(i)Manifesto ZosKia – parte 2

Danilo Nobrega*

Conforme exposto anteriormente, neste momento, o autor entende ZosKia como uma experiência magicka e filosófica que emerge da interpretação em prática dos textos de Austin Osman Spare e tem como método, fenômeno e objetivo a criação materializada na arte. É difícil resumir um algo que foi criado com o objetivo de ser não cartesiano, com um forte recorte da perspectiva e um tanto labiríntico, mas enxerga que o “estado de presença” é seu principal sintoma… é como empunhar uma espada samurai, você é a espada, então você é além da espada, você é o corte, o matador, o morto e os pássaros acima. Talvez o mais eficiente pode ser fazer uma provocação: CRIE! Vale ressaltar que esse modelo de trabalho vem sendo tratado contemporaneamente no recorte da “arte visionária”.

Afastamento e aproximações entre ZosKia e magia do caos

ZosKia e Magia do Caos são tão próximos que por vezes são tratados como família, o que eu acho muito divertido, não por uma pretensa árvore genealógica, mas sim por uma série de afastamentos e aproximações muito “familiares”. Destas acho que existem as que são de ordem temporal (das quais eu vou tratar) e as de ordem autoral (que vão ficar para depois). Bom, vamos a lista:

A crença: fundamental para ambas e igualmente dispare. Enquanto no caos a crença é uma ferramenta, um objeto a ser desmontado em partes até um mecanismo primeiro… em ZosKia ela é um tipo de intermédio entre o ser e o comportamento e portanto há uma procura de não se identificar com a mesma, para, com isso Ser em potência. 

Cosmologia: “Nada é verdadeiro, tudo é permitido”. Mesma frase, contornos bem distantes. Enquanto no caos ela pautam tipo de relativismo e generalização estrutural, em ZosKia ela fala que “Estamos todos bêbados de sermos Deuses”, o ponto não é que tudo tem um mínimo divisor comum. É que tudo tem uma ligação macro, como um tipo de “biosfera de Ser em potência” ou um “holismo superlativo”. 

Fazer: O método do Caos é como um cartesianismo “Faça você mesmo” onde existem várias propostas de escadas e você pode formatar os degraus. ZosKia propõe um método sem edifícios. Existe um fluxo e o mergulhar, e nem é um mergulho que anseia a profundeza exclusiva. É um mergulhar onde você se desfaz, se perde.

Postura: O comportamento da magia do Caos é um tipo de contracultura que se agrega a outros objetos, como a magia cerimonial ou a cultura pop para assim se nutrir.

ZosKia se parece mais com um manifesto artístico, onde mediante termos, propostas, instrumentos, técnicas e apreciação…  Cada fazedor, espectador e objeto se expressa no mundo. Bom, depois de tudo isso, nos resta a aproximação. Para além de nomenclaturas, elementos e dadas as particularidades de cada um… a aproximação entre ambos os fazeres é a primazia do criar. CRIE

ZosKia é dificil? Sim e não

ZosKia tem fama de ser algo complicado, parte disso vem da escrita truncada do próprio Spare e parte vem de um fetichismo que acontece dentro da comunidade. Mas apesar desses pontos serem relevantes, eu ainda acho que todo esse estranhamento tem mais motivos. Eu vou listar alguns… Primeiro a incerteza, eu acho que é até uma posição política ter um tipo de fala que não dá a entender uma certeza e concretude absoluta do conhecimento, mas sim uma construção constante do mesmo. Mas isso é algo que também vem de uma proposta de ZosKia em torno de uma leitura que foge ao entendimento cartesiano em prol de uma percepção mais labiríntica, que valoriza a imersão, principalmente para se fazer em contínua formulação. Com isso existe uma preponderância da interpretação. O que me leva ao fato de que ZosKia Cultus é um termo criado pelo Kenneth Grant impactado pelo Spare e que este apenas o aceitou. Com isso e outros fatores, sou levado a pensar ZosKia como uma interpretação que emerge em fazer dado à contemplação da obra artística do Spare. O ponto central disso tudo é que ZosKia não se dá como um sistema, passo a passo ou um método típico das tradições ocultas europeias. ZosKia se aproxima mais da dinâmica das relações artísticas. Com criador, objeto e o espectador como autores de um significado, fazer ou impressão que fica no espaço entre. Nesse sentido, ZosKia é muito mais simples do que parece, ZosKia é sobre ser.

