Shinto

Aisatsu yo!

O Shinto, literalmente traduzido como “o Caminho dos Kami”, é uma religião étnica e natural surgida no Japão com o objetivo de cultuar os Kami, entidades sobrenaturais erroneamente denominadas “deuses” – para saber o que são Kami, eu recomendo a leitura deste post aqui.

A origem do Shinto é muito discutida pelos estudiosos orientais. Esteja o seu ponto de origem junto com a formação da cultura japonesa, ou com a influência da filosofia chinesa e do budismo mayahana, o fato é que o Shinto foi moldado à luz de várias religiões estrangeiras. Em geral, é amplamente considerado que o Shinto surgiu como religião a partir de outras formas religiosas tais como o animismo, o shamanismo, o culto aos ancestrais e o culto à natureza, gradualmente moldando seus próprios rituais e formas de culto.

 A adoração aos Kami, visto como o centro do Shinto, mudou bastante com o passar dos anos. A influência budista trouxe o “amálgama de kami e budas”, o chamado Shuugou Shinbutsu, acarretando mudanças na filosofia e nas práticas diárias e de culto nos santuários. Após o período Kamamura (1333 A.D.), surgiram várias teorias xintoístas com base das ideias de Confúcio.

O mais importante impacto religioso e filosófico sobre a estrutura do Shinto foi representado pelo budismo, mas o antigo pensamento chinês e o confucionismo possuem também uma grande influência. A inspiração chinesa deu-se basicamente através do Onmyoudou, que influenciou os rituais de purificação. O próprio Shugendou é um produto do nascente Shuugou Shinbutsu, mas que, após sua consolidação, exerceu sua influência na formação do xintoísmo moderno.

Até um pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial, os santuários e templos xintoístas possuíam uma certa autonomia, o que favoreceu o surgimento de diversas “novas religiões” derivadas do Shinto. Depois da guerra, o sistema de santuário foi consolidado sob o Jinja Honchou (algo como uma associação de santuários xintoístas), permanecendo até os dias de hoje.

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Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente aqueles ligados ao Japão.

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/shinto

A Cor Vermelha

A cor vermelha é predominante no oriente. Seja no Japão ou na China, sempre encontramos elementos tradicionais que marcam suas culturas pintados com essa cor. Os templos xintoístas geralmente são vermelhos; os nós chineses são preferencialmente atados com fio de seda vermelho, e no Feng Shui, três moedas chinesas amarradas com fio vermelho atraem prosperidade. O que significa a cor vermelha para os chineses e japoneses?

O fundamento vem da tradição taoísta, que posteriormente permeou as tradições japonesas do onmyoudou e do xintoísmo, eventualmente espalhando-se para outras escolas.

O vermelho é a cor do quadrante sul, regido por Zhu Qiao (ou Suzaku, em japonês), o Pássaro Vermelho do Sul, a região quente e luminosa na qual os seres percebem-se uns aos outros, correspondente ao Verão e ao movimento Fogo. Na Sequência do Céu Posterior, o trigrama do sul é Li, o Fogo. Por isso, os sábios se voltavam para o sul quando escutavam o sentido do universo, e os governantes sentavam em direção ao sul quando davam suas audiências, pois isso significa que governavam voltados para a Luz.

O princípio luminoso é o princípio Yang, o ativo, o gerador. O Sol brilhando no céu é uma das imagens do trigrama Li, e é também uma das representações da energia Yang.

Dessa forma, possui a cor vermelha, por conseguinte, a mesma capacidade calorosa e ativa, e o mesmo princípio forte, luminoso e gerador.

A título de curiosidade, especificamente no Japão, as crianças costumam pintar o sol em seus desenhos como uma grande bola vermelha, igual ao retratado na bandeira do Japão. Ademais, o vermelho, além de ser uma cor do sol e do fogo, da força da vida, e muito utilizada em talismãs e amuletos para afastar o mal, também é utilizado para designar recém nascidos e crianças muito pequenas. Para os que conhecem o idioma, “vermelho” em japonês é “akai”. As crianças, então, são chamadas de “aka-chan”.

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Originalmente publicado no blog Magia Oriental em 01/03/2012

Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente daqueles ligados ao Japão.

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#MagiaOriental

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Onigawara e máscaras Hannya

Muito além de ser um mero elemento arquitetônico, as Onigawara exercem um papel de proteção, prevenindo os intemperismos, afastando desastres naturais, fogo e espíritos malignos. Elas são colocadas estrategicamente nos cantos nordestes das construções. Como já vimos, a posição nordeste é conhecida o “Portão do Oni”, e, no Feng Shui, é uma direção nada auspiciosa…

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Originalmente publicado no blog Magia Oriental em 01/03/2012

Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente daqueles ligados ao Japão. É Mestre Reiki, onmyouji, e professora do Instituto Seimei para Cultura e Religião.

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Onryou, Médiuns e Ringu, ou “O Chamado” em japonês

Foi com o filme “O Chamado” que o ocidente abriu as portas para os filmes de assombração orientais. Infelizmente, abriram as portas para as péssimas refilmagens com atores norte-americanos em cenários orientais e personagens de nomes japoneses. Digo ainda filmes de “assombração” porque vejo muitas pessoas reclamarem desse tipo de gênero, alegando que não são assustadores o suficiente. É óbvio que não são – para os ocidentais.

Enfim, deixando as críticas cinematográficas (temporariamente) de lado, vamos ao que interessa.

Ringu é baseado na obra do escritor japonês Suzuki Koji, dividida em quatro livros: Ringu (1991), Rasen (1995), Loop (1998) e The Birthday (1999)

Evidentemente, o escritor dos livros baseou-se na história dessas duas mulheres para compor suas personagens, dando inclusive seus nomes a elas (Sadako – Sadako e Chizuko – Shizuko).

A alma humana é chamada de “reikon”, a junção dos elementos “rei” e “kon”, ou seja, essência espiritual e alma, respectivamente. Especificamente, “ichirei shikon”, ou “um espírito e quatro almas”. Isso porque a kon dos humanos é composta de quatro partes, quais sejam, “aramitama”, ou a coragem, “nigimitama”, ou a amizade, “sachimitama”, ou o amor, e “kushimitama”, ou a sabedoria.

Quando um ser humano morre, seu espírito “rei” e duas das quatro almas, “sachimitama” e “kushimitama”, vão para o outro mundo, enquanto que a “aramitama” e a “nigimitama” permanecem nesse plano. Como a “aramitama” está associada ao corpo físico, ela acabará por se desintegrar, restando apenas a “nigimitama”, que também irá desaparecer, mas num processo que levará um pouco mais de tempo.

Assim, se houver um desequilíbrio na reikon de uma pessoa, ou seja, entre as suas “quatro almas” (geralmente a “nigimitama”, que quando em desequilíbrio, está ligada ao ódio, ao egoísmo e ao apego), ela pode vir a se tornar um fantasma, um Yuurei. Assim, como é a “nigimitama” que permanece por maior tempo nesse plano, ela “segura” o restante das almas, impedindo que o espírito da pessoa parta para o outro mundo. Por outro lado, se ela vier a desencarnar em um momento de grande ódio e/ou violência, ela se torna um Onryou, um espírito vingativo.

