Apoteose Humana

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Langdon se virou de costas para Katherine, encarou a parede curva e sussurrou bem baixinho:

– Katherine, aqui é sua consciência falando. Por que você abandonou Robert?

Katherine parecia já conhecer as espantosas propriedades acústicas da cúpula… pois a parede sussurrou de volta.

– Porque Robert está sendo um medroso. Ele deveria vir até aqui comigo. Ainda temos muito tempo (…)

Langdon sabia que ela estava certa e, com relutância, foi contornando a galeria, mantendo-se grudado à parede o tempo todo.

– Este teto é absolutamente incrível – comentou Katherine maravilhada, com o pescoço esticado para abarcar o imenso esplendor da Apoteose acima dela. – Deuses míticos misturados com inventores e suas criações? E pensar que esta é a imagem no centro do nosso Capitólio.

Langdon voltou os olhos para cima na direção das gigantescas formas de Franklin, Fulton e Morse ao lado de seus inventos tecnológicos.

Um arco-íris brilhante se projetava a partir desses personagens, guiando o olhar de Langdon para George Washington, que subia aos céus em cima de uma nuvem. A grande promessa do homem que se torna Deus.

– É como se toda a essência dos Antigos Mistérios estivesse pairando sobre a Rotunda – disse Katherine.

Langdon tinha de admitir que não havia muitos afrescos no mundo que fundiam invenções científicas com deuses míticos e apoteose humana. A espetacular coleção de imagens do teto era de fato uma mensagem dos Antigos Mistérios e estava ali por um motivo. Os pais fundadores tinham imaginado os Estados Unidos como uma tela em branco, um campo fértil sobre o qual poderiam lançar as sementes dos mistérios. Hoje, aquele ícone sublime – o pai da nação subindo as céus – pairava silenciosamente sobre os legisladores, líderes e presidentes do país… um lembrete arrojado, um mapa para o futuro, a promessa de um tempo em que o homem iria evoluir rumo à maturidade espiritual completa.

– Robert – sussurrou Katherine com os olhos ainda fixos nas enormes figuras dos grandes inventores norte-americanos acompanhados por Minerva -, esse afresco é profético. Hoje em dia, as invenções mais avançadas estão sendo usadas para estudar as idéias mais antigas. A noética pode ser uma disciplina nova, mas é a ciência mais antiga do mundo: o estudo da mente humana. – Ela se virou para Langdon, maravilhada. – E estamos aprendendo que os antigos compreendiam o pensamento de modo mais profundo do que compreendemos hoje.

– Faz sentido – retrucou o professor. – A mente humana era a única tecnologia à disposição dos antigos. Os primeiros filósofos a estudaram de forma incansável.

– Isso mesmo! Os textos antigos são obcecados pelo poder da mente humana. Os Vedas descrevem o fluxo da energia mental. A Pistis Sophia fala sobre a consciência universal. O Zohar explora a natureza da mente-espírito. Os textos xamanísticos predizem a “influência remota” de Einstein em termos de cura a distância. Está tudo lá! E olhe que eu nem comecei a falar da Bíblia.

– Você também? – brincou Langdon. – Seu irmão tentou me convencer de que a Bíblia está cheia de informações científicas cifradas.

– Mas está mesmo – disse ela. – E, se você não acredita em Peter, leia alguns dos textos esotéricos de Newton sobre as Escrituras. Quando começar a entender as parábolas crípticas, Robert, você vai perceber que a Bíblia é um estudo da mente humana.

Langdon encolheu os ombros.

– Acho que vou ter que ler tudo de novo.

– Deixe-me fazer uma pergunta – disse ela, obviamente sem apreciar seu ceticismo. – Quando a Bíblia nos diz que devemos “construir nosso templo” e fazer isso “sem ferramentas e sem ruído”, de que templo você acha que ela está falando?

– Bem, o texto diz que o nosso corpo é um templo.

– Sim, em Coríntios 3:16. Vós sois o templo de Deus. – Ela sorriu. – E o Evangelho segundo João diz exatamente a mesma coisa. Robert, as Escrituras sabem muito bem o poder que existe latente em nós, e nos incentivam a dominar esse poder… a construir os templos de nossas mentes.

– Infelizmente, acho que grande parte do mundo religioso está esperando que um templo de verdade seja reconstruído. Isso faz parte da Profecia Messiânica.

– Sim, mas deixa de lado um ponto importante. O Segundo Advento é o do homem, o instante em que a humanidade finalmente constrói o templo de sua mente.

– Não sei – disse Langdon, esfregando o queixo. – Não sou nenhum estudioso da Bíblia, mas tenho quase certeza de que as Escrituras descrevem em detalhes um templo físico que precisa ser construído. Segundo a descrição, a estrutura seria dividida em duas partes: um templo externo chamado Santo e um santuário interno chamado Santo dos Santos. As duas partes estão separadas uma da outra por um fino véu.

Katherine sorriu novamente.

– Bela memória bíblica para um cético. Aliás, você já viu um cérebro humano de verdade? Ele é constituído por duas partes: uma externa, chamada dura-máter, e outra interna, chamada pia-máter. Essas duas partes são separadas pela membrana aracnóide, um véu de tecido que parece uma teia de aranha.

Langdon inclinou a cabeça, surpreso.

Com delicadeza, ela ergueu a mão e tocou a têmpora de Langdon.

– Existe um motivo para temple, em inglês, significar tanto “têmpora” quanto “templo”, Robert.

Enquanto Langdon tentava processar o que Katherine acabara de dizer, lembrou-se inesperadamente do Evangelho gnóstico segundo Maria: Onde a mente está, lá está o tesouro.

– Talvez você tenha ouvido falar – disse Katherine, baixando o tom de voz – nos exames de ressonância magnética feitos em iogues meditando. Quando em estado avançado de concentração, o cérebro humano produz, por meio da glândula pineal, uma substância parecida com cera. Essa secreção cerebral não se parece com nenhuma outra substância do corpo. Ela tem um efeito incrivelmente curativo, é capaz de regenerar células e talvez seja um dos motivos por trás da longevidade dos iogues. Isso é ciência, Robert. Essa substância tem propriedades inconcebíveis e só pode ser criada por uma mente em estado de profunda concentração.

– Eu me lembro de ter lido sobre isso alguns anos atrás.

– E, falando nisso, você conhece o relato da Bíblia sobre o “maná dos céus”? Langdon não via ligação alguma entre os dois assuntos.

– Está se referindo à substância mágica que caiu do céu para alimentar os famintos?

– Exatamente. Dizia-se que essa substância curava os doentes, dava a vida eterna e, estranhamente, não produzia dejetos depois de consumida. – Katherine fez uma pausa, como se estivesse esperando que ele entendesse. – Robert – insistiu ela -, um alimento que caiu do céu? – Ela cutucou a própria têmpora. – Que cura o corpo por magia? Que não gera dejetos? Ainda não entendeu? São palavras em código, Robert! Templo é um código para “corpo”. Céu é um código para “mente”. A Escada de Jacó é a sua coluna vertebral. E o maná é essa rara secreção produzida pelo cérebro. Quando você vir essas palavras cifradas nas Escrituras, preste atenção. Elas muitas vezes são sinais de um significado mais profundo escondido sob a superfície.

Katherine passou a falar rápido, explicando como a mesma substância mágica aparecia em todos os Antigos Mistérios: néctar dos deuses, elixir da vida, fonte da juventude, pedra filosofal, ambrosia, orvalho, ojas, soma. Depois começou a dar uma longa explicação sobre como a glândula pineal representava o olho de Deus que tudo vê.

– Segundo Mateus 6:22 – disse ela com animação -, “Quando o teu olho for bom, todo o teu corpo terá luz”. Esse conceito também é representado pelo chacra ajna e pelo pontinho na testa dos hindus que…

Katherine se deteve abruptamente, parecendo encabulada.

– Desculpe… sei que estou falando sem parar. Mas é que acho tudo isso tão emocionante! Passei anos estudando as afirmações dos antigos sobre o incrível poder mental do homem, e agora a ciência está nos mostrando que o acesso a esse poder se dá, na verdade, por meio de um processo físico. Se usado corretamente, nosso cérebro pode invocar poderes literalmente sobre-humanos. A Bíblia, como muitos textos antigos, é uma exposição detalhada da máquina mais sofisticada de todos os tempos… a mente humana. – Ela deu um suspiro. – Por incrível que pareça, a ciência ainda não alcançou todo o potencial da mente.

– Parece que seu trabalho com a noética vai representar um salto à frente nessa área.

– Talvez seja um salto para trás – disse ela. – Os antigos já conheciam muitas das verdades científicas que estamos redescobrindo atualmente. Em questão de anos, o homem moderno será forçado a aceitar algo hoje impensável: nossas mentes podem gerar energia capaz de transformar a matéria física. – Ela fez uma pausa. – As partículas reagem aos pensamentos… o que significa que nossos pensamentos têm o poder de mudar o mundo.

Langdon abriu um leve sorriso.

– Minha pesquisa me fez acreditar nisto: Deus é muito real… uma energia mental que permeia tudo – disse Katherine. – E nós, seres humanos, fomos criados a essa imagem…

– Como assim? – interrompeu Langdon. – Criados à imagem de… uma energia mental?

– Exatamente. Nossos corpos físicos evoluíram com o tempo, mas nossas mentes é que foram criadas à semelhança de Deus. Nós estamos levando a Bíblia muito ao pé da letra. Aprendemos que Deus nos criou à sua imagem, mas não são nossos corpos físicos que se assemelham a Deus, são nossas mentes.

Langdon se calara, totalmente fascinado.

– É esse o verdadeiro presente, Robert, e Deus está esperando que entendamos isso. Pelo mundo todo ficamos olhando para o céu à procura de Deus… sem nunca perceber que Ele está esperando por nós. – Katherine fez uma pausa, dando tempo para aquelas palavras serem absorvidas. – Nós somos criadores, mas ainda assim ficamos ingenuamente fazendo o papel de criaturas. Vemos a nós mesmos como ovelhas indefesas, manipuladas pelo Deus que nos criou. Mas, quando percebermos que somos realmente feitos à imagem do Criador, vamos começar a entender que nós também devemos ser criadores. Assim que entendermos esse fato, as portas do potencial humano irão se escancarar.

Langdon se lembrou de um trecho da obra do filósofo Manly P. Hall: Se o infinito não quisesse que o homem fosse sábio, não teria lhe dado a faculdade de saber. Langdon tornou a erguer os olhos para A Apoteose de Washington – a ascensão simbólica do homem à divindade. A criatura… se transformando em Criador.

– O mais incrível de tudo – disse Katherine – é que, assim que nós, humanos, começarmos a dominar nosso verdadeiro poder, teremos enorme controle sobre o mundo. Seremos capazes de projetar a realidade em vez de simplesmente reagir a ela.

Langdon baixou os olhos.

– Parece… perigoso.

Katherine ficou surpresa… e impressionada.

– Isso, exatamente! Se os pensamentos afetam o mundo, então precisamos tomar muito cuidado com a maneira como pensamos. Pensamentos destruitivos também têm influência, e todos sabemos que é muito mais fácil destruir do que criar.

Langdon pensou em todas as histórias sobre a necessidade de proteger o antigo saber dos não merecedores e de compartilhá-lo apenas com os iluminados. Pensou no Colégio Invisível e no pedido do grande cientista Isaac Newton a Robert Boyle para que guardasse “total silêncio” sobre seu estudo secreto. Ele não pode ser divulgado, escreveu Newton em 1676, sem imensos danos para o mundo.

– Houve, no entanto, uma reviravolta interessante – disse Katherine. – A grande ironia é que, durante séculos, todas as religiões do mundo incentivaram seus seguidores a abraçar os conceitos de fé e crença. Agora a ciência, que passou muitos séculos desprezando a religião ao considerá-la mera superstição, está sendo obrigada a admitir que sua próxima grande fronteira é literalmente a ciência da fé e da crença… o poder da convicção e da intenção. A mesma ciência que erodiu nossa fé nos milagres está agora construindo uma ponte para atravessar o abismo que criou.

Langdon passou um bom tempo pensando nas palavras dela. Bem devagar, tornou a erguer os olhos para a Apoteose.

– Quero fazer uma pergunta – falou, olhando de volta para Katherine. – Mesmo que eu conseguisse aceitar, apenas por um instante, que tenho o poder de modificar matéria física com a mente e de criar tudo aquilo que desejo… como poderia acreditar nisso se, infelizmente, não vejo nenhum indício desse poder na minha vida?

Ela deu de ombros.

– Então você não está procurando direito.

– Calma lá, quero uma resposta de verdade. Isso está parecendo uma resposta de padre. Quero uma de cientista.

– Você quer uma resposta de verdade? Aqui está. Se eu lhe der um violino e disser que você tem a capacidade de usá-lo para tocar músicas lindas, não estarei mentindo. Você tem essa capacidade, mas vai precisar treinar muito para que ela se manifeste. Aprender a usar a mente é a mesma coisa, Robert. O pensamento bem direcionado é uma habilidade que se adquire. Manifestar uma intenção requer um foco digno de um raio laser, uma visualização sensorial completa e uma crença profunda. Nós demonstramos isso no laboratório. E, como no caso do violino, existem pessoas que demonstram uma aptidão natural maior que outras. Olhe para a história. Veja os relatos de mentes iluminadas que realizaram feitos milagrosos.

– Katherine, por favor, não me diga que você realmente acredita nesses milagres. Quer dizer, francamente… transformar água em vinho, curar os doentes com um toque da mão?

Katherine inspirou fundo e soltou o ar lentamente.

– Eu já vi pessoas transformarem células cancerosas em células saudáveis apenas pensando nelas. Vi mentes humanas afetando o mundo físico de inúmeras formas. E quando você testemunha isso, Robert, quando essas coisas se tornam parte da sua realidade, a única diferença entre elas e alguns dos milagres sobre os quais já lemos passa a ser a intensidade.

Langdon estava pensativo.

– É um jeito inspirador de ver o mundo, Katherine, mas fico com a sensação de que isso é um salto de fé impossível. E, como você sabe, a fé nunca foi uma coisa fácil para mim.

– Então não pense nisso como fé. Pense que é apenas uma mudança de perspectiva: aceitar que o mundo não é exatamente como você imagina. Historicamente, todos os grande avanços científicos começaram com uma idéia simples que ameaçou virar todas as crenças de cabeça para baixo. A simples afirmação “A Terra é redonda” foi desprezada e taxada de impossível porque a maioria das pessoas acreditava que, se fosse assim, os oceanos se derramariam do planeta. O heliocentrismo foi chamado de heresia. As mentes medíocres sempre atacaram aquilo que não entendem. Há aqueles que criam… e aqueles que destroem. Essa dinâmica existe desde que o mundo é mundo. Mas os criadores sempre acabam encontrando quem acredite neles. Então a quantidade de seguidores cresce até que alcança um número crítico e, de repente, o mundo se torna redondo, ou o sistema solar passa a ser heliocêntrico. A percepção se transforma e uma nova realidade nasce.

Langdon aquiesceu, agora com o pensamento longe.

– Você está com uma cara engraçada – disse ela.

– É, sei lá. Por algum motivo, estava me lembrando de como eu costumava pegar um pequeno barco e ir até o meio do lago à noite, só para ficar deitado debaixo das estrelas pensando nesse tipo de coisa.

Ela assentiu, compreendendo.

– Acho que todos nós temos uma lembrança parecida. Ficar deitado olhando para o céu… isso de alguma forma abre a mente. – Ela ergueu os olhos para o teto e então falou: – Me dê seu paletó.

– O quê? – Ele tirou o paletó e o entregou a ela.

Katherine o dobrou duas vezes, estendendo-o no chão da galeria como um travesseiro comprido.

– Deite-se.

Langdon se deitou de costas e Katherine ajeitou a cabeça dele sobre metade do paletó dobrado. Então ela se deitou ao lado dele – duas crianças, com os ombros colados sobre aquela passarela estreita, olhando para o enorme afresco de Brumidi.

– Muito bem – sussurou Katherine. – Procure entrar naquele mesmo estado de espírito… uma criança deitada em um barco… observando as estrelas… com a mente aberta e cheia de assombro.

Langdon tentou obedecer, embora, naquele instante, deitado e à vontade, uma súbita onda de exaustão tomasse conta de seu corpo. À medida que sua visão se embaçava, ele percebeu uma forma difusa lá em cima que o despertou na mesma hora. Será possível? Não conseguia acreditar que não tivesse percebido isso antes, mas os personagens de A Apoteose de Washington estavam obviamente posicionados em dois círculos concêntricos – um círculo dentro de um círculo. Será que a Apoteose também é um circumponto? Langdon se perguntou que outro detalhe deixara passar naquela noite.

– Tenho uma coisa importante para dizer a você, Robert. Existe outra peça que considero o aspecto mais espantoso da minha pesquisa.
Ainda tem mais?

Katherine se apoiou no cotovelo.

– E juro… se nós, seres humanos, formos capazes de apreender de forma honesta essa única verdade simples… o mundo vai mudar da noite para o dia.

