sob a influência do seu criador , mas adquire o instinto básico de qualquer réstia de vida que o INSTINTO DE SOBREVIVÊNCIA. A duração de um elemental (Formas-Pensamento) varia muito sendo proporcional a intensidade dos pensamentos de quem o gerou. Alguns minutos, horas, mas o pensamento forte, repetitivo, convicto pode durar alguns dias. Os elementais ficam em volta do seu criador em suspensão, circulando, tendem a provocar a repetição da idéia buscando se fortificar para viver mais tempo. Crianças criam companheiros astrais. Tem como tendência prolongar suas curtas vidas reagindo sobre o seu criador, provocando a renovação do pensamento que o originou. Existem casos de criações encontrarem energias paralelas e se alimentarem de várias ao mesmo tempo, o que prolongaria sua vida por um tempo bem considerável, alguns deixam seus criadores , encontrando essa energia no próprio astral se transformam em demônios errantes. Casos de mães devotas criando para seus filhos anjos da guarda, visto por muitos clarividentes, acompanhando algumas crianças.

02 – Elementais Criados Conscientemente: Tantos os adeptos e ocultistas da Magia Branca e Magia Negra se servem freqüentemente de elementais artificiais nos seus trabalhos, neste caso essas criaturas são como escravas, poucas são as tarefas que não possam ser realizadas por essas criaturas quando cientificamente preparadas e habilmente dirigidas. Não tem sido pouco o mal que essas criaturas espalham pelo mundo. Os elementais formados conscientemente são dotados de uma inteligência superior aos formados inconscientemente, além da duração de suas vidas, serem bem maiores, por isso são mais perigosos. Da mesma forma são mais astutas para prolongar a vida, quer alimentando-se como Vampiros da vitalidade de seres humanos, quer influenciando que façam oferendas, matando animais, cuja vitalidade é direcionada e absorvida pelo elemental. Podem prolongar suas vidas por anos a fio, tem casos que são séculos. Tem um caso na índia que uma entidade protetora das lavouras, quando não lhes era ofertada as oferendas, alimentos, focos de fogos espontâneos rebentavam simultaneamente entre as cabanas, apareciam do nada.

03 – Artificiais Humanos: apesar de ser pouco numerosa esta entidade existe, guardiões de Lojas Brancas, Demônios da Idade Média, líderes que já reencarnaram, mas seu ser artificial ainda continuam vivo no mundo astral e são vistos por clarividentes.

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Charles Webster Leadbeater (Londres, Inglaterra, 16 de fevereiro de 1847 – Perth, Austrália, 1º de março de 1934), foi sacerdote da Igreja Anglicana e Bispo da Igreja Católica Liberal, clarividente, escritor, orador, maçom e uma das mais influentes personalidades da Sociedade Teosófica.

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/os-habitantes-do-plano-astral

impertinências?

“Eu não vejo necessidade disso!” Diz um senhor barbudo no meio do pátio. “Pra quê dia de consciência de alguém? Isso muda alguma coisa? As pessoas preconceituosas vão continuar sendo. Não há garantia pra ninguém de que isso realmente mude a posição de alguém.“

O jovem ao lado, negro e cansado do papo, olha o senhor branco e velho e não responde. Sai dali pensativo, sem interesse em dialogar com mais ninguém. Seus antepassados não concordariam com aquilo, nunca! As lutas travadas já poderiam ter sido esquecidas e tudo ter voltado como antes se não fosse a manutenção destas datas simbólicas. Ele sabe disso, poderia até passar horas num discurso frenético com o senhor, mas de que adiantaria mesmo? Nesse ponto ele concorda. Preconceito algum muda por causa disso, mas ocorre algo que o senhor não parecia perceber. Ao determinar que tais datas tenham tanto valor e repercussão os homens tolos, estes cheios de preconceito ao que for, temerão represálias cada vez maiores. E já que eles não conseguem corrigir suas tolices sozinhos, com alguns poucos pensamentos acerca, a leia o oprimirá.

Esse pensamento o deixou cabisbaixo. Nos últimos anos, diante da balburdia da homofobia, ao se deparar com o “dia do homem hétero” ele até sentiu a vontade de rir, mas teve uma impressão ruim. Viu que estes dotados de pouca capacidade ao se tornarem minoria poderiam explodir num frenesi louco para não perderem o “jeito”. Iriam gritar por liberdade de expressão, coisa que ele concorda plenamente, mas até que ponto agredir alguém é liberdade saudável?

Continuou cabisbaixo. Foi andando e sentiu vontade de ir mais a fundo no pensamento. Lembrou-se dos seus estudos esotéricos que o levou ao ocultismo. Lembrou-se de tantos místicos de araque que ele conhecera cheios de rancor e preconceitos. Era muito curioso todo aquele papo de energia positiva e não perdiam a chance de alfinetar um cristão que fosse. Tudo muito contraditório. Quando por fim conheceu e estudou com afinco o ocultismo, sentindo que ali não mais se depararia com esse tipo de atitude viu que estava enganado. “O ser humano é preconceituoso por natureza!” Ele sentiu-se mal com tal afirmação. O que deveria dizer ao seu próprio eu? Tentou imaginar que esteve errado esse tempo ao pensar assim. “Os ocultistas são seres elevados!” E desta vez não segurou o riso. Continuou caminhando debaixo do sol. Assim pensou em tudo o que ele aprendeu nesse tempo todo. Sendo negro, interessado por magia e homossexual. Tudo o que sabia era que ele sentia-se mal todo santo dia. E não era por erro dele. Era uma culpa que não lhe pertencia. O ocultismo sanou parte disso, mas ao ver irmãos agirem de forma tão mesquinha e medíocre ele assustou-se.  Não há topo de pirâmide alguma. Estas já não são os moldes do etéreo. O mundo na verdade nunca foi feito sobre trilhos em linha reta. Por que haveria de haver um deus no trono?

Esse pensamento fora mais devastador ainda. No entanto lembrou-se de um amigo, pelo qual tinha grande sentimento, sentimento este que ele teve que provar que não se referia ao seu lado homoafetivo, de modo algum, para não perder o amigo. Acabou rindo novamente. As pessoas são medrosas demais para se desfazerem de suas certezas. Acham que tudo está determinado, que seres humanos com pensamentos distintos são perigosos. Que o toque do olhar ou da mão vai fazer alguém tornar-se de sal ou de ouro. Essas imagens não são por mero acaso. Cada um dinamiza seu mundo de acordo com suas mais profundas aspirações. Se temem, irão ressecar diante do que estão para perder e endurecerão como estátuas. Se o valor é o mais importante, até o amor terá preço e código de barras numa prateleira qualquer.  Continuou até sua casa. Morava só e não chegou a fazer parte das cotas do governo, coisa que ele não sabia se era bom de fato, mas diante das evidências era necessário um empurrão. Ele lembra o quanto sofreu pra conseguir aprender o que não lhe ensinaram no colégio. Como a falta de acesso à internet o prejudicou por só ter livros velhos e rabiscados de algum estudante branco qualquer.  Como o transporte público era defasado, curioso como público não significa livre de taxas, no hospital eu não pago nada. Ele riu novamente.  Será?!

“A vida está ressentida.” Ele pensa alto. “Ela está sem vigor para mudar.” São tantos termos e moldes para se enquadrar que não existe mais o ir e vir. Ele mesmo já declarou-se não homossexual, várias vezes. Acha o termo esdrúxulo demais. Na verdade ele já apaixonou-se por uma mulher e teve até um filho com ela. “Falta uma árvore e um livro!” pensa ele, mas rapidamente se retraiu no pensamento, sentindo a crítica literária em balbúrdia diante de uma citação tão impertinente. E rindo fechou a porta atrás de si, pensando nos paulos coelhos e nos zumbis dos palmares. Desta vez não fez nenhum banimento como de costume, sentia-se aliviado em ver que verdadeira vontade não tem bula.

Djaysel Pessôa

S.O.Q.C.

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Zzurto

Curtam o Zzurto no face!

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“O homem que é escravo de suas paixões ou dos preconceitos deste mundo não poderá ser um Iniciado; ele nunca se elevará enquanto não se reformar; não poderá, pois, ser um Adepto, por que a palavra ‘Adepto’ significa aquele que se elevou por sua vontade e por suas obras.”

Eliphas Levi

#medo #Preconceito

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/impertin%C3%AAncias

O que vos liga à fraternidade?

A Ordem DeMolay conta com Iniciações e, portanto, pode ser chamada de Ordem Iniciática. No entanto, não é uma Ordem magística – seu intuito é formar bons homens, amigos fiéis, jovens cidadãos de nossa grande nação, dignos dos elogios de todos os homens de bem. Como a Maçonaria, ela é uma organização fraternal, tanto que sua 4ª Virtude é o Companheirismo, e, por isso, seus membros tratam-se entre si como Irmãos, chamando os maçons de Tios [nos Estados Unidos, o termo é Dad, Pai]. Entre nossos Tios, incluem-se Marcelo Del Debbio, criador deste portal.

Não é uma ideia curiosa? Um belo dia, você é admitido como membro de um grupo e, a partir daquela data, passa a tratar pessoas que você nunca viu na vida como Irmão. Não parece surreal e falso? Na melhor das hipóteses, forçado. Afinal, quem é aquele DeMolay Iniciado no Capítulo Abaeté, nº 583, ou no Capítulo Xanxerê, nº 469? Nos Congressos Regionais, Estaduais e Nacionais, dezenas e centenas de outros jovens que eu devo chamar de Irmãos? Não é um conceito estranho?

Este é o mistério dos Iniciados, o mistério que está além do véu e mesmo quem devassar nossos Rituais e observar nossas Cerimônias, sem contudo tomar parte de nossas reuniões, jamais será capaz de compreendê-lo. Os Maçons o conhecem, os Cavaleiros Templários o conhecem, os Pitagóricos o conhecem – e nós, os DeMolays, também o conhecemos.

O que nos liga nessa fraternidade indissolúvel são os juramentos que realizamos. Nós nos dedicamos aos mesmos ideais e seguimos as mesmas Virtudes. Nosso grande objetivo é sermos melhores e sabemos que, para isso, podemos contar com todos os nossos Irmãos – e eles sabem que podem contar conosco.

