Os Sonhos (Parte 6)

Por: Colorado Teus

Esta é uma série de textos que começou com Breve introdução à Magia, depois definimos nossos termos técnicos em Signos, falamos sobre a precisão das divisões entre os planos em A Percepção e a Evolução e como isso pode ser organizado em em Rituais e depois mostramos como a simples mistura de sistemas mágicos pode ser um fracasso para pesquisas em Análise de sistemas mágicos.

Para entender um pouco melhor o exercício prático do quinto texto, separei outra frase do livro “O Poder do Mito”, de Joseph Campbell:

“Quanto ao ritual, é preciso que ele se mantenha vivo. Muito do nosso ritual está morto. É extremamente interessante ler a respeito das culturas primitivas, elementares – como elas transformam os contos populares, os mitos, o tempo todo, em função das circunstâncias. Um povo se move de uma área em que, digamos, a vegetação era o suporte básico, para as planícies. Muitos dos nossos índios das planícies, do período em que andavam a cavalo, tinham pertencido originariamente à cultura do Mississipi. Eles viviam ao longo do Mississipi, tinham moradia fixa nas cidades e desenvolviam uma agricultura estável.

Então receberam os cavalos dos conquistadores espanhóis, o que tornou possível aventurar-se pelas planícies e praticar a grande caçada das manadas de búfalos. Por essa época, sua mitologia transformou-se de mitologia ligada à vegetação, em mitologia ligada ao búfalo.”

Muitos dos rituais foram criados de maneira a modificar o estado de consciência das pessoas e lembrá-las do que é realmente importante para suas vidas.

Como estamos falando sobre a criação dos sistemas mágicos, é preciso saber o porquê deles serem criados. Quase tudo que foi discutido até agora é mais ligado aos mundos ativo e formativo, ou Assiah e Yetzirah respectivamente (de acordo com a divisão com base nos Quatro Elementos citada no terceiro texto da série), então, após entender estes, vamos falar sobre o mundo emocional ou criativo, o mundo da Água, Briah.

“Emoção é uma experiência subjetiva, associada ao temperamento, personalidade e motivação. A palavra deriva do latim emovere, em que o e- (variante de ex-) significa ‘fora’ e movere significa ‘movimento’.” Emoção. In: Wikipedia. Disponível em:. . Acesso em: 07/08/2014.

Podemos ver que existe uma diferença entre sentimentos e emoções, já que os sentimentos estão ligados diretamente aos nossos sistemas de percepção, enquanto emoção é um tipo específico de sentimento, o que coloca a pessoa reativamente em movimento (aqui falamos dos mais diferentes tipos de movimento, desde um pensamento a um movimento físico).

Todos temos os mais variados tipos de emoções durante nosso dia a dia, desde a vontade de abraçar aqueles que amamos, até a vontade de afastar alguém que queremos não queremos por perto. Mas existe um problema muito grande quando vamos falar sobre emoções, elas estão além da nossa língua, estão acima do plano dos símbolos. Cada emoção depende basicamente da percepção de mundo de quem a sente e também da intensidade com que o algo que a gerou aconteceu.

Quando eu digo “Eu amo minha mãe”, é um amor muito diferente de quando eu digo “Eu amo minha namorada”, ou “Eu amo meu trabalho”, ou “Eu amo meu filho”, ou “Eu amo chocolate” etc. Quando, por exemplo, a palavra “amor” é lida em um texto, o leitor tenta ativá-la recordando de algo (ou seja, o remete a algo que ele já sentiu) para entender que tipo de amor o autor está tentando citar. Mas uma pessoa que nunca teve um filho, não vai entender exatamente o que um pai sente quando diz “Eu amo meu filho” enquanto esse não tiver um (exemplo emprestado do querido MDD).

Para contornar estas situações, existem muitas técnicas que ajudam a colocar uma parte maior do sentimento no texto, como fazer comparações ou metáforas, escrever poemas e músicas, fazer um desenho, um vídeo etc. Eu poderia falar “Eu amo tanto minha namorada que sem ela minha vida seria preto e branco”. Com isto, levo o leitor a pensar em como é a diferença em ver algo em preto e branco e à cores (como tv ou fotos); ao sentir a diferença, ver que é muito mais sem graça (obviamente existem exceções), ele consegue chegar mais perto de entender que minha vida seria bem mais sem graça sem minha namorada, e, assim, entender um pouco mais do meu amor por ela. Mas mesmo assim não é algo preciso, então eu poderia escrever um ou vários poemas, uma ou várias músicas, fazer desenhos e muitas outras coisas. Cada vez que fizer algo assim, as outras pessoas poderão entender um pouco melhor minhas emoções.