Ela passou a ter toda a sua atenção.

– Para começar – disse ela – , eu deveria lembrá-lo dos mantras maçônicos que nos incitam a “reunir o que está disperso”, “criar ordem a partir do caos” e encontrar a “união”.

– Continue. – Langdon estava intrigado.

Katherine sorriu para ele.

– Nós provamos cientificamente que o poder do pensamento humano cresce exponencialmente em proporção à quantidade de mentes que compartilham um mesmo pensamento.

Langdon continuou em silêncio, perguntando-se aonde ela queria chegar com essa idéia.

– O que estou dizendo é o seguinte: duas cabeças pensam melhor do que uma, mas não são duas vezes melhor, e sim muitas vezes melhor. Várias mentes trabalhando em uníssono ampliam o efeito de um pensamento… de forma exponencial. É esse o poder inerente aos grupos de oração, aos círculos de cura, aos cantos coletivos e às devoções em massa. A idéia de uma consciência universal não é um conceito etéreo da Nova Era. É uma realidade científica palpável… e dominar essa consciência tem o potencial de transformar o mundo. Essa é a descoberta fundamental da ciência noética. E o que é mais importante: isso está acontecendo agora. É possível sentir essa mudança à nossa volta. A tecnologia está nos conectando de formas que jamais imaginamos: veja o Twitter, o Google, a Wikipédia e tantas outras coisas… tudo isso se une para criar uma rede de mentes interconectadas. – Ela riu. – E garanto a você: assim que eu publicar meu livro, todo mundo vai começar a postar no Twitter coisas do tipo “aprendendo sobre ciência noética”, e o interesse por essa disciplina vai explodir de forma exponencial.

As pálpebras de Langdon estavam incrivelmente pesadas.

– Sabe que até hoje eu não aprendi a mandar um twitter?

– Um tweet – corrigiu ela, rindo.

– Como?

– Deixe para lá. Feche os olhos. Eu acordo você quando chegar a hora.

(…)Engolido por uma nova onda de exaustão, fechou os olhos. Na escuridão de sua mente, se surpreendeu pensando na consciência universal… nos escritos de Platão sobre “a mente do mundo” e o “deus da união”… no “inconsciente coletivo” de Jung. O conceito era ao mesmo tempo simples e espantoso.
Deus está na união de Muitos… e não em Um só.

– Elohim – falou Langdon de repente, reabrindo os olhos ao perceber um vínculo inesperado.

– Como? – Katherine ainda o olhava de cima.

– Elohim – repetiu ele. – A palavra hebraica usada no Antigo Testamento para se referir a Deus! Ela sempre me intrigou.

Katherine abriu um sorriso de cumplicidade.

– Sim. A palavra está no plural.
Exatamente! Langdon nunca tinha entendido por que os primeiros trechos da Bíblia se referiam a Deus como um ser plural. Elohim. O Deus Todo-Poderoso do Gênesis era descrito não como Um… mas como Muitos.

– Deus é plural – sussurrou Katherine – porque as mentes dos homens são plurais.

Os pensamentos de Langdon estavam a mil… sonhos, lembranças, esperanças, medos, revelações… tudo rodopiava acima dele no domo da Rotunda. À medida que seus olhos começavam a se fechar novamente, ele se viu encarando três palavras em latim que faziam parte da Apoteose.

E PLURIBUS UNUM.
De muitos, um só, pensou, pegando no sono.

***

Trecho retirado do livro “O Símbolo Perdido”, de Dan Brown (Rio de Janeiro: Sextante, 2009).

#Maçonaria #mente #pensamento

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/apoteose-humana

Referências Ocultistas em Promethea

O Alan Moore é um gênio. E Promethea é uma de suas obras primas, com referências muito mais complexas do que Watchmen ou mesmo a Liga Extraordinária.

Recentemente, comentei sobre uma sequencia de páginas de Promethea referentes a Daath e o pessoal me pediu para escrever sobre toda a série. Nesta série de posts, que começará no Sedentário e continuará no Teoria da Conspiração, tentarei comentar sobre as referências ocultistas que ele utilizou enquanto escrevia Promethea.

Não será um trabalho simples. Ao longo de 32 edições (que por si só já foi uma escolha pensada, visto que a Árvore da Vida possui 32 Paths (entre 10 Esferas e 22 Caminhos) que relacionam praticamente todos os Sistemas magísticos e filosóficos que existem.
A primeira HQ, “The Radiant Heavenly City”, traz na capa Promethea desenhada por ninguém menos do que Alex Ross, em um estilo egipcio, mas a própria capa já traz dentro de si algumas surpresas e referências:

O Nome “The Radiant Heavenly City” é uma referência bíblica; Apocalipse 22,14 “Bem-aventurados aqueles que guardam os seus mandamentos, para que tenham direito à árvore da vida, e possam entrar na Cidade Celestial pelas portas.”. A Cidade Celestial mencionada é o Paraíso que os crentes pensam que é de verdade e os ateus pensam que é de mentira mas, na realidade, é apenas simbólica para representar Kether, o Universo e a origem de todas as idéias. A Árvore da Vida é uma estrutura simbólica que representa todos os níveis de consciência humanos, de Malkuth (a pedra bruta) a Kether (o todo).

“Se Ela não existisse, nós teríamos de inventá-la” é uma referência ao maçon Voltaire, que disse “Se deus não existisse, nós teríamos de inventá-lo“.

E finalmente, o conjunto de imagens à direita de Promethea não são apenas desenhos aleatórios: são hieróglifos egipcios e símbolos esotéricos que contam uma história: O Sol (que acompanha Promethea durante sua jornada – o iniciado, iluminado); Ibis (que representa o Pai); O Por do Sol (que representa o fim de um período ou era); o Labirinto (que representa a jornada); O capacete (representando as muralhas de tróia, o conflito e a guerra); As águas e o olho (o despertar da consciência e a pesquisa – a protagonista entra na Jornada do Herói fazendo uma pesquisa a respeito de Promethea); os dois ankhs (herança – promethea é filha do sábio que morre no início da HQ), o escaravelho (renascimento de Promethea) e o Alef (o Começo)… em resumo para quem não leu: Alan Moore conta a história da primeira HQ em hieroglifos!

No Lado esquerdo, os hieroglifos representam as águas (consciência, emoções), a serpente e os dois lados da árvore da Vida (A via úmida e a via Seca dos alquimistas), a pena de Maat queimada (a incompletude), o abismo (a separação entre o reino material e o das idéias) a Lira e louros (representando a poesia e poetas), o Ankh (o domínio da árvore, a própria Promethea) e finalmente Hórus, filho do Sol. Novamente, para quem não leu, spoilers: Alan Moore explica que a idéia de Promethea e a escalada até a iluminação não pode ser destruída, permanecendo dormente até cruzar novamente o abismo através da poesia (ou textos).

O caduceu e as duas vias de subida na Árvore da Vida são representadas no bastão que Promethea segura. A palavra “Promethea” vem de Prometeus, o titã que roubou o fogo dos deuses para trazer aos mortais e, por causa, disso foi punido e condenado a permanecer acorrentado a uma rocha pela eternidade, com uma águia comendo seu fígado, que renascia a cada novo dia. Tal qual os símbolos, cujos significados atravessam o tempo e as culturas.

e acabamos a CAPA… faltam 32 paginas. Agora vocês têm uma idéia do porquê o Alan Moore é foda!

Alexandria 411 DC – Ano em que Santo Agostinho faz o discurso sobre “A imutabilidade de Deus é percebida através da mutabilidade de suas criações”. O mesmo tema de Promethea, já que estamos falando de idéias e formas mutáveis. Voce pode conferir este discurso no site do Vaticano. Obviamente a escolha da data não é uma coincidência.

O pai de Promethea está terminando traduções do egipcio para o grego (note as estátuas de Hermes e Toth sobre a mesa, representando o mesmo deus na cultura grega e egípcia) quando é abordado pelos fanáticos cristãos malucos. Ele possui o dom da profecia, não apenas avisando Promethea sobre seu reencontro (que só vai acontecer lá pela edição 19) mas também falando as frases dos cristãos antes deles próprios, demonstrando que já sabia seu destino e o aceitava (se ele previa o futuro, poderia ter fugido, mas não o fez, e estava sorrindo quando o mataram). Note as imagens do Sol nos cantos dos quadrinhos, desenhados como se estivesse pondo. A partir do começo da história, o Sol é retratado de uma forma moderna, mas DE OLHOS FECHADOS no presente, até o final do capítulo, quando o sol moderno abre os olhos ao renascimento de Promethea.

Na página 20-21, Promethea conversa pela primeira vez com Toth-Hermes. Ambos conversam com ela como se fossem uma única pessoa e explicam o que Moore chamou de Immateria, ou o que os cabalistas conhecem como Ruach, o Mundo das Idéias e Emoções. Ali, todas as histórias possuem vida e podem acessar nosso mundo de tempos em tempos. Carl Jung chamou este estado de consciência de Inconsciente Coletivo e Richard Dawkins chamou estas “idéias vivas” de Memeplexes.

Na página 22 é mostrado um Centauro como sendo o tutor de Promethea. Centauros são construções imagéticas que representam o signo de Sagitário. Sagitário, ou Fogo Mutável, é a essência espiritual/filosófica manifestada no estado mental; é o processo de síntese: de reunir várias teorias e configurá-las em uma tese, como uma espiral.
No arquétipo grego, este período de tempo no qual estas energias estavam mais manifestas coincidia com a fase próxima ao inverno, quando eram valorizados os caçadores e os cavalos (a caça era necessária para obter carne e peles para o inverno e o cavalo para percorrer estas distâncias), daí a fusão de cavalo + cavaleiro em uma única figura, que absorvia o arquétipo de acadêmico e se tornava Quíron, o professor de Herakles (o Sol, filho de Deus com uma humana, Jesus, o Iniciado).

Na última página, uma referência o Arcano do Mundo, do tarot. Moore coloca como símbolos dos quatro elementos o Escaravelho (Terra), os Louros (Fogo), o pássaro/Toth (Água) e o Homem/Hermes (Ar).
Esta representação iconográfica acaba confundindo um pouco os iniciantes, porque aparentemente o pássaro deveria representar o Ar, mas a razão para isso é astronômica. Quando os primeiros zodíacos foram criados na Babilônia, o posicionamento das constelações no céu era diferente do que está ai hoje e a que ocupava o correspondente às emoções era a Constelação de Aquila (daí a imagem da Águia Dourada estar associada à Coragem) e o Ar é a constelação de Aquadeiro (era representado por um homem carregando uma jarra de água, o que causa confusão nos esquisotéricos com o nome Aquário e a correlação com o elemento AR). Constelações e os Signos nunca tiveram nada a ver um com o outro, ao contrário do que a Veja e os leigos astrônomos afirmaram recentemente.

#AlanMoore

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/refer%C3%AAncias-ocultistas-em-promethea

Carl Gustav Jung

1875 – 1961

Carl Gustav Jung nasceu a 26 de julho de 1875, em Kresswil, Basiléia, na Suíça, no seio de uma família voltada para a religião. Seu pai e vários outros parentes eram pastores luteranos, o que explica, em parte, desde a mais tenra idade, o interesse do jovem Carl por filosofia e questões espirituais e o pelo papel da religião no processo de maturação psíquica das pessoas, povos e civilizações. Criança bastante sensível e introspectiva, desde cedo o futuro colega de Freud demonstrou uma inteligência e uma sagacidade intelectuais notáves, o que, mesmo assim, não lhe poupou alguns dissabores, como um lar algumas vezes um pouco desestruturado e a inveja dos colegas e a solidão.

Ao entrar para a universidade, Jung havia decidido estudar Medicina, na tentativa de manter um compromisso entre seus interesses por ciências naturais e humanas. Ele queria, de alguma forma, vivenciar na prática os ideais que adotava usando os meios dados pela ciência. Por essa época, também, passou a se interessar mais intensamente pelos fenômenos psíquicos e investigou várias mensagens hipoteticamente recebidas por uma médium local (na verdade, uma prima sua), o que acabou sendo o material de sua tese de graduação, “Psicologia e Patologia dos Assim Chamados Fênomenos Psíquicos”.

Em 1900, Jung tornou-se interno na Clínica Psiquiátrica Bugholzli, em Zurique, onde estudou com Pierre Janet, em 1902, e onde, em 1904, montou um laboratório experimental em que criou seu célebre teste de associação de palavras para o diagnóstico psiquiátrico. Neste, uma pessoa é convidada a responder a uma lista padronizada de palavras-estímulo; qualquer demora irregular no tempo médio de resposta ou excitação entre o estímulo e a resposta é muito provavelmente um indicador de tensão emocional relacionada, de alguma forma, com o sentido da palavra-estímulo. Mas tarde este teste foi aperfeiçoado e adaptado por inúmeros psiquiatras e psicólogos, para envolver, além de palavras, imagens, sons, objetos e desenhos. É este o princípio básico usado no detector de mentiras, utilizado pela polícia científica. Estes estudos lhe granjearam alguma reputação, o que o levou, em 1905, aos trinta anos, a assumir a cátedra de professor de psiquiatria na Universidade de Zurique. Neste ínterim, Jung entra em contato com as obras de Sigmund Freud (1856-1939), e, mesmo conhecendo as fortes críticas que a então incipiente Psicanálise sofria por parte dos meio médicos e acadêmicos na ocasião, ele fez questão de defender as descobertas do mestre vienense, convencido que estava da importância e do avanço dos trabalhos de Freud. Estava tão enstusiasmado com as novas perspectivas abertas pela psicanálise, que decidiu conhecer Freud pessoalmente. O primeiro encontro entre eles transformou-se numa conversa que durou treze horas ininterruptas. A comunhão de idéias e objetivos era tamanha, que eles passaram a se corresponder semanalmente, e Freud chegou a declarar Jung seu mais próximo colaborador e herdeiro lógico, e isso é algo que tem de ser bem frisado, a mútua admiração entre estes dois homens, frequentemente esquecida tanto por freudianos como por junguianos. Porém, tamanha identidade de pensamentos e amizade não conseguia esconder algumas diferenças fundamentais, e nem os confrontos entre os fortes gênios de um e de outro. Jung jamais conseguiu aceitar a insistência de Freud de que as causas dos conflitos psíquicos sempre envolveriam algum trauma de natureza sexual, e Freud não admitia o interesse de Jung pelos fenômenos espirituais como fontes válidas de estudo em si. O rompimento entre eles foi inevitável, ainda que Jung o tenha, de certa forma, precipitado. Ele iria acontecer mais cedo ou mais tarde. O rompimento foi doloroso para ambos. O rompimento turbulento do trabalho mútuo e da amizade acabou por abrir uma profunda mágoa mútua, nunca inteiramente assimilada pelos dois principais gênios da Psicologia do século XX e que ainda, infelizmente, divide partidários de ambos os teóricos.

Aterior mesmo ao período em que estavam juntos, Jung começou a desenvolver uma sistema teórico que chamou, originalmente, de “Psicologia dos Complexos”, mais tarde chamando-a de “Psicologia Analítica”, como resultado direto de seu contato prático com seus pacientes. O conceito de inconsciente já está bem sedimentado na sólida base psiquiátrica de Jung antes de seu contato pessoal com Freud, mas foi com Freud, real formulador do conceito em termos clínicos, que Jung pôde se basear para aprofundar seus próprios estudos. O contato entre os dois homens foi extremamente rico para ambos, durante o período de parceria entre eles. Aliás, foi Jung quem cunhou o termo e a noção básica de “complexo”, que foi adotado por Freud. Por complexo, Jung entendia os vários “grupos de conteúdos psíquicos que, desvinculando-se da consciência, passam para o inconsciente, onde continuam, numa existência relativamente autônoma, a influir osbre a conduta” (G. Zunini). E, embora possa ser frequentemente negativa, essa influência também pode assumir caracterísiticas positivas, quando se torna o estímulo para novas possibilidades criativas.

Jung já havia usado a noção de complexo desde 1904, na diagnose das associações de palavras. A variância no tempo de reação entre palavras demonstrou que as atitudes do sujeito diante de certas palavras-estímulo, quer respondendo de forma exitante, quer de forma apressada, era diferente do tempo de reação de outras palvras que pareciam ter estimulação neutra. As reações não convencionais poderiam indicar (e indicavam de fato) a presença de complexos, dos quais o sujeito não tinha consciência.