Como dissemos, esta não é uma exclusividade da Ordem DeMolay. Todas as organizações fraternais são assim. Aí está a grande dificuldade para entendê-las – e os homens temem aquilo que não compreendem, acovardam-se diante do terrível enigma “Decifra-me ou devoro-te” e recorrem à violência para não desnudarem seus corações.

As empresas e as corporações fazem longas pesquisas e traçam estratégias para conseguir com que seus funcionários “vistam a camisa”. Nós, seres humanos, temos vontade de sermos parte de algo maior do que nós mesmos. Queremos ser parte de algo grandioso, algo que vá além de nossas vidas breves, pois somos coisas frágeis.

O que os empresários falham em perceber é que seus empregados estão ali motivados por objetivos particulares; a grande meta é o salário, utilizado para diversos fins, a influência e o poder. Não há como vestir a camisa e se identificar plenamente quando não se tem tanto em comum, exceto frequentar o mesmo lugar. Até certo ponto, funciona – basta lembrar dos anos de escola e da rivalidade com outros colégios – mas, internamente, não existe coesão. Não existe fraternidade.

Por isso, dentro das Ordens fraternais, temos pessoas de todo tipo, de todo credo, de toda história e de todo pensamento. Somos cristãos e somos agnósticos, somos judeus e somos muçulmanos, somos espíritas e espiritualistas, somos petistas e psdbistas, somos esquerdistas, direitistas e centristas, somos apoiadores e condenadores do governo atual e do passado, somos ricos e somos pobres, somos negros, brancos, mulatos, somos muito novos e somos bastante velhos. Porque nós estamos unidos em torno de uma causa comum, uma chama [que se manifesta em sete, no caso dos DeMolays] que reconhecemos arder no íntimo dos nossos Irmãos.

O verdadeiro espírito de Companheirismo e de fraternidade é sublime e mesmo as discordâncias intelectuais e materiais são incapazes de fazer frente à ligação que nos une de modo permanente.

A Ordem DeMolay permanece ativa através das décadas porque ela não existe somente nos sábados e domingos em que seus membros se reúnem, mas se manifesta a cada instante que os DeMolays agem de acordo com seus princípios, na escola, na faculdade, em casa, com os amigos, com a namorada, com um estranho e com um Irmão. Nossas cerimônias não são palavras mortas no papel ou fórmulas vazias, posto que tomam vida nos nossos gestos, palavras e pensamentos.

Ser um DeMolay não é um privilégio que nos torna homens especiais ou superiores aos demais; na verdade, trata-se de uma dádiva, um presente de serviço porque o verdadeiro DeMolay trabalha para ser um homem melhor, sabendo que esta é a melhor maneira de fazer com que as luzes das Virtudes Cardeais brilhem diante dos homens, de modo que eles vejam nossos bons trabalhos e glorifiquem o Pai Celestial.

Hugo Lima

#Demolay #VirtudeCardeal

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/o-que-vos-liga-%C3%A0-fraternidade

[parte 4/7] Alquimia, Individuação e Ourobóros: A arte Alquímica

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“Tudo vai, tudo volta; eternamente gira a roda do ser. Tudo morre, tudo refloresce, eternamente transcorre o ano do ser. Tudo se desfaz, tudo é refeito; eternamente constrói-se a mesma casa do ser. Tudo se repara, tudo volta a se encontrar; eternamente fiel a si mesmo permanece o anel do ser. Em cada instante começa o ser; em torno de todo o “aqui” rola a bola “acolá”. O meio está em toda parte. Curvo é o caminho da eternidade.”

– Nietzsche

Alquimia

Esta é a quarta parte da série de sete artigos “Alquimia, Individuação e Ourobóros”, que é melhor compreendida se lida na ordem. Caso queira acompanhar desde o começo, leia as parte 1, 2 e 3.

No post anterior, vimos que, o arquétipo de Hermes, juntamente com o simbolismo do caduceu, serve como organizador e centralizador da psique, atuando no “caos primordial”, estruturando-o e elevando seu potencial. Este caos primordial é análogo ao conceito de prima matéria dos alquimistas. Ambos os conceitos se apresentam como uma fonte de energia desordenada, cuja harmonização permite a obtenção de um potencial incalculável.

“Nasce como uma ciência natural que busca a compreensão da própria natureza a partir de uma especulação filosófica, como se pode ver já na filosofia pré-socrática no século VI a C. É dela que nasce o conceito de prima matéria a partir da crença de que o mundo tinha origem em uma única substância que era subdividida nos quatro elementos terra, ar, fogo e água, os quais, segundo diferentes recomposições faziam surgir todos os objetos físicos existentes no universo. Esta idéia, a prima matéria, teve sua evolução chegando com Aristóteles a ser considerada como pura potencialidade, que em seguida adquire forma, quando é atualizada na realidade.” (SANTOS, 2013)

Para Jung (2008), a manipulação da prima matéria, correspondente aos aspectos inconscientes dissociados. O alquimista tem que realizar a Opus Alquimica, que corresponde ao processo de individuação, transformando seus conteúdos internos e os trazendo a luz da consciência. Esse processo acontece através de três (podem ser quatro) momentos alquímicos e psíquicos: nigredo, albedo, rubedo. Vale a pena frisar que as metáfora alquímicas compreendem um vasto simbolismo, que varia entre os alquimistas e pesquisadores, porém todos resultam no mesmo objetivo: a obtenção da pedra filosofal.

Dentro destes momentos, pode-se dividir a Opus em diferentes estágios, que variam dentro do arcabouço alquímico, mas que neste trabalho, será utilizado as definições de Hauck (1999), podendo ser resumidas em sete estágios de transformação: calcinação, dissolução, separação, conjunção, fermentação, destilação e coagulação.

Esta imagem mandálica é um clássico da alquimia medieval, ela foi primeiramente publicada em 1959 pelo alquimista alemão Basil Valentine, e representa o conceito de Azoth:

“Azoth era considerado como um remédio universal, ou solvente universal utilizado na alquimia. Seu símbolo era o caduceu; o termo, que foi originalmente um nome para uma fórmula oculta necessária para os alquimistas parecida com a pedra filosofal, se tornou uma palavra poética para o elemento mercúrio, o nome é proveniente do Latim Medieval, uma alteração de “azoc”, sendo originalmente derivado do árabe “al-zā’būq”, que significa “o mercúrio”.” [tradução livre] http://en.wikipedia.org/wiki/Azoth

Esta imagem irá nos guiar frente ao simbolismo utilizado na metáfora alquímica. No centro da imagem temos o homem, alquimista. A sua direita, um rei, princípio masculino, solar, a sua esquerda uma rainha, princípio feminino, lunar. A dicotomia já nos é evidente, sugerindo que a integração destes aspectos seriam necessários para atingir a Opus.

Podemos notar a presença dos quatro elementos, como manifestação quaternária do todo, associados à tipologia junguiana. Vemos na imagem, o pé direito do homem na terra, seu pé esquerdo na água, sua mão direta segurando uma tocha, associada ao fogo, e sua mão esquerda segurando uma pena, associada ao elemento ar. Há também os triângulos adjacentes a roda, representando a manifestação trina do corpo, alma e espírito.

Na parte superior da figura, é possível ver uma estranha figura alada, que pode ser associada com o disco solar egípcio ou o topo do caduceu de Hermes (Mercúrio), analisado anteriormente. Exstem uma série de simbolismos na imagem, como por exemplo o leão sob o rei, a salamandra em chamas e os pássaros da roda, porém seria necessário um outro post apenas para interpretá-los.

Por fim, temos a circular dos raios, associados com diferentes cores, que representam os estágios alquímicos. Estes estágios serão nosso foco daqui pra frente.

As etapas Alquímicas

O primeiro raio está associado à calcinação, ou calcinato, intrínseca ao elemento fogo. Para Hauck, esta etapa está psicologicamente associada a morte do ego e destruição dos mecanismos de defesa, a extinção do interesse no mundo material, e as respectivas ilusões associadas a este. Inicia-se o processo de enegrecimento, podemos citar como ilustração desta etapa, “escuro e nebuloso é o início de todas as coisas, mas não o seu fim”, frase de autor desconhecido.

Para Masan (2009), esta operação é realizada na Sombra, onde permanecem os desejos instintivos e não integrados. O fogo é está ligado com a frustração dos desejos, aspecto natural do processo de desenvolvimento associado ao Si-mesmo.

“Os aspectos do ego identificados com as energias transpessoais da psique (Self ou mesmo, o fogo Divino) e utilizados para fins pessoais, sejam de poder ou de prazer, serão calcinados. Quanto maior a dicotomia entre bem e mal, certo e errado, ou seja, quanto maior a polarização desses aspectos neuróticos, mais longa será a calcinação desses elementos, até que o fogo da própria culpa esvazia a balança do julgamento por essa imagem punitiva e compensatória, representada pela ira divina, enquanto imagem arquetípica constelada no psiquismo”(MASSAN, 2009, 26).

O segundo raio está associado com a etapa de dissolução, ou solutio, representada pelo elemento água. Psicologicamente dizendo, está atrelada com a quebra das estruturas artificiais da psique, através da imersão no inconsciente, ou das partes irracionais e rejeitadas. O elemento água como uma abertura das comportas, e inundação de energias pessoais antes cristalizadas, dissolução de aspectos fixos da personalidade.

“A operação apresenta, no aspecto negativo e sombrio, um sentido de dissolução da matéria diferenciada ou conteúdo do ego […]. Por outro lado, em seus aspectos superiores, onde ocorre à transposição de opostos, consolida-se o espírito, ou seja, os aspectos transpessoais da pisque objetiva, o Si-mesmo. É o encontro com o Numinoso, que reestabelece a saúde da relação ego-Self, salvando apenas o que vale ser salvo, os conteúdos realmente alinhados com o Si-mesmo, e redimindo os conteúdos comprometidos, derretendo-os ou reordenando-os em novas estruturas”.(MASAN, 2009, 14)

O terceiro raio diz respeito à separação, ou separatio. É o momento de captar tudo aquilo que sobrou das etapas anteriores e selecionar. É recuperar a energia congelada dos hábitos e pensamentos cristalizados (pré-conceitos, crenças, fobias). Refere-se à essência e energia separada das amarras da matéria. Esta psicologicamente associada à escolha dos aspectos dissolvidos anteriormente, desapegando daquilo que não mais apresenta valor psíquico, explicitando a essência e valores espirituais, portanto, associado ao elemento ar.