Isso ocorre devido ao desequilíbrio da aramitama no momento da morte (geralmente brusca e violenta, tomada pelo ódio), que torna o espírito igualmente violento. Além disso, como a aramitama naturalmente sofre um processo de desintegração, esse tipo de espírito também costuma vampirizar as suas vítimas, de maneira a prolongar a sua “sobrevida” neste plano, e nada melhor do que a adrenalina liberada durante uma sessão de filme de terror para garantir a energia necessária para tal intento.

Apesar da crítica sobre ficção científica, a explicação original para as mortes – que vocês só descobrem em Rasen – não deixa de ser interessante. Quem não quiser spoilers, que não leia o próximo parágrafo.

Sadako (novamente, a do filme) plasma no vídeo as suas imagens mentais e acopla a ele um vírus por ela criado, que mata em sete dias, a menos que a pessoa dê um jeito de transmiti-lo, ou seja, fazendo com que outra pessoa assista ao vídeo e seja infectada, escrevendo livros e fazendo filmes sobre sua história para disseminá-lo, ou engravidando mulheres para que elas dêem a luz a clones seus. Seu objetivo? Dominar o mundo, que dúvida!

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As Correntes do Budismo

Enquanto viveu Siddhartha Gautama (o Buda Sakyamuni), sua doutrina era oralmente transmitida. Com a sua morte, foi preciso reunir na cidade de Rajagriha o primeiro concílio budista. Este teve o fim de fixar em língua Pali os fundamentos da sabedoria do Senhor Buda. Assim, foram compostos os Tripitaka (Coleção de Três Livros). No primeiro ficaram reunidos os sermões de Sakyamuni. No segundo, as regras disciplinares da comunidade de monges. E no último, uma coletânea de comentários adicionais.

Cem anos mais tarde, idéias reformistas reuniram em Vesali o segundo concílio budista. A partir daí ficou o Budismo dividido em duas grandes correntes:

A corrente ortodoxa Theravada (Escola dos Antigos) caracteriza-se por seguir literalmente aos Tripitaka e por acreditar que a Iluminação Budista é somente alcançada mediante a observância dos preceitos monásticos. Daí vir ser conhecida como a corrente Hinayana (Pequeno Veículo) do Budismo.

A segunda corrente, a reformadora, diz que todos os seres originalmente possuem a Semente da Iluminação Budista, estando esta ao alcance de todos, mesmo os sem compromisso monástico. Portanto, é a corrente Mahayana (Grande Veículo) do Budismo.

No Mahayana, o esforço individualista na conquista no Nirvana (Iluminação Búdica) cede lugar à compaixão do Bodhisattva (aquele que renuncia à sua iluminação para que possa orientar os seres à compreensão do Caminho de Buda).

A corrente Theravada difundiu-se para o Ceilão, Birmânia, Camboja, Vietnã, Indonésia e Tailândia. O Mahayana multiplicou-se em inúmeras escolas surgidas da miscigenação com diversas seitas da Índia. Ramificou-se para o Tibet, China, Coréia e Japão.

Adaptado de Shingon Shu – Budismo Esotérico

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Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente aqueles ligados ao Japão.

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/as-correntes-do-budismo

Oshougatsu

Ao longo do mês de dezembro e no início do mês de janeiro, serão postadas no blog Magia Oriental algumas das celebrações mais tradicionais das comemorações de Oshougatsu com certa antecedência, de forma que vocês possam acompanhá-las e até mesmo realizá-las se tiverem a oportunidade.

A primeira preparação para os festivais de Oshougatsu é o Susuharai, modernamente chamado de Osouji, que a famosa limpeza de final de ano. Mas essa limpeza não consiste apenas em tirar o pó e passar um paninho úmido pela casa, é uma verdadeira limpeza mesmo: começa-se do sótão até o porão.

Tudo o que foi acumulado durante o ano e que não possui mais utilidade é jogado fora; os livros são todos retirados das prateleiras para serem reorganizados, os móveis são retirados de suas posições e todos os cantinhos são limpos. Nas casas tradicionais japonesas, o tatami é removido para ser espanado na rua, e o papel das shouji (as portas de correr) é trocado.

Essa limpeza não possui data fixa para acontecer. Alguns a iniciam cerca de um mês antes; outros, alguns dias antes do Ano-Novo, tudo conforme a necessidade da limpeza da casa, a quantidade de objetos a serem jogados fora e a serem organizados. Nos templos, os sacerdotes realizam o Susuharai entre os dias 13 e 15 de dezembro.

O Susuharai não possui apenas um caráter de limpeza física, mas também espiritual: é uma forma de remover toda a energia estagnada dentro da casa ao longo do ano, renovando o ambiente para recepcionar as boas energias do Toshigami, o Kami do Oshougatsu. Para quem divide casa/apartamento e não tem como fazer uma faxina desse nível, é possível fazer a limpeza apenas no quarto. O importante é sair da inércia e movimentar as energias para receber o Ano-Novo.

Da mesma forma que publicarei as comemorações de Oshougatsu, procurarei comentar e registrar também as minhas próprias preparações, para que elas não pareçam tão intangíveis assim de serem feitas. Quem for curioso e não quiser esperar pelas postagens, pode conferir a série de Oshougatsu feita no ano passado logo abaixo.

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Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente aqueles ligados ao Japão.

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Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/oshougatsu

Nove Anos do Teoria da Conspiração!

Hoje, 10/08, exatamente nove anos atrás, em 10/08/2007, era postado o primeiro texto do Teoria da Conspiração no Sedentário: A Santa Ceia e os Símbolos Astrológicos. Lembrando as palavras de um Exu amigo, “Quando vai ver, já foi!”.

Nos dias de hoje, onde qualquer estudante de primeiro ano de filosofia pode inventar para si um titulo pomposo e criar um blog esotérico para tentar impor suas verdades, e dezenas de blogs de magias e pactos e ordens e curiosos de todos os calibres esquisotéricos surgem a cada dia na internet, como podemos saber se determinado autor é confiável?

Eu me fiz essa pergunta dez anos atrás, quando encontrei com o Del Debbio pela primeira vez em uma loja Maçônica, em uma palestra sobre “Kabbalah Hermética” (que vocês ja devem ter assistido pelo menos alguma versão dela. São todas iguais, mas todas diferentes. Só assistindo duas para ver. Para quem não viu, tem um link de uma delas no youtube Aqui). Adoro essa palestra porque sempre os judeus tradicionais se arrepiam todo quando ele faz as correlações da árvore das vidas com outras religiões. E este, talvez, seja o maior legado que ele deixará na história do Hermetismo.

Mas o que o gabarita para fazer estas afirmações?