Utilizando-se desta técnica e do estudo dos sonhos e de desenhos, Jung passou a se dedicar profundamente aos meios pelos quais se expressa o inconsciente. Os sonhos pessoais de seus pacientes o intrigavam na medida em que os temas de certos sonhos individuais eram muito semelhantes aos grandes temas culturais ou mitológicos universais, ainda mais quando o sujeito nada conhecia de mitos ou mitologias. O mesmo ocorria no caso dos desenhos que seus pacientes faziam, geralmente muito parecidos com os símbolos adotados por várias culturas e tradições religiosas do mundo inteiro. Estas similaridades levaram Jung à sua mais importante descoberta: o “inconsciente coletivo”. Assim, Jung descobrira que além do consciente e inconsciente pessoais, já estudados por Freud, exitiria uma zona ou faixa psíquica onde estariam as figuras, símbolos e conteúdos arquetípicos de caráter universal, frequentemente expressos em temas mitológicos. Por exemplo, o mito bíbilico de Adão e Eva comendo do fruto da árvore do Conhecimento do Bem e do Mal e, por isso, sendo expulosos do Paraíso, e o mito grego de Prometeu roubando o fogo do conhecimento dos deuses e dando-o aos homens, pagando com a vida pelo sua presunção são bem parecidos com o moderno mito de Frankenstein, elaborado pela escritora Mary Schelley após um pesadelo, e que toca fundo na mente e nas emoções das pessoas de forma quase “instintiva”, como se uma parte de nossas mentes “entendesse” o real significado da história: o homem sempre paga um alto preço pela ousadia de querer ser Deus.

Enquanto o inconsciente pessoal consiste fundamentalmente de material reprimido e de complexos, o inconsciente coletivo é composto fundamentalmente de uma tendência para sensibilizar-se com certas imagens, ou melhor, símbolos que constelam sentimentos profundos de apelo universal, os arquétipos: da mesma forma que animais e homens parecem possuir atitudes inatas, chamadas de instintos, também é provável que em nosso psiquismo exista um material psíquico com alguma analogia com os instintos. Talvez, as imagens arquetípicas sejam algo como que figurações dos próprios insitintos, num nível mais sofisticado, psíquico. Assim, não é mais arriscado admitir a hipótese do inconsciente coletivo, comum a toda a humanidade, do que admitir a existência instintos comuns a todos os seres vivos.

Assim, em resumo, o inconsciente coletivo é uma faixa intrapsíquica e interpsíquica, repleto de material representativo de motivos de forte carga afetiva comum a toda a humanidade, como, por exemplo, a associação do femino com características maternas e, ao mesmo tempo, em seu lado escuro, crueis, ou a forte sensação intuitiva universal da existência de uma transcendência metaforicamente denominada Deus. A mãe boa, por exemplo, é um aspecto do arquétipo do feminino na psique, que pode ter a figura de uma deusa ou de uma fada, da mãe má, ou que pode possuir os traços de uma bruxa; a figura masculina poderá ter uma representação num sábio, que geralmente é representado por um ermitão, etc. As figuras em si, mais ou menos semelhantes em várias culturas, são os arquétipos, que nada mais são que “corpos” que dão forma aos conteúdos que representam: o arquétipo da mãe boa, ou da boa fada, representam a mesma coisa: o lado feminino positivo da natureza humana, acolhedor e carinhoso.

Este mundo inconsciente, onde imperam os arquétipos, que nada mais são que recepientes de conteúdos ainda mais profundos e universais, é pleno de esquemas de reações psíquicas quase “instinitvas”, de reações psíquicas comuns a toda a humanidade, como, por exemplo, num sonho de perseguição: todas as pessoas que sonham ou já sonharam sendo perseguidas geralmente descrevem cenas e ações muito semelhanes entre si, senão na forma, ao menos no conteúdo. A angústia de quem é perseguido é sentida concomitantemente ao prazer que sabemos ter o perseguidor no enredo onírico, ou a sua raiva, ou o seu desejo. Estes esquemas de reações “instintivas” (uso esta palavra por analogia, não por equivalência) também se encontram nos mitos de todos os povos e nas tradições religiosas. Por exemplo, no mito de Osires, na história de Krishna e na vida de Buda encontramos similiradades fascinates. Sabemos que mitos encobrem frequentemente a vida de grandes homens, como se pudessem nos dizer algo mais sobre a mensagem que eles nos trouxeram, e quanto mais carismáticos são esses homens, mais a imaginação do povo os encobrem em mitos, e mais esses mitos têm em comum. Estes padrões arquetípicos expressos quer a nível pessoal que a nível mitológico relacionam-se com caracterísiticas e profundos anseios da natureza humana, como o nascimento, a morte, as imagens parterna e materna, e a relação entre os dois sexos.

Outra temática famosa com respeito a Jung é a sua teoria dos “tipos psicológicos”. Foi com base na análise da controvérsia entre as personalidades de Freud e um outro seu discípulo famoso, e também dissidente, Alfred Adler, que Jung consegue delinear a tipologia do “introvertido” e do “extrovertido”. Freud seria o “extrovertido”, Adler, o “introvertido”. Para o extrovertido, os acontecimentos externos são da máxima importância, ao nível consciente; em compesação, ao nível insconsciente, a atividade psíquica do extrovertido concentra-se no seu próprio eu. De modo inverso, para o introvertido o que conta é a resposta subjetiva aos acontecimentos externos, ao passo que, a nível insconsciente, o introvertido é compelido para o mundo externo.

Embora não exista um tipo puro, Jung reconhece a extrema utilidade descritiva da distinção entre “introvertido” e “extrovertido”. Aliás, ele reconhecia que todos temos ambas as características, e somente a predominância relativa de um deles é que determina o tipo na pessoa. Seu mais famoso livro, Tipos Psicológicos é de 1921. Já nesse período, Jung dedica maior atenção ao estudo da magia, da alquimia,das diversas religiões e das culturas ocidentais pré-cristãs e orientais (Psicologia da Religião Oriental e Ocidental, 1940; Psicologia e Alquimia, 1944; O eu e o inconsciente, 1945).

Analisando o seu trabalho, Jung disse: “Não sou levado por excessivo otimismo nem sou tão amante dos ideais elevados, mas me interesso simplesmente pelo destino do ser humano como indivíduo – aquela unidade infinitesimal da qual depende o mundo e na qual, se estamos lendo corretamente o signficado da mensagem cristã, também Deus busca seu fim”. Ficou célebre a controvertida resposta que Jung deu, em 1959, a um entrevistador da BBC que lhe perguntou: “O senhor acredita em Deus?” A resposta foi: “Não tenho necessidade de crer em Deus. Eu o conheço”.

Eis o que Freud afirmou do sistema de Jung: “Aquilo de que os suíços tinham tanto orgulho nada mais era do que uma modificação da teoria psicanalítica, obtida rejeitando o fator da sexualidade. Confesso que, desde o início, entendi esse ‘progresso’ como adequação excessiva às exigências da atualidade”. Ou seja, para Freud, a teoria de Jung é uma corruptela de sua própria teoria, simplificada diante das exigências moralistas da época. Não há nada mais falso. Sabemos que foi Freud quem, algumas vezes, utilizou-se de alguns conceitos de Jung, embora de forma mascarada, como podemos ver em sua interpretação do caso do “Homem dos Lobos”, notadamente no conceito de atavismo na lembrança do coito. Já por seu turno, Jung nunca quis negar a importância da sexualidade na vida psíquica, “embora Freud sustente obstinadamente que eu a negue”. Ele apenas “procurava estabelecer limites para a desenfreada terminologia sobre o sexo, que vicia todas as discussões sobre o psiquismo humano, e situar então a sexualidade em seu lugar mais adequado. O senso comum voltará sempre ao fato de que a sexualidade humana é apenas uma pulsão ligada aos instintos biofisiológicos e é apenas uma das funções psicofisiológicas, embora, sem dúvida, muitíssimo importante e de grande alcance”.

Carl Gustav Jung morreu a 6 de junho de 1961, aos 86 anos, em sua casa, à beira do lago de Zurique,em Küsnacht após uma longa vida produtiva, que marcou – e tudo leva a crer que ainda marcará mais – a antropologia, a sociologia e a psicologia.

Freud e Jung: Estudos Críticos

A fecunda e tumultuada amizade entre Freud e Jung, nas palavras de Paul Roazen, é um dos marcos da história do pensamento e da cultura ocidental.

O rompimento dessa amizade entre os dois maiores cientistas e sábios do século impediu a continuação de  uma parceria que poderia ter contribuído para um desenvolvimento ainda maior da ciência da psique e para o alargamento dos horizontes de conhecimento da interioridade do homem.

Muito já se disse e se escreveu sobre o assunto. Mas não há conclusão que se imponha de modo a silenciar a polêmica que se arrasta e prossegue entre os discípulos menos avisados de cada um dos mestres.

Relacionamos a seguir textos que iluminam a questão, embora alguns dos seus aspectos permaneçam obscuros e possivelmente nunca venham a ser completamente elucidados. Talvez porque sejam manifestações cujas origens estão fincadas nas mais abissais regiões do inconsciente dos protagonistas.

De qualquer sorte, talvez seja necessário àqueles que se propõem seguir as orientações teóricas de Freud ou de Jung ou, ainda, de Freud e Jung – mergulhar na história dessa turbulenta amizade e extrair as suas próprias conclusões. É possível que esse mergulho termine por ser um encontro pessoal de cada um com a sua própria verdade. Um confronto rico e saudável com o seu inconsciente. Então, quem sabe, talvez tenhamos aprendido a lição maior desses mestres segundo a qual pessoa alguma pode acompanhar ou orientar uma jornada que ela mesmo não a tenha feito.

O confrontar-se com o inconsciente e o defrontar-se com a própria sombra parece ser o exemplo maior de coragem pessoal e honestidade intelectual que Freud e Jung legaram às gerações de estudiosos da alma humana que os sucederam.

Esse entendimento poderá ser útil à compreensão aprofundada das teorias do Dr. Sigmund Freud e do Dr.Carl Gustav Jung.

E, parafraseando o bardo inglês, o resto é silêncio!

  • AMIGOS ÍNTIMOS, RIVAIS PERIGOSOS – A turbulenta convivência de Freud e Jung
    Duane Schultz
    Rio de Janeiro: Rocco, 1991 – 274 p.
    O autor, psicólogo e pesquisador da história da psicologia e da psicanálise, apresenta um relato claro e objetivo da turbulenta convivência entre Freud e Jung.

  • CORRESPONDÊNCIA COMPLETA DE SIGMUND FREUD E CARL G. JUNG
    William McGuire (org.)
    Rio de Janeiro: Imago, 1993 – 651 p.
    Contém a correspondência de Freud e de Jung no período de 1906 a 1914.

  • FREUD E JUNG – Anos de amizade, anos de perda
    Linda Donn
    Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991 – 358 p.
    Percorrendo a trajetória da amizade de Freud e Jung, desde o início até o tempestuoso conflito que levou ao seu rompimento, a autora mostra o trabalho que os dois cientistas realizaram para dar forma e substância à psicanálise e, por fim, focaliza o lastimável conflito que impediu a continuação da amizade e da colaboração científica entre os dois maiores estudiosos da mente humana de todos os tempos.

  • FREUD E A PSICANÁLISE
    Carl Gustav Jung
    Petrópolis: Vozes – Volume IV das Obras Completas
    Reúne os principais escritos de Jung sobre Freud e sobre a psicanálise, destacando principalmente as mudanças do seu ponto de vista sobre a ciência freudiana. Contém uma análise detalhada sobre as suas idéias fundamentais e as suas diferenças em relação a Freud.

  • FREUD E SEUS DISCÍPULOS – Capítulo VI – p. 259-335
    Paul Roazen
    São Paulo: Cultrix, 1978 – 669 p.
    Completo estudo de Freud, contemplando suas idéias, personalidade e as relações com os seus discípulos. No captítulo VI, o autor trata da relação Freud-Jung e da sua importância para psicanálise.

  • FREUD – Uma vida para o nosso tempo – Capítulo 5 – p. 191-231
    Peter Gay
    São Paulo: Companhia das Letras,1989 – 719 p.
    Considerada uma das mais bem documentadas biografias de Freud, Peter Gay dedica praticamente todo o
    seu capítulo 5, que trata da Política Psicanalítica, à análise da amizade Freud e Jung. No começo, Jung
    era o “Principe Herdeiro” , depois transformado no “Inimigo”.

  • UM MÉTODO MUITO PERIGOSO – Freud, Jung e Sabina Spielrein – A história ignorada dos primeiros anos da psicanálise
    John Kerr
    Rio de Janeiro: Imago, 1997 – 643 p.
    Nesse livro, John Kerr apresenta um estudo dos primórdios da história da psicanálise, principalmente sobre o papel que Jung desempenhou nessa etapa do surgimento da ciência freudiana. O autor reexamina a polêmica relação Freud-Jung-Sabina Spielrein e seu impacto na estruturação das idéias de Jung e a importância desse tríplice relacionamento para o movimento psicanalítico.

  • VIDA E OBRA DE SIGMUND FREUD – 3 VOLUMES
    Ernest Jones
    Rio de Janeiro: Imago, 1989
    Tradicional biografia de Freud, escrita por um dos seus contemporâneos e discípulo. No segundo volume da trilogia, Capítulo 5, Ernest Jones trata das dissenções sofridas pelo movimento psicanalítico, dentre as quais inclui o rompimento com Jung ( p. 146-160).

    • VIENA DE FREUD E OUTROS ENSAIOS
      Bruno Bettelheim
      Rio de Janeiro: Campus, 1991 – 273 p.
      Ensaios sobre Freud e a psicanálise. Na primeira parte, no ensaio Uma assimetria secreta, o autor comenta o Diário de uma secreta simetria, que apresenta a correspondência entre Sabina Spielrein, Freud e Jung organizada pelo psicólogo junguiano Aldo Carotenuto.

 

Volume .. Título
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I ESTUDOS PSIQUIÁTRICOS Esse volume reúne os primeiros escritos psiquiátricos de Jung sobre os chamados fenômenos ocultos:
-SOBRE A PSICOLOGIA E PATOLOGIA DOS FENÔMENOS CHAMADOS OCULTOS – (1902)
-ERROS HISTÉRICOS DA LEITURA-(1904)
-CRIPTOMNÉSIA – (1905)
-DISTIMIA MANÍACA-(1903)

Outros trabalho incluídos:
-UM CASO DE ESTUPOR HISTÉRICO EM PESSOA CONDENADA À PRISÃO – (1902)
-SOBRE A SIMULAÇÃO DE DISTÚRBIO MENTAL – (1903)
-PARECER MÉDICO SOBRE UM CASO DE SIMULAÇÃO DE INSANIDADE MENTAL – (1904)
-UM TERCEIRO PARECER CONCLUSIVO SOBRE DOIS PARECERES PSIQUIÁTRICOS CONTRADITÓRIOS (1906)
-SOBRE O DIAGNÓSTICO PSICOLÓGICO DE FATOS

Os estudos que se contém nesse volume expressam a polêmica de Jung com o modelo psiquiátrico vigente e a tendência de seus estudos e pesquisas.

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II ESTUDOS EXPERIMENTAIS Contém as contribuições de Jung aos “Estudos diagnósticos de associações”, cujas principais experiências foram realizadas, sob a sua direção, na clínica psiquiátrica da Universidade de Zurique, a partir de 1902 e publicados entre 1904 e 1910. Outros estudos incluídos referem-se aos trabalhos de “Pesquisas Psicofísicas” (1907-1908).
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III PSICOGÊNESE DAS DOENÇAS MENTAIS Os artigos integrantes desse volume pertencem à fase das primeiras publicações de Jung e, na sua maioria, abordam temas psiquiátricos, de modo particular a esquizofrenia.
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IV FREUD E A PSICANÁLISE Reúne os principais escritos de Jung sobre Freud e sobre a psicanálise, destacando as mudanças do seu ponto de vista sobre a ciência freudiana. Contém uma análise detalhada sobre as idéias fundamentais de Jung e as suas diferenças em relação às de Freud.
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V SÍMBOLOS DA TRANSFORMAÇÃ0-Análise dos primórdios de uma esquizofreniaVersão completa e definitiva de uma das mais importantes e avançadas obras de Jung, publicada em 1952. O texto original, denominado, Símbolos e transformações da libido data de 1911-12. A elaboração da versão definitiva se estendeu por quase 40 anos. Esse escrito, em que Jung abandona a terminologia da psicanálise e da psiquiatria da época, assinala o ponto de sua ruptura com Freud.
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VI TIPOS PSICOLÓGICOS Publicado em 1921, contém a teoria junguiana sobre as diferenças entre as pessoas e suas relações com o mundo. Nele, o autor faz incursões pelo campo da arte, da filosofia, da mitologia, da religião e do simbolismo para fundamentar as suas idéias. É um dos textos mais conhecidos e divulgados de Jung. A sua elaboração, nas palavras do autor, demorou quase vinte anos para ser concluída.
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VII ESTUDOS SOBRE PSICOLOGIA ANALÍTICA Reúne dois estudos publicados independemente:

– Psicologia do Inconsciente – Vol VII/1

Nesse tomo, Jung discute as concepções de Freud e de Adler sobre o inconsciente, ao mesmo tempo em que apresenta uma introdução à psicologia do inconsciente, fundamentada nos arquétipos do sonho. O texto, publicado inicialmente em 1912, foi modificado ampla e sucessivamente ao longo dos anos, inclusive quanto ao título.

– Eu e o Inconsciente – Vol VII/2

Publicado em 1928, resulta de uma conferência proferida em 1916, subordinada ao tema “A Estrutura do inconsciente”. O trabalho original está incluído no apêndice desse tomo. O texto é uma introdução aos conceitos fundamentais da Psicologia Analítica.