“Surge aí à necessidade de dissecar esses conteúdos do inconsciente pessoal e coletivo e realizar a escolha, a separatio, trazendo a consciência, através do ato de julgar, uma vinculação com o Self. Isso requer um poder para arcar com o ônus dessa escolha, uma desvinculação da necessidade de atender aos critérios do outro, mas sim de ser fiel àquilo para o que aponta o Si-mesmo, da mesma forma como não se pode servir a dois senhores, só que sem o domínio neurótico da unilateridade” (MASAN, 2009, 25).

A conjunção, ou coniunctio, é análoga ao quarto raio da figura. Conjunção é a grande guinada do opus alquímico. Notemos que na figura, através do movimento circular, existe o deslocamento das forças da alma (na direita), para o espírito (na esquerda). Em nível pessoal, a conjunção é o fortalecimento do nosso verdadeiro Self, a união dos aspectos masculinos e femininos de nossa personalidade em um novo sistema psíquico. Esta etapa corresponde à ‘pequena pedra’, ou o primeiro esboço do que seria a pedra filosofal atingida no final da operação.

“Conjunção pode ser vista com a criação de um self superior e a conquista do que Carl Jung nomeou de individuação, no qual o self fragmentado é reunido à um todo original. A criação desta pessoa completa e harmoniosa significa que atingimos nosso máximo no plano terrestre”. (HACUK, 1999, 162)

Associada então com o elemento terra, a conjunção pode ser divida em duas sub-etapas, segundo Masan: coniunctio inferior e superior. Na primeira, a união dos opostos separados de forma imperfeita, resulta em algo que deverá ser submetido a novos procedimentos.

Masan define que a coniunctio inferior acontecerá sempre que o ego identificar aspectos inconscientes, como a sombra, anima, ou mesmo o Si-mesmo (Self), através de uma perspectiva introvertida ou coletiva. Essa identificação deve ser ‘purificada’, ou seja, eliminada, redimida, para dar continuidade ao processo de individuação. A coniunctio superior representa a conjunção mor dos aspectos previamente impossíveis de serem integrados. Após passar pelos estágios anteriores da Opus, a prima matéria pode finalmente ter seus opostos complementados.

“Assim como na alquimia, a psique, dentro do processo analítico, vai transformando-se, ora dispondo-se num lado e ora de outro, no sentido das suas polaridades, até que lhe seja capaz a absorção de uma terceira figura, gradativa e construída, surgida de dentro da sua própria alma que lhe traduz essa expressão de convivência com o dual. A dissolução do conflito, gerado pelas dicotomias neuróticas, concebe o cenário onde essa pedra, em cujo seio se fixa o espírito, se manifesta. […] O casamento Divino, que somente existirá se ali houver o Amor, sua causa e seu efeito.

Enquanto na coniunctio inferior o amor é concupiscente, aqui, na coniunctio superior, esse amor é transpessoal. Revela-se no mundo como o altruísmo em seu sentido extrovertido e na psique, como a conexão com o Si-mesmo, gerando a unidade” (MASSAN, 2009, 34).

Masan apresenta o Amor como uma das chaves para a integração psicológica dos opostos. Seria insensato pensar em amor se associá-lo com o coração. A simbologia do coração é estudada no livro “A Psique do Coração”, de Denise Ramos. A autora apresenta mitos e imagens de culturas americanas que tinham como centro o coração, sendo ele, em quase todas as histórias um ícone do sagrado ou oferecido ao sagrado.

No capítulo “Elegias Para Acalmar o Coração”, é somado às ideias de rezas para ‘abrir’ o coração e permitir o esvaziamento do sofrimento com o preenchimento de Deus. No capítulo “O Coração em Julgamento” é recapitulado toda a simbologia do coração no antigo Egito, como este sendo um exemplar da alma do indivíduo.

Ainda nesse mito egípcio, ao morrer, o coração era pesado numa balança, onde na contraparte ficava a pena de Maat. Neste julgamento especial, se o coração fosse mais pesado que a pena, ou seja, estivesse carregado das impurezas do ego, não era permitido ao falecido integrar-se a completude.

No sub-capítulo “O Lugar Secreto” é destacado o valor simbólico do coração na tradição hindu, e como o coração está associado nestas culturas como o ‘lugar da consciência”, sendo o Self em si, o lugar que o homem emana a si mesmo, um guia de luz.

Ainda segundo a autora, Anãhata é a representação do chakra cardíaco no Tantra Yoga, que une os chakras superiores com os inferiores, o Tantra Yoga tem como objetivo alinhar e equilibrar as polaridades masculinas e femininas. Tal equilíbrio acontece no coração, e quando acontece, o praticante da técnica consegue ouvir o som ‘hum’ (ॐ), do vazio, que emana por todo o tempo e espaço.

Essas informações aparecem no sub-capítulo “O Lugar do Som Universal”. Uma frase que pode exemplificar o amor como via de integração das polaridades é a de Nietzsche: “Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal”.

Hauck (1999) sincretiza o processo alquímico da conjunção da seguinte forma: “Psicologicamente, Conjunção é usar a energia sexual dos corpos para transformação pessoal. Conjunção se ocupa no corpo no nível do coração”

A próxima figura, é uma foto tirada no dia 06/06/2013 no Elevado Presidente Costa e Silva, São Paulo, conhecido também como “Minhocão”:

É possível perceber inúmeras analogias com os temas tratados neste trabalho. A expressão artística urbana expressando a angústia de uma sociedade doente, cindida. Amor e Ourobóros como resoluções arquetípicas coletivas. Apesar de toda a fertilidade do tema social em questão, voltemos a descrição das etapas alquímicas.

Podemos perceber, portanto, que apesar de todo o processo alquímico estar intimamente ligado ao processo de individuação, a etapa de Conjunção é a que representa o ápice do processo, que é a integração dos aspectos complementares.

A quinta etapa do processo alquímico descrito por Hauck, observado na imagem é a fermentação. É a introdução de uma nova perspectiva de vida, resultado da etapa anterior – Conjunção – que é a ascensão para um novo estado de consciência, a transição para um estado mental elevado. Nesta etapa, existe a transição da nigredo para a leukosis, resultando no aparecimento da cauda pavonis, metáfora para imaginação ativa e ‘coloração da vida’, alguns autores definem esse amarelamento (leukosis) e o aparecimento da “cauda pavonis” como uma quarta etapa, entre o nigredo e albedo, enquanto outros, definem apenas como um aspecto transitório entre estas duas etapas. Representa psicologicamente a transição da psique para um estado mais conectado com o espírito, ou na nomenclatura junguiana, Si-mesmo (Self).

O penúltimo raio é análogo à etapa de destilação, ou destilatio. Neste estágio a metáfora que se apresenta é o aumento da pureza, associado com a cor branca, ou albedo. Psicologicamente, representa o esforço para que as impurezas do ego e do id não sejam incorporadas no último estágio. Representa a eliminação dos sentimentalismos e emoções, ou ainda melhor, das paixões egoístas e infantis, aspectos que na manifestação do verdadeiro Self, não são pertinentes, uma vez que se procura um estado pleno de espiritualidade.

“Seus pensamentos e sentimentos são os sentimentos e pensamentos do Universo inteiro”, Esta declaração descreve o processo de destilação, onde [o alquimista] se tornou muito mais interessado no bem maior do que apenas em seu próprio. É a fase de transformação onde estamos espiritualmente e emocionalmente maduros o suficiente para fundir-nos com o inconsciente coletivo sem sermos devastados pelo o que encontramos lá. A razão pela qual nós podemos manter o nosso equilíbrio, depois de ter chegado à fase de destilação é que o ego não nos controla e, portanto, podemos apreciar os mistérios do coletivo – e pessoal – material da sombra, sem a intromissão do ego.

Destilação traz o criativo fora de nós. Ela incentiva tudo o que somos se manifestar em formas equilibradas e serenamente poderosas. Ele anuncia a entrada da influência das forças superiores e do equilíbrio dessas forças com os inferiores, que fornecem firmeza, tão crucial para a totalidade” (SHANDERÁ, 2002).

O sétimo e último estágio é chamado de coagulação, ou coagulatio. Representa a ressurreição do espírito, materializado no corpo.

“A Coagulatio é uma operação que expressa, pelas suas imagens, o processo de formação do ego e sua ligação com os aspectos da vida, as forças ctônicas, através da vivência da carnalidade no seu sentido mais amplo, construindo, pelas experiências, a terra onde se lastreia o ego em seu caminhar e, logicamente, configurando, por essas mesmas vivências, a relação do eixo Ego-Self” (MASSAN, 2009, 34)

É a representação da pedra filosofal, ou Grande Pedra, antes anunciada pela coniunctio. O alquimista adentra o estágio de rubedo, e pode “curar-se de todas as feridas e enfermidades” (HAUCK, 1999, 140). Esta etapa é utilização da libido dentro de sua forma plena, integrada com a impulsão da consciência para os estados mais elevados do vir-a-ser.

“Vale ressaltar que o desejo é o agente da coagulatio. Esta operação é necessária não para aqueles que já se movimentam adequadamente dentro de sua libido, mas para aqueles outros com uma inconsistência em seu querer e o temor de colocar os pés na vida, com dificuldade, inclusive de sorver os cálices que ela dispõe. O desenvolvimento do ego nestes casos passa pelo lugar dessa consciência e realização do desejo, a fim de que haja a movimentação da energia psíquica” (MASSAM, 2009, 22).

Neste estágio, para Hamilton (1985), é manifestada, no alquimista a vontade de encarnar na terra o estado de consciência iluminado na mente e no corpo. É como se uma alma desejasse ser ‘encorpada’ sem o senso de separação do seu estado puro original. Só quando a alma está encarnada na psique que pode ser vivenciado o estado espiritual de completude. A psique pode agora expressar as qualidades da alma e da natureza. A frase “assim na terra como no céu” ilustra com perfeição este estado.