Talvez porque a história do MDD dentro das Ordens iniciáticas seja única. A maioria de nós, estudiosos do ocultismo pré-internet, começávamos pela revista Planeta, depois comprávamos os livros da editora Pensamento, entrávamos na Maçonaria, em alguma ordem rosacruz e seguíamos pela senda sem nunca travarmos contato com outras vertentes. Quem é da macumba, caia em um terreiro escondido no fundo de algum quintal e ficava por lá décadas, isolado. Cada um com suas verdades…

O DD começou em 1989 lá na Inglaterra. E ainda teve sorte (se é que alguém aqui ainda acredita que existam coincidências) de cair em um craft tradicional de bruxaria, com a parte magística da coisa (que inclui incorporações) e contato com o pessoal da SRIA, do AA e de outros grupos rosacruzes. Quando voltou para o Brasil, talvez tivesse ficado trancado em seu quarto estudando e nunca teríamos este blog… mas ele também foi um dos primeiros Jogadores de RPG aqui no Brasil. (RPG é a sigla de um jogo que significa “role playing games” ou jogos de teatro). Em 1995 publicou um livro que utilizava o cenário medieval de mitologias reais em um jogo que foi um dos mais vendidos da história do RPG no Brasil (Arkanun). Por que isso é importante?

Porque ele se tornou uma espécie de subcelebridade pop. E isso, como veremos, foi de importância vital para chegarmos onde estamos hoje (vai anotando as coincidências ai…).

Bem, o DD se graduou em arquitetura e fez especializações em história da arte, semiótica e história das religiões comparadas. De um trabalho de mais de dez anos de pesquisas, publicou a Enciclopédia de Mitologia, um dos maiores trampos sobre o assunto no Brasil.

Com a faculdade veio a maçonaria e aqui as coisas começam a ficar interessantes. Por ser um escritor famoso, ele conheceu o Grande Secretário de Planejamentos do GOB, Wagner Veneziani Costa, um dos caras mais importantes e influentes dentro da maçonaria, editor da Madras, uma das pessoas mais inteligentes que eu conheço e fundador da loja maçônica Madras, que foi padrinho do Del Debbio. E aqui entra o ponto que seria crucial para a história do hermetismo no Brasil, a LOJA MADRAS.

No período de 2004 a 2008, a ARLS Madras contou entre seus membros com pessoas como Alexandre Cumino (Umbanda), Rubens Saraceni (Umbanda Sagrada), Johhny de Carli (Reiki), Cláudio Roque Buono Ferreira (Grão Mestre do GOB), Sérgio Pacca (OTO, Thelemita e fundador da ARLS Aleister Crowley), Mario Sérgio Nunes da Costa (Grão Mestre Templário), Adriano Camargo Monteiro (LHP, Dragon Rouge), José Aleixo Vieira (Grande Secretário de Ritualística), Severino Sena (Ogan), Waldir Persona (Umbanda e Candomblé), Carlos Brasilio Conte (Teosofia), Alfonso Odrizola (Umbanda, diretor da Tv espiritualista), Ari Barbosa e Cláudio Yokoyama (Magia Divina), Marco Antônio “Xuxa” (Martinismo), Atila Fayão (Cabalá Judaica), César Mingardi (Rito de York), Diamantino Trindade (Umbanda), Carlos Guardado (Ordem da Marca), Sérgio Grosso (CBCS), entre diversos outros experts em áreas de hermetismo e ocultismo. Agora junte todos estes caras em reuniões quinzenais onde alguém apresentava uma palestra sobre um tema ocultista e os outros podiam questionar e debater sobre o assunto proposto com seus pontos de vista e você começará a ter uma idéia do que isso representou em termos de avanço do conhecimento.

Entre diversas contribuições para a maçonaria brasileira, trouxeram o RER (Rito Escocês Retificado), O Rito Maçônico-Martinista, para o Brasil, fundando a primeira loja do rito, ARLS Jerusalem Celeste, em SP, e organizaram as Ordens de Aperfeiçoamento (Marca, Nauta, Arco Real, Templários e Malta). O Del Debbio chegou a ser Grande Marechal Adjunto da Ordem Templária em 2011/2012.

Em paralelo, tínhamos a ARLS Aleister Crowley e a ARLS Thelema, onde se estudava magia prática e que era formada por membros da OTO, Astrum Argentum, Arcanum Arcanorum, AMORC, TOM e SRIA, e trocávamos conhecimento com a OTO no RJ (Loja Quetzocoatl, com minha querida soror Babalon) e a Ordem dos Cavaleiros de Thelema (que, dentre outros, tivemos a honra de poder conversar algumas vezes com Frater Áster – Euclydes Lacerda – antes de seu falecimento em 2010). Além disso, tínhamos acesso a alguns dos fundadores do movimento Satanista em São Paulo e Quimbandeiros (cujos nomes manterei em segredo para minha própria segurança kkkkk). A ARLS Crowley era tão engajada que até o Padre Quevedo palestrou uma vez sobre demonologia lá.

Palestra no evento de RPG “SANA”, em 2006. Eu avisei que ele era subcelebridade, não avisei? Bem… nesse meio tempo, o MDD já estava bem conhecido dentro das ordens Iniciáticas, dando diversas palestras e cursos fechados apenas para maçons e rosacruzes. De dia, popstar; de noite, frequentando cemitérios para desfazer trabalhos de magia negra com a galera do terreiro. Fun times!

Ok, mas e a Kabbalah Hermética?

O lance de toda aquela pesquisa sobre Mitologia e suas correlações com a Cabalá judaica o levou a estudar a Torah e a Cabalá com rabinos e maçons do rito Adonhiramita por 5 anos, tendo sido iniciado na Cabalá Sefardita em um grupo de estudos iniciáticos. Apesar da paixão e conhecimento pela cultura judaica, ele escolheu não se converter (segundo palavras do próprio “Não tem como me converter ao judaísmo; como vou ficar sem filé à Parmigiana?“). Seus estudos se intensificaram entre os textos de Charles “Chic” Cicero via suas publicações na Ars Quatuor Coronatorum, nas Lojas Inglesas e os textos de Tabatha Cicero via Golden Dawn.

A idéia da Kabbalah associada aos princípios alquímicos, unificando tarot, alquimia e astrologia sempre levantou uma guerra com os judeus ortodoxos, que consideram a Cabalá algo profundamente vinculado à sua religião (por isso costumamos grafar estas duas palavras de maneira diferente: Kabbalah e Cabalá.

Em 2006, Adriano Camargo publica o “Sistemagia”, um dos melhores guias de referência de Kabbalah Hermetica, onde muitas das correlações debatidas em loja foram aproveitadas e organizadas.

No meio de todos estes processos de estudos, chegamos em 2007 em uma palestra na qual estava presente o Regis Freitas, mais conhecido como Oitobits, do site “Sedentário e Hiperativo”, que perguntou a ele se gostaria de ter um blog para falar de ocultismo. O nome “Teoria da Conspiração” foi escolhido pelo pessoal do S&H e em poucas semanas atingiu 40.000 leitores por post.

Del Debbio se torna a primeira figura “pública” dentro do ocultismo brasileiro a defender uma correlação direta entre os orixás e suas entidades com as Esferas da Árvore das Vidas e as entidades helênicas evocadas nos rituais de Aleister Crowley. “Apenas uma questão de máscaras que a entidade espiritual escolherá de acordo com a egrégora em que estiver trabalhando” disse uma vez em uma entrevista.