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VIII A DINÂMICA DO INCONSCIENTE Os textos desse volume expõem os conhecimentos fundamentais e as hipóteses de trabalho de Jung, o que permite conhecer a sua posição epistemológica. Destacam-se os seguintes trabalhos: a energia psíquica; a função transcendente;,a teoria dos complexos; o significado da constituição e da herança para a psicologia; determinantes psicológicas do comportamento humano; instinto e inconsciente; a natureza do psíquico; psicologia do sonho; os fundamentos psicológicos da crença nos espíritos; o real e o supra-real; as etapas da vida humana; a alma e a morte; sincronicidade.
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IX – 1 OS ARQUÉTIPOS E O INCONSCIENTE COLETIVO Encontra-se em fase de tradução para o português.
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IX – 2 AION – Estudos sobre o simbolismo do Si-mesmoO segundo tomo do volume IX das obras completas de C.G.Jung contém uma extensa monografia sobre o arquétipo do Si-mesmo.
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X PSICOLOGIA EM TRANSIÇÃO Reúne estudos sobre a relação do indivíduo com a sociedade, tendo como ponto de partida o escrito Sobre o Inconsciente(1918), em que Jung expõe a teoria de que o conflito na Europa, naquela época, tinha a sua origem no inconsciente coletivo, influenciando grupos e nações. A partir desse trabalho, o autor escreveu ensaios que retomam e aprofundam os temas abordados. O volume inclui, ainda, o texto Um mito moderno: Sobre coisas vistas no céu(1958). Nesse trabalho, Jung considera o mito como uma compensação pela unilateralidade de nossa era tecnológica, cuja tendência preponderante é cientificista.
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XI PSICOLOGIA DA RELIGIÃO OCIDENTAL E ORIENTAL Contém os principais estudos de Jung sobre o fenômeno religioso e a sua importância para o desenvolvimento psicológico do homem. Os ensaios contidos neste volume abordam a religiosidade oriental e ocidental, por meio dos quais o autor mostra que subjacentes a todas as religiões estão conteúdos arquetípicos, representações primordiais da alma humana.
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XII PSICOLOGIA E ALQUIMIA Reúne os principais estudos de Jung sobre a alquimia, em que faz relação entre os processos alquímicos e o desenvolvimento da personalidade.
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XIII ESTUDOS ALQUÍMICOS Encontra-se em fase de tradução para o português.
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XIV MYSTERIUM CONIUNCTIONIS Publicada em dois volumes (XIV/1 e XIV/2), essa obra contempla os estudos avançados de Jung no campo da alquimia, em que ele mostra que a alquimia antecipa parte da problemática do homem moderno. O subtítulo do volume “Pesquisas sobre a separação e a composição dos opostos psíquicos na Alquimia” indica a idéia central do trabalho: a unificação ou superação dos opostos.
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XV O ESPÍRITO NA ARTE E NA CIÊNCIA Nesse volume estão publicados os ensaios de Jung sobre:
-Paracelso (1929)
-Sigmund Freud, um fenômeno histórico-cultural (1932)
-Sigmund Freud (1939)
-Richard Wilhelm (1930)
-Relação da psicologia analítica com a obra de arte poética (1922)
-Psicologia e poesia (1930)
-Ulisses, um monólogo ( 1932) – Refere-se à obra de James Joyce.
-Picasso (1932)
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XVI A PRÁTICA DA PSICOTERAPIA Contém trabalhos sobre questões relativas à prática da psicoterapia. Na primeira parte trata, o autor trata dos problemas gerais:princípios básicos da prática da psicoterapia; o que é psicoterapia; alguns aspectos da psicoterapia moderna; os objetivos da psicoterapia; os problemas da psicoterapia moderna; psicoterapia e visão do mundo; medicina e psicoterapia; psicoterapia e atualidade; questões básicas da psicoterapia. E na segunda, aborda os temas específicos:o valor terapêutico da ab-reação; aplicação prática da análise dos sonhos; a psicologia da transferência.
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XVII O DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE Esse volume reúne os trabalhos de Jung sobre psicologia infantil, cuja parte mais importante é constituída por três preleções sobre “Psicologia Analítica e Educação” Foram incluídos também os ensaios “O casamento como relacionamento psíquico” texto que tem sido amplamente estudado e debatido nas questões de terapia de casais. Outro estudo incluído:”Sobre a Formação da Personalidade”.
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XVIII ESCRITOS DIVERSOS XVII/1 -Fundamentos de Psicologia Analítica

Reúne as cinco conferências proferidas por Jung, na Clínica Tavistock, em Londres. em 1935. Nessas textos, Jung faz um introdução ampla aos princípios fundamentais de sua psicologia. Dentre os ouvintes dessas conferências encontravam-se médicos, psiquiatras, psicanalistas freudianos, etc. É interesssante registrar que o psicanalista Wilfred R.Bion esteve presente, pelo menos, às duas primeiras exposições.No texto estão registradas as intervenções que fez.  Os demais textos que compõem este volume estão em fase de tradução para o português.

OUTRAS OBRAS DE C.G.JUNG PUBLICADAS EM PORTUGUÊS

  • HOMEM E SEUS SÍMBOLOS (O)
    Editor:Carl G.Jung e, após a sua morte, Marie-Louise von Franz
    Edição especial brasileira
    Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 317 p.
    Nesse livro, Jung acentua que o homem só se realiza através do conhecimento e da aceitação do inconsciente – conhecimento que ele adquire por intermédio dos sonhos e seus símbolos. Trata-se do único trabalho de Jung destinado a explicar ao público leigo a sua maior contribuição ao conhecimento da mente humana: a sua teoria a respeito da importância do simbolismo. Particularmente, o simbolismo dos sonhos.
  • HOMEM À DESCOBERTA DA SUA ALMA (O)
    Porto: Livraria Tavares Martins, 1975.
    Livro publicado originariamente em francês-“L’HOMME À LA DÉCOUVERTE DE SON ÂME”. No prefácio que escreveu, em setembro de 1943, Roland Cohen declara que a obra destinava-se a apresentar ao público francês o essencial da psicologia de Carl Gustav Jung, reunindo os trabalhos que expunham as bases de sua obra:
  • LIVRO I – EXPOSIÇÃO

I – O problema fundamental da psicologia contemporânea
II- A psicologia e os tempos presentes

  • LIVRO II – OS COMPLEXOS

III-Introdução à psicologia analítica – Primeira parte: Psicologia geral
IV-Introdução à psicologia analítica – Segunda parte: Os complexos
V- Considerações gerais sobre a teoria dos complexos

 

  • LIVRO III – OS SONHOS

VI-A psicologia do sonho
VII-A utilização prática dos sonhos
VIII-Introdução à psicologia analítica – Terceita parte: Os sonhos

  • MEMÓRIAS, SONHOS E REFLEXÕES
    Compilação e prefácio de Aniela Jaffé
    Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1989. 361 p.
    Testemunho que Jung dá de si mesmo. No prólogo ele afirma “A minha vida é a história de um inconsciente que se realizou”. A leitura desse livro é imprescindível para uma compreensão adequada da personalidade do criador da psicologia analítica.

 

 

Postagem original feita no https://mortesubita.net/biografias/carl-gustav-jung/

Os Sonhos (Parte 6)

Por: Colorado Teus

Esta é uma série de textos que começou com Breve introdução à Magia, depois definimos nossos termos técnicos em Signos, falamos sobre a precisão das divisões entre os planos em A Percepção e a Evolução e como isso pode ser organizado em em Rituais e depois mostramos como a simples mistura de sistemas mágicos pode ser um fracasso para pesquisas em Análise de sistemas mágicos.

Para entender um pouco melhor o exercício prático do quinto texto, separei outra frase do livro “O Poder do Mito”, de Joseph Campbell:

“Quanto ao ritual, é preciso que ele se mantenha vivo. Muito do nosso ritual está morto. É extremamente interessante ler a respeito das culturas primitivas, elementares – como elas transformam os contos populares, os mitos, o tempo todo, em função das circunstâncias. Um povo se move de uma área em que, digamos, a vegetação era o suporte básico, para as planícies. Muitos dos nossos índios das planícies, do período em que andavam a cavalo, tinham pertencido originariamente à cultura do Mississipi. Eles viviam ao longo do Mississipi, tinham moradia fixa nas cidades e desenvolviam uma agricultura estável.

Então receberam os cavalos dos conquistadores espanhóis, o que tornou possível aventurar-se pelas planícies e praticar a grande caçada das manadas de búfalos. Por essa época, sua mitologia transformou-se de mitologia ligada à vegetação, em mitologia ligada ao búfalo.”

Muitos dos rituais foram criados de maneira a modificar o estado de consciência das pessoas e lembrá-las do que é realmente importante para suas vidas.

Como estamos falando sobre a criação dos sistemas mágicos, é preciso saber o porquê deles serem criados. Quase tudo que foi discutido até agora é mais ligado aos mundos ativo e formativo, ou Assiah e Yetzirah respectivamente (de acordo com a divisão com base nos Quatro Elementos citada no terceiro texto da série), então, após entender estes, vamos falar sobre o mundo emocional ou criativo, o mundo da Água, Briah.

“Emoção é uma experiência subjetiva, associada ao temperamento, personalidade e motivação. A palavra deriva do latim emovere, em que o e- (variante de ex-) significa ‘fora’ e movere significa ‘movimento’.” Emoção. In: Wikipedia. Disponível em:. . Acesso em: 07/08/2014.

Podemos ver que existe uma diferença entre sentimentos e emoções, já que os sentimentos estão ligados diretamente aos nossos sistemas de percepção, enquanto emoção é um tipo específico de sentimento, o que coloca a pessoa reativamente em movimento (aqui falamos dos mais diferentes tipos de movimento, desde um pensamento a um movimento físico).

Todos temos os mais variados tipos de emoções durante nosso dia a dia, desde a vontade de abraçar aqueles que amamos, até a vontade de afastar alguém que queremos não queremos por perto. Mas existe um problema muito grande quando vamos falar sobre emoções, elas estão além da nossa língua, estão acima do plano dos símbolos. Cada emoção depende basicamente da percepção de mundo de quem a sente e também da intensidade com que o algo que a gerou aconteceu.

Quando eu digo “Eu amo minha mãe”, é um amor muito diferente de quando eu digo “Eu amo minha namorada”, ou “Eu amo meu trabalho”, ou “Eu amo meu filho”, ou “Eu amo chocolate” etc. Quando, por exemplo, a palavra “amor” é lida em um texto, o leitor tenta ativá-la recordando de algo (ou seja, o remete a algo que ele já sentiu) para entender que tipo de amor o autor está tentando citar. Mas uma pessoa que nunca teve um filho, não vai entender exatamente o que um pai sente quando diz “Eu amo meu filho” enquanto esse não tiver um (exemplo emprestado do querido MDD).

Para contornar estas situações, existem muitas técnicas que ajudam a colocar uma parte maior do sentimento no texto, como fazer comparações ou metáforas, escrever poemas e músicas, fazer um desenho, um vídeo etc. Eu poderia falar “Eu amo tanto minha namorada que sem ela minha vida seria preto e branco”. Com isto, levo o leitor a pensar em como é a diferença em ver algo em preto e branco e à cores (como tv ou fotos); ao sentir a diferença, ver que é muito mais sem graça (obviamente existem exceções), ele consegue chegar mais perto de entender que minha vida seria bem mais sem graça sem minha namorada, e, assim, entender um pouco mais do meu amor por ela. Mas mesmo assim não é algo preciso, então eu poderia escrever um ou vários poemas, uma ou várias músicas, fazer desenhos e muitas outras coisas. Cada vez que fizer algo assim, as outras pessoas poderão entender um pouco melhor minhas emoções.

Mas sabemos que emoções não são ligadas apenas a amor. Os índios tinham uma ligação muito forte com a Mãe Natureza, então sempre que conseguiam alguma comida, sentiam gratidão e uma felicidade muito grande e, para expressar isso, criavam festivais, músicas, pinturas, esculturas e muitas outras coisas como forma de agradecê-La. É aí que percebemos a diferença que Joseph Campbell cita de quando há uma mudança nos hábitos dos índios, toda sua maneira de cultuar é modificada (cultos de agradecimento à floresta tornam-se cultos de agradecimento aos búfalos), porém, as emoções são praticamente as mesmas. Quem sabe uma foto ajude o leitor a perceber estas emoções que citei dos índios:

Com isso, voltamos àquilo que eu estava falando sobre símbolos no texto 4, que símbolos são imagens que um grupo de pessoas tem com um significado em comum (aquilo que os une), então, com a formação de um sistema simbólico, começa a existir uma padronização que ajuda muito na expressão das emoções entre pessoas que o entendem/vivem. Isto é fortalecido quando as pessoas vivem utilizando e percebendo aquele sistema simbólico rotineiramente, não é que não funciona para quem não vive assim, porém, é bem mais fraco para estes. Eu que, para comer, preciso apenas arrumar dinheiro e ir a um supermercado, nunca saberei de verdade o que é louvar um Deus Caçador, o que é suplicar comida a Ele junto com toda uma cidade, com seus filhos, com medo de nunca mais conseguir comer e ver seus entes queridos morrerem de fome.

Até aqui falamos das emoções que nós conseguimos entender e tentamos transmitir a alguém, mas e as que nem nós mesmos conseguimos entender? É aí que entra o que se chama de “subconsciente” dos seres humanos, o lugar onde ficam as emoções que o ser possui, mas ainda não foi capaz de entender conscientemente. Quando estas emoções começam a aflorar, elas começam a chegar na mente e tomam forma de símbolos que o ser possui em memória, o que pode ficar algo grosseiramente aproximado. Vamos a um exemplo:

Dois nativos, um que viveu a vida toda na Floresta Amazônica e o outro que viveu no Egito. Quando algo começa a ameaçar a vida do primeiro, nos sonhos, ele poderá ver uma onça pintada tentando atacá-lo, uma aranha, uma cobra etc. Se esse mesmo algo ameaça a vida do segundo, ele verá nos sonhos um escorpião, uma serpente, um crocodilo etc.

Quando é algo que a pessoa não consegue fazer a mínima ideia do que seja, não possui nada que se aproxime daquilo, começam a aparecer seres deformados e totalmente desconexos durante os sonhos, como uma onça pintada com cabeça de cobra e oito patas, formando um “novo ser”. Este novo ser, apesar de deformado, não é necessariamente bom ou mal, é apenas divergente dos padrões com que a pessoa criadora está habituada.

Utilizar um bom sistema simbólico ajuda justamente nisso, quando se sintoniza com um, as emoções começam a chegar baseadas nesses padrões. Por exemplo, imaginemos que várias pessoas, em diferentes partes do mundo, precisam disciplinar alguém mas não têm forças para isso. Neste momento um grego pode sonhar que é o deus Áres, um umbandista que é Ogum, um hindu que é Kali, um egípcio que é Hórus, uma criança dos dias atuais que é Vegeta, Kratos, um soldado armado etc.

Como é importante analisar as próprias emoções, é muito importante que se entenda qual a base simbólica que sua mente está utilizando, ou seus sonhos e visões viram uma salada de frutas. Note que, em razão de toda educação e percepção de mundo que as pessoas de um grupo têm (a forma de disciplinar do grego não é a mesma dos umbandistas, hindus e egípcios), logo, as imagens citadas não são as mesmas, gerando deuses, culturas e padrões de ação diferentes (algumas vezes muito parecidos, mas nunca iguais). Mas, apesar disso, existem sim símbolos que servem para a grande parte das pessoas do mundo todo, são imagens formadas à partir do que foi citado no capítulo 3 como “Inconsciente Coletivo”, que é a parte não consciente das coisas que todas as pessoas do mundo são capazes de perceber, simplesmente por serem seres humanos gerados e criados por outros seres humanos; este assunto será abordado no próximo capítulo, quando estivermos falando de Atziluth, ou o mundo do Fogo.

Como de costume, para terminar este texto proponho um exercício prático: a construção de um diário de sonhos. Todas as pessoas do mundo sonham, porém, nem todas lembram deles, justamente porque lembrar dos sonhos gasta energia e a maioria das pessoas não quer gastar energia em algo que para ela não faz o menor sentido. A melhor maneira que conheci para lembrar de sonhos é anotando-os, quando fazemos isso, nosso cérebro começa a dar mais atenção (awereness) a eles e nos ajuda a lembrar cada vez de mais e mais detalhes, até que chegará uma hora em que a pessoa dificilmente conseguirá lembrar se o que se passou foi sonho ou realidade. Daí vem a segunda grande importância de anotá-los: para não confundirmos os sonhos com a realidade do mundo físico. Existem outras coisas que nos ajudam a induzir nosso cérebro a lembrar dos sonhos, como: imagens, talismãs, músicas, orações etc. Um terceiro ponto, não menos importante que os outros, é começar a perceber os padrões em que as imagens chegam, assim, podemos entender melhor quais são nossos próprios sistemas simbólicos e, dessa forma, entender melhor nossas emoções inconscientes.