“Esta união do espírito / alma com o corpo / mente representa o final e mais importante casamento alquímico. Agora a anima torna-se a Mãe de Deus, ou a Consorte de Deus, o objeto do amor místico. As figuras de animus correspondentes são Os Iluminados – Cristo, Buda, Santos, etc. Isto significa que a consciência de Deus, ao nascer no mundo da terra, percebe sua natureza divina conscientemente – como um indivíduo transcendental e iluminado, num estado de unidade com o todo cósmico. Isso, então, é a pedra filosofal que o alquimista procurava. É o grande ponto culminante da Grande Obra” (HAMILTON, 1985, 8).

Ainda para o autor, o equivalente terapêutico é fácil de ser percebido, uma vez que o paciente transcendeu a natureza de seus dilemas e conflitos, e isso envolve uma mudança de personalidade que vai acomodar e manter essa realização. O paciente percebe que sua vida tem sido uma imposição que resultou numa série de problemas, e agora inicia um processo de mudança para uma sustentação mais pertinente a sua verdadeira natureza.

Hauck (1999) define que, ao atingir este estágio, o raio de transformação se volta a terra, e é iniciado novamente o ciclo previamente proposto, indicando que os estágios e transformações são processos eternos e constantes, assim como a lapidação do Self, ou o processo de individuação proposto por Jung, fazendo com que o alquimista volte à etapa de nigredo, e continue seu processo.

“Tudo o que coagula está sujeito a transformar-se. Dai decorre que após a coagulatio, os processos de putrefactio e mortificatio se realizam também, até porque, o fim da encarnação é o desencarne, visto que está sujeito às injunções do tempo e do espaço” (MASSAN, 2009, 27).

Percebemos que o processo alquímico é cíclico, e, assim como o processo de individuação, exige um constante processo de atuação do indivíduo para com seus conteúdos, processo este que Jung define acontecer por toda a vida.

A mesma metáfora pode ser utilizada para definir o Ourobóros, um processo cíclico e constante, que representa a integração de opostos e a volta para a unidade. No capítulo seguinte iremos analisar a figura arquetípica do Ourobóros e avaliar suas correspondências com o processo alquímico e o de individuação.

Referências Bibliográficas:

HAMILTON, Nigel. The Alchemical Process of Transformation. Disponível em: http://www.sufismus.ch/assets/files/omega_dream/alchemy_e.pdf. 14/05/2013

HAUCK, Dennis Willian. The Emerald Tablet: Alchemy for Personal Transformation. Arkana. Ed.Pengun Group. 1999.

MASSAN, Francisco. Opus Alquímica e Psicoterapia. Disponível em: www.clinicapsique.com/doc/opus.doc. 14/05/2013

RAMOS, Denise Gimenez. A Psique do Coração: Uma Leitura Analítica de seu Simbolismo. São Paulo. Cultrix. 1990.

SANTOS, Vitor P. Calixto. Jung e a Metáfora Alquímica. Disponível em http://www.symbolon.com.br/artigos/jungeameta.htm. 14/05/2013

SHANDERÁ, Nanci. The Alchemy in Spiritual Progress – Part 7: Distillation. Disponível em: http://alchemylab.com/AJ3-1.htm. 14/05/2013

Imagens:

“Nigredo, Albedo e Rubedo” de Thomas Norton em ‘Ordinal of Alchemy’, 1477

“Azoth” de Basil Valentine

“Calcinato Angelus” de Suanne Iles

Trecho do filme “Elena” de Petra Costa, 2013

“Artodyssey” de Tomasz Alen Kopera

A interação das polaridades (sol e lua). “Rosarium Philosophorum”, Séc XVI

Andrógino, representando a natureza dual. “Rosarium Philosophorum”, Séc XVI

“Heart Chakra” de Ormus Oils

Coração e pena na balança em hieróglifo egípcio

“Mais amor por favor” (ygormarotta.com/mais-amor-por-favor)

Pavão em tecido

Gravura representando a destilação, capa do livro “O Museu Hermético” de Alexander Robb

“Aquamarine Muse” de Philip Rubinov Jacobson

A natureza de Buddha

Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br

#Alquimia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/parte-4-7-alquimia-individua%C3%A7%C3%A3o-e-ourob%C3%B3ros-a-arte-alqu%C3%ADmica

Entrevistas e Palestras de Julho/2020

Bate-Papo Mayhem #037 – Com Khaled Hammoud – A História do Islamismo.
https://youtu.be/tagBCzZUAro

Bate-Papo Mayhem #038 – Com Alfonso Odriozola – A História da Umbanda Sagrada
https://youtu.be/_oZ1dxSi2Yc

Bate-Papo Mayhem #039 – Com frater Goya – O Tarot de Thoth
https://youtu.be/YxNJ8nqSvx8

Bate-Papo Mayhem #040 – Com Rodrigo Vignoli – Magia do Caos, Servidores e ABRALAS
https://youtu.be/CPmB-qmR7d4

Bate-Papo Mayhem #041 – Com Marcelo Costa Menezes – Os Arcanos Maiores e a Jornada do Ser
https://youtu.be/Algn3mvLlEg

Bate-Papo Mayhem #042 – Com Gilberto Antonio Silva – O Taoísmo: unindo o visível e o invisível
https://youtu.be/aYVXKxbGfmY

Bate-Papo Mayhem #043 – Com Felipe Cazelli – Mito e Sagrado nas Historias em Quadrinhos – O aspecto religioso dos Super-herois
https://youtu.be/sIIt094ppKQ

Bate-Papo Mayhem #044 – Com Marcia Seabra Novello – Magia Sexual e o Tarot de Thoth
https://youtu.be/yasgmTFJfwI

Bate-Papo Mayhem #045 – Com Elizabeth Nakata – Básicos da Astrologia: Planetas, Signos e Casas
https://youtu.be/YviDWsHg6t8

Bate-Papo Mayhem #046 – Com Hugo Ramirez – Iniciação, Hermetismo e Ritualística na Ordem Demolay
https://youtu.be/tlVMt0A6-rM

Bate-Papo Mayhem #047 – Com Deborah Jazzini – Os Arcanos Menores do Tarot
https://youtu.be/EpSBbe0OxzE

Bate-Papo Mayhem #048 – Com Marcos Keller – Servidores, Entidades Astrais, Devas e Deuses.
https://youtu.be/Lo36JIx0-SQ

#Batepapo

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/entrevistas-e-palestras-de-julho-2020

O campo além das ideias

Caminhando junto ao poente numa das regiões mais inóspitas do planeta, as margens do grande Kalahari, deserto ao sul da África, Pedro se impressiona com os hábitos de seus companheiros (além do guia turístico, é claro): os bushmen, ou povo san, caçadores-coletores que vivem em torno dos poucos poços d’água subterrânea na região há dezenas, quiçá centenas de milhares de anos.

“É interessante como a gente anda neste lugar e é incapaz de observar o que eles observam. Eles veem cada planta, fruta, cada detalhe da paisagem com outro olhar, pois isso tudo faz parte da sua sobrevivência” – conclui Pedro, ou Pedro Andrade, jornalista apresentador do programa Pedro Pelo Mundo, do canal de TV a cabo GNT. Neste episódio ele decidiu retornar a Botswana, antigo protetorado britânico que, após adquirir sua independência em 1966, multiplicou seu PIB per capta em dezenas de vezes e se encaminha para a prosperidade sem ter passado por guerra civil ou períodos ditatoriais, algo extremamente incomum para um país africano.

Mas a grande característica de Botswana é precisamente estar tão isolado do resto do mundo que, por algum milagre, o povo san pôde viver relativamente intocado até os dias atuais, preservando uma cultura e estilo de vida arcaicos, o que também pôde ser comprovado pela ciência. Segundo estudos modernos, os san possuem um dos mais elevados graus de diversidade do DNA mitocondrial dentre todas as populações humanas, o que indica que eles são uma das mais antigas comunidades do globo. O seu cromossomo Y também sugere que, do ponto de vista evolucionário, os san se encontram muito perto da “raiz” da espécie humana (homo sapiens).

No fim da noite, Pedro participa como observador dos rituais e cânticos dos san. Em torno de uma pequena fogueira, as mulheres cantam e batem palmas sentadas, e os homens dançam enfileirados em círculo. Mas não é só isso: após entrarem em transe, alguns dos xamãs [1] san incorporam seus próprios antepassados e entidades da natureza. Até mesmo o guia turístico, um branco ocidental que se apaixonou pela região e pelos san, pratica a incorporação para virar ele mesmo um xamã entre o povo ancestral. Afinal, os san são antigos o suficiente para saber que, sejamos brancos ou negros, todos somos um mesmo povo, todos saímos dali, ou de bem perto dali, há centenas de milhares de anos, para povoar o resto do planeta.

Alguma coisa antiga e profunda tocou Pedro nesta viagem, e principalmente neste breve contato com os san. É isto pelo menos que ele próprio confessa ao fim do episódio, muito embora “não saiba explicar ao certo o que é exatamente”. Decerto, o mesmo deve ocorrer com muitos ditos civilizados que têm a oportunidade de realizar este tipo de contato. Seria inútil perguntar ao próprio guia turístico e aprendiz de xamã o que é que o fez trocar a vida ocidental pela vida como guia turístico no Kalahari. Há alguma coisa de transcendente nos san, alguma alma ancestral que, de muitas formas, é também a nossa alma.

E decerto de nada adiantaria escrever um tratado sobre o assunto. Ainda que os san aprendessem inglês ou português, jamais seriam capazes de colocar em palavras as experiências místicas que, de tão constantes, quase diárias, são praticamente o seu dia a dia. Os san vivem até hoje noutro mundo, o mesmo mundo que toda a nossa espécie viveu um dia, mas que vem sendo gradativamente esquecido. Neste mundo, não faz sentido se falar em mundo material e espiritual, em vivos e mortos, em coisas sagradas: no dia a dia dos san, o material e o espiritual são basicamente uma coisa só, os vivos e os mortos jamais deixaram de se comunicar, e não há nada, absolutamente nada, que não seja sagrado.