Servidores e Arte Abstrata… não é para tentar entender, mas quem consegue resistir?

Sigilos e servidores são duas faces de um mesmo fenômeno, atenção. Enquanto sigilos trabalham com esquecimento, servidores são fruto do foco, ou da obsessão. Aquilo que captura nossa atenção. Existe toda uma questão terapêutica e psiquica em torno disso, mas eu quero tratar da relação dos Servidores com suas representações. Acontecem uma série de discussões em torno do entendimento da arte, sobretudo a arte abstrata. Todavia em sua origem havia um objetivo de elogio ao não entendimento, a apreciação da forma pela forma, sem a formatação do Saber. Ainda assim existe todo um afã em torno dos significados das abstrações. Um dos motivos disso talvez seja a tendência do nosso olhar procurar formas e motivos que acalmem a nossa ansiedade pelo conhecido, familiar e seguro. É muito fácil ficar obcecado nas figuras incomuns e nos supostos segredos da arte abstrata. Com tudo isso no horizonte, eu me pergunto se, em detrimento da arte figurativa tão popular para servidores, não seria a abstração a forma mais alinhada à função do mecanismo dos mesmos.

Engula o Sigilo!

 ENGULA O SIGILO! Aqui eu pretendo propor uma forma um pouco distinta de operar simbolicamente o sigilo. Saindo das questões em torno da “energização/ carregamento”, afim de fazer um paralelo mais direto com corpo. Seria algo em torno de:

  Você sente fome (1), procura os ingredientes (2),  cozinha (3), come (4), faz a digestão (5) e… caga (6). 

 Para o sigilo, fica bem semelhante… você percebe a vontade (1), escolhe um método (2), “cozinha” (formula) o intento (3) e na hora de comer, mastigar e engolir você vai estar desfazendo o intento no sigilo, ou seja, sigilizando de forma propriamente dita (4) e consequente absorvendo, consumindo, engolindo. Tudo isso através de seu estado de presença. Até que sobre apenas o prazer da saciedade, a satisfação da certeza. Durante a digestão, você já não percebe o sigilo de forma direta (eis o famoso esquecimento) . O corpo está se nutrindo, se potencializando… o sigilo está em processo de manifestação (5). Você só vai “lembrar” do “almoço”, quando for a hora de por ele para fora ou… em outras palavras, no momento que a mudança proposta já foi alcançada. Quando aquele sigilo deixa de ser uma questão a ser tratada e já está manifesto (6).  

O sigilo não se manifesta no mundo, a Sigilização sim

Sigilização, eu trato sigilo como ação de desfazer um intento dentro de um processo artístico, a forma mais tradicional é um grafismo ininteligível, mas eu quero tratar da relação disso com a postura de “nem isso-nem aquilo” necessária para que o sigilo seja no mundo. Essa postura surge de um profundo estado de presença que segue uma impactante Catarse. Seria algo semelhante a uma tontura após rodar seguida de uma confortável sensação de apetite satisfeito. É um afeto no corpo que gera uma mudança de estar. Outro exemplo é o susto, porém o mais comum é o gozo, porém nesse recorte, eu ressalto não apenas ejaculação, mas toda permutação do ato sexual. A grande questão aqui é a alteração. Tendo isso em vista, a principal alteração que nos interessa é  a que se dá pelo é através do processo de criação… Portanto, não fragmentar a produção do sigilo do que chamam de “carregamento”, a meu ver, é a forma mais eficiente de manifestação.