“Vamos todos em busca do elixir da longa vida…”

Vai dar certo!

#MagiaPrática

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/os-sonhos-parte-6

Os Templários e o Baphomet

Baphomet (do grego), o andrógeno bode-cabra de Mendes. Segundo os cabalistas ocidentais, especialmente os franceses, os Templários foram acusados por adorar Baphomet. Jacques de Molay, Grão-Mestre da Ordem do Templo, com todos os seus irmãos, morreram por causa disso. Porém, esotérica e filosoficamente falando, tal palavra nunca significou “bode” nem qualquer outra coisa tão objetiva como um ídolo. O termo em questão quer dizer, segundo Von Hammer, “batismo” ou iniciação na sabedoria, das palavras gregas Baph e Metis, significando “Batismo de Sabedoria”, e da relação de Baphometus com Pã.

Von Hammer deve estar certo, Baphomet era um símbolo hermético-cabalístico, mas a história, tal como foi inventada pelo clero, é falsa. Pã é o deus grego da Natureza, do qual deriva a palavra Panteísmo; o deus dos pastores, caçadores, lavradores e habitantes das campinas.

Segundo Homero, é filho de Hermes e Dríope; seu nome significa “Todo”. Foi inventor da chamada flauta do deus Pã, e uma ninfa que ouvisse o som desse instrumento não resistia ao fascínio do grande Pã, apesar de sua figura grotesca. Pã tem certa relação com o bode de Mendes, no que este representa, como um talismã de grande potência oculta, a força criadora da Natureza.

Toda a filosofia hermética se baseia nos segredos ocultos da Natureza e, assim como Baphomet, era inegavelmente um talismã cabalístico. O nome de Pã era de grande virtude mágica naquilo que Eliphas Levi chamava de “Conjuração dos Elementais”. Outra teoria nos leva a uma composição do nome de três deuses: “Baph”, que seria ligado ao deus Baal; “Pho”, que derivaria do deus Moloc; e “Met”, advindo de um deus dos egípcios, Set. Para conhecê-los, sugiro a leitura do livro Maçonaria – Escola de Mistérios – Seus Símbolos e Tradições, de Wagner Veneziani Costa, lançamento da Madras Editora.

A palavra “Baphomet” em hebraico é como segue: Beth-Pe-Vav-Mem-Taf. Aplicando-se a cifra Atbash (método de codificação usado pelos cabalistas judeus), obtem-se Shin-Vav-Pe-Yod-Aleph, que se soletra Sophia, palavra grega para Sabedoria.

O símbolo do Baphomet é fálico, haja vista que em uma de suas representações há a presença literal do falo, devidamente inserido em um vaso (símbolo claro da vulva). O Baphomet de Levi possui mamas de mulher, e o pênis é metaforicamente representado por um caduceu (símbolo de Mercúrio, usado hoje na Medicina). Esse tipo de simbologia sexual aparece com freqüência na alquimia (o coito do rei e da rainha), com a qual o ocultismo tem relação. O Sol e a Lua ou, até mesmo, o Sol e Vênus, a Estrela matutina e vespertina, Phosforus, Lúcifer, o Portador da Luz…

Pode ser interpretado em seu aspecto metafísico, no qual pode representar o espírito divino que “ligou o céu e a terra”, tema recorrente na literatura esotérica. Isso pode ser visto no Baphomet de Eliphas Levi, que aponta com um braço para cima e com o outro para baixo (em uma posição muito semelhante a representações de Shiva na Índia). No ocultismo, isso representaria o conceito que diz: “Assim é em cima, como é embaixo”.

Antes, porém, quero apresentar um personagem muito importante: Eliphas Levi Zahed é tradução hebraica de Alphonse Louis Constant, abade francês, nascido no dia 8 de fevereiro de 1810 em Paris. O maior ocultista do século XIX, como muitos o consideram, era filho do modesto sapateiro Jean Joseph Constant e da dona de casa Jeanne-Agnès Beaupurt. Tinha uma irmã, Paulina-Louise, quatro anos mais velha que ele. Apesar de mostrar desde menino aptidão para o desenho, seus pais o encaminharam para o ensino religioso.

Foi assim que, aos 10 anos de idade, ingressou na comunidade do presbitério da Igreja de Saint-Louis em L´lle, onde aprendeu o catecismo sob a direção do abade Hubault, que selecionava os garotos mais inteligentes que demonstravam alguma inclinação para a carreira eclesiástica. Desse modo, Eliphas foi encaminhado por ele ao seminário de Saint-Nicolas du Chardonnet, para concluir seus estudos preparatórios. A vida familiar cessou para ele a partir desse momento. No seminário, teve a oportunidade de se aprofundar nos estudos lingüísticos e, aos 18 anos, já era capaz de ler a bíblia em seu texto original.

Após 15 anos de estudos, Eliphas Levi deixou o grande seminário para ingressar no mundo; tinha então 26 anos de idade. Sua mãe, ao saber disso, suicidou-se. Abalado e sem nenhuma experiência do mundo, teve muitas dificuldades para encontrar um emprego. Essa barreira aumentava ainda mais pelo boato que correu, segundo o qual ele teria sido expulso do seminário. Após ter percorrido o interior da França, trabalhando em um circo, Eliphas encontrou em Paris alguns trabalhos como pintor e jornalista. Fundou, com seu amigo Henri-Alphonse Esquirros, uma revista intitulada As Belas Mulheres de Paris, na qual se aplicava como desenhista e pintor, e Esquirros atuava como redator.

Eliphas Levi passou por vários empregos, sempre perseguido pelo clero que via nele um apóstata. Foi então que escreveu sua Bíblia da liberdade, desejando dividir com seus irmãos as alegrias de suas descobertas (1841). Essa publicação lhe custou oito meses de prisão e 300 francos de multa! Foi acusado de profanar o santuário da religião, de atentar contra as bases da sociedade, de propagar o ódio e a insubordinação.

Ao sair da prisão, realizou pequenos trabalhos, principalmente pintura de quadros e murais de igrejas, e fez colaborações jornalísticas. Apesar dos contratempos materiais, não deixou jamais de aperfeiçoar seus conhecimentos e enriquecer sua erudição. Foi após Emanuel Swedenborg que encontrou os grandes magos da Idade Média, os quais o lançaram definitivamente no Adeptado: Guillaume Postel, Raymond Lulle, Henry Corneille Agrippa. Assim, em 1845, aos 35 anos de idade, escreveu sua primeira obra ocultista, intitulada O Livro das Lágrimas ou o Cristo Consolador.

Em 1855, fundou a Revista Filosófica e Religiosa (cujos artigos principais se encontram em seu livro A Chave dos Grandes Mistérios. Nesse mesmo ano, publicou seu Dogma e Ritual da Alta Magia e o poema Calígula, identificando no personagem o imperador Napoleão III. Por causa disso, foi preso imediatamente. No fundo da prisão escreveu uma réplica, o Anti-Calígula, retratando-se. Foi então posto em liberdade.

No dia 31 de maio de 1875, faleceu Eliphas Levi. Aqueles que o acompanharam até o último momento testemunharam sua grande coragem e resignação. No momento de expirar, estava bastante calmo. Sua vida tinha sido plena de realizações espirituais. Havia cumprido a missão de iniciado e de iniciador.

“Toda intenção que não se manifesta por atos é uma intenção vã,

e a palavra que a exprime é uma palavra ociosa. É a ação que prova a vida, e é também a ação que prova e demonstra a vontade.

Por isso está escrito nos livros simbólicos e sagrados que os homens serão julgados, não conforme seus pensamentos e suas idéias, mas segundo suas obras.

Para ser é preciso fazer…”

A ilustração mais famosa de Eliphas Levi sobre Baphomet, que muitos conhecem, seja de cartas de Tarot, como o demônio, seja como símbolo ocultista, é esta: “Figura panteística e mágica do absoluto. O facho colocado entre os dois chifres representa a inteligência equilibrante do ternário; a cabeça de bode, cabeça sintética, que reúne alguns caracteres do cão, do touro e do burro, representa a responsabilidade só da matéria e a expiação, nos corpos, dos pecados corporais. As mãos são humanas, para mostrar a santidade do trabalho; fazem o sinal do esoterismo em cima e em baixo, para recomendar o mistério aos iniciados e mostram dois crescentes lunares, um branco que está em cima, o outro preto que está em baixo, para explicar as relações do bem e do mal, da misericórdia e da justiça. A parte baixa do corpo está coberta, imagem dos mistérios da geração universal, expressa somente pelo símbolo do caduceu. O ventre do bode é escamado e deve ser colorido em verde; o semicírculo que está em cima deve ser azul; as pernas, que sobem até o peito, devem ser de diversas cores. O bode tem peito de mulher e, assim, só traz da humanidade os sinais da maternidade e do trabalho, isto é, os sinais redentores. Na sua fronte e em baixo do facho, vemos o signo do microcosmo ou pentagrama de ponta para cima, símbolo da inteligência humana que, colocado assim, embaixo do facho, faz da chama deste uma imagem da revelação divina”.

Esse panteu deve ter por assento um cubo e, para estrado, uma bola e um escabelo triangular. É uma boa representação; no entanto, peca historicamente e não deve ser tomado como “verdadeiro” Baphomet, pois essa figura é muito parecida com a curiosa representação do Diabo, esculpida alguns anos antes da sua “tese”, em 1842, no pórtico da igreja de Saint-Merri, em Paris.

Em relação aos Templários, encontramos uma gárgula que poderia ter servido de inspiração a Levi na comendoria de Saint Bris le Vineux que pertencia à Ordem.

Spectrum nos dá alguns esclarecimentos: “…Em meio às diversas polêmicas que compõem o tema do satanismo, alguns pontos não ficam totalmente esclarecidos. Por exemplo, a representação de uma cabra com corpo humano encontrada nos cultos do satanismo religioso é denominada Baphomet, que já era conhecida desde os tempos pré-cristãos. Portanto, não possui nenhuma relação com o demônio conhecido no cristianismo. Para os satanistas, Baphomet é uma energia da natureza que os motiva a conseguir nossos objetivos. Nesse caso, a cabra com corpo humano e asas simboliza força, fertilidade e liberdade, características muito valorizadas pelos povos pagãos.

O pentagrama é um símbolo encontrado originalmente nas culturas pré-cristãs com diversos significados. No caso do satanismo religioso, é utilizado com duas pontas voltadas para cima, representando a face de Baphomet.

A origem da cruz invertida nos remete a São Pedro, que não se julgava digno de morrer como Jesus e pediu para ser crucificado de cabeça para baixo. Esse símbolo é encontrado na Basílica do Vaticano, no trono ocupado pelo Papa. Porém, a cruz invertida também foi adotada por grupos que se intitulam satanistas ou anticristãos”.

Na época dos celtas, o homem reconhecia o espírito animador dos seres vivos. Ele era geralmente descrito como o Deus Cornudo, um homem com chifres. Era uma força sem moralidade, que não podia ser aplacada e com ela não se podia barganhar. Era simbolizada como o Deus Cornudo porque conferia certos poderes sobre os animais, e um homem com chifres porque representava algo extra que o homem poderia conquistar. Os chifres duplos simbolizavam a natureza bipolar da força que era tanto boa quanto má, luz e escuridão, beleza e terror, positivo e negativo. Ainda mais, a imagem do Deus Cornudo dava uma impressão da espantosa e temível natureza desse tipo de poder.

Blavatsky relaciona Baphomet a Azazel, o bode expiatório do deserto, de acordo com a Bíblia Cristã, cujo sentido original – segundo a célebre ocultista russa – foi deploravelmente deturpado pelos tradutores das Sagradas Escrituras. Ela ainda explica que Azazel vem da união das palavras Azaz e El, cujo significado assume a forma de um interessante “Deus da Vitória”. Não obstante a essa definição, Blavatsky vai além em seus preceitos, quando equipara Baphomet – O Bode Andrógino de Mendes – ao puro Akasha, a Primeira Matéria da Obra Magna.

O Akasha é o princípio original, o espaço cósmico, o éter dos antigos, o quinto elemento cósmico. Ele é o substrato espiritual do Prakriti diferenciado. Segundo a Teosofia, ele está relacionado a uma força chamada Kundalini. Eliphas Levi o chamou de Luz Astral. Na Filosofia Hindu é um lugar, o elemento éter. Também significa ar, atmosfera, luz. Designa o espaço sutil onde estão armazenados todos os conhecimentos e feitos humanos, desde os primórdios. É a memória da humanidade. Corresponde ao Inconsciente Coletivo de Carl Jung.

O deus Pã, antiqüíssima divindade pelágica especial para Arcádia, é o guarda dos rebanhos que ele tem por missão fazer multiplicar. Deus dos bosques e dos pastos, protetor dos pastores, veio ao mundo com chifres e pernas de bode. Pã é filho de Mercúrio. Era muito natural que o mensageiro dos deuses, sempre considerado intermediário, estabelecesse a transição entre os deuses de forma humana e os de forma animal. Parece, contudo, que o nascimento de Pã provocou certa emoção em sua mãe, ela ficou assustadíssima com tão esquisita formação. As más línguas diziam que, quando Mercúrio apresentou o filho aos demais deuses, todo o Olimpo desatou a rir. Mas como é provável que haja nisso um pouco de exagero, convém restabelecer os fatos na sua verdade, e eis o que diz o hino homérico sobre a estranha aventura: “Mercúrio chegou a Arcádia, que era fecunda em rebanhos; ali se estende o campo sagrado de Cilene. Nesses páramos, ele, deus poderoso, guardou as alvas orelhas de um simples mortal, pois concebera o mais vivo desejo de se unir a uma bela ninfa, filha de Dríops. Realizou-se então o doce enlace matrimonial. Por fim, a jovem ninfa deu à luz o filho de Mercúrio, menino esquisito, de pés de bode e testa armada de dois chifres. Ao vê-lo, a nutriz abandona-o e foge. Espantam-na aquele olhar terrível e aquela barba tão espessa. Mas o benévolo Mercúrio, recebendo-o imediatamente, colocou-o no colo, cheio de júbilos. Chega assim à morada dos imortais ocultando o filho, cuidadosamente, na pele aveludada de uma lebre. Depois, apresenta-lhes o menino. Todos os imortais se alegram, sobretudo Baco, e dão-lhe o nome de Pã, visto que para todos foi considerado um objeto de diversão”.

Conta-se que as ninfas zombavam incessantemente do pobre Pã em virtude do seu rosto repulsivo, e o infeliz deus, ao que se diz, tomou a resolução de nunca amar. Mas Cupido é cruel, e afirma uma tradição que Pã, desejando um dia lutar corpo a corpo com ele, foi vencido e abatido diante das ninfas que se riam.

O deus Pã, entidade silvestre extremamente lúbrica (por isso é metade homem, metade bode), assedia a deusa Afrodite, personificação do amor carnal, com um sorriso maroto; Eros, que personifica o impulso amoroso, empurra com ar brincalhão e malicioso os chifres de Pã, ocultando-os. Eros era considerado filho de Afrodite e de Ares, deus da guerra. Sua forma também me faz lembrar de outro deus, um deus Egípcio, AMON, que muitas vezes é representado também como um bode, com chifres grandes. Amon era o deus do oculto, do escuro… da noite… do invisível…

No século XX, o controvertido ocultista inglês Aleister Crowley desenvolveu um culto e uma religião que têm como um de seus principais fundamentos exatamente o referido ídolo templário, segundo sua própria e peculiar concepção de Baphomet. O entendimento de Crowley por certo lançará mais matérias à reflexão sobre este discutível tema, bem como ajudará a avaliar o modo polêmico de abordagem desse mistério, modo este que é típico de uma crescente vertente de ocultistas contemporâneos.

Ao longo das obras de Crowley, são fartas as referências a Baphomet, chamado por ele de “Mistério dos Mistérios”, no cânone central de sua religião, composto na forma de um missal denominado Liber XV – A Missa Gnóstica. Tal era sua identificação com Baphomet, que esse nome foi adotado como um de seus mais importantes pseudônimos, ou motes mágicos.

O assunto é tão relevante que nos Rituais de Iniciação da Ordo Templi Orientis, uma das Ordens lideradas por Crowley, praticamente todas as consagrações são feitas em nome de Baphomet, não importando se os consagrados estejam conscientes ou não a respeito do sentido de tal ato e muito menos de suas implicações futuras. Tamanha é a proeminência do conceito implícito ao termo que no VI Grau da referida Ordem, a título de ilustração, numa clara referência a suas supostas raízes orientais, a palavra Baphomet é declarada como aquela que comporta os Oito Pilares (as oito letras que formam a palavra) que sustentam o Céu dos Céus, a Abóbada do Templo Sagrado dos Mistérios, no qual está o Trono do Rei Salomão.

Ainda em sua Missa Gnóstica, Crowley identifica Baphomet com um símbolo chamado “Leão-Serpente”, que, assim como Baphomet, é a representação do andrógino ou hermafrodita. Mais especificamente, ele é um composto que possui em si mesmo o equilíbrio das forças masculinas e femininas transmu-tadas num só elemento.