E, como as palavras por si só são inúteis, precisamos recorrer à poesia. Como bem resumiu o poeta persa Jalal ud-Din Rumi: “Além das ideias de certo e errado há um campo, eu lhe encontrarei lá. Quando a alma se deixa naquela grama, o mundo está preenchido demais para que falemos dele. Ideias, linguagem, e mesmo a frase cada um já não fazem mais nenhum sentido”.

Para boa parte do planeta, os san são um povo selvagem que permaneceu atrasado e perdido nalgum deserto africano. Para os san, ou para os seus espíritos ancestrais, o restante do planeta é nada mais do que a família que resolveu ir caminhar para as regiões mais afastadas, até que se esqueceu de retornar. E, segundo a ciência moderna, são os san quem estão com a razão [2]. Dá o que pensar.

É costume do Ocidente avaliar a “evolução” de um povo ou civilização pela sua capacidade filosófica e científica, em suma, pela sua racionalidade. No campo espiritual, porém, as coisas são um tanto mais complexas de se julgar. O povo san, por exemplo, não pratica canibalismo, não faz sacrifícios de sangue aos deuses, não devasta o seu meio ambiente de forma predatória. Um teólogo de certo renome poderá dizer: “Ok, tudo bem, mas eles são incapazes de reconhecer um Deus único”… Mas, será que isso é algum parâmetro razoável para determinar sua “evolução espiritual”?

Há muitos reinados milenares do continente africano que veneravam os chamados orixás, que são basicamente os correspondentes dos deuses das mitologias gregas ou egípcias, e possivelmente até mais antigos. No entanto, entre diversos mitos de Criação africanos, temos um “Ser Supremo quem criou os orixás e os homens”, e seu nome é Olorum. Ao contrário dos demais orixás, Olorum não possui nem culto direto nem templo individual, além é claro de não receber oferendas, sejam de animais ou frutas ou o que for, já que Olorum “já é tudo”. Ora, muito embora seja complexo associar Olorum diretamente com Javé ou Allah, fica muito claro que, no fundo, a religião dos orixás também é, e sempre foi, monoteísta. Portanto, os africanos antigos já conheciam um Deus Criador único, e isso não foi invenção exclusiva dos povos do Oriente Médio.

Claro que nem todos os povos africanos ao longo dos últimos milênios chegaram à mesma profundidade de compreensão espiritual. Mas nós ocidentais não podemos nos gabar de estarmos muito na frente deles. Até pouco tempo atrás, nossas doutrinas mais elaboradas ainda aceitavam, na prática, que escravos não tinham alma, e que precisavam ser batizados para conseguirem sua entrada no Céu. Foi assim que muitos ditos cristãos arrancaram milhões de africanos a força de suas casas e, através de grilhões e açoites, os trouxeram para trabalhar na América. Trabalho não assalariado, evidentemente.

Nem mesmo seus nomes eles puderam trazer na bagagem. Chegando ao Novo Mundo, eram batizados com nomes como Joaquim de Jesus ou Maria de Fátima. Mas, ainda que os nomes tenham se perdido, seus espíritos ancestrais jamais lhe abandonaram. Foi assim que, no Brasil, o maior país negro do mundo, surgiu o samba, o Candomblé, a Umbanda etc. Os sobrinhos dos san perderam suas casas e seus nomes, mas os orixás persistiram, afinal aqui eles também estavam dentro de Olorum. Não há nada “lá fora”.

E, apesar dos grilhões, dos açoites e do preconceito que surge da ignorância persistente dos ditos civilizados, lá naquele campo onde vivem os poetas e os místicos, lá, além das ideias de certo e errado, lá, onde habitam os deuses e dançam os xamãs, eles nos perdoaram, eles nos aceitaram de volta, de braços abertos, de alma aberta.

E, aqueles que, como Pedro, estiveram por lá, ainda que por pouco tempo, ainda que por uma noitinha só, compreenderam: a África é todo o mundo!

***
[1] O termo “xamã” se originou do estudo dos povos indígenas da Sibéria, mas na realidade se aplica para povos ancestrais em todo o mundo. No Brasil, por exemplo, um xamã pode ser conhecido como pajé.
[2] Há diversas teorias para as origens da humanidade, mas o mais aceito atualmente é que nossa espécie surgiu na África e depois migrou para o resto do globo. Em todo caso, ainda que tenha surgido no mesmo período na Europa, teria a pele tão negra quanto à dos africanos, visto que a mutação que possibilitou a pele branca é relativamente recente, de cerca de 8.000 anos atrás (portanto mais nova que o próprio povo san).

Crédito da imagem: Google Image Search/Latinstock (povo san)

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#Ciência #história #xamanismo

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/o-campo-al%C3%A9m-das-ideias

A guerra dos 50 anos

» Parte 2 da série “Intoxicados” ver parte 1

Parece cocaína, mas é só tristeza… Muitos temores nascem do cansaço e da solidão; Descompasso, desperdício – herdeiros são agora da virtude que perdemos… (Legião Urbana)

Se você quer afastar seu filho, filha, ou algum familiar querido, ou amigo, das drogas, fará bem em começar por desiludi-los da lenda de que as drogas fazem sempre mal… Não é verdade, obviamente: se fosse assim, na primeira dose de cachaça um adolescente iria cuspir aquele terrível gosto amargo no chão e nunca mais pensaria em beber novamente. Porém, se esta fosse à regra, não haveriam bebidas alcoólicas sendo vendidas quase como água pelo mundo afora. Pode ser amargo no início, mas depois fica doce, e depois, se exagerarmos na dose, fica amargo de novo; Só que uma amargura muito mais triste – a amargura que anestesia a alma.

Outras drogas podem ser doces desde a primeira dose, gerando “grandes viagens psíquicas” que já chegaram até a inspirar alguns grandes artistas, contanto que sejam usadas com parcimônia – o que raramente é o caso. Você pode subir no pedestal da moralidade e avisar aos desavisados: “Tomem muito cuidado, pois o caminho das drogas é doce somente no início, depois provoca grande tristeza!” – Mas, devemos considerar que há alguns seres civilizados e cultos da pós-modernidade, assim como muitos miseráveis e oprimidos, que, de uma forma ou de outra, constataram que na vida só existe tristeza – Se pelo menos nas drogas conseguem um pouco de doçura aqui e ali, ainda estarão saindo no lucro… São essas tais máquinas tristes, com tendências suicidas, que não veem nenhum problema em se suicidar aos poucos, uma bala, uma cheirada, uma seringa de cada vez.

O vício em drogas produz verdadeiros zumbis psíquicos, incapazes de sentir quase nada de realmente profundo (ou seja, capaz de lhes tocar a alma) no transcorrer de sua fase viciada. Pode parecer terrível, mas ainda assim conseguem o que queriam desde o princípio: não sentir mais aquela melancolia, aquela angústia de terem de cuidar das próprias almas… Ainda que assim também se abstenham de sentir felicidade, está tudo bem: podem então “viajar” nas drogas, até que sua viagem pela vida, uma viagem que não veem muito sentido de ser, em todo caso, finalmente chegue ao fim.

Porém, o mais incrível em toda essa história é o fato de que alguns dos maiores governos do mundo, influenciados ou não pelas grandes doutrinas religiosas, acreditem até hoje que a repressão é o melhor caminho para se resolver o problema, deixando o tratamento dos zumbis em (décimo) segundo plano, como que se eles fossem efetivamente zumbis, e não mais seres; Não mais pessoas em busca de alguma doçura real nessa vida; Não mais almas atormentadas, mas que podem ainda ser curadas.

A chamada lei seca total entrou em vigor nos EUA em 1920, promulgada durante o segundo mandato de Woodrow Wilson. Seu cumprimento foi amplamente burlado pelo contrabando e fabricação clandestina de bebidas alcoólicas. A lei seca foi abolida em 1933, já no primeiro mandato de Roosevelt. Permaneceu ativa por quase 14 anos… Enquanto esteve efetiva, veio contribuir para o aumento das fortunas de vários mafiosos, dos quais o mais conhecido é, sem dúvida, Al Capone. A sua revogação veio ajudar a débil recuperação econômica (devido ao “crash” da Bolsa em 1929), mas essencialmente contribuiu para o final do período de ouro da máfia norte-americana. Esta década e meia de proibição do álcool em uma sociedade capitalista – e que preza a liberdade – nos ensinou muito acerca da natureza humana, e de sua propensão para a ilegalidade e violência, se for o caso, para conseguir chegar aos seus objetos de desejo ou, pelo menos, aos seus anestesiadores de almas…

No Corão (5:91) é dito que “Satã apenas deseja suscitar a inimizade e o ódio entre vós com intoxicantes e jogo, e impedir-vos de lembrardes de Alá e da prece. Sendo assim, não ireis vos abster?”; Não chega a ser uma proibição cabal, mas uma espécie de aconselhamento… Mesmo assim, ainda que as bebidas alcoólicas tenham sido largamente consumidas no mundo islâmico (e principalmente no período de ouro do Islã, em Al-Andalus), ainda hoje há inúmeros países islâmicos que punem o tráfico de entorpecentes mais pesados, como cocaína e heroína, com a pena de morte. Aparentemente funciona: com a pena de morte em estados totalitários, o tráfico de drogas ilegais é quase nulo nos países do Islã. A questão é que não apenas os traficantes são punidos e perseguidos, mas também os usuários. Aqui está a solução: matar todos os zumbis (que, em todo caso, já buscam a morte)… E então estaremos supostamente seguindo o desejo de algum deus estranho. Para os islâmicos, parece ter resolvido, ou pelo menos enquanto mantém sua população sob o jugo totalitário de seus estados teocráticos. Até que venham as primaveras árabes.