Danilo Nobrega (1993) é artista visual carioca que vive desde a adolescência na cidade de Maricá. Sua arte teve semente nos desenhos de infância, mas foi na vida adulta (e no excesso dela) que se materializou, depois do contato com arte terapia em 2017. Desde então investiga um fazer que abraça uma linguagem mística ampla para tratar do Ser, Existir e Se Tornar no mundo enquanto um fenômeno artístico e para tudo que existe no mesmo. Unindo um abstrato filosófico com cotidiano social, sob esse argumento, possui forte influência de Deleuze. Mistura muitos fazeres, influências e técnicas, arte digital, ilustração, pintura, balonamento, sequencialidade, tabulação, colagem, fotografia, origami, caligrafia e uma série de outros elementos para compor seu trabalho. Tendo isso em vista tem uma dificuldade de se identificar com alguma escola ou semelhante. O mais próximo disso vem de sua referência mística, ZosKia Cultus. Para mais siga em: @danilonobrega23 no instagram, twitter e outros.

 

Postagem original feita no https://mortesubita.net/magia-do-caos/imanifesto-zoskia-parte-2/

A Cura Sexual Através da Magia Sexual

Por Christopher Penczak

Sexo. É um dos mistérios espirituais. Não se pode realmente explicá-lo. Você tem que vivenciá-lo diretamente, como todos os mistérios de expansão de consciência das tradições orientais e ocidentais. Tantas histórias de criação têm o universo nascendo através do amor do casal divino. Mas ao contrário dos estados profundos da meditação iogue e dos rituais cabalísticos em línguas secretas, a maioria das pessoas comuns têm a chance de explorar os mistérios do sexo, e encontrar seu poder curativo e transformador. Todos nós o buscamos. Embora seja um impulso primordial, em um nível superior, também buscamos experiências sexuais para explorar os mistérios da divindade.

Através da atividade sexual, estimulamos os centros de energia do corpo e podemos experimentar uma profunda sensação de consciência alterada. Você encontra a sexualidade na yoga tântrica oriental e nas práticas taoístas, na magia cerimonial ocidental e no Grande Rito Wiccano. Você vê dicas de uma tradição de magia sexual nos mistérios de Ísis e Osíris, o Canto de Salomão, e, alguns especulariam, os mistérios gnósticos de Cristo e Maria Madalena. A ideia de união e cura através da sexualidade é universal.

Mesmo que não saibamos nada sobre energia, meditação, ou ritual, ativamos a corrente sexual e experimentamos estes estados de ser. O sexo é muito poderoso e por causa disso, muitas emoções, sentimentos e expectativas se envolvem em nossa sexualidade, tornando-a uma de nossas maiores forças e alegrias, mas também criando alguns de nossos maiores problemas. Ter uma compreensão dos componentes esotéricos da sexualidade pode influenciar profundamente nosso desenvolvimento espiritual, cura e atitudes em relação à sexualidade, transformando-nos.

De todas as tradições da sexualidade sagrada, a palavra mais fortemente ligada à prática é tantra. O tantra é um sistema esotérico oriental, enraizado nas religiões da Índia, e inclui uma variedade de práticas, incluindo aquelas associadas à sexualidade sagrada, mas seria negligente pensar que o tantra é apenas sobre sexualidade. Alguns traduzem a palavra tantra para significar ou “tear” ou “texto”, referindo-se a uma tradição maior. Embora grande parte desta tradição tenha tradicionalmente permanecido escondida de olhos abertos, ela felizmente veio à tona e foi disponibilizada ao público. Qualquer pessoa que deseje encontrar mais informações sobre a sexualidade espiritual pode fazê-lo com bastante facilidade.

O mais famoso destes manuais sexuais é o amplamente conhecido Kama Sutra. Um texto da Índia, a mais famosa tradução de Sir Richard Francis Burton apareceu em 1883. O Kama Sutra causou muita agitação por causa de seus diagramas que detalham várias posições sexuais, mas em geral, a maioria do livro não é sobre sexo, mas cobre tópicos de relacionamentos, casamento e como ser um bom cidadão, no contexto da cultura indiana na época em que foi escrito.