O Leão-Serpente, na verdade, é uma forma cifrada de mencionar a concepção humana, a união dos princípios masculinos (Leão) com os femininos (Serpente), ou do espermatozóide com o óvulo, formando o zigoto. Há, seguindo com os preceitos de Crowley, diversos modos de mencionar essa dualidade: Sol e Lua, Fogo e Água, Ponto e Círculo, Baqueta e Taça, Sacerdote e Sacerdotisa, Pênis e Vagina, além de várias outras duplas de eternos polares. E eu tomo a liberdade de acrescentar A Espada e o Graal.

Originalmente, o símbolo representado pelo Leão-Serpente consta em alguns dos mais antigos documentos gnósticos, os quais remontam ao começo do século II d.C. Apresentado sob a forma de uma figura arcôntica com cabeça de leão e corpo de serpente, o Leontocéfalo era a própria imagem do Demiurgo do Mundo, sendo a versão gnóstica para o Jeová mosaico. Crowley, ao se utilizar desse mesmo simbolismo, pretendia resgatar os cultos de um cristianismo hoje considerado primitivo.

Crowley e seus adeptos, entretanto, não se detêm apenas em demonstrar o Mistério de uma forma puramente alegórica. A “Luz da Gnose”, como é chamada, é celebrada de modo literal. Assim, o ponto máximo da encenação de seu missal consiste na celebração do Supremo Mistério, ou seja, durante a realização das Missas Gnósticas ocorre a comunhão, por parte de todos os partícipes da cerimônia, das hóstias, também chamadas de hóstias dos céus, ou bolos de luz, preparadas com sêmen e fluido menstrual. De acordo com Crowley, Baphomet, sob o nome Leão-Serpente, surge desse composto, da matéria primeva, oriunda da grande obra, ou seja, do ato sexual entre Sacerdote e Sacerdotisa.

Por meio dos poderes mágicos dos operantes do rito da grande obra, a matéria primeva é transmutada em “Elixir”, ou “Amrita”. A grande obra, contudo, por meio das propriedades mágicas da fórmula de Baphomet, ainda teria a capacidade de transmutar os operantes do rito e não apenas as substâncias que o compõem. Baphomet, assim como concebido por Crowley, é então o Elixir ou tintura da sabedoria, o veículo da Luz da Gnose, a qual compõe o Mistério Místico Maior, também chamado segredo central de sua Ordo Templi Orientis.

Crowley considerava Baphomet como o supremo Mistério Mágico dos Templários, segredo este que estaria concentrado nos graus superiores de sua Ordem. Da mesma forma, ele clamava que esse era o mesmo mistério oculto nos graus superiores da Maçonaria. Será que ele se enganou? Ou conhecia um outro rito na Maçonaria?

Por Frater WLUX 11

Bibliografia:

BANZHAF, Hajo e THELER, Brigitte. O Tarô de Crowley – Palavras-Chave. São Paulo: Madras Editora, 2006.

BORGES, Jorge Luis. O Livro dos Seres Imaginários. Rio de Janeiro: Editora Globo, sd.

CARROLL, Peter James, texto traduzido por Pássaro da Noite.

CROWLEY, Aleister. O Livro de Thelema. São Paulo: Madras Editora, 2000.

KING, Francis. Sexuality, Magic & Pervesion, p. 98. Los Angeles: Feral House, 2002.

–. The Secrets Rituals of the O.T.O., p. 164. Nova York: Samuel Weiser, 1973.

LEVI, Eliphas. Dogma e Ritual de Alta Magia. São Paulo: Madras Editora, 2004.

–. A Chave dos Grandes Mistérios. São Paulo: Madras Editora, 2005.

RAPOSO, Carlos. In: “Baphomet”, Revista Sexto Sentido.

STANLEY, Michael (coordenação). Emanuel Swedenborg. São Paulo: Madras Editora, 2006.

#Maçonaria #Ocultismo #Templários

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/os-templ%C3%A1rios-e-o-baphomet

As stregoicas do castelo do Conde Drácula

Shirlei Massapust

Certa vez, muitos anos atrás, eu estava num shopping tirando xérox quando um homem que nunca vi na vida se apresentou como jornalista e depositou uma fotografia de Christopher Lee no balcão. Perguntei se me permitiria xerocar a foto também, para minha coleção de vampiros. Então ele anotou seu telefone atrás e gentilmente me doou aquele tesouro. Nunca telefonei. E nunca descobri quem são as três atrizes posando para nu artístico diante do ator vestido dos pés à cabeça.

No século XX a imprensa fazia ruidoso alarido sobre a virilidade do pródigo polígamo que tinha à sua mercê uma coleção de belas mulheres. Sérgio França resumiu o espírito da época numa curiosa edição retirada do mercado por decisão judicial em processo movido por Francis Ford Copolla contra um humilde e trêmulo editor brasileiro:

Essa é a essência do mito de Drácula, presente na totalidade das versões no cinema, na literatura, no inconsciente coletivo. O medo ancestral do hábito de morte e maldição nos dentes do vampiro, a sugar não só o sangue, mas a humanidade e o direito final de todas as pessoas — a morte.

Esse é o Drácula que retorna, o vampiro sempre presente: sangue e fogo; morte e amor — a real natureza do bem e do mal, da magia e do poder. Atitudes geradas pela liberação sexual de mulheres reprimidas. A vitória da sedução. Na verdade, a questão principal não é o efeito de Drácula sobre as mulheres, mas o fascínio que esse poder do vampiro exerce sobre os homens. E a despeito da eterna cena final dos filmes, Drácula sobrevive. Sempre.[1]

Em Drácula (1897) o conde não é o único residente num castelo na Transilvânia, Romênia. A poeirenta ala proibida para visitas era habitada por três stregoicas que, pelas atitudes e trajes, “se comportavam como damas da mais alta classe”.[2] Contudo, embora se comporte como arrimo da família provendo habitação e sustento, o Conde Drácula não parece sexualmente interessado em nenhuma das suas convivas. Quando flagra o trio em frenesi alimentar, aos beijos com o agente imobiliário Jonathan Harker, o vampiro expressa ciúme não por elas, mas por sua mais recente presa humana.

Tive a clara e imediata consciência da presença do conde e de sua explosão de raiva, violenta como a fúria de uma tormenta. Ao abrir meus olhos involuntariamente, vi sua possante mão agarrar a bela mulher pelo pescoço e com brutal violência arrastá-la para traz. Os olhos azuis como safiras expediam fagulhas de ódio, os dentes rilhavam e seu rosto agora estava rubro de paixão.

E o conde?

Eu nunca poderia imaginar tal expressão de ódio e de fúria, mesmo entre os demônios do inferno. Seus olhos estavam literalmente lançando chamas e seus lampejos sanguíneos eram sinistros, dando a impressão de que o fogo do inferno tivesse se concentrado em seu olhar. Agora seu rosto perdera o rubor anormal, se tornara mortalmente pálido e suas feições adquiriam uma rigidez de máscara mortuária. As espessas sobrancelhas que se tocavam por sobre o nariz pareciam formar um arco incandescente. Com um violento empurrão desferido por seu braço, arremessou a mulher para longe de si, e então investiu sobre as outras duas, como se as empurrasse para trás, mesmo sem tocá-las. Era aquele o mesmo e imperioso gesto que eu o vira empregar quando afugentara os lobos. E ele usou um tom de voz que, embora baixo e quase não passando de um sussurrar, parecia cortar o denso ar da sala.

— Como ousam vocês, qualquer uma de vocês, tocar esse homem? Como têm a audácia de se arriscar apenas para vir vê-lo, quando eu as proibi? Para trás, eu lhes ordeno! Esse ser me pertence! Fujam da tentação de se misturar com ele, do contrário terão de se haver comigo!

— Você nunca amou mesmo! Jamais amará!

Essas palavras foram apoiadas pelas outras duas, e as três, em uníssono, explodiram em uma nova, melancólica e cruel gargalhada que ecoou na sala de tal forma que por pouco não me causa um desmaio, parecendo-me antes uma demonstração de prazer demoníaco. Depois disso o conde voltou-se e, olhando firmemente em meus olhos, tornou a falar no mesmo tom sussurrado.

— Sim, eu também posso amar, e vocês mesmas o podem testemunhar através do passado. Não foi assim? Bem, agora lhes farei uma promessa… Depois que eu terminar com ele, as três poderão beijá-lo à vontade. Agora basta! Vão embora! Eu tenho de despertá-lo, pois há muito o que fazer.

— E nós não teremos nada esta noite? — perguntou ainda uma delas.

Ela deu uma breve risada, ao mesmo tempo apontando para um saco que fora lançado sobre o soalho e dentro do qual se debatia, como se ali se ocultasse algum ser vivo. O conde respondeu apenas movendo a cabeça, num leve aceno afirmativo.

Uma das mulheres deu alguns passos para a frente e abriu o pequeno fardo. Se meus ouvidos não me enganaram, ouvi um débil suspiro, acompanhado de um gemido, vindo daquela direção, como o som emitido por uma criança quase asfixiada. Em uma fração de segundo as três mulheres formaram um círculo em torno do local do ruído, enquanto eu estremecia de horror. Mas, quando voltei a olhar, elas já haviam desaparecido com o tétrico fardo.[3]

A minissérie brasileira Drácula – A Sombra da Noite (1985-1987)[4], com roteiro de Ataíde Braz e desenhos de Neide Harue Nakazato, foi a primeira adaptação onde uma das stregoicas ganhou um nome, Natasha. A segunda história é o único trecho fiel ao romance de Bram Stoker, com uma diferença significativa: As vampiras do castelo tem escrúpulos; ao invés de crianças elas só atacam assaltantes em legítima defesa.

Stregoicas, por Luis Royo.[5]

A primeira adaptação do livro Drácula para o cinema que os herdeiros de Bram Stoker autorizaram foi realizada pela Universal Studios Inc., em 1931. Nesta época não somente as stregoicas permaneceram anônimas como os nomes das atrizes Jeraldine Matilda Dvorak (1904-1985), Mildred Pierce (1908-1981) e Dorothy Estelle Triebitz (1906-1992) não foram listados nos créditos finais, em razão do papel secundário ser equiparado ao da mera figuração! As criaturas depravadas, com seios de fora, que mordem a virilha de Jonathan Harker (Keanu Reaves), em Bram Stoker’s Drácula (1992), ganharam coreografia personalizada, mas não identidades. Mas pelo menos os créditos mencionam as atrizes Michaela Bercu, Florina Kendrick e Mônica Belluci.

“Faça com que fique esquisito”, era a instrução básica de Francis a seu filho Roman Coppola, diretor da segunda unidade de Drácula de Bram Stoker e diretor de todos os efeitos especiais vistos no filme. Sem orçamento bastante para disputar com a tecnologia de ponta utilizada em marcos computadorizados (…) ele recorre a técnicas antigas, como (…) alçapões para o surgimento das noivas de Drácula de sob a cama. (…) Outros efeitos criados por Roman obedecem à tradição inicial do cinema — trucagem se dá pela maneira como a cena é realizada, não pela maneira como é filmada. Um exemplo claro é quando as noivas de Drácula se transformam numa gigantesca aranha humana. O “efeito”, ali, resultou de uma complicada coreografia, através da qual as atrizes criaram a forma da aranha combinando seus próprios corpos.[6]

Passaram cento e dez anos até o roteirista Stephen Sommers conceder o mínimo de dignidade às stregoicas, dando-lhes os nomes Aleera, Verona e Marishka no filme Van Helsing (2004). Interpretadas respectivamente pelas atrizes Eleana Anaya, Silvia Colloca e Josie Maran, elas fazem a diferença neste filme onde o conde quase fica em segundo plano. Aliás, tudo acontece porque Aleera, Verona e Marishka desejam superar a infertilidade natural da condição vampírica e criar enxames de bebês morcego.

Drácula ama Jonathan?

A interpretação de tal diálogo depende muito da permissividade e censura prévia dos editores e veículos de comunicação. Na Itália dos anos oitenta Guido Crepax (1933-2003) roteirizou e ilustrou o romance gráfico Conte Dracula (1987), onde fez Jonathan Harker queixar-se em desespero pelo vampiro tê-lo possuído como um animal cobrindo sua fêmea. Esse discurso discreto e minimamente gráfico foi a menção mais explícita a bissexualismo que pudemos encontrar desde sempre até décadas depois.

Noutro extremo, nos EUA do século XXI, a série Dracula (2020), adaptada por Mark Gatiss e Steven Moffat, dirigida por Jonny Campbell, Damon Thomas e Paul McGuigan, obedeceu à agenda progressista intrínseca ao período caracterizando o Conde Drácula (Claes Bang) como um monstro de gênero bissexual que se põe em posição passiva ao se relacionar sexualmente com homens hipnotizados.

Provavelmente a perspectiva menos incorreta era a interpretação majoritária das editoras paulistanas Continental (1959-1961), Outubro (1961-1966), Taika (1966-1978), D-Arte (1967-1993) e outras menos expressivas onde, nas inúmeras e intermináveis quadrinizações do Conde Drácula, o rei dos vampiros até poderia aparecer em posições sugestivas – ele frequentemente elogiava a beleza feminina,  –  todavia estava impedido por imposição de pacto demoníaco de se apaixonar, ou teria seus poderes reduzidos.

Romance de R. F. Lucchetti, sob o pseudônimo Brian Stockeler.

Nesta perspectiva vampiros extrairiam prazer do sangue e poder da maldade. Diferentemente do mitologema e folclore europeu, os vampiros dos principais títulos de quadrinhos brasileiros não faziam indivíduos eleitos para a conversão beberem sangue com propriedade de transposão de informação genética ou mágica, extraído de seus corpos. A reprodução (transformação) se dava por mordedura, como se eles fossem morcegos contaminados transmitindo vírus da raiva. Então o Conde Drácula precisa, ele mesmo, eliminar o perigo de concorrência todas as vezes em que não deseja que suas vítimas se transformem em novos vampiros e disputem território consigo.

Nos romances gráficos de Nico Rosso – especialmente naqueles roteirizados pela brasileira Helena Fonseca – o conde só morde mulheres e, a seguir, crava lâminas de ferro no coração da vítima para prevenir a explosão demográfica e concorrência pelo sangue dos mortais. Se algo der errado, caçadores de vampiros fazem serviço de utilidade pública eliminando restolhos antes que elas se tornem muito numerosas.

R. F. Lucchetti chegou a dar a um livro o título Os Vampiros não Fazem Sexo (1974), o qual originou uma versão em quadrinhos com desenhos de Nico Rosso.

Quando o Conde Drácula desobedece às regras do pacto e cai de amores por alguma mulher, não somente o Diabo vem pessoalmente lhe punir disparando raios como nascem poderosas vampiras boazinhas que atormentam a pós-vida do vilão, a exemplo de Naiara e Nadia, duas filhas de Drácula que ganharam séries próprias.

Voltando ao livro de Bram Stoker, imagino que todos os vampiros, machos e fêmeas, tinham interesse em humanos de qualquer sexo ou gênero; porém perdiam a chama da paixão por eles depois de conversos. — Repare que Drácula não procura Lucy após a conversão. — Se for verdade que uma ou todas as stregoicas foram noivas de Drácula, parece que eles passaram a viver sob regime de separação de corpos porque, embora o costume da época atribuísse à mulher o dever de realizar trabalhos domésticos, era o próprio conde quem limpava a ala do castelo onde somente ele vivia.

Um pesadelo inspirador

Pesquisadores descobriram que Bram Stoker não criou a parte da estória onde Jonathan é arrebatado pelas vampiras. Ele apenas descreveu um pesadelo sonhado em 08/03/1890, no qual “um rapaz vê algumas jovens; uma delas tenta beijá-lo, não nos lábios, e sim no pescoço”. Seis dias depois Stoker voltou a escrever sobre o assunto, já na intenção de produzir as primeiras linhas de um conto:

— “Será um sonho? Mulheres querem beijá-lo. Terror de morte. De repente o conde a afasta: ‘Este homem me pertence!’”

Houve quem sugerisse que a temível mulher era Florence Stoker. Um parente da família descreveu Florence como uma pessoa absorta, amaldiçoada por sua grande beleza e o desejo de preservá-la. Florence rompeu o noivado com Oscar Wilde para casar com Bram Stoker, mas, depois, o esposo preferia passar a maior parte do tempo viajando sozinho… A experiência da paternidade foi demasiadamente dispendiosa e o convívio foi se tornando cada vez mais problemático. Então, neste dia em particular, não foi só a comida indigesta que estragou sua noite. A antipatia pela pessoa real, em sua cama, fê-la invadir seus sonhos na forma de súcubo para exigir a atenção de um marido que não a amava mais.