Mas, estranho de se pensar, a grande diversão dos bares islâmicos é fumar narguilé enquanto conversamos com os amigos… Lá, na terra onde quase todos os entorpecentes são proibidos, fuma-se tabaco (e outras especiarias) com essa espécie de cachimbo d’água, à vontade… Então, talvez nem lá, nem lá a questão esteja totalmente resolvida. Hoje a ciência sabe que o tabaco é bem mais prejudicial à saúde do que, por exemplo, a cannabis, entretanto a cannabis é ilegal em quase todo mundo, e a grande fonte de renda dos traficantes de drogas ilegais, enquanto que o tabaco é perfeitamente aceito (com algumas ressalvas) em todo o mundo, inclusive no islâmico…

Segundo a AVAAZ, nos últimos 50 anos as políticas atuais de combate às drogas falharam em toda a América Latina, mas o debate público está estagnado no lodo do medo, da corrupção e da falta de informação. Todos, até o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, que é responsável por reforçar essa abordagem, concordam – organizar militares e polícia para queimar plantações de drogas em fazendas, caçar traficantes, e aprisionar pequenos traficantes e usuários – tem sido completamente improdutivo. E ao custo de muitas vidas humanas – do Brasil ao México, e aos Estados Unidos [1], o negócio ilegal de drogas está destruindo nossos países, enquanto as mortes por overdose continuam a subir.

Enquanto isso, países com uma política menos severa – como Suíça, Portugal, Holanda e Austrália – não assistiram à explosão no uso de drogas que os proponentes da guerra às drogas predisseram. Ao invés disso, eles assistiram à redução significativa em crimes relacionados a drogas, e são capazes de focar de modo direto na destruição de impérios criminosos.

Lobbies poderosos impedem o caminho da mudança, inclusive militares, polícias e departamentos prisionais cujos orçamentos estão em jogo. E políticos de toda nossa região temem ser abandonados por seus eleitores se apoiarem abordagens alternativas. Mas pesquisas de opinião mostram que cidadãos de todo o mundo sabem que a abordagem atual é uma catástrofe.

Parece complexo, mas pode ser simples como uma partida de futebol: em time que esta ganhando não se mexe, mas em time que está perdendo ou, no máximo, amargando um empate em 0 a 0 ou 1 a 1, devemos pensar em mudanças, nem que sejam provisórias, nem que sejam apenas para que ganhemos o primeiro jogo deste longo campeonato… Se pararmos de dar murro em prego nos próximos anos, a guerra de 50 anos do combate às drogas no mundo ocidental poderá ficar conhecida por nossa história como a primeira tentativa, mas que não deu certo, e nos levou as próximas. Mas, se não pararmos para reavaliar a situação, poderemos chegar a um século de guerra inútil, com máquinas tristes cada vez mais tristes, grandes cidades cada vez mais violentas, playboys cada vez mais alienados, e zumbis cada vez mais aterrorizantes… Para um filme de horror, não está nada mal.

Nós pedimos que vocês acabem com a guerra às drogas e o regime de proibição, e movam-se em direção a um sistema baseado em descriminalização, regulamentação, saúde pública e educação. Essa política de 50 anos falhou, abastece o crime organizado violento, devasta vidas e está custando bilhões. É hora de uma abordagem humana e efetiva (AVAAZ; Manifesto endereçado a ONU, que neste momento conta com mais de 650 mil assinaturas online).

» Na continuação – um passeio pelo Inferno.

***
[1] Recentemente, até mesmo os EUA, o país que iniciou a malfadada “guerra as drogas”, se rendeu a política de legalização da maconha, a grande responsável pelos lucros dos traficantes (em alguns países, chega a representar 80% do mercado):

“Por muito tempo – décadas – outros países corretamente entenderam que seriam criticados pelos EUA se tomassem medidas para liberalizar as suas leis. Mas no caso do Uruguai, os EUA se deram conta de que não estão na posição de criticar abertamente o governo uruguaio, e de fato não criticaram.”

– trecho de artigo da BBC Brasil

***

» Veja também o post Intoxicados: o fim da guerra, que complementa esta parte da série.

Crédito da foto: Mauricio Abreu/JAI/Corbis

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#Islamismo #Drogas #Medicina #política #Economia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/a-guerra-dos-50-anos

Magia Sexualis de P.B. Randolph

Por Spartakus FreeMann

Nós nos propomos aqui através destas poucas linhas, traçar a vida e ensinamento de um dos principais iniciadores da Magia Sexual. Pascal Beverly Randolph, um homem do século XIX, ousará escrever e publicar livros que tratam da sexualidade e especialmente da magia sexual dentro de uma nação e de um século ainda muito puritanos.

Conteúdo:

P.B. Randolph

Pascal Beverly Randolph nasceu em 8 de outubro de 1825 em Nova York, ele era filho de uma mãe mestiça – de origem franco-malgaxe – Flora Beverly, e de um pai médico, Edmund Randolph. O casamento não duraria e Flora teve que criar o seu filho sozinha. Com a sua morte, ele seria criado por uma meia-irmã que iria negligenciar a sua educação e o deixaria por sua própria conta.

Por volta dos 15 anos, ele saiu de casa para se juntar à marinha. Ele viaja todos os oceanos em poucos anos. Ele forma o seu caráter através de vários contatos com marinheiros de diferentes origens e nações.

Aos 20 anos, Randolph sofre um acidente que o obrigou a deixar a marinha. Começou então a estudar medicina. Ao mesmo tempo, na atmosfera do nascente espiritualismo das irmãs Fox, Randolph começa se interessar pelo magnetismo de Mesmer, cujas reflexões sobre a polaridade animal teriam impacto nas suas próprias teorias sobre condensadores fluídicos e votos.

Em 1850, casou-se com uma índia chamada Mary Jane e ao mesmo tempo foi iniciado na Hermetic Brotherhood of Luxor, a Irmandade Hermética de Luxor, (então chefiada por Peter Davidson). Em 1855, vai para a Alemanha, onde entra em contato com a Fraternidade Rosae Crucis, na qual logo seria iniciado. Parece que não há nenhum documento conhecido sobre esta iniciação. Só se pode adivinhar a data exata e a cerimônia em si. No entanto, de acordo com Clymer, um dos sucessores de Randolph, ninguém poderia atingir o grau de Filósofo Iniciado dentro da F.R.C sem ter sido previamente recebido em uma Cúpula e ter sido reconhecido como Neófito lá e colocado sob a orientação e a instrução de um mestre. Diz-se que Randolph se tornou Supremo Grão-Mestre da Suprema Grande Cúpula na América em 1858.

Randolph passaria alguns meses em Paris em 1854, durante os quais conheceria Eliphas Levi, um dos maiores ocultistas de seu tempo. Ele estudaria as obras de Saint-Germain e Cagliostro. Lá ele descobre as obras escritas sobre os Ansaireth ou Nusairis da Síria, esse povo misterioso que não é judeu, nem cristão, nem mesmo muçulmano. Eles seriam os famosos Yezidis, adoradores do deus Pavão. Segundo o próprio Randolph, o líder dos Ansaireth, Narek El Gebel, que chegou à terceira Cúpula Rosa-Cruz em Paris com cartas de apresentação, reconhecendo em Randolph as aptidões exigidas, o convidou a vir à Síria para lá estudar com os Ansaireth. Pouco depois, Randolph empreendeu uma viagem iniciática na Turquia, Grécia e Oriente Médio para aprofundar os ensinamentos secretos dos Ansaireth.

Em 1860, Randolph fundou seu próprio Conselho Americano da FRC e logo retornou a Londres para ali encontrar Bulwer Lytton e Kenneth Mackenzie. De volta aos Estados Unidos, Randolph participou da Guerra Civil que acabara de estourar ao se alistar nas fileiras da União e levantar uma tropa de soldados negros, conhecida como “Fremont Legion (Legião Fremont)”. Ao final das hostilidades, Randolph milita pelos direitos dos negros. O assassinato de Lincoln o enoja com a política e ele decide se estabelecer como médico em Boston. Ele logo abriu uma nova loja de sua ordem lá.

Começa a escrever suas principais obras: Seership (Vidente), Love and the Master Passion (Amor e a Paixão Mestra), Eulis and the History of Love (Éulis e a História do Amor), bem como sua magistral Magia Sexualis. Em 1872, a publicação deste último livro fez com que fosse preso por incitação ao amor livre, mas foi libertado rapidamente. O grande incêndio que devasta Boston destrói completamente o escritório e o laboratório de Randolph, as placas originais de seus livros se perdem. Ele é denunciado pelos espíritas como libertino e seus próprios amigos começam a se afastar dele.

Em maio de 1873, Randolph sofre um acidente que lhe dá um vislumbre de seu fim iminente. Foi nesse momento mais sombrio de sua vida que ele mais uma vez encontrou o amor na pessoa de uma jovem ativista feminista, Kate Corson. O casamento logo foi celebrado e, em 1874, nasceu um filho, Osíris Budh, a quem Randolph considerava um deus desde que foi concebido segundo seus próprios princípios mágicos. Randolph continua a publicar seus trabalhos e a dar vida a um círculo da Irmandade de Éulis.

Em 29 de julho de 1875, Randolph morre em circunstâncias que permanecem misteriosas: Maria de Naglowska alegará que Blavatsky teria travado uma guerra oculta contra ele causando sua morte, segundo outras pessoas, teria sido um suicídio e, finalmente, para alguns outros, ele teria morrido durante um rito mágico… Parece, no entanto, que quando ele morreu, seu ensinamento mágico de essência puramente sexual desapareceu, oculto, talvez, por aqueles próximos a ele. Quando Clymer faz contato com a esposa e o filho de Randolph, eles alegam não saber nada sobre as instruções especiais e os materiais que tratam de doutrinas sexuais. Eles insistem apenas no caráter espiritual e moral da obra de Randolph, rejeitando o lado sexual mágico.

A Fraternidade de Éulis

A Fraternidade de Éulis foi fundada por volta de 1870 por Randolph como um corpo docente complementar ao da Fraternitas Rosae Crucis.

A chave para entender a Irmandade de Éulis pode estar no panfleto publicado por Randolph em 1875, The Book of the Triplicate Order, Rosicrucia, Eulis, Pythianae, no qual está escrito:

“Somos um organismo triplo, primeiro Rosacruz, pois somos os herdeiros desta Fraternidade e seus sucessores, e como tal cultivamos todas as ciências do conhecimento e para isso nos interessa tudo o que é obscuro, desconhecido e que corresponde ao aspectos mais profundos da natureza e as profundezas mais sutis da insondável alma humana.