Os místicos modernos levaram seus próprios empreendimentos para a sexualidade sagrada e escreveram sobre suas experiências e ensinamentos. Eles estão se baseando em fontes tântricas tradicionais, assim como as da alquimia taoísta quando se aproximam dela a partir de uma visão oriental. As tradições mágicas ocidentais analisam o papel da alquimia ocidental, e a imagem do casamento divino, em suas práticas rituais. Elas se expandiram sobre as explorações do moderno renascimento ocultista que combinou teorias e ensinamentos tanto do Oriente como do Ocidente.

Um dos clássicos modernos a partir do qual se pode olhar a magia sexual de uma perspectiva ocidental é a Magia Sexual Moderna de Donald Michael Kraig. Como seu predecessor, Modern Magick, este texto fornece um manual minucioso e detalhado nas artes da magia sexual ocidental. Kraig traça a história a partir de uma variedade de tradições e inovadores, e cobre a prática real da magia sexual usando terminologia e um estilo que são fáceis de entender. Kraig tem uma extensa preparação para quem procura explorar a magia sexual. Uma de suas sugestões envolve o uso do Exercício de Kegel:

Este exercício, cujo nome vem de seu inventor, tonifica os músculos usados durante o ato sexual. Uma maneira fácil de aprender este exercício é parar o fluxo quando você urina. Permitir que o fluxo seja retomado e interrompido novamente. É esta contração e relaxamento que compreende o exercício. Certifique-se de que você não está apenas contraindo o esfíncter anal. Repita o exercício várias vezes. Você pode praticar este exercício em quase qualquer momento e em qualquer lugar. Trabalhe até fazer isso pelo menos cem vezes por dia.

– Modern Sex Magick, p. 72.

Os exercícios de Kegel podem ajudar uma mulher a ser orgástica, e também ajudar com alguns problemas em torno do fluxo urinário e incontinência. A construção deste músculo ajuda a preparar um para os rituais de magia sexual.

O contato sexual com entidades espirituais nos coloca em contato com a divindade aparentemente intangível, mas descobrimos através da sexualidade que a divindade também está dentro dela. Através de experiências sexuais individuais, duplas ou grupais, encontramos o divino dentro dos participantes, vendo os deuses dentro da humanidade, e encontramos nossa própria centelha divina interior. Ao encontrar esta centelha, temos epifanias e revelações espirituais que transformam nossas vidas.

Para uma visão mais ortodoxa sobre o assunto a partir de uma perspectiva taoísta oriental, temos a Yoga Taoísta & Energia Sexual de Eric Steven Yudelove. Este é um curso de 14 semanas apresentado pelo autor para incorporar a yoga taoísta, Chi Kung, alquimia taoísta e kung fu sexual em um sistema transformacional. Os iniciantes e os experientes nestas artes serão beneficiados com o livro.

O primeiro exercício na Semana Um do curso é chamado de Respiração Capilar. Envolve a retirada de energia excedente para dentro do corpo. O cabelo é um depósito de energia excedente.

Isto pode não parecer um exercício sexual, mas muitos dos exercícios preliminares de uma tradição devem ser dominados para se passar para as práticas mais exóticas. As tradições orientais estão focalizadas nos centros energéticos e refinando a energia que passa por esses centros, na vida diária e durante a interação sexual. O poder da energia sexual que passa por esses caminhos nos cura em vários níveis, aumentando nossa vitalidade, ajudando o sistema imunológico, curando doenças e, finalmente, expandindo a consciência.

Aqueles que procuram instruções mais diretas nas tradições tântricas podem se beneficiar do CD Yoga Nidra: Meditação Tântrica e Visualização pelo Dr. John Mumford e Jasmine Riddle. O Dr. Mumford é um renomado especialista em artes orientais e instrutor experiente em seus mistérios. Yoga Nidra é uma técnica de desenvolvimento que lhe permite progredir para um estado refinado de sono psíquico. Os elementos gêmeos que a yoga tântrica utiliza são a sensação e a visualização do corpo. Dr. Mumford e Jasmine Riddle guiam você através de estágios de desenvolvimento, movendo sua consciência através de diferentes partes de seu corpo. O componente de visualização permite que você entre em contato com seus centros psíquicos, ou chakras. Como exemplo, o Enigma nos guia através da sintonia sensacional em cada mão, concentrando-se individualmente em cada dedo. Nós nos movemos pela ponta, o prego, a primeira articulação seguida do nó, a segunda articulação seguida do nó, a terceira articulação seguida do nó, e terminamos com a almofada na palma de sua mão.