Estes trabalhos em magia prática puderam ser feitos graças ao intercâmbio de conhecimentos na ARLS Madras, pois foi possível que médiuns umbandistas estudassem hermetismo, kabbalah e cabalá em profundidade e, consequentemente, as entidades que trabalham com eles pudessem se livrar das “máscaras” africanas e trabalharem com formas mais adequadas, como alquimistas, templários e hermetistas. Com a ajuda dos terreiros de Umbanda Sagrada, conseguimos trabalhar até com judeus estudiosos da cabalá que eram médiuns, cujas entidades passaram grandes conhecimentos sobre correspondências dos sistemas judaico e africano, bem como de sua raiz comum, o Egito. A maioria deste conhecimento ainda está restrito ao AA, ao Colégio dos Magos e a outros grupos fechados mas, aos poucos, conforme instruções “do lado de lá”, estão sendo gradativamente abertos.

Em 2010, conhece Fernando Maiorino, diretor da Sirius-Gaia e ajuda a divulgar o I Simpósio de Hermetismo, onde participam também o Frater Goya (C.I.H.), Acid (Saindo da Matrix), Carlos Conte (Teosofia), Renan Romão (Thelema) e Ione Cirilo (Xamanismo). Na segunda edição, em 2011, participam além dos acima o monge Márcio Lupion (Budismo Tibetano), Mário Filho (Islamismo), Alexandre Cumino (Umbanda), Adriano Camargo (LHP), Gilberto Antônio (Taoísmo) e Lázaro Freire (projeção Astral).

A terceira edição ampliou ainda os laços entre os pesquisadores, chamando Felipe Cazelli (Magia do Caos), Wagner Borges (Espiritualista), Claudio Crow (Magia Celta) e Giordano Cimadon (Gnose).

O Blog do “Teoria da Conspiração” também cresce, agregando pensadores semelhantes. Além de textos de todos os citados neste post, também colaboram estudiosos como Jayr Miranda (Panyatara, FRA), Kennyo Ismail (autor do blog “No Esquadro” e um dos maiores pesquisadores contemporâneos sobre maçonaria), Aoi Kwan (Magia Oriental), Raph Arrais (responsável pelas belíssimas traduções da obra de Rumi), o Autor do blog “Maçonaria e Satanismo” (cujo nome continua em segredo comigo!), Tiago Mazzon (labirinto da Mente), Fabio Almeida (Música e Hermetismo), Danilo Pestana (Satanismo), Bruno Cobbi (Ciganos), PH Alves e Roe Mesquita (Adeptus), Frater Alef (Aya Sofia), Jeff Alves (ocultismo BR), Yuri Motta (HQs e Ocultismo), Djaysel Pessoa (Zzzurto), Leonardo lacerda e Hugo Ramirez (Ordem Demolay).

A ARLS Arcanum Arcanorum, braço maçônico da Ordem de Estudos Arcanum Arcanorum, que trabalha em conjunto com a SOL (Sociedade dos Ocultistas Livres), o Templo Aya Sofia, o Colégio dos Magos e o Teoria da Conspiração.

E os frutos desse trabalho se multiplicaram. Com o designer Rodrigo Grola, organizou o Tarot da Kabbalah Hermética, possivelmente um dos melhores e mais completos tarots que existem, além dos pôsteres de estudo. Hoje seus alunos estão desenvolvendo HQs, Livros, Músicas, dando aulas e até mesmo produzindo um Seriado de TV baseado nos estudos da Kabbalah Hermética.

E agora esta em financiamento coletivo para um livro que deve elevar todos os paradigmas de Kabbalah hermética para outro patamar. O Livro bateu todos os recordes de arrecadação no Catarse e ainda há mais de um mês pela frente.

Quando sair publicado, o estudo de mitologias comparadas, kabbalah e astrologia hermética nunca mais será o mesmo. Isso se chama LEGADO.

E ai temos a resposta que tive para a pergunta do início do texto: Como saber se um autor é confiável? Oras, avaliando toda a história dele e quais são suas bases de estudo, quem são seus professores, quais as pessoas que o ajudam e quem são seus inimigos. Quais são os caras que ele pode perguntar alguma coisa quando tem dúvida? e quais são os caras que tentam atrapalhar o seu trabalho?

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Pronto. Aqui está o texto que eu tinha prometido sobre os nove anos de Blog. Parabéns, Frater Thoth, já passou da hora de alguém começar a organizar uma biografia decente sobre os seus trabalhos.

#Blogosfera

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/nove-anos-do-teoria-da-conspira%C3%A7%C3%A3o

As Moedas Chinesas

Aisatsu yo!~

Eu já falei sobre moedas chinesas em outra oportunidade por aqui. Hoje trarei informações novas a respeito delas. Mas, aproveitando a ocasião, não custa relembrar:

As moedas chinesas possuem grande papel dentro da magia oriental. São usadas tanto no Feng Shui como no I Ching. Elas são redondas, com um furo quadrado no meio. O formato redondo da moeda, o círculo, representa a figura do Céu, enquanto o furo quadrado representa a Terra.

As que são cunhadas com valor monetário possuem um lado com quatro kanjis, que geralmente indicam o nome do Imperador da época que foram cunhadas. O outro lado às vezes possui dois, em manchu – um antigo idioma incorporado pelos chineses, e praticamente em extinção hoje em dia –, ou nenhum.

Outros tipos de moedas foram cunhadas sem valor comercial: tratam-se de amuletos taoístas, que possuem desenhos de deuses, animais e estrelas; e moedas especiais para uso no Feng Shui. Estas últimas também possuem quatro kanjis em uma de suas faces, que trazem palavras como harmonia, felicidade, virtude e prosperidade; o outro lado traz animais fantásticos na mitologia chinesa, como dragões e fênix (a imagem do topo deste post ilustra esse tipo de moeda para Feng Shui).

As moedas chinesas são um dos mais poderosos símbolos de riqueza, principalmente quando amarradas com fitas vermelhas. Elas são amarradas em trios, e representam a sorte nos três tipos do tao: o Tao da Terra, o Tao do Homem, e o Tao do Céu. No Feng Shui, este amuleto é usado para trazer prosperidade, pendurando as moedas atrás da porta de casa ou aguardando-as dentro da carteira.

Ao longo da história da China, moedas foram cunhadas em cinco diferentes tipos de caligrafia; algumas do mesmo tipo foram produzidas em dois ou três. São eles: o estilo de selo (zhuanshu), o estilo dos escribas (lishu), o estilo regular (kaishu), o estilo comum (xingshu), e o estilo de grama (caoshu).

O estilo regular e o estilo dos escribas são os tipos de caligrafia que melhor são compreendidos, pois são bem desenhados, conforme a tipografia. Já os outros três são muito difíceis de entender.

O estilo selo corresponde à antiga adaptação dos caracteres pictográficos para kanjis. Suas linhas são finas, o traçado é livre e está muito perto do antigo pictograma. Ou seja, sua leitura não é possível ao leigo, e são relativamente poucas as pessoas que sabem ler este tipo de caligrafia.

Os estilos comum e de grama são escritas cursivas e, portanto, apresentam deformações em comparação à sua tipografia, sendo o segundo estilo mais deformado do que o primeiro. Esses tipos de caligrafia podem dificultar a leitura, mas não a torna impossível para o leigo.