Somos Pitianos porque somos pitagóricos que têm a relação mais íntima com a Fundação do Universo – o Deus da Natureza e sua Alma – e com o mundo espiritual e invisível, assim como a sede de maior conhecimento e da amizade mais verdadeira com nossos Irmãos e com o Mundo.

Somos Eulisianos, porque cultivamos os mais preciosos tesouros do pensamento que nos foram transmitidos através dos tempos; e traduzimos nosso nome oriental “Marek Gebel” – Portão da Luz – como Éulis ou o Portão do Amanhecer, nome pelo qual, durante este período o Terceiro Templo, a Ordem Tríplice, a Confraria e a Fraternidade serão doravante conhecidos.”

– Randolph, The Book of the Triplicate Order (O Livro da Ordem Triplicata).

Este texto, destinado ao uso dos membros da Fraternidade e dos candidatos à iniciação, também fornece uma história da Ordem.

Os candidatos são recebidos por votação usando bolas pretas e brancas. A Ordem é mista e tem 3 graus:

•       Construtor,

•       Arquiteto, e Cavaleiro do Templo para homens;

•       Construtora, Matrona e Irmã do Templo para as mulheres.

Há também um corpo supremo: a Loja da Pedra Angular cujo Conselho é composto por Irmãos e Irmãs: Hierarcas ou Melquisedeques, Hierofantes e Senadores.

Após a morte de Randolph em 1875, Freeman B. Dowd assumiu a liderança do F.R.C e da Fraternidade de Eulis. Em 1878, Dowd fundou uma Grande Loja na Filadélfia e em 1907, na época de sua aposentadoria, a sucessão foi assegurada por Edward Brown.

Quando Brown morreu em 1922, R.S. Clymer assumiu. Nascido em 1878, Clymer seria recebido como Neófito dentro da F.R.C e da Fraternidade de Éulis em 1897.

Em 1906 publicou suas duas primeiras obras The Rosicrucians, Their Teachings (Os Rosacruzes, Seus Ensinamentos) e Philosophy of Fire (Filosofia do Fogo).

Em 1911, ele decidiu se estabelecer em Quakertown no local de Beverly Hall, onde estabeleceu a sede da Ordem. Clymer logo entraria em conflito com Lewis e sua A.M.O.R.C. (Antiga e Mística Ordem da Rosa-Cruz). Com outros iniciados, ele cria a F.U.D.O.S.F.I. (Federação Universal das Ordens, Sociedades e Fraternidades Iniciáticas) para combater Lewis e a influência da F.U.D.O.S.I. (Federação Universal das Ordens e Sociedades Iniciáticas).

Magia Sexualis

Nas linhas seguintes, procuraremos descrever muito brevemente alguns pontos da doutrina mágica, ou Magia Sexualis, de Randolph.

“Após uma introdução apresentando os apetites espirituais da comunidade de Éulis, Magia Sexualis oferece inicialmente exercícios que permitem ao mago desenvolver as qualidades necessárias para a prática da magia: volância (emissão de uma intenção por visualização), decretismo (capacidade de emitir ordens peremptórias), posismo (posturas e gestos mágicos) e, finalmente, tirauclairismo, destinado a influenciar uma pessoa à distância. Para isso – que parece ser a obsessão do autor apesar dos grandes discursos sobre a luz celestial e o amor universal -, a parte seguinte intitulada “Magia” é dedicada à confecção de perfumes, cores e números, em adequação ao horóscopo da pessoa que você deseja sugestionar.” – Melmothia, La Magia Sexualis de Pascal B. Randolph

Os Fluidos e a Polarização dos Sexos

O Universo, assim como todos os seres vivos, sem exceção, são regidos pelo princípio das forças contrárias que exercem um poder absoluto de atração uns sobre os outros. Alguns os chamam de força positiva e força negativa e outros redescobrem neles o bom e o mau, a emissão e a recepção, a vida e a morte, o homem e a mulher. Assim, o polo feminino atrai o masculino e pode-se assim atrair para si as coisas desejadas pela criação de seu modelo oposto: criando o negativo para obter o oposto e, portanto, o positivo!

O falo do homem positivamente polarizado e o ktéis negativamente polarizados da mulher e o cérebro do homem é negativamente polarizado e de essência magnética enquanto o da mulher é positivamente e de essência elétrica.

As Operações Sexuais Mágicas ou Magia Sexualis

De acordo com o ensinamento de Randolph, as operações de magia sexual realizadas de acordo com as regras perseguem 7 objetivos principais :

1.      carregamento de condensadores fluídicos e os “Votos”;

2.      produção de uma influência e de um fluido magnético;

3.      realização de um projeto específico;

4.      determinação do sexo da criança a ser concebida;

5.      refinamento dos sentidos;

6.      regeneração da Energia Vital;

7.      provocação de visões sobre-humanas.

Randolph também fornece alguns princípios que são importantes conhecer para melhor entender e realizar os exercícios de magia:

1.      A união sexual considerada como oração. O homem que vive com sua esposa em sutil e perfeita harmonia e que pratica um ato sexual perfeito como casal consegue obter a realização de certos desejos. Mas é necessário que o pedido seja claro e formulado de forma clara pelos dois operadores.

2.      É aconselhável praticar o ato sexual com uma mulher de nível moral elevado, nunca se deve usar uma prostituta ou uma virgem ignorante ou uma menor de 18 anos. Buscaremos sempre realizar esses atos com nossos parceiros. É necessário que o espasmo masculino e feminino ocorram ao mesmo tempo, porque então resulta uma corrente mental que pode modificar o astral. O prazer compartilhado sofre então a lei da polarização oposta do casal: no homem o sexo é positivo e a cabeça negativa e na mulher o sexo é negativo e a cabeça positiva. Assim, o homem fertiliza fisicamente a mulher e a mulher fertiliza espiritualmente o homem.

3.      A união carnal deve ser inocente e não uma simples busca de prazer físico.

4.      O corpo deve ser saudável e a higiene respeitada como uma prática sagrada.

5.      As operações mágicas devem ser mantidas em segredo e deve-se tentar evitar o contato mundano ao se preparar para operações mágicas.

6.      Deve-se formular seus desejos com antecedência e não esquecer de formulá-los na hora do coito.

7.      Antes, durante e depois do ato de amor, deve-se ter em mente uma imagem clara do que se deseja.

8.      É necessário comer de forma simples e preferir alimentos naturais.

9.      Tome o ar duas vezes por semana: inspire profundamente e mantenha o ar o maior tempo possível.

10.     Não procure contato com seu parceiro com muita frequência. Faça amor uma ou duas vezes por semana.

11.     Não procure o ato se estiver doente ou com raiva.

12.     Durma bem.

13.     Nunca se esqueça do axioma: O amor é a base da vida.

14.     O momento em que o esperma entra no corpo da mulher é o momento mais fértil, de maior poder e de maior emoção.

15.     Se um homem deseja algo e o mantém em mente desde o momento em que entra até o momento em que se afasta da mulher, esse desejo será concedido todas as vezes.

16.     Todas as forças e o poder emanam do lado feminino de Deus.

Randolph aconselha 5 posições para atos de magia sexual

1.      O homem estendido sobre a mulher com a sua testa encontrada contra a testa dela. Esta posição destina-se a corrigir os sentidos e as habilidades dos operadores.

2.      De quatro, o homem mantendo o peito reto para penetrar por trás da mulher prostrada. Acredita-se que essa posição favoreça a projeção da influência para fora sobre uma pessoa escolhida, um voto…

3.      O homem e a mulher estão sentados frente a frente, sexos entrelaçados, bustos inclinados para trás enquanto dão as mãos. Esta posição reforça as influências mágicas sobre o exterior.

4.      O homem e a mulher estão sentados de frente um para o outro, a mulher cruzando as pernas ao redor dos lombos do homem, ambos testa com testa. Esta posição permite a realização de desejos comuns.

5.      De quatro, mas o homem se abaixa sobre as costas da mulher e apoia o queixo no pescoço dela. Esta posição permite influenciar a mulher.

Condensadores fluídicos

A magia é uma ciência, a única ciência que estuda, teórica e praticamente, as maiores forças da Natureza, aquelas que estão ocultas. Ela declara e prova que o Universo está, em suas menores partes, sujeito à influência de certos fluidos que são a base de todos os fenômenos físicos e psíquicos.

Para poder operar essas forças, é preciso concentrá-las num determinado ponto e depois redirecioná-las de acordo com a sua vontade. Estas operações de condensação podem ser realizadas de 4 maneiras diferentes:

1.      O operador pode usar sua própria energia;

2.      Pode utilizar as forças externas por indução;

3.      Pode vincular forças externas a um indivíduo que foi escolhido para esse propósito;

4.      Pode vincular essas forças a um objeto fornecido para esse fim.

Este último é conhecido há milênios como a “carga dos votos”. Existem diferentes tipos de materiais que podem ser usados para condensar fluidos: dois líquidos (tintas aplicadas a um talismã e líquidos guardados em garrafas) e um sólido (votos e estatuetas).

Os Votos e estatuetas

A utilização dos votos vem da observação das leis de correspondência, simpatia e polarização.

Votos são estatuetas que são preparadas de uma maneira particular, com a ajuda das leis de correspondência e simpatia, e que são carregadas com a força psíquica de um indivíduo para obter um resultado positivo ou negativo.

Deve-se notar que todas essas operações mágicas não são de forma alguma uma questão de libertinagem ou sexo vulgar ritualizado, mas uma busca espiritual. O orgasmo é santificado e se torna mágico. Segundo Randolph: “…Além da união carnal, busque a união das almas.”

Fonte:

FREEMANN, Spartakus. La Magia Sexualis, de Randolph à Naglowska. EzoOccult, publicado em 2001, atualizado em 2020. Disponível em: https://www.esoblogs.net/3318/la-magia-sexualis. Acesso em: 28 de fev. de 2022.