Depois de guiá-lo pelos centros de consciência de seu corpo com consciência sensacional, as visualizações avançam em direção aos diferentes sentidos. Luz, calor, frio e alegria são sentidos, seguidos por exercícios de chakra que se movem da base para a coroa e para trás novamente. Acompanhada de música meditativa, a voz suave de Jasmine Riddle dá uma sensação relaxante que o acompanhará ao longo de sua viagem. Em última análise, você pode alcançar um estado de movimento consciente através das sensações corporais usando exercícios de visualização que culminam em uma perspectiva iluminada.

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Fonte: https://www.llewellyn.com/journal/article/1037

COPYRIGHT (2006) Llewellyn Worldwide, Ltd. All rights reserved.

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Texto adaptado, revisado e enviado por Ícaro Aron Soares.

Postagem original feita no https://mortesubita.net/magia-sexual/a-cura-sexual-atraves-da-magia-sexual/

Abramelin

Abraao o judeu

1362 – 1460

Tudo o que se sabe sobre Abrão, o mago, alquimista, teólogo e filósofo do século XIV é diretamente derivado do manuscritos de posse da Bibliotheque de l’Arsenal em Paris, um arquivo, deve-se dizer, rico em fontes originais do ocultismo medieval.  O título completo da obra é em português “O Livro da Sagrada Magia de Abramelim, conforme passado por Abrão, o Judeu para seu filho Lamech.” Inteiramente escrito em francês, este documento alega ser a tradução de um manuscrito ainda mais antigo em hebraico, e o estilo da caligrafia sugere um escriba que viveu no século dezoito ou no final do século dezessete. A grafia e gramática do texto sugerem que o autor era ou semiletrado ou pouco cuidadoso, possivelmente não tendo o francês como lingua nativa.

Abraão, (doravente chamado de Abraham para maior acuidade histórica) foi ao que tudo indica nativo de Mayence, nascido em cerca de 1362. Seu pai, Simon, também foi adepto das investigações ocultistas e da prática mágica e desde cedo guioi seu filho nos estudos. Numa certa fase da vida, a tutotia do pai da lugar a um outro professor indetificado com o nome Moses. Abraham no entando ao crescer, rapidamente supera seu segundo mestre ao ponto de o descrever por fim como “um bom homem, mas inteiramente ignorante do Verdadeiro Mistério e da Verdadeira Magia.”

Sem um guia a sua altura, a fase sgeuinte da sua vida é dedicada a numerosas viagens educacionais ao redor do mundo conhecido. Com seu amigo Samuel, boemio por natureza, ele visita a Austria, a Hungria, a Grécia até chegar a Constantinopla (atual Istambul) onde fixou-se por aproximadamente dois anos. Após isso Abraham viajou para a Arabia, em sua época talvez o maior centro de aprendizagem mística do mundo onde dedicou mais alguns anos de vivência. Em seguida dirigiu-se para a Palestina e então para o Egito onde aprendeu uma grande quantidade de segredos ocultos.

Foi nas terras do Egito que Abraham conheceu Abra-Melin, célebre filósofo da região, a esta altura já com idade avançada em uma pequena cidade chamada Arach próxima ao Rio Nilo.  Lá ele vivia em uma casa modesta no topo de um pequeno monte coberto de árvores. Um homem gentil e educado, levando uma vida simples e regrada, apóstolo do Temor a Deus e evitando qualquer acúmulo de riquezas. Ele concordou em ensinar sua sagrada arte a Abraham com a promessa de que ele abandonaria seus falsos fogmas e passaria a viver no caminho e sob a lei de Deus.