No Brasil, a Loja Coelestium oferece moedas chinesas originais, obtidas de escavações de sítios arqueológicos e de naufrágios ocorridos próximos à costa. Devido à dificuldade de identificá-las, pelos motivos explicados acima e também pela antiguidade e desgaste das mesmas – foi incumbida a mim a missão de reconhecê-las conforme sua dinastia e datá-las.

Compartilho com vocês, então, algumas dessas preciosidades que tive o prazer de tê-las nas mãos por alguns momentos:

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Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente daqueles ligados ao Japão.

Outros posts interessantes no blog Magia Oriental:
O que é o I Ching?
A história do I Ching?
O Céu Anterior Posterior e o Céu Posterior

Métodos para consultar o I Ching

A Estrutura dos Hexagramas

Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/as-moedas-chinesas

Em busca do vampiro indiano

No livro O Culto do Vampiro o ocultista francês Jean-Paul Bourre queixa-se de que “atualmente a maioria dos adeptos da magia já não ousa reconhecer os poderes do sangue. Para eles, magia vermelha e magia negra são a mesma magia diabólica, e preferem acender bastões de incenso sob as imagens de ‘Maha-qualquer-coisa’”, preferindo “cobrir-se de flores cantando que o mundo é bom, luminoso e pacífico”. Mas, “os verdadeiros mágicos são raros… e quando eles surgem, afastamo-nos deles, horrorizados”. [1] Devo também me confessar pasma por haver encontrado fiéis “correndo horrorizados” de certas passagens de seus próprios textos sagrados.

 

 

Sangue e carne:

 

Segundo as instruções do Bardo Thödul, se o espírito do morto mentir no estado de chönyid, Yama, o Senhor da Morte, “colocará uma corda em volta do teu pescoço e te puxará adiante; ele cortará a tua cabeça, extrairá teu coração e arrancará teus intestinos, devorará teu cérebro, beberá teu sangue, comerá tua carne e roerá teus ossos”. [2] No mesmo livro sagrado lemos que Yama é antecedido pelos 28 detentores do poder e pelas 58 deusas sinistras bebedoras de sangue. Desde que creia nelas o moribundo delirante poderá ver tais entidades, como ocorreu no momento de agonia de um policial hindu, na casa dos 40 anos, que sofria de tuberculose pulmonar. Os pesquisadores Osis e Haraldsson relataram o caso:

 

De sua cama no hospital, ele gritava: “O Yamdoot (mensageiro da morte) está vindo para me levar. Tirem-me desta cama para que o Yamdoot não me encontre”. Apontando para a janela, ele disse: “Lá está ele”. Naquele momento, como se alguém tivesse disparado um tiro, “um bando de corvos em cima de uma árvore, vista da janela, voou em disparada”. A enfermeira ficou “aterorizada” e correu para fora, mas não viu nenhum motivo para aquele tumulto, concluindo que “até os corvos pressentiram algo terrível”. Alguns minutos após essa experiência negativa, o paciente entrou em coma profundo e morreu. [3]

 

Desde a mais alta divindade até o mais insignificante fantasma, todas as entidades indianas relacionadas à morte apreciam sangue e carne humana. E mesmo no piedoso marasmo da segunda metade do século XX toda e qualquer divindade poderia converter-se num agente da morte em determinadas circunstâncias. Assim, por exemplo, A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada narra-nos a parábola do demônio Hiraņyakaśipu que viu Kŗşņa como a morte personificada enquanto o devoto Prahlāda contemplou-o como seu Senhor querido, pois “aqueles que desafiam Deus irão vê-lo sob Seu aspecto horroroso, mas aqueles que se dedicam a Ele, irão vê-lo sob Sua forma pessoal”. [4] Por vezes até pessoas comuns podem ser elevadas ao status de espectro da morte. Por exemplo, em maio de 1973 cadáveres de mendigos surgiram misteriosamente nos becos de Calcutá. Tinham marcas de mordidas no pescoço, aparentemente produzidas por aparelhos mecânicos (a polícia não esclareceu de que tipo). Conforme o repórter André Machado, “assim que soube da onda vampiresca, a população ficou em pânico e saiu às ruas armada de tacapes e estacas de madeira”.[5] Cinco maltrapilhos com aparência suspeita acabaram linchados pela multidão enfurecida, e outros 20 saíram feridos.

Noutro caso, investigado por Idries Shah, em 1956, difundiu-se a história de que uma viúva inglesa que vivia em Bombaim teria sugado o sangue de uma das vítimas de um acidente na estrada. Ela morreu alguns meses depois do acidente, sendo que a lenda da vampira continuou e cresceu. Diziam que comia carne crua e bebia sangue humano sempre que possível. Shah encontrou uma amiga da viúva, que lhe explicou o incidente:

 

Quando circulava o rumor de que era vampira – contado por algum dos sobreviventes do acidente e não por mim – ela me procurou para “confessar” que ia voltar à Inglaterra para tratamento. Perguntei-lhe se ela era vampira e ela disse que não. A verdade é que, quando criança, ela tinha sofrido de uma doença e tinha de comer sanduíches de carne crua. Ela se acostumou tanto com isso que nunca comia carne cozida. Seu médico via isso como um estado psicológico mais ou menos inofensivo. E assim continuou ela com a dieta. Ao ir para a Índia, ela descobriu que era difícil conseguir carne crua, apesar de sentir muita vontade e, finalmente, ela conseguiu arranjar fornecedor. Mas ela se “controlava”, tanto quanto possível. Na noite do acidente, ela me contou que não comia carne crua há semanas e que, ao se curvar sobre um ferido, aquilo foi demais para ela e então encostou seu rosto no dele como para beija-lo. Um indiano que estava presente, conhecendo talvez o seu gosto por carne sangrenta, deu início aos rumores. [6]

 

Resumindo, o consumo de sangue e carne humana é uma constante entre uma infinidade de caracteres do folclore da Índia e Tibet, fato que deixa os pesquisadores ocidentais completamente desnorteados sempre que tentam produzir estudos de religiões comparadas sobre o mito do vampiro. Assim, todos que se prendem ao elemento isolado “beber sangue” acabam catalogando uma infinidade de hematófagos. Matthew Bunson, o primeiro antropólogo a escrever uma enciclopédia dos mitos do vampiro ao redor do globo, encontrou na Índia um problema comum. Ele teria descoberto que muitos folcloristas referem-se ao bhuta como o vampiro indiano por excelência ao passo que outros o catalogam como um tipo específico de vampiro e incluem outros tipos, como “rakshasa, jigarkhwar, hanh saburo, hant-pare, hantu-dor dong, mah’anah, pacu-pati, penanggalan, pisacha, e vetala”. [7] Seu sucessor, Gordom Melton, acrescenta as entidades femininas yatu-dhana, churel e chedipe à lista e confessa sua incapacidade de esgotar o tema em um único artigo:

Em toda a Índia, entre os vários grupos étnicos e lingüísticos, havia uma multidão de fantasmas, demônios e espíritos malignos que viviam dentro ou perto dos cemitérios e dos locais de cremação e que tinham alguma semelhança com os vampiros da Europa. Muitos enganavam os outros assumindo a forma de uma pessoa viva. Transformavam-se, assumindo uma aparência terrivelmente demoníaca pouco antes de atacar suas vítimas. [8]

 