Mas sabemos que emoções não são ligadas apenas a amor. Os índios tinham uma ligação muito forte com a Mãe Natureza, então sempre que conseguiam alguma comida, sentiam gratidão e uma felicidade muito grande e, para expressar isso, criavam festivais, músicas, pinturas, esculturas e muitas outras coisas como forma de agradecê-La. É aí que percebemos a diferença que Joseph Campbell cita de quando há uma mudança nos hábitos dos índios, toda sua maneira de cultuar é modificada (cultos de agradecimento à floresta tornam-se cultos de agradecimento aos búfalos), porém, as emoções são praticamente as mesmas. Quem sabe uma foto ajude o leitor a perceber estas emoções que citei dos índios:

Com isso, voltamos àquilo que eu estava falando sobre símbolos no texto 4, que símbolos são imagens que um grupo de pessoas tem com um significado em comum (aquilo que os une), então, com a formação de um sistema simbólico, começa a existir uma padronização que ajuda muito na expressão das emoções entre pessoas que o entendem/vivem. Isto é fortalecido quando as pessoas vivem utilizando e percebendo aquele sistema simbólico rotineiramente, não é que não funciona para quem não vive assim, porém, é bem mais fraco para estes. Eu que, para comer, preciso apenas arrumar dinheiro e ir a um supermercado, nunca saberei de verdade o que é louvar um Deus Caçador, o que é suplicar comida a Ele junto com toda uma cidade, com seus filhos, com medo de nunca mais conseguir comer e ver seus entes queridos morrerem de fome.

Até aqui falamos das emoções que nós conseguimos entender e tentamos transmitir a alguém, mas e as que nem nós mesmos conseguimos entender? É aí que entra o que se chama de “subconsciente” dos seres humanos, o lugar onde ficam as emoções que o ser possui, mas ainda não foi capaz de entender conscientemente. Quando estas emoções começam a aflorar, elas começam a chegar na mente e tomam forma de símbolos que o ser possui em memória, o que pode ficar algo grosseiramente aproximado. Vamos a um exemplo:

Dois nativos, um que viveu a vida toda na Floresta Amazônica e o outro que viveu no Egito. Quando algo começa a ameaçar a vida do primeiro, nos sonhos, ele poderá ver uma onça pintada tentando atacá-lo, uma aranha, uma cobra etc. Se esse mesmo algo ameaça a vida do segundo, ele verá nos sonhos um escorpião, uma serpente, um crocodilo etc.

Quando é algo que a pessoa não consegue fazer a mínima ideia do que seja, não possui nada que se aproxime daquilo, começam a aparecer seres deformados e totalmente desconexos durante os sonhos, como uma onça pintada com cabeça de cobra e oito patas, formando um “novo ser”. Este novo ser, apesar de deformado, não é necessariamente bom ou mal, é apenas divergente dos padrões com que a pessoa criadora está habituada.

Utilizar um bom sistema simbólico ajuda justamente nisso, quando se sintoniza com um, as emoções começam a chegar baseadas nesses padrões. Por exemplo, imaginemos que várias pessoas, em diferentes partes do mundo, precisam disciplinar alguém mas não têm forças para isso. Neste momento um grego pode sonhar que é o deus Áres, um umbandista que é Ogum, um hindu que é Kali, um egípcio que é Hórus, uma criança dos dias atuais que é Vegeta, Kratos, um soldado armado etc.

Como é importante analisar as próprias emoções, é muito importante que se entenda qual a base simbólica que sua mente está utilizando, ou seus sonhos e visões viram uma salada de frutas. Note que, em razão de toda educação e percepção de mundo que as pessoas de um grupo têm (a forma de disciplinar do grego não é a mesma dos umbandistas, hindus e egípcios), logo, as imagens citadas não são as mesmas, gerando deuses, culturas e padrões de ação diferentes (algumas vezes muito parecidos, mas nunca iguais). Mas, apesar disso, existem sim símbolos que servem para a grande parte das pessoas do mundo todo, são imagens formadas à partir do que foi citado no capítulo 3 como “Inconsciente Coletivo”, que é a parte não consciente das coisas que todas as pessoas do mundo são capazes de perceber, simplesmente por serem seres humanos gerados e criados por outros seres humanos; este assunto será abordado no próximo capítulo, quando estivermos falando de Atziluth, ou o mundo do Fogo.

Como de costume, para terminar este texto proponho um exercício prático: a construção de um diário de sonhos. Todas as pessoas do mundo sonham, porém, nem todas lembram deles, justamente porque lembrar dos sonhos gasta energia e a maioria das pessoas não quer gastar energia em algo que para ela não faz o menor sentido. A melhor maneira que conheci para lembrar de sonhos é anotando-os, quando fazemos isso, nosso cérebro começa a dar mais atenção (awereness) a eles e nos ajuda a lembrar cada vez de mais e mais detalhes, até que chegará uma hora em que a pessoa dificilmente conseguirá lembrar se o que se passou foi sonho ou realidade. Daí vem a segunda grande importância de anotá-los: para não confundirmos os sonhos com a realidade do mundo físico. Existem outras coisas que nos ajudam a induzir nosso cérebro a lembrar dos sonhos, como: imagens, talismãs, músicas, orações etc. Um terceiro ponto, não menos importante que os outros, é começar a perceber os padrões em que as imagens chegam, assim, podemos entender melhor quais são nossos próprios sistemas simbólicos e, dessa forma, entender melhor nossas emoções inconscientes.

“Vamos todos em busca do elixir da longa vida…”

Vai dar certo!

#MagiaPrática

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/os-sonhos-parte-6

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