Pelo presso de dez florins de ouro, que foram distribuidos aos pobres da cidade, Abra-Melin confiou a Abraham certos documentos contendo uma grande variedade de operações e segredos acumulados durante sua vida. Este conhecimento parece emergir de um cenário ocultista especificamente, mas não exclusivamente judaico. Um exemplo claro disso são as receitas que ele lega para a confecção do óleo e o incenso, que podem ser encontradas de forma idêntica no Pentateuco. Em Êxodo 30:23-25, temos a receita para o Óleo de Abramelim: “Também toma das principais especiarias, da mais pura mirra quinhentos siclos, de canela aromática a metade, a saber, duzentos e cinqüenta siclos, de cálamo aromático duzentos e cinqüenta siclos, de cássia quinhentos siclos, segundo o siclo do santuário, e de azeite de oliveiras um him.” Pouco adiante em Êxodo 30:34-36, temos a receita para o Incenso de Abramelim: “Toma especiarias aromáticas: estoraque, e ônica, e gálbano, especiarias aromáticas com incenso puro; de cada uma delas tomarás peso igual; e disto farás incenso, um perfume segundo a arte do perfumista, temperado com sal, puro e santo e uma parte dele reduzirás a pó e o porás diante do testemunho, na tenda da revelação onde eu virei a ti; coisa santíssimá vos será.”

Após isso Abraham deixa o Egito e segue para a Europa onde eventualmente fixa morada em Würzburg, na Alemanha, tornando-se profundamente envolvido com o estudo da Alquimia. Nesta época ele se casa com uma mulher, provavelmente sua própria prima, que lhe dá três filhas e dois filhos. O filho mais velho foi chamado Joseph e o mais novo recebeu o nome de Lamech.

Assim como seu pai, e provavelmente o pai de seu pai antes dele, Abraham instruiu seus filhos homens nos assuntos ocultos, enquanto que para suas filhas deixou dotes de 100,000 florins de ouro. Esta considerada soma de riqueza, assim como suas muitas viagens demonstram que Abraham foi um homem de posses, a quem nunca faltou sustento e recursos. Tesouro estes que o próprio mago atribuiu aos seus talentos como magista.

Ele também tornou-se célebre ao final da vida ao produzir impressionantes atos de magia na presença de pessoas famosas e importantes de sua época como o próprio Imperador Sigismund da Alemanha, o bisco de Würzburg, Henrioque VI da Inglaterra, o duque da Bavária e o papa João XXII. Aqui a narrativa se encerra e não existe detalhes sobre o final da vida de Abraham, sendo que a data e circustancias de sua morte são incertas, embora seja estimada como ocorrida em meados de 1460.

A Sagrada Magia de Abra-Melin

 

O documento mencionado, que é a origem destas informações biográficas foi traduzido em 1896 por Samuel Liddell MacGregor Mathers, um dos fundadores da Hermetic Order of the Golden Dawn e tornou-se um dos tomos mais importantes da magia cerimonial. As  traduções mais recentes para o inglês feita por Georg Dehn e Steven Guth atribuem a autoria e e identidade histórica de Abraham com a de Rabbi Yaakov Moelin יעקב בן משה מולין. Diversos fatores nos levam a crer que Abraham, o Judeu é o pseudônimo ou o nome iniciático deste Rabbi, pois muitos dados biográficos deles se encaixam como uma luva na narrativa acima passada.

A primeira parte desta obra conta a própria história de vida de Abraham, tal como aqui mencionada. A segunda parte é baseada nos documentos entregues por Abra-Melin durante sua viagem ao Egito. Nesta seção do manuscrito são expostos os princípios gerais da magia, incluindo o capítulos como “Quais são e quais são as classes da Verdadeira Magia”? “O que deve ser levado em consideração para uma operação mágica”, “Como convocar os Espíritos” e “De que maneira devem ser feitas as operações”