Para facilitar as pesquisas no campo eu gostaria de propor um novo padrão de busca. O vampiro não pode ser qualquer bebedor de sangue humano ou até os piolhos, pulgas, pernilongos e lombrigas se enquadrariam perfeitamente na descrição. Ele não pode ser um deus porque possui corpo humano nem tão pouco se deverá rotular como vampiro a qualquer pessoa que consuma sangue com regularidade, pois neste caso englobaríamos todos os membros da tribo Massái (povo do Quênia e da Tanzânia cuja dieta diária inclui uma mistura de sangue e leite extraído do gado bovino). — Lembre-se que estamos procurando por vampiros mitológicos e não por algum costume tribal, portadores de hematomania (doença mental) ou “real vampyres” entendidos na moderna concepção norte-americana do termo. — Ele não deve sequer ser apenas um morto que ressuscitou, sem necessitar ou desejar o consumo de sangue, pois na Índia e Tibet, conta-se que diversos santos e devotos, a exemplo de Sri Chaitanya Mahaprabhu (nascido em Mayapur, Índia, 1486), morreram voluntariamente e voltaram à vida. Sobretudo, ele não pode ser um ser capaz de dispensar o consumo de sangue.

Partindo daí excluímos Kali, Yama e inúmeros outros inumanos, apesar de manter ressalvas sobre determinados elementos de seu séqüito. Excluímos o Bhuta, pois como anotou corretamente Marcos Torrigo, “os Bhuta se alimentam de fezes e intestinos encontrados em corpos decompostos”, promovendo doenças nos seres humanos como “uma forma de gerar o seu alimento”. [9] Logo, não é um vampiro.

Não é preciso beber sangue ou ter asas de morcego para se ser um rakshasa (lit. malvado, perverso). O adjetivo também se aplica a um homem vivo comum que comete um ato de crueldade como, por exemplo, atirar uma criança ao fogo. (Isso significa que alguns vampiros poderão ser rakshasas, mas nem todo rakshasa será necessariamente um vampiro). A chedipe (lit. prostituta) também não precisa montar um tigre ou ter patas de animal. Pode ser uma prostituta de verdade. As bruxarias das dakinis da vida real funcionam tão bem quanto as mandingas das mães de santo de nossos terreiros, mas elas nem sequer incorporam entidades. Apenas para o vetalā não há exceção. Ele deve ser sempre um cadáver reanimado por seu próprio espírito ou pelo de outrem.  É o equivalente perfeito do vampir ou blutssauger cujos relatos começaram a circundar a Europa a partir de 1732.

 

O vampiro modelo

 

Segundo Devandra P. Varna, os Vampiros surgiram pela primeira vez na Índia e as histórias se espalharam pela Europa através da Rota da Seda. Esta tese não pode ser comprovada, mas a idéia não é absurda nem impossível.

Na Índia os relatos de ressurreição de homens santos são facilmente encontrados. Um dos casos mais recentes foi o de Sai Baba, que teria pedido a seu discípulo Mahalsapathy para tomar conta de seu corpo durante três dias enquanto seu espírito viajaria “pra Alá”. Diz-se que sua respiração diminuiu até cessar e sua circulação se interrompeu. Dado como morto, as autoridades tentaram fazer Mahalsapathy cumprir uma lei da Índia que obriga a cremação ou enterro dos corpos em 24 horas após a morte, mas ele se recusou. No terceiro dia a respiração retornou, Sai Baba abriu os olhos e voltou à vida. Contudo, o privilégio de ir e vir pelos portais da morte não deve ser legado ao homem comum. Os santos retornam para o benefício da humanidade, mas o vulgo tenta reverter o fado por motivos egoístas. O Bardo Thödul relata a reação de um espírito ordinário diante no momento posterior à morte do corpo:

Verás tua própria casa, os criados, parentes e o [teu] cadáver, e pensarás: “Agora estou morto! Que farei?”; e, oprimido por intenso pesar, este pensamento te ocorrerá: “Oh, daria tudo para possuir um corpo!” E assim pensando, vagarás de um lado para outro procurando um corpo.

 

Nas instruções do Bardo Thödul o homem comum, ignorante das artes mágicas, nunca conseguirá reentrar em seu corpo ou possuir qualquer outro. Mas sempre haverá alguém tentando burlar as leis; incluindo as da natureza. Segundo W. Y. Evans-Wentz,

 

os tibetanos fazem objeção ao enterro, pois acreditam que, quando um cadáver é enterrado, o espírito do morto, vendo isso, tenta reentrar nele, e que, se a tentativa for bem-sucedida, origina-se um vampiro, enquanto que a cremação ou outros métodos de dissipar rapidamente os elementos do corpo morto impedem o vampirismo. [10]

A fórmula admite variações como, por exemplo, trocar de corpo. Assim, na versão do Vetālapancavimsatikā de Somadeva, um yogi abandona seu corpo idoso e entra no cadáver de um jovem morto. O folclore da Índia e Tibet, bem como a literatura devocional, falam de um ser denominado pelo termo sânscrito vetāla, posteriormente traduzido para o tibetano como Baital. Isabel Burton o define como “um gigantesco morcego, vampiro ou espírito maligno que habitava e animava cadáveres”. [11] Diz respeito a uma espécie de ‘espírito’ que freqüenta o smashana (cemitério crematório), adentra e anima corpos humanos frescos nos quais a putrefação ainda teria feito maiores estragos. De acordo com Louis Renou, “os vetālas aparecem na literatura desde o Harivamsa; fazem parte da decoração semidemoníaca do tantrismo sivaíta, de onde passaram ao tantrismo budista”. [12]Sua aparição mais famosa deu-se na coletânea Vetālapancavimsatikā (Vinte e Cinco Contos do Vetāla), existente em diversas versões distintas, que constitui um episódio do Kathā-saritsāgara, composto entre 1063 e 1081. [13]No Tibet esta coletânea foi chamada de Baital-Pachisi. [14]

No Vetālapancavimsatikā de Somadeva, brâmane natural de Cachemir que viveu na segunda metade do século XI, o vetāla recebe os títulos de “mestre em Ioga”, “príncipe dos vampiros”, “mestre dos poderes sobrenaturais”, etc.[15]ua posição social parece diametralmente oposta a de seu correspondente no Baital-Pachisi, onde o espírito do filho de um oleiro reentra em seu próprio corpo após para ajudar o rei Vikram e o jovem príncipe Dharma Dhwaj a fazerem justiça contra seu malfeitor. No processo o cadáver sofre horrenda metamorfose:

Seus olhos, que estavam arregalados, eram de um castanho esverdeado e nunca piscavam. Seus cabelos também eram castanhos e castanho era seu rosto [16]— três matizes diferentes que, não obstante, aproximavam-se um do outro de forma desagradável, como em um coco seco. Tinha o corpo magro e cheio de nervuras como um esqueleto ou um bambu e, estando pendurado de um galho como uma ‘raposa voadora’,[17] pela ponta dos dedos, seus músculos contraídos ressaltavam como se fossem cordas de fibra de coco. Não parecia ter uma gota de sangue, ou este estranho líquido devia ter-se escoado todo para a cabeça, e quando o rajá tocou-lhe a pele, sentiu-a fria como o gelo e viscosa como a de uma serpente. O único sinal de vida era o furioso agitar de uma pequena cauda muito semelhante à de um bode. [18]

