Definir ou delimitar o conceito do Tao (ou Dao) da filosofia oriental, é no mínimo uma tarefa paradoxal, afinal ‘O tao que pode ser expressado, não é o tao absoluto’. É um conceito muito antigo, adotado como princípio fundamental do taoismo.
Tao (em chinês: 道; Wade-Giles: tao; pinyin: dao) significa, traduzindo literalmente, o caminho, mas é um conceito que só pode ser apreendido por intuição. O tao não é só um caminho físico e espiritual; é identificado com o absoluto que, por divisão, gerou os opostos/complementares Yin e Yang, a partir dos quais todas as “dez mil coisas” que existem no Universo foram criadas.
Quando pensamos numa substância única que dá forma a tudo que existe no Universo, lembramos do conceito alquímico da prima matéria, ou matéria prima. A prima materia é um conceito chave da Alquimia. Ela é como o nome sugere a matéria prima com a qual se realiza as operações e se extraem os elementos. Ela não está em tudo, ela é tudo.
“O termo prima matéria tem uma longa história, que remonta aos filósofos pré-socráticos. Esses antigos pensadores estavam presos a uma ideia arquetípica, que lhes dizia que o mundo é gerado de uma matéria única original, a chamada primeira matéria” (EDINGER, 2006, p.29)
Por esse motivo, a água, como símbolo, é associada à prima matéria, pois todos viemos da água (organismos unicelulares). A água também é um símbolo para o inconsciente, instância inicial que ‘gera’ a consciência. No entanto, a água é um símbolo alquímico ambíguo. Ao mesmo tempo em que representa um dos quatro elementos, representa todos os quatro indiferenciados. De novo, remontamos à filosofia oriental para facilitar e transcender nossa visão de mundo, como vemos neste vídeo de Bruce Lee:
E o que a Ciência pode aprender com esses conhecimentos milenares? Como é falado no vídeo, é preciso estar num ponto de equilíbrio entre instinto e controle, sendo que em demasia, este último pode te tornar um ‘homem mecânico’. Mas será que a comunidade científica acompanha este pensamento integral? No prefácio da segunda edição do livro “O Tao da Física”, Fritjof Capra diz o seguinte sobre os novos paradigmas científicos que se formavam a partir dentre outras coisas, da física quântica:
“A reacção da comunidade científica, previdentemente, tem sido mais cautelosa; mas, também aí, o interesse nas vastas implicações da física do século vinte tem aumentado. A relutância dos cientistas modernos em aceitar as profundas semelhanças entre os seus conceitos e os dos místicos não é surpreendente, já que o misticismo —pelo menos no Ocidente — tem sido tradicionalmente associado, de maneira errada, com coisas vagas, misteriosas, acientíficas. Esta atitude está, felizmente, a mudar. À medida que o pensamento oriental começou a interessar um número significativo de pessoas e a meditação deixou de ser ridícula ou suspeita, o misticismo tem sido tomado a sério mesmo na comunidade científica” (CAPRA, 1982, p.13)
Capra escreveu isso há 32 anos!!! Será mesmo que a visão de um mundo integrado estava tão próxima como o físico austríaco imaginara? De toda forma, estamos percebendo, mais agora do que nunca, que nossa sociedade está passando por um momento crítico. Vejamos nosso cenário político e a dicotomia batida de ‘petralha’ vs. ‘coxinha’. Ou então os casos absurdos, porém recorrentes, de estupros e violência contra a mulher, que expressam um evidente descompasso da energia masculina (yang) em relação a feminina (yin). As polaridades que nos dividem no coletivo, também nos dividem internamente, e o Casamento Alquímico, ou coniunctio oppositorum, parece uma metáfora pertinente para o trabalho que temos, individualmente e coletivamente, para executar.
“Estas discussões ajudaram-me muito na compreensão do abrangente enquadramento cultural, presente no grande interesse pelo misticismo oriental que surgiu no Ocidente nos últimos vinte anos. Agora entendo este interesse como integrante de uma tendência que visa contrariar um profundo desequilíbrio na nossa cultura—nos nossos pensamentos e sentimentos, valores e atitudes, e estruturas sociais e políticas. Achei a terminologia chinesa de yin e yang muito útil para descrever este desequilíbrio cultural. A nossa cultura tem consecutivamente favorecido valores e atitudes yang, ou masculinos, negligenciando as suas contrapartes complementares yin, ou femininas. Temos favorecido auto-asserções em lugar de integração, análise em lugar de síntese, conhecimento racional em lugar de sabedoria intuitiva, ciência em lugar de religião, competição em lugar de cooperação, expansão em lugar de conservação, e ‘ assim por diante. Este desenvolvimento unilateral chegou a um estado alarmante, a uma crise de dimensões sociais, ecológicas, morais e espirituais” (CAPRA, 1982, p.14)
Neste contexto, portanto, saudável é se atentar da responsabilidade em harmonizar-nos internamente, e seguir o fluxo natural da existência, em equilíbrio. A palavra Tao pode significar ‘caminho’, mas seu verdadeiro significado transcende a gramática, se tornando compreensível apenas em esferas abstratas. A arte, como sempre, pode nos ajudar. Como diria o poeta espanhol Antonio Machado:
Caminhante, são teus passos
o caminho, e nada mais;
caminhante, não há caminho,
faz-se o caminho ao andar.
Se você gostou desse conteúdo, você pode assistir ao filme ‘O Ponto de Mutação’, baseado no livro homônimo de Fritjof Capra, escrito após ‘O Tao da Física’. Mas se você gostou mesmo, participe do mini-curso de 4h sobre Alquimia Taoista, com prática de Tai Chi Chuan (气功 QiGong) que acontecerá em breve na Clínica Antharez. Dúvidas, críticas ou sugestões, nos comentários!
Referências Bibliográficas:
CAPRA, Fritjoc. O Tao da Física. Lisboa: Editorial Presença. 1975.
EDINGER, Edward. Anatomia da Psique: O Simbolismo Alquímico na Psicoterapia. São Paulo: Cultrix, 1990.
Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano, Mestrando em Ciências da Religião e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br ou envie um e-mail para contato@antharez.com.br
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Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/o-caminho-alqu%C3%ADmico-do-tao