A terceira parte do documento é bem menos teórica e o autor supões que seu leitor sabe a base do que está sendo exposto. Aqui são tratadas a parte prática da operação mágica. São técnicas com vários propósitos como: provocar visões, reter espíritos familiares, dominar tempestades, transformar coisas e pessoas em diferentes formas e figuras, voar através dos ares, destruir edifícios, curar doenças, descobrir objetos roubados e caminhar debaixo d`agua. O autor ainda trata da cura taumaturgica de males como a lepra, a paralisia, a febre e o mal estar geral. Ele também oferece conselhos sobre como fazer-se amado por uma mulher e como conseguir o favor de papas, imperadores e pessoas influêntes. Muitas dessas façanhas são realizadas pelo emprego adequado de quadrados e signos cabalísticos. Com eles o autor ensina como causar visões específicas como a de homens armados, ou mesmo como evocar “Comédias, Operas e todo tipo de Música e Dança”. Diferentes símbolos representam diferentes resultados nas operações.

O temperamento e personalidade de Abraham é revelado nas entrelinhas da obra. Nela há um evidênte pouco caso de quase todos os magistas de sua época e um quase desprezo de todas as obras ocultas que não as dele mesmo ou de seu mestre Abra-Melin. Abraham critica abertamente todos aqueles que se contentam com os dogmas das religiões em que nasceram e aponta que ninguém culpado desta falha jamais atingirá qualquer sucesso nas práticas da magia. A doutrina fundamental do livro é que o cosmos é povoado por hostes de anjos e demônios. Os demônios trabalham em última instância, sob a direção dos anjos O homem situa-se entre as forás angélicas e demoniacas. E a cada homem é designado um anjo protetor e um demônio tentador. O objetivo dos grandes iniciados é controlar seu demônio e atingir o contato e conversação com seu sagrado anjo guardião. Uma vez que tenha atigido este grau elevado o magista tem ao seu controle todos os espíritos infernais, e portanto grande poder sobre a criação. Apesar dos claros benefícios materiais e pessoas óbvios, em seus escritos existe uma fé bastante forte de que isso pode e deve ser feito não apenas para o benefício imediato do mago, mas sim como uma conquista que afeta imediatamente a posição da humanidade no cosmos.

 

O impacto no ocultismo posterior

 

Após a tradução de MacGregor Mathers, este sistema ganhou um lugar de destaque no ocultismo ocidental igualavel ao sistema enoquiano e as chaves de Salomão. Sua herança direta pode ser encontrada no Hermetismo, no Rosicrucianismo, na Thelema e mesmo  no Neopaganismo. Sem muita procura pode ser visto nas obras ocultistas posteriores encabeçadas pelo próprio Mathers, assim como nos trabalhos de Aleister Crowley e Dion Fortune. O primeiro obstáculo desta nova geraçao foi tentar sobreviver diante do forte monoteísmo abraamico que permeia todo o sistema de Abra-melin. O temor a Deus é o primeiro e  mais necessário requisito da obra e a todo tempo lembrada. Orações incessantes e leitura constante dos textos bíblicos fazem parte do processo que leva ao contato do Sagrado anjo Guardião. De fato, todos os outros tipos de operações mágicas são tidas por Abraham como falsas e inúteis, verdadeiras armadilhas dos demônios para afastar os adeptos do caminho da Grande Obra. Foi necessária uma releitura histórica de todo o manuscrito para que ele pudesse ser usado em uma época tão mais laica como os século XIX e XX.

O grimório de Abramelim passou a ser visto então como uma coletânea de conhecimentos mágicos muito mais antigos, na mesma medida em que Plotino e Agostinho de Hipona fizeram os ensinamentos de Platão atravessarem a Idade Média, Abramelim foi o responsável por apresentar os mistérios Egípcios e Babilônicos numa roupagem monoteísta. Na perspectiva do ocultismo renascente do período de Crowley e compania, o judeu Abraham aproveitou o trabalho de magistas mais antigos e dos sacerdotes da antiguidade e encharcou com toda a submissão e servidáo própria de sua religião.

Na mão dos autores modernos, o Anjo Guardião de Abraham desdobrou-se em equivalentes como o Gênio da Golden Dawn, ao Augoeideis de Iamblichus, ao Atman do Hinduismo e ao Daemon dos gnósticos. É Cristo em Jesus e Budha em Sidarta. A roupagem judaica foi portanto eliminada em prol de uma imersão com a egrégora mais antiga, mais primal e atávica.