Papéis descrevem os lugares que visitou, os livros que leu e os pensamentos que teve entre março de 1890 e fevereiro de 1986. O pesadelo esteve sempre presente nesses seis anos. Na redação final Jonathan observa que duas stregoicas possuíam “tez de um moreno dourado” e narizes aquilinos “à semelhança do conde”, detalhe que sugere parentesco consanguíneo.[7] Estas agregadas respeitam a hierarquia doméstica da mulher de etnia caucasiana, que abalou o sono do autor na pele do personagem:

Era dotada de rara beleza — o que de mais fascinante se possa imaginar sob a forma de mulher —, com uma farta e longa cabeleira de cachos dourados e olhos magníficos, da cor e com o brilho de safiras. Tive a impressão, embora indefinida e imprecisa, de já haver visto seu rosto e de conhecê-lo por meio de sua aparição em algum sonho tenebroso, do qual na hora não me foi possível lembrar.[8]

Infelizmente a diversidade genética nunca é representada nos filmes temáticos onde as stregoicas parecem todas iguais, modificando somente a cor da cabeleira lisa. A tendência nas produções cinematográficas do século XX foi o branqueamento da pele das personagens e redução do vestuário até o nudismo.

Notas:

[1] FRANÇA, Sérgio. Drácula: Sangue e sedução. Em: AS MELHORES HISTÓRIAS DE DRÁCULA. São Paulo, Bloch, 1993, p 31.

[2] STOKER, Bram. Drácula. Trad. Vera M. Renoldi. São Paulo, Nova Cultura, 2002, p 45.

[3] STOKER, Bram. Drácula. Trad. Vera M. Renoldi. São Paulo, Nova Cultura, 2002, p 46-47.

[4] A minissérie brasileira Drácula – A Sombra da Noite, com roteiro de Ataíde Braz e desenhos de sua esposa, Neide Harue Nakazato, foi lançada em cinco números pela editora Nova Sampa, indo às bancas de 1985 a 1987. Em 1989 os dois primeiros números foram relançados com novas capas. Em 1991 a minissérie completa foi reunida em um grosso volume. Uma nova edição está prevista para 2022.

[5] COOL WALLPAPERS. Acessado em 21/04/2022. URL: https://coolwallpapers.me/picsup/6058417-art-moon-luis-royo-girls-vampires-vampires-blood-cemetery.jpg>.

[6] RONDEAU, José Emilio. Drácula: Delírio sangrento. Em: SET: Cinema e vídeo, Ano VII, N.º 1. São Paulo, Editora Azul, janeiro de 1993, p 18-19.

[7] STOKER, Bram. Drácula. Trad. Vera M. Renoldi. São Paulo, Nova Cultura, 2002, p 45.

[8] STOKER, Bram. Drácula. Trad. Vera M. Renoldi. São Paulo, Nova Cultura, 2002, p 45.

Postagem original feita no https://mortesubita.net/vampirismo-e-licantropia/as-stregoicas-do-castelo-do-conde-dracula/

Feng Shui – 風水 – Acupuntura para ambientes

Feng Shui 風水, (pronuncia-se fon-suei) significa, em chinês, literalmente “Vento” e “Água”.

O Feng Shui é uma espécie de Acupuntura dos Ambientes ou medicina das habitações e imóveis; ele propõe um método de vida baseado num relacionamento harmonioso com o meio ambiente e suas linhas de energia, e relaciona-se intimamente com a busca de lugares ideais para a instalação do ser humano, que, segundo os chineses, pode alterar sua sorte, trazendo o conceito de que uma casa tem um “funcionamento metabólico” o qual deve ser estudado, respeitado e modificado segundo determinados critérios. As influências invisíveis explicam por que certas edificações ou áreas em uma cidade que são bem ocupadas enquanto outras são evitadas pelos habitantes, viram guetos, etc. Em sumo, ela é uma técnica que ajuda a obtermos espaços agradáveis e energeticamente harmonizados.

O Feng Shui opera com o princípio de que a paisagem é animada por forças ocultas e linhas de energia que são causadas pelas formas dos objetos que nos cercam, pelas dimensões e cores das estruturas físicas que constituem essa mesma paisagem [“A forma é que dá qualidade à energia, mas por outro lado, a forma sem a energia também é neutra” (Carl Gustav Jung, “Psicologia do Inconsciente”, p. 71). “(…) A idéia de energia não é de uma substância que se movimenta no espaço, mas um conceito abstraído das relações de movimento. (…)”em “A Energia Psíquica”.

Alguns tipos de energia são auspiciosas, favoráveis e causadoras de condições harmoniosas (a que os chineses se referem como “Respiração Cósmica do Dragão” ou Sheng Chi), outras perniciosas, insalubres e geradoras de discórdias (que representam com o termo “Sopro da Morte” ou Shar Chi). A posição de nossa residência, ou lugar de trabalho e a distribuição, cor material etc. dos objetos com que nos rodeamos podem afetar nossa atitude e inclusive nossa psique [para um aprofundamento no conceito das Energias das Formas recomendamos um estudo sobre Radiônica].

Nesse sistema tradicional, tudo o que seja construção, habitação ou comércio é desenhado, instalado e decorado em função de certos critérios topográficos e magnéticos.

Segundo o princípio essencial do Feng Shui, tudo o que há no Universo emana energia, e tem um importante papel de troca. O padrão desta troca acompanha o ritmo da Natureza e pode ser expresso de forma análoga entre as áreas e partes das edificações e as partes, órgãos e funções do organismo com áreas da vida em geral. Assim, modificando o design e a distribuição interna e externa dos móveis nos ambientes, estamos interagindo com o Fluxo Energético que nos banha e nos cerca, alterando os rumos que nossa vida seguirá a curto, médio e longo prazo.

Toda mudança externa no ambiente proporciona uma mudança interna em nós mesmos. A casa não é estática, ela tanto influência seus moradores como é influenciada por eles; ela acompanha suas transformações e influi sobre elas! Quando mudamos algo em nossas casas estamos trabalhando com nossas emoções, com nosso estado de humor, com nossa percepção a nível inconsicente. Cada objeto novo que entra ou cada objeto velho que sai está intimamente relacionado a mudanças interiores profundas, que podem ser detectadas pelo método psicanalítico das associações de idéias. Utilizando determinados objetos, cores, formas, distribuição, direções, texturas, plantas, luzes, sons… Podemos criar um ambiente equilibrado e vitalizante. Alguns objetos são arquétipos, e requerem maior atenção (mesa, cama, espelho etc) .

A forma e as cores dos ambientes, dos objetos e dos móveis têm grande influência sobre as energias. Por isso, podemos melhorar alguns aspectos de nossa vida apenas com a mudança de certas coisas de lugar ou adicionando e eliminando outros objetos. Estamos ligados a todo sistema da vida, e nossa experiência não pode ser separada das forças vitais à nossa volta (por isso o consultor de Feng Shui examina toda a área externa próxima ao imóvel). Mesmo quando não podemos perceber isso, cada parte da vida depende de outra para criar o todo. Quando uma parte é destruída, toda a unidade se desfaz. Não ter essa ligação prejudica a nossa vida.

Interiores com bom Feng Shui alimentam o Chi dos moradores, e com isso eles progredirão no mundo exterior e darão conta de lidar com circunstâncias hostis. A harmonia universal deve começar pelo seio familiar…

As orientações obtidas através de uma análise do Feng Shui ambiental exerce um profundo efeito sobre a família, melhorando o relacionamento entre todos, atraindo boa saúde, promovendo prosperidade, protegendo as crianças e animais de estimação. Nos negócios, traz novas oportunidades, aumenta o fluxo de clientes, eleva o prestígio, estimula a criatividade.

Por isso propomos algumas modificações ao adotarmos o Feng Shui Oriental. Não somos chineses, de modo que a simbologia que lembra o som em chinês do nome de um objeto nada terá a nos retratar – assim como a simbologia do som em português do nome de um objeto não terá nenhuma implicação no Feng Shui oriental! É um abuso do bom senso pretender que um ideograma qualquer tenha algum efeito sobre as condições psíquicas de um ocidental que sequer sabe diferenciar um destes símbolos gráficos de outro. OS IDEOGRAMAS* NÃO TÊM EFEITO SOBRE A PSÍQUE OCIDENTAL, ou melhor, se o têm, melhor seria usarmos símbolos análogos mas que sejam representantes da nossa cultura, da nossa religião. A maioria dos assim chamados “Instrumentos de Cura do Feng Shui”** são, por este e outros motivos, ineficientes ou ineficazes, simplesmente porque estão imbuídos de elementos religiosos, simbólicos, fonéticos, etc de outra cultura, e muitas vezes têm atributo distinto em nossa cultura. Exemplo? A figura do dragão (que no Oriente e um ente divino, e no Ocidente representa o demônio – basta ver as imagens de São Jorge matando o dragão).

Nosso universo possui uma linguagem simbólica, por vezes inconsciente para nós. O Feng Shui evidencia os “diálogos” entre o ser e o ambiente e todo processo pessoal que isso implica. Os símbolos são imagens ligadas ao indivíduo através de uma verdadeira ponte de emoções, por isso ele é significativo e possui o poder da transformação. O F.S. utiliza elementos simbólicos como estimulação inconsciente e usufrui de seus poderes transformadores. Encontramos argumento similar ao adotado pela Teoria do Feng Shui na Psicologia, através dos seus psicotestes projetivos, em especial no teste denominado H.T.P. (House-Tree-Person, ou teste do desenho da Casa, da Árvore e da Figura Humana – criado por John N. Buck, em 1948), especialmente no que diz respeito ao significado simbólico dos elementos contidos no desenho da casa (portas, janelas, cortinas, jardim chaminé, etc). Cada elemento do desenho da casa, no caso, representa uma estrutura psíquica, e os adornos que se coloca nos desenhos retratam as condições destas estruturas.

Ao mudarmos elementos externos do nosso cotidiano estamos (potencialmente) modificando aspectos internos e ao trabalharmos com elementos simbólicos estamos ativando nosso inconsciente e buscando transformações [várias formas de terapia trabalham com esse contexto. A exemplo a Grafoterapia, que modificando os traços da escrita pretende implementar os respectivos traços de caráter, personalidade, humor etc.. no paciente]. Utilizando determinados objetos, cores, formas, distribuição, direções, texturas, plantas, luzes, sons… Podemos criar um ambiente equilibrado e vitalizante.

Para nós o mais importante é a “engenharia psicológica” envolvida na criação e na disposição dos móveis num determinado ambiente. Por isso somos, pessoalmente, defensores da causa da criação de conceitos para um Feng Shui Brasileiro. Os argumentos e razões para isso consideram:

A questão do idioma

Não faz o menor sentido usarmos quadros com ideogramas chineses de prosperidade, amor, sorte… Uma vez que tais símbolos não têm nenhuma conexão com nossa cultura, com a estruturação da nossa linguagem e com o simbolismo do nosso inconsciente coletivo. Tomemos como exemplo o símbolo do Dragão; considerado sagrado pela maioria dos povos do oriente, mas símbolo representativo do mal no mundo Ocidental Cristão. Imaginemos agora uma pessoa devota de São Jorge com uma imagem de um dragão chinês exposta na sua sala… Certamente a vida dessa pessoa irá “desandar”. Precisamos respeitar e usar os símbolos próprios de nossa cultura, ou daquela que descendemos ou que tomamos contato (nesse caso podemos usar os símbolos hebreus, druidas, etc.). Uma grande dificuldade encontrada no estudo de alguns conceitos orientais é que às vezes o mesmo termo pode significar conceitos diferentes, em função do contexto onde se insere.

A questão topográfica

Se para a economia da China Antiga as condições climáticas (ventos) e fluviais (rios) eram essenciais, na economia do nosso país outros critérios são mais importantes, e consideramos também que embora o fluxo magnético da Terra sirva igualmente para todos, há variações no fluxo desse campo segundo a localização hemisférica e a latitude terrestre.

Postagem original feita no https://mortesubita.net/asia-oculta/feng-shui-%e9%a2%a8%e6%b0%b4-acupuntura-para-ambientes/

O Caminho Sinistro – Parte 1

Preparação

Diante da crescente torrente de absurdos vistos na internet envolvendo o Caminho da Mão Esquerda (que prefiro chamar de Caminho Sinistro, por motivo fonético e abreviativo apenas, vide adiante), nasceu a necessidade de trazer luz ao tema. E não se trata de mero jogo de palavras, há uma errônea associação compulsória do caminho sinistro com as trevas e a malignidade que deve ser desfeita durante a nossa caminhada juntos.

Não tenhamos pressa, contudo. Vamos lidar aqui com temas e conceitos que se opõem ao status quo e elementos fortemente enraizados no inconsciente coletivo, e isto NÃO é sinônimo de lesar a integridade física, a humanidade, as leis básicas ou a propriedade, de si mesmo ou de outrem. Se você entende a associação a uma ordem ou culto sinistro como um facilitador para a prática de más ações, saiba que o Código Penal brasileiro prevê tal intenção em seu artigo 288. E se você tem inclinação criminal, peço encarecidamente que pare por aqui.

Uma coisa que talvez decepcione alguns de vocês é que eu não vou dar carteirada. Não vou me esconder atrás de um nome mágico de demônio milenar, nem apresentar cargos, graus iniciáticos e títulos, pois creio ser desnecessário nesse momento. Espero que você se contente, por hora, em saber que sou uma pessoa relativamente acessível, apesar de introvertido.

Bom, vamos ao que interessa.

Meta-Percepção

Antes de qualquer coisa pare e se pergunte por que você está aqui, lendo isso. O Ego destreinado tende a responder que está aqui “porque quer”, porque assim o decidiu baseado em uma escolha pessoal qualquer, e a estes eu surpreendo dizendo que estão aqui porque eu quero. Claramente não escolhi cada leitor deste artigo, mas escolhi ter leitores, escolhi transmitir um conhecimento, escolhi a forma, o conteúdo, o veículo, enfim, criei este instante, este continuum do qual você agora faz parte para, apenas posteriormente, existir algum exercício da sua vontade. Não se trata, neste caso, de um conflito de vontades, visto que elas não se contrapõem, mas curiosamente a minha se faz manifesta e predominante desde antes da existência da sua.

Essa diferença sutil em como percebemos as coisas e seus significados é a forma que escolhi para começar nossa caminhada, pois dela vai depender não só nossa compreensão como nosso sucesso no caminho sinistro. E eis aqui a primeira grande oportunidade de exercitar a semântica.

O Caminho Sinistro
Sinistrum, forma neutra do latim clássico, significando apenas… esquerdo. Oposto a destro. As sinonímias referentes a “impróprio”, “adverso”, “desafortunado”, “funesto” e congêneres são do período pós-clássico. É perfeitamente possível um caminho sinistro ser ensolarado, florido e cheio de vivacidade, como também é perfeitamente possível que seja desolado, pútrido e nefasto. Sinistro, neste caso, apenas alude ao fato dele se encontrar à esquerda de outro.

Mas porque estamos falando de esquerda mesmo?

O ocultismo moderno pegou emprestados os termos usados no Tantra indiano para caracterizar duas correntes doutrinárias: O Caminho da Mão Direita (Righ-Hand Path; RHP; Dakshinachara) refere-se a doutrinas e/ou grupos que seguem princípios éticos, morais e filosóficos mais rígidos e conservadores, com forte tendência ortodoxa e o Caminho da Mão Esquerda (Left-Hand Path; LHP; Vamachara) refere-se a doutrinas e/ou grupos com práticas heterodoxas em sua maioria, que reforçam e induzem o questionamento e a oposição moral, não adotando estruturas éticas e filosóficas complexas.

Contudo, perceba que é um erro grotesco presumir e associar de imediato o caminho destro ao bem e o caminho sinistro ao mal, cabendo aqui lembrar que a prática do bem ou do mal é uma escolha humana individual, independente do caminho trilhado.

Os Aghori

Muitas definições em pouco tempo, certo? Para bem entender o termo, vamos evoluir com ele in loco, com praticantes do Vamachara, o caminho sinistro tântrico.

Os Aghori são devotos de Kala Bhairava, uma manifestação de Shiva associada à aniquilação… do mal. Eles se submetem em sua rotina ritualística à necrofagia, coprofagia, urofagia, caminham entre cadáveres e fazem utensílios com ossos humanos, justificando tal comportamento como uma prática não-dual, o contato com o Advaita Vedanta, o verdadeiro Eu, transcendendo através dos tabus sociais. Apesar de não serem considerados “hindus” pelos indianos em geral, os Aghori têm curandeiros reconhecidos por seus poderes ditos milagrosos. Pense na prática Aghori como uma vacina, em que você se contamina com o que quer evitar e a diferença entre imunização e infecção está simplesmente na dose e na manipulação do agente.

Fatores Históricos

Note, caro leitor, não haver menção sobre o caminho sinistro em época anterior à adoção do termo pelos textos védico e simplesmente não há outros fatores que definam com firmeza a existência da corrente antes das definições tântricas.

Mas não teriam Ahriman ou Baal seus cultos bem antes disso? Por certo que sim, mas neste momento peço encarecidamente que, se ainda não entendeu o motivo da minha pergunta, volte a ler este artigo do início. Um culto a Ahriman pode ser extremamente organizado, ortodoxo, conservador e fundamentalista (nenhuma dessas características se opõe às da entidade e, na verdade, até fazem sentido no contexto histórico e social), classificando-o na corrente doutrinária da Mão Direita. Insisto que, na grande maioria das vezes, “bem” e “mal” são definições e escolhas humanas.