***

Texto adaptado, revisado e enviado por Ícaro Aron Soares.

Postagem original feita no https://mortesubita.net/magia-sexual/a-magia-sexualis-de-pascal-beverly-randolph/

Goécia, Kiumbas e os demônios de verdade

Postado no S&H em 3/9/2008.
Já estava com saudades de escrever para o Sedentário. Estas semanas sem parar na correria da Bienal e todas as palestras para lançamento da Enciclopédia de Mitologia praticamente acabaram com o meu (pouco) tempo livre e prejudicaram um pouco o cronograma do Teoria da Conspiração. Para manter a constância, tenho publicado textos de amigos meus e ocultistas famosos no meu Blog pessoal.
Mas esta semana retornaremos às atividades normais.

Dando continuidade à série “Desmistificando os Demônios”, falaremos agora sobre as entidades hostis que habitam o Plano Astral. Para entender o que se passa, você precisará ler primeiro os textos “O Diabo não é tão feio quanto se pinta”, “Belzebu, Satanás e Lúcifer”, “Zaratustra, Mithra e Baphomet” e “666, the Number of the beast”. Nestes textos, eu explico detalhadamente de onde surgiu cada um dos alegados “demônios” inventados pela Igreja Católica e copiados ad nausea pelas Igrejas evangélicas e caça-níqueis que se vê por ai. Porém, esta explicação precisou fazer um parênteses porque não seria possível continuar a explicação sobre manifestação de entidades astrais no Plano Físico sem explicar primeiro o que é o Plano Astral. Então chegamos a uma “mini-série” onde expliquei o que é e como funciona o Plano Astral. Esta série está nos textos “Yesod – Bem vindo ao Deserto do Real”, “Thanatos”, “Hecate”, “Hermes”, “Morpheus” e “Caronte”, que explicam as cinco interações do Plano Físico com o Astral.
Sei que é um bocado de texto para ler, mas tenho fé em vocês, jovens leitores. E muito do que eu falei em colunas anteriores, sobre Pirâmides, Círculos de Pedra e Chakras estão interligados com estas manifestações físicas das entidades astrais.

A Goécia e os 72 demônios de Salomão
Apesar de ser atribuído ao rei Salomão – que, segundo o folclore judaico, tinha o poder de controlar os demônios do céu, da terra e do inferno -, o texto da Clavícula não tem nada a ver com o legendário soberano judeu. Pela estrutura da composição do texto, ele deve ter sido escrito por volta do sec. XII d.C. provavelmente na região do Império Bizantino, que herdou boa parte do conhecimento clássico e helenístico, inclusive no que se refere ao esoterismo.
Muitos dos títulos usados nos textos (Príncipes, Duques, Barões…) não existiam nos tempos bíblicos e, portanto, não poderiam ter sido usados naquela época.
O Lemegeton Clavicula Salomonis, na minha opinião, se trata de uma compilação dos 72 “espíritos das trevas”, que deveriam fazer a contraparte dos 72 anjos cabalísticos, ou derivados dos nomes de Deus (falarei sobre isso no futuro, por ora chega de textos sobre kabbalah).
Como todos os tratados de magia medieval, a Clavícula descreve um procedimento ritualístico bastante complexo, com a utilização de toda uma parafernália cerimonial de robes, pantáculos, amuletos e talismãs, que devem ser confeccionados seguindo à risca as precisas instruções contidas em cada capítulo. Um leitor moderno que vá ler o texto à procura de um manual prático ficará decepcionado – pode-se dizer o que for dos rituais seguidos pelos magos medievais, menos que eles são práticos. Mesmo problema, aliás, do Livro de Abramelin. E não ajudam nada as constantes advertências de que o menor erro pode fazer com que a alma do mago seja arrastada para o inferno pelas entidades que ele tentam imprudentemente evocar.
E quais seriam estas entidades?

Bem… para entender o que estes magos estavam invocando, precisamos retornar um pouco no tempo e estudar as magias cerimoniais e tribais africanas (ou nossa contraparte moderna da Umbanda, Condomblé, Wodun, Santeria, Vodu e ritos caribenhos de invocação dos mortos). Ou mesmo entender o fenômeno das mesas girantes estudadas pelo maçon Allan Kardec ou as tábuas de Oui-ja do século XVIII-XIX. Embora mais “educados” em suas aparições para a fina nata européia, todos os princípios acima lidam com basicamente a mesma coisa: a manifestação de seres espirituais no Plano Físico.

Sabemos que as entidades que vivem no Astral são basicamente o MESMO tipo de pessoa que vive no Plano Físico; apenas não possuem um corpo de carne ou as limitações que possuímos aqui. Sendo assim, a índole e a moral destas pessoas varia da mesma maneira que a índole e a moral das pessoas que estão vivas. E o trabalho dos feiticeiros ou magistas consiste em chamar e contratar as pessoas certas para realizar o trabalho desejado.

No Plano Material, quando temos um problema de hidráulica em casa, contratamos um encanador para resolver o problema; se o problema é na fiação, chamamos um eletricista; se estamos doentes, chamamos um médico; e assim por diante…
No Plano Astral, a coisa funciona da MESMA MANEIRA.
Quando um xamã indígena realiza um ritual de invocação de um “espírito ancestral” para, por exemplo, ajudar no tratamento de uma pessoa doente, é exatamente isso que ele está fazendo: entrando em comunicação com os antigos médicos da tribo que examinarão a pessoa e dirão o que há de errado com ela.
Quando um Guia em um templo de umbanda ou candomblé examina uma pessoa, ele está observando as alterações e distúrbios na aura (campo eletromagnético) e sugerindo algum tratamento para sanar aquele problema.

No mundo físico, se alguém precisar “eliminar” um oponente, pode contratar os serviços de um matador de aluguel. Claro que isso é considerado criminoso, anti-ético, ilegal, etc… mas é uma possibilidade que existe!
No Mundo Astral, acontece a mesma coisa. Pode-se contratar os serviços de pessoas especializadas em separar casais, manipular a índole das pessoas, quebrar objetos, atrapalhar negócios ou até mesmo aleijar, adoecer ou mesmo matar um outro ser vivente. Nenhuma surpresa.

No mundo físico, os bandidos se agrupam em gangues, com símbolos, ritualísticas próprias (máfia russa, tríade, yakusa, etc.), vestem máscaras para não serem identificados e usam do terror e intimidação para impor respeito e medo nas suas vítimas (como por exemplo, nas armaduras samurai japonesas). No Plano Astral ocorre a exata mesma coisa. Como o duplo-etérico (perispírito) é MUITO mais maleável do que nossa pele física, é possível modificar e transformar nossa estrutura espiritual para ficarmos com a aparência que desejarmos, o que inclui chifres, garras, dentes afiados e qualquer outra coisa que você pensar que vá assustar os crentes. E eles sabem disso e usam destas modificações astrais como maneira de intimidação, desde sempre.

Na antiguidade, os médiuns videntes eram capazes de enxergar estas formas e dos relatos delas surgiram as descrições que tradicionalmente associamos aos demônios, como asas, chifres, dentes, garras, rapo, espinhos e tudo mais. Outros assumem formas animalescas como lobos ou serpentes; outros ainda assumem formas vampíricas, monstruosidades ou deformidades (eu vi certa vez no astral um ser extremamente pálido, quase albino, careca, vestindo um robe negro, que possuía 6 olhos avermelhados no rosto, quatro do lado direito e dois no esquerdo, uns sobre os outros, e que ficavam piscando de maneira desordenada…). Também há entidades que se utilizam de correntes, pregos, ganchos, piercings, espetos e toda forma de agressões e auto-mutilações sado-masoquistas que você puder imaginar (Clive Barker certamente inspirou-se nestes seres para criar os cenobitas nos seus livros da série “Hellraiser”). O Baixo-Astral ou Baixo-Umbral está repleto deste tipo de criaturas.

Nos cultos afros, chamam estas entidades de Kiumbas, de onde vem a palavra quimbanda, ou “magia negra”. No kardecismo, chamam estas entidades de “obsessores” ou “espíritos trevosos”, no hermetismo chamamos estas entidades de “seres goéticos”. Tome muito cuidado com a mistureba que a mídia e os cristitas fazem com os cultos africanos:
UMBANDA , CANDOMBLÉ e QUIMBANDA são religiões bem diferentes entre si, embora os cristitas misturem tudo e chamem de “Macumba”.

E o termo “magia negra” é utilizado errôneamente, pois não há “cor” na magia, existe o uso que se faz da magia. Assim como o gênio da lâmpada na história de Aladin, estas entidades fazem o que o magista as comandar.
O ritual e toda a ritualística envolvida serve para se entrar em conexão com as entidades astrais. Para tanto, os magistas dividem as ritualísticas de invocação e evocação em três tipos: a Teurgia, a Magia Natural e a Goécia.

A Teurgia lida com os anjos e com os seres de luz, lida com os 72 nomes de Deus, com suas manifestações, com as sephiroth da Kabbalah e com os Salmos bíblicos (sim, crianças, mais uma vez a Bíblia se mostra extremamente valiosa para o estudante de ocultismo).
A Magia Natural lida com Elementais (gnomos, ondinas, silfos e salamandras), orixás, Exus, Devas, Asuras, Djinns, Efreetis e outras criaturas da natureza.
E finalmente, a Goécia lida com os seres do baixo-umbral.

Tendo os rituais certos, nos dias e horários certos, consegue-se contatar estas criaturas; mas apenas contatá-las: é como ter à mão o telefone do Cabeleira e do Zé Pequeno. O Ritual apenas chama estas entidades, o segundo passo é negociar com elas o preço do serviço. E não usei o Zé Pequeno de exemplo à toa… negociar com estas entidades é como negociar com os traficantes do “Cidade de Deus”, você nunca sabe o que poderá acontecer.

Acho que com isto conseguimos fechar a série desmistificando os demônios. Se tiverem alguma dúvida deixem nos comentários que eu tento responder aqui mesmo ou, se for o caso, abro uma nova sessão de “Perguntas e Respostas”.

#Goécia

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/go%C3%A9cia-kiumbas-e-os-dem%C3%B4nios-de-verdade