Na magia cerimonial o objetivo é portanto conseguir uma conexão com esta realidade intima superior. Em Magick Without Tears, Crowley é enfático ao dizer: “Nunca se deve esquecer nem por um momento que o trabalho central e essencial do magista é atingir o Conhecimento e Conversação com o Sagrado Anjo Guardião. Uma vez que seja atingido ele deve é claro se inteiramente deixado nas mais deste Anjo, que pode ser invariavelmente e inevitavelmente levá-lo ao grande passo seguinte – atravessar o Abismo e obter o grau de Mestre do Templo.”

Depos da edição de Mathers uma nova edição foi publicada em 1970 reapresentando a história de Abraham e o sistema de Abra-Melin a uma nova geração de magistas, muit mais acostumados com a experimentação e muito menos dada a dogmatismos de qualquer tipo. Apesar do respeito histórico pelo autor, existe uma tendência na maioria dos magistas contemporâneos em afirmam que em realidade o “Anjo da Guarda” de Abraham é o arquétipo profundo do Eu Superior, o Kia de Austin Spare ou do Self, para usar termos psicológicos atualizados. Ao atingir este estado de integração o adepto se torna consciênte de sua Verdadeira Vontade. Sua vida então é esclarecida com seu propósito. Com isso em mente, a operação de Abra-Melin se torna uma exploração do Eu Interior em direção a natureza divina que existe em potencial dentro de cada um. No Brasil, a editora Madras publicou uma edição sob o título “Santo Anjo Guardião – A Magia Sagrada de AbraMelin, o Mago Atribuída a Abraão, o Judeu”.

 

Sources:

The Book of the Sacred Magic of Abra-Melin the Sage. Translated by S. L. MacGregor-Mathers. Chicago: De Laurence, 1932. Reprint, New York: Causeway Books, 1974.
The Book of Abramelin: A New Translation
, Georg Dehn, transl. by Steven Guth, Ibis Publishing, 2006)
Santo Anjo Guardião – A Magia Sagrada de AbraMelin, o Mago Atribuída a Abraão, o Judeu, Editora Madras

 

[…] Postagem original feita no https://mortesubita.net/biografias/abrao-o-judeu-e-abramelin/ […]

Postagem original feita no https://mortesubita.net/biografias/abrao-o-judeu-e-abramelin/

‘A Árvore da Vida: Estudo sobre Magia

ISRAEL REGARDIE

A Árvore da Vida – Um Estudo sobre Magia é a principal obre de Israel Regardie sobre a filosofia e a prática da Magia Cerimonial. Com o esmero de um professor dedicado, o autor revela um estudo sem igual sobre as raizes caldeas e egipcias da magia e percorre os caminhos da yoga, da cabala, da alquimia, da magia sexual, bem como os segredos da invocação, e da viagem astra. Todas estas lições culminam por fim nos tradicionais métodos para entrar em contato com o eu superior do magista.

ÍNDICE

PRIMEIRA PARTE

“A MAGIA É A CIÊNCIA TRADICIONAL DOS SEGREDOS DA NATUREZA QUE A NÓS FOI TRANSMITIDA PELOS MAGOS.” Éliphas Lévi

SEGUNDA PARTE

“SENTADO EM SUA CADEIRA VOCÊ PODE VIAJAR MAIS DO QUE COLOMBO JAMAIS O FEZ E PARA MUNDOS MAIS NOBRES DO QUE AQUELES QUE OS OLHOS DELE CONTEMPLARAM. NÃO ESTÁ CANSADO DE SUPERFÍCIES? VENHA COMIGO E NOS BANHAREMOS NA FONTE DA JUVENTUDE. POSSO INDICAR-LHE O CAMINHO PARA O ELDORADO.” Candle of Vision – A. E .

[…] Postagem original feita no https://mortesubita.net/alta-magia/a-arvore-da-vida-um-estudo-sobre-magia/ […]

Postagem original feita no https://mortesubita.net/alta-magia/a-arvore-da-vida-um-estudo-sobre-magia/