E o que isso quer dizer? Quer dizer que o Caminho Sinistro não é exatamente uma “tradição”. Pra ser bem franco, é um caminho ainda em exploração e formação. Não existem ordens medievais assumidamente sinistras, por exemplo. Faço pequena ressalva para stregheria, druidismo e semelhantes, de forte inclinação heterodoxa que ainda hoje vivem se escondendo por causa dos traumas da… bom, você sabe porque.

Existem pouquíssimas ordens e/ou cultos sinistros que transpuseram ou sequer se aproximaram do seu primeiro século de existência, como a controversa Ordem Tifoniana, antiga O.T.O. Tifoniana (T.O.T.O.), que tem como base o mesmo Thelema e graus iniciáticos de outras ordens Crowleyanas não-sinistras.

Portanto, atenção redobrada com o termo “tradição sinistra” e seus semelhantes, em geral eles não são literais e não são usados para nossa geração, mas embasam e fundamentam a credibilidade dos textos para gerações futuras, quando a tradição de fato existir. Ou não.

Fatores Antropológicos

O ser humano, especialmente o moderno, tem uma forte tendência ao oportunismo, e isso é lamentavelmente notável na área do ocultismo sinistro. O conceito de oposição moral acabou por fazer pessoas de moral intrínseca duvidosa aderirem às fileiras da corrente doutrinária (vide observação sobre crime em Preparação), e fatores psicológicos e sociais deram continuidade a essa prática transformando-a em uma espécie de tendência. Hoje não é completamente errado afirmar que o caminho sinistro é trilhado por outcasts, proscritos e misantropos.

As ordens muitas vezes abraçam alguma espécie de fundamentalismo injustificado, às vezes disfarçado, o que separa ainda mais seus probandos, neófitos e (sic) adeptos do convívio social saudável. Tenha em mente neste ponto, caro leitor, que a misantropia mística exige um nível de concentração, dedicação e domínio mental altíssimos, sendo totalmente contra-indicada para o caminho sinistro sem rígida supervisão.

De uma forma geral, as pessoas buscam o caminho sinistro pelos motivos errados, buscando os objetivos errados e são, invariavelmente, enganadas. Isso tem corroborado para a rápida degeneração da corrente original, desaparecimento das ordens sérias (p.e. O.T.O. Tifoniana deixar de usar o nome O.T.O., círculos internos de outras ordens se desassociarem, recrutamento cancelado, atividades públicas canceladas, etc…), multiplicação de pequenas ordens e cultos oportunistas, crescimento e migração de egrégoras nefastas e a invariável ridicularização geral dos praticantes.

Considerações

Por hora, caro leitor, eu o convido a ficar com a imagem dos Aghori na mente para reflexão. Um povo religiosamente proscrito? Sim. Com hábitos sanitários perigosos? Sem dúvida. Mas qual é o valor prático disso? Note que eu ainda não me atenho ao valor místico, mas o prático mesmo. Quanto sabe de anatomia um Aghori em relação a um hindu que nada faz além de orar? Qual tem melhor sistema imunológico? Qual tem medo do escuro? Qual é o real valor da contaminação física e moral a que se expõem os praticantes? E talvez a questão mais pertinente de todas: você se imagina um Aghori ou ficaria satisfeito em conhecer um curandeiro Aghori quando um familiar adoecesse?

Como este é o nosso primeiro contato, vou ser breve e deixar o que está aqui pra ser digerido e debatido. Procurei usar exemplos de fácil pesquisa para aqueles que queiram se aprofundar em quaisquer dos elementos abordados no artigo.

Gostaria de aproveitar o ensejo e agradecer ao Marcelo pelo espaço e pela oportunidade, e a você leitor pela companhia.

Até breve.

#LHP

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/o-caminho-sinistro-parte-1

Carl Jung e o Ocultismo – Giancarlo Kind Schmid

Bate-Papo Mayhem #102 – 12/11/2020 (Quinta) 22h Com Giancarlo Kind Schmid – Carl Jung e o Ocultismo (Inconsciente Coletivo, Sincronicidade e Alquimia)

Os bate-Papos são gravados ao vivo todas as 3as, 5as e sábados com a participação dos membros do Projeto Mayhem, que assistem ao vivo e fazem perguntas aos entrevistados. Além disto, temos grupos fechados no Facebook e Telegram para debater os assuntos tratados aqui.

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#Batepapo #Jung #Psicologia

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A Consciência Genética

O sistema nervoso central, incluindo o cérebro, assim como todo o resto do corpo foi projetado pelo código interno da molécula de DNA após milhares e milhares de anos de evolução e seleção natural. Esta mesma molécula é a que hoje envia sinais através do RNA mensageiro para informar ao organismo o que este deve fazer: Cresça cabelos ruivos, tenha olhos azuis, fique de pé e comece a andar, comece a falar, encontre um companheiro, tenha um filho. A nossa vida inteira já esta determinada no interior desta nossa fita de acido desribonucleico

Esses arquivos de DNA sempre ficaram acessíveis á perscruta cerebral consciente, mesmo séculos e séculos antes de Darwin, Mendel, Crick e Watson. Enquanto estávamos despertos a consciência genética sempre esteve acessíveis na forma dos arquétipos do inconsciente coletivo em mitos e metáforas da cultura humana de diferentes povos. Enquanto estávamos dormimos esta mesma consciência buscava um contato mais pessoal conosco por meio de sinais interiores traduzidos dentro de nossos próprios sonhos. Desesperadamente os genes pareciam quere se comunicar.

Quando esta integração genética é feita consciente, mente o individuo atinge o que ouso chamar de consciência genética. Por milhares de anos este estado resultou em místicos,  poucos e sábios, mas recentemente isso parece estar se tornando algo cada vez mais organizado. Esta consciência que ultrapassada os limites do individuo, recebeu diversos nomes em diferentes períodos da história, mas quase todos que dela provaram se referiam a um estado de iluminação, da luz do mundo, de despertar ou de uma nova consciência.

Os primeiros a alcançarem a consciência genética, há alguns milhares de anos, interpretavam como podiam suas experiências, falavam de vidas passadas, anjos, duendes, reencarnações, deuses e  imortalidade, retorno dos mortos, etc. Que esses antigos adeptos genéticos estavam falando de algo real, na melhor das linguagens à disposição em suas épocas, é indicado pelo fato de que muitos deles, especialmente os Hindus e os Sufis, forneceram visões poéticas maravilhosamente corretas da evolução, milênios antes de Darwin e previram a busca da superação da condição humana muito antes das obras de Nietzsche.

Os Gregos chamaram a consciência genética de “a visão de Pã”. Os Chineses de o grande “Tao”, os Hindus de “Consciência de Atman”, traduções que ainda hoje geram no mínimo um silêncio respeitoso pelo mais convicto dos céticos. As figuras numinosas que inspiram  espanto e respeito, aquelas figuras de um “Deus Sublime” ou de “Deusas ou Demônios” que aparecem nos estágios iniciais dessa tomada de consciência, correspondem aos arquétipos de Jung do inconsciente coletivo, e são reconhecidos como os “visitantes do mundo dos sonhos”, pelos primitivos ou “os Sidde” pelas bruxas, assim como o “Povo Estranho” em centenas de tradições populares.

Jung mostrou que todos estes arquétipos não são oriundas de mundos exteriores, espirituais e metafísicos, mas sim frutos de uma redução mínima para a qual retorna todo o organismo incluindo o ser humano e sua mente racional e criativa. Os Deuses não eram  algo posterior ao mundo, mas algo anterior ao corpo e ainda presente nele. Conhece a ti mesmo e conhecerás o teu Senhor ensinou o Islamismo, enquanto a tradição cristã apregoava “O Reino dos Céus está dentro de Você”.. A consciência genética surge exatamente quando o sistema nervoso central torna-se consciente de sua ligação com os genes.

Gurdjieff denomina esta conexão entre o Sistema Nervoso Central e o DNA como Centro Emocional Superior, o inconsciente filogenético do Dr. Stanislaus Grof e a “Hipótese Gaia” dos biólogos Margulis e Lovelock são três metáforas modernas que juntamente com o Inconsciente coletivo de Jung buscam explicar esta maneira de pensar. As visões da evolução passada e futura, descritas  por aqueles que tiveram experiências transpessoais durante o trauma da morte clínica, das ditas experiências “próximas da morte” também descrevem de certa forma este paradigma genético.

No entanto exercícios especiais para desencadear o despertar do ser humano como um  aglomerado de genes não são encontrados no ensinamento iogue: geralmente tal experiência meramente acontece , quando acontece, depois de muitos anos de prática esmerada daqueles tipos avançados de raja ioga, que desenvolvem o êxtase somático. Estudos do Timoth Leary Phd demonstram que altas doses de LSD  também desencadeiam visões da consciência genéticas, ainda que temporárias.

De qualquer forma após milênios de tentativas de contato por parte dos genes somente com a ciência contemporânea esta realidade foi melhor compreendida, como sendo arquivos genéticos ativados pela excitação das proteínas anti-histonas – ou em termos forçosamente metafóricos, a “memória” do DNA se desvelando de volta até o início da vida, contendo também as plantas genéticas para possíveis evoluções futuras.

“Eu sou Ele, que foi, que é, e que será” uma sentença do Livro Egípcio dos mortos, tanto  na forma hieroglífica como na caligrafia ocidental foi encontrada na mesa onde de Beethoven compôs a Nona Sinfonia, e toda a música posterior “evolucionárias”, abrangendo períodos  de tempo da ordem de eras . Vale lembrar que Beethoven era um Maçon Livre adorava o único Arquiteto Cósmico e seu objetivo a imortalidade.  Pode-se julgar disto tudo e da sua própria música que Beethoven havia aberto sua consciência genética.

Aqui habitam os arquétipos primordiais, muito mais antigos que a própria linguagem e ainda assim, mais novos que o amanhã.  São todos personificações dos genes como a grande Mãe celta, o Baphomet dos templários, “O Grande Arquiteto Cósmico” da maçonaria ou o Bebê no Ovo azul no final do filem de Stanley Kubrick, 2001. Essas imagens não são delírios poéticos de povos ou de indivíduos. Elas reaparecem nos sonhos dos indivíduos ( o mito pessoal da noite) e nos mitos de todos os povos ( sonhos impessoais das espécies) e, uma vez e sempre nas estórias de anjos e Ufos. Jesus e Cristo, Sidarta e Budha, O Ser Humano e a Entidade Planetária; em outras palavras O Sistema Nervoso e o DNA.

Joyce em o Desperar de Fennegan explica a lógica do consciência genético assim: “Esses anos e terras nossos, nada mais são que poeira de tijolos. Somos humanos e humus da mesma massa e retorno. No limiar do pão nosso de cada dia jaz o cadáver da colheita de nosso pai fecundo que cairá se preciso mais inadvertidamente se reerguerá.”. Nosso pai fecundo, a semente o código genético, e o ovo, a sabedoria celular manda o sinal ao longo das épocas. Numa metáfora semelhante o geneticista ganhador do Prêmio Nobel, Herbert Muller diz: “Todos somos robôs gigantes manufaturados pelo DNA para produzir mais DNA.” Para o individuo as quebras da cadeia de vida/morte/vida/morte são extremamente reais e dolorosas: para a sabedoria do Pai Semente.  A unidade contínuo da vida/morte/vida morte… é uma realidade maior.

Este estado permite  ao cérebro individual “conversar” com o arquiteto  evolucionário que projetou o seu corpo e – com bilhões e bilhões de outras pessoas, desde o início da vida.  Esta “arquiteta” é a maior projetista sobre este planeta como Buck Fuller comentou repetidamente  nenhum projetista humano já se igualou a sua eficiência ou mesmo em sua estética em produtos rotineiros como rosas, ovos, colônias de insetos, peixes, etc…

De forma menos poética, seja ao humanizarmos este arquiteto numa Grande Mãe ou num Deus das Florestas. Ou animalizarmos num ser com cabeça de chacal, como um Louca deus Divino, como uma tribo africana. Ou ainda se o espiritualizarmos  em algo totalmente abstrato como os Hindus e os Cientistas Cristãos , estamos apresentando apenas uma visão  humanizada deste ser de três bilhões de anos  de idade. Quando o molecularizamos  como DNA, estamos ainda vendo apenas uma seção transversal do mesmo, mas fazemos isso simplesmente porque esta é até agora a sua versão mais útil em termos de análise científica.

Ele ou Ela pode ser personificado em termos modernos como Mãe DNA ou Pai Acido Nucléico. O Racionalista imediatamente repudia tais personificações humanizadas,  uma vez que Ele ou Ela é inconsciente do que faz é um fenômeno não inteligente. A resposta em todas as eras é a de que Ele ou Ela não está inconsciente mas sim intoxicado em si próprio, embriagado em sua própria imensidão.

Mas se julgarmos a inteligência pela capacidade de sobreviver, o pool genético é mais inteligente do que qualquer pessoa, por um fator de vários milhares, mesmo se considerarmos os gênios. Einstein não era tão inteligente quanto o povo judeu quando este é considerado de forma coletiva.  Ele formulou a lei da relatividade e foi esperto o suficiente para escapar dos Nazistas. Os Judeus historicamente criaram dezenas de idéias tão importantes quanto a relatividade e sobreviveram a centenas de “progons”.

A espécie  humana é ainda mais inteligente do que pool genético. Vive milhões de anos a mais do que qualquer individuo, muitos milhares de vezes mais do que qualquer pool genético e é autora de muito mais arte, ciência, filosofia e conquistas do que qualquer outro grupo especifico. A biosfera – Gaia – O código do DNA é ainda mais inteligente do que todos os indivíduos, pools genéticos e espécies. Sobreviveu a tudo que lhe foi atirado  contra ela por cerca de quatro bilhões de anos e está ficando cada vez mais esperta o tempo todo. Pela humanidade dispõe de um olho cada vez melhor com que ver e julgar sua trajetória, como nunca antes e está se preparando gradualmente para abandonar esse planeta e expandir-se pelo universo.

Beethoven , para cita-lo mais uma vez disse: “Qualquer pessoa que compreenda minha música não mais será infeliz.”, Isto acontece porque  a sua música é uma melodia da consciência genética da mesma forma que os Upanishads são uma poesia da consciência genética, representa o espírito da Vida tornando-se consciente de Si mesmo, dos Seus poderes, das suas próprias capacidades para progresso infinito.

Para aqueles que ainda não passaram pela experiência genética por meios pessoais e religiosos espera-se que com o decorrer dos anos uma compreensão maior da natureza nos forneça os subsídios para ligarmos essa consciência através da própria razão e da ciência. Quando isso acontecer a visão religiosa será esclarecida pelo que realmente é e todos os deuses e mitos da antiguidade retornaram como velhos amigos do tempo de infância revelando-se agora sob seus verdadeiros nomes.

Seja como for a maneira como isso aconterá, estaparece uma hipotese cada vez mais próxima com o passar dos anos. A religião cada vez mais se curva para a ciência e a ciência a cada instante parece se tornar tão fascinante quando qualquer misticismo. Qualquer que seja o nome dado a este movimento que trará a consciência genética para as grandes massas com ele virá à compreensão em grande escala do papel da humanidade como parte um todo muito maior.  A raça humana terá então abandonado sua infância e estará livre para expandir-se e crescer com seus genes para as fronteiras mias distantes do espaço infinito. Quando isso acontecer, então a aventura da vida terá finalmente começado e todo adulto será um Cristo e toda  criança será um messias.

EXERCICIOS

1 – Faça uma lista e pelo menos 15 semelhanças entre São Paulo (ou qualquer outra cidade grande)  e uma colônia de insetos, tal como uma colméia ou um formigueiro. Se você não puder pensar em quinze alternativas, procure ler o livro Sociobiologia de Edward Wilson. Contemple a informação do DNA, que criou estes enclaves de alta coerência e organização, seja na sociedade dos primatas ou dos insetos.

2 – Leia os Upashads e todas as vezes que ler a palavra “Atman” ou “Alma do Mundo” traduza como “Fita Mestre do DNA” Veja se isto lhe faz ler esta tradição antiga com maior sentido.

3 – Observe seus próprios sonhos, quanto se seu conteúdo poderia ser atribuído a mensagens de seu próprio código genético quanto a incongruências de seu próprio comportamento cotidiano em relação a vontade deste “Pai Fecundo”.

4 – Jung e vários dos seus discípulos  como Coleman, Steiger e Fideler, sugeriram que da mesma forma que as mitologias clássicas, os mitos modernos dos UFOS são mensagens deste circuito de DNA coletivo dirigidas ao cérebro.  O que significam tais mensagens? O que é que o filamento de DNA poderia estar querendo dizer a humanidade?

5 – Releia o encontro de Moisés com o “Eu Sou o que Sou” no deuteronômio. Tente ler com a interpretação de que Moises estava falando com seu própria consciência genética. Quais os interesses da sarsa ardente em relação ao povo hebreu?

6 – Dedique um tempo a prática da DNA-Vidência

Robert Anton Wilson

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