 

Segundo a tradição, o vetāla pode ser controlado por aqueles que alcançam a Vetāla Siddhi (poder sobre os vetālas). Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891) teria definido esta técnica yogi como “uma prática de feitiçaria” que pretende possuir “meios de alcançar poder sobre os vivos através de magia negra, encantamentos e cerimônias executadas sobre um corpo humano morto, durante cuja operação o cadáver é profanado”.  [19]No Kathā-saritsāgara tal dom pode ser usado para causas justas como, por exemplo, quando “antigamente, o rei Trivikramasena, de gloriosa memória, obteve a soberania sobre os Vidyadharas graças a um vetāla”. [20]

Um certo número de fontes ainda preserva detalhes da ritualística, permitindo sua reconstrução parcial. A cerimônia foi concebida como assessória a uma forma extinta de culto localizado no tempo e no espaço. Numa época em que a pena de morte por enforcamento era comum e os altares de sacrifício ainda não haviam desaparecido, havia um templo branco de Kali (Gauri) propositalmente construído próximo a um smashana (cemitério crematório), nas margens do rio Godavari. A adaptação do Baital-Pachisi, pelo sábio Bhavabhuti, especifica que o rito era levado a cabo necessariamente “durante a noite de segunda-feira, no décimo quarto dia da metade escura do mês de bhadra (agosto)”. Devo adiantar que tal rito culmina com um sacrifício humano no altar de Kali.

O bom devoto (geralmente descrito como um membro da nobreza) opta pelo auto-sacrifício enquanto os homens de má fé (tradicionalmente representados como figuras sujas, pertencentes a castas inferiores e de aparência horrenda), optam por ofertar a vida alheia; caso em que a pretensa vítima fica autorizada a inverter os papeis e sacrificar seu algoz, como teria feito o semi-histórico chátria Vikramaditya ou Vikramarka, rei de Ujjayani. [21] Há também uma passagem ambígua que deixa em aberto a possibilidade de “sacrificar” não um ser humano vivo, mas o corpo de um morto recolhido do cemitério.

Um conto indiano de data incerta diz que antes de iniciar sua jornada o bom devoto deveria lavar-se em um poço e limpar-se “como para uma prece”.[22] A seguir cumpre-se a segunda etapa do rito que exige a obtenção do corpo fresco de um enforcado, usado para conjurar e prestar homenagem ao vetāla no sítio do smashana. No conto supracitado o devoto vai ao crematório e encontra uma árvore onde pendia um enforcado, mas desta vez excepcionalmente não é o corpo que ele deseja. Junto ao cadáver há o vulto de uma mulher assustadora:

 

Ela estava sugando com um ruído baboso, com pequenos soluços e gemidos de prazer, como um bebê mamando no peito da mãe. Mas é natural um bebê sugando o leite — enquanto aquilo era uma dakini, sugando o sangue do cadáver de um jovem.[23]

 

Deduzimos que na falta de um vetāla guia serve uma dakini. É digno de nota que a ressurreição real de um cadáver é algo antinatural no sentido biológico e, portanto, impossível, enquanto uma feiticeira (dakini) sugando o sangue de um morto é um fato antinatural apenas no sentido ético-religioso. A variante onde a dakini substitui o vetāla pode ter sido útil para alguém cuja fé não fosse suficientemente forte para crer que o corpo do morto – que permanece imóvel – foi reanimado.  Um outro problema em relação à escolha do corpo é que o morto deveria ter sido executado por agentes da lei em causa justa (Se o devoto levantasse falsa acusação contra um inocente para enganar a justiça, fazendo-a fornecer o corpo do qual necessitava, o vetāla/baital poderia frustrar seus planos). Portanto, a dakini poderia conduzir àquele que não conseguisse encontrar um defunto fresco na data proposta, que fosse fraco demais para carregar um corpo ou que realmente não soubesse como chegar no templo de Kali.

Optando por um vetāla, o devoto deveria carregar o cadáver-guia para dentro do templo cuja localização ele conhecia de antemão (afinal, trata-se de um devoto). Uma vez no templo, o oficiante oferece um sacrifício humano no altar da deusa. A vítima da imolação deveria posicionar-se em ashtanga, que é um tipo saudação hindu na qual as oito partes do corpo (têmporas, nariz, queixo, joelhos e mãos) tocam o solo. Então sua cabeça é cortada fora (em caso de auto-sacrifício alguém deveria auxiliar o devoto, decapitando-o). Numa animação alegórica, a estátua de Kali ganha vida:

 

Ela enfiou seus dentes no coração dele e bebeu profundamente de seu sangue. Ela sugou e engoliu até que sua face e suas mãos ficaram ensangüentadas e suas roupas manchadas.[24]

 

As dakinis, servas da deusa, cozem a vítima sacrifical e participaram do fim do banquete, consumindo a prasādam (a comida oferecida). Supondo que os relatos correspondam ao modelo de uma cerimônia real, a estátua de Kali e o vetāla comeriam tão pouco quanto um exu honrado com a oferta de um ebó de frango e farofa, enquanto as bruxas e devotos esfomeados pela miséria da Índia medieval encontrariam alívio em um grande  banquete canibal.

 

O processo de reencarnação:

 

Em caso de auto-oferta o espírito do morto receberia tratamento especial. Como recompensa, ele reviveria – reencarnaria – com o melhor karma possível e lhe seriam concedidos um ou mais desejos. Podem ser bagatelas, como sacos de ouro para distribuir aos pobres ou concessões superiores de cunho divino. Diziam-lhe que na vida futura ele governaria sobre todo o mundo. Seria um rei invencível nas batalhas, amado pelo povo e possuidor de riquezas infinitas. O mesmo é válido para a vítima que conseguisse livrar-se da armadilha de um mal devoto e sacrificasse o seu inimigo. No conto em análise uma imagem alegórica faz a estátua da deusa ganhar vida e devora-lo. Quando o esqueleto encontrou-se limpo e polido, deu-se o milagre:

 

A própria Kali pegou uma ânfora com um líquido dourado e espargiu-o sobre os ossos. Alguns músculos e cartilagens começaram a surgir sobre o esqueleto. Então ela jogou mais líquido e ele começou a criar carne, até que a carne cresceu de volta ao normal e as veias e os vasos sangüíneos embutidos nele começaram a inchar com um pouco de sangue.[25]

 

Está subtendido que uma ressurreição análoga foi levada a cabo no Kathā-saritsāgara, de Somadeva, onde o ministro Vikramakesarin foi separado de seu rei Mrgânkadatta por efeito de uma maldição, mas recebeu de um velho brâmane “um encantamento que lhe assegurará o domínio sobre a raça dos Vampiros”. [26] Seguindo o conselho do brâmane, o ministro “aceita o encantamento, conjura um Vampiro a entrar num cadáver humano, capta as simpatias dele dando-lhe de comer sua própria carne e pede-lhe, como favor, que o ajude a achar Mrgânkadatta. O Vampiro consente, e vê-se Vikramakesarin cavalgando o cadáver — dentro do qual está o Vampiro —, percorrendo os ares nesta montaria para encontrar-se milagrosamente aos pés do rei”.[27]

No Vetālapancavimsatikā de Somadeva, o deus Siva assiste a morte de Ksātisīla e presenteia o rei com a “espada que se chama Invencível” através da qual submeteria a sua vontade “a terra com suas ilhas e seus domínios infernais” e se tornaria soberano dos “Espíritos aéreos”. [28] Já na versão tibetana do Baital-Pachisi, de Bhavabhuti, o deus Indra ordena a Vikram que faça um pedido. Séculos de inalterável popularidade nacional e grande difusão internacional são provas literais da concretização de seu humilde desejo: “Ó poderoso soberano do mais baixo paraíso, que esta minha história se torne famosa através do mundo!”[29]

 

Breve citação do vetāla como agente do mal no budismo:

 

Conforme a narrativa do capítulo XXVI do Sutra de Lótus (Hokkekyo), na ocasião em que a assembléia presidida por Buda reuniu-se para a composição deste livro o Bodhisattva Dador Intrépido tomou a palavra para ensinar palavras de poder (dharanis) capazes de proteger e guardar aqueles que leiam, recitem, aceitem e/ou promovam o referido sutra, pois “se um mestre da Lei adquirir estes dharanis, mesmo que yakshas, rakshasas, putanas, krityas, kumbhandas ou espíritos esfomeados o vigiem e tentem aproveitar-se dele, serão incapazes de o fazer”.

Esta é a fórmula fornecida pelo Bodhisattva:

 

jvale mahajvale ukke mukke ade adavati nritye nrityavati ittini

vittini chittini nrityani nrityakati

 

Repare que os rakshadas foram citados na lista de entidades passíveis de banimento pelo dharani do Bodhisattva, mas os representantes desta classe de entidades demoníacas estavam presentes, acompanhados de seu séquito. Eles apressaram-se em resguardar seu espaço, esperando apenas que Vaisharavana e o protetor do leste, Dhritarasha, terminassem seu discurso (pois estes deuses guerreiros representavam o shitenōu, grupo ao qual nenhum demônio faria bem em interromper). Contrariando sua natureza maligna, os rakshasas prometeram dar proteção àqueles que lêem, aceitam e promovem o Sutra do Lótus, bem como punição exemplar a quem não o faça:

 

— Ainda que passem sobre as nossas cabeças, nunca perturbarão os mestres da Lei! Quer sejam yakshas, pakshasas, espíritos esfomeados, putanas, krityas, vetalas, skandas, umarakas, apasmarakas, yakshas krityas ou humanas, ou uma febre, quer seja de um dia, de dois, três, quatro ou até sete dias, ou mesmo uma febre constante, seja na forma de um homem, de uma mulher, de um rapaz ou rapariga, ainda que apenas num sonho, nunca os perturbará!

Então, na presença do Buda elas falaram em verso, dizendo:

— Se houver alguém que não preste atenção aos nossos encantamentos e perturbe e prejudique os pregadores da Lei, as suas cabeças serão desfeitas em sete pedaços como os ramos da árvore arjaka. O seu crime será igual ao de alguém que mate pai e mãe, ou de alguém que adultere o óleo ou que engane os outros com medidas e escalas, ou que, como Devadatta, cause dissensões na Ordem de monges. Se alguém cometer um crime contra os mestres da Lei fará recair sobre si uma culpa igual a estas!

Depois de terem recitado estes versos, as filhas de rakshasa disseram ao Buda:

— Honrado Pelo Mundo, nós usaremos os nossos próprios corpos para proteger e guardar aqueles que aceitam, lêem, recitam e praticam este sutra. Nós velaremos para que eles tenham paz e tranqüilidade, livrando-os do declínio e do mal e anulando os efeitos de todas as ervas venenosas.

 

Este é o encantamento (darani) dado pelos rakshasas, na presença de Buda, para aqueles que desejam invocar sua proteção:

 

itime itime itime atime itime

nime nime nime nime nime

ruhe ruhe ruhe ruhe

stahe stahe stahe stuhe shuhe

 

Dessa forma o mestre da lei continua protegido contra yakshas, putanas, krityas, kumbhandas e espíritos esfomeados, além de ganhar um escudo extra contra pakshasas, vetālas, skandas, umarakas, apasmarakas, humanos indesejáveis, doenças e veneno; mas permite que os rakshasas continuem transitando e atuando diante de sua presença desde que não lhe façam mal. Desta forma sabemos que o budismo também acabou incorporando uma entidade – o vetāla – que possui uma ligação muito mais estreita com o vampirismo ocidental do que o próprio rakshasa.

 

Ira divina:

 

A mais ávida sugadora de sangue da mitologia Índia é, de longe, a deusa Kali. “Porque você sabe, e todo mundo sabe”, diz um conto indiano, “que Kali é a deusa das diabas e das bruxas, bem como dos santos e dos reis, e das pessoas comuns e dos pobres. De todo mundo”[30] Noutro ponto, a narrativa nos explica:

 

“Bem, se ele está indo visitar Kali, deve ser boa gente”, pensou Vikram. Porque como você sabe, todos os reis são Kshatriyas, e Kshatriyas veneram Kali, a deusa da guerra. Seja como Durga quando ela monta um tigre, ou como Chandi engolindo gotas do Demônio Maior, ou como Kali dançando intoxicada com o sangue dos corpos dos demônios que ela matou. Seja como você a chama, ela é Poder. Mas quando é Kali, ou Bhavani ou Chandi, adora sangue. Você sabe, quando você a vê com a língua pendurada, segurando um demônio decapitado, um colar de caveiras em tomo do pescoço, e uma saia de mãos decepadas. A Terrível, a Destruidora, a Engolidora de Homens da cavernosa dentada dos dois lados. E por que não — o útero do mundo, a Criadora, o que ela pode expelir, pode sugar — por que não? Não é verdade? Uma vez ela escondeu uma espada lá, você sabe onde — mas seu Lord Shiva transformou a poderosa linga num raio! Que festanças têm esses dois! Eles fazem a Terra sacudir [31]

 

No livro Vikram and the Vampire (tradução livre do Baital-Pachisi), a estátua de Kali aparece no santuário, localizado no cemitério, e quando o rei entra, ele a vê:

 

Ali estava Smashna-Kali, a deusa, em sua forma mais horrível. Era uma mulher muito preta e nua, com uma cabeça ferida, parcialmente decepada e pintada pendendo sobre seu ombro. Sua língua se enrolava em sua grande boca bocejante. Seus olhos eram vermelhos como os de um bêbado; suas sobrancelhas eram da mesma cor; seu cabelo grosso e áspero pendia como uma manda até os joelhos.[32]

 

Richard Burton comenta ironicamente que “não podendo encontrar vítimas, essa agradável divindade, para satisfazer sua sede do curioso suco, cortou seu próprio pescoço para que o sangue jorrasse para sua boca”. [33]

Segundo Gordon Melton, Kali tinha um relacionamento ambigüo com o mundo. “Por um lado destruía os espíritos malignos e estabelecia a ordem. Entretanto, também servia como representante das forças que ameaçavam a ordem social e a estabilidade por sua embriaguez de sangue e subseqüente atividade frenética”.[34] Ela apareceu pela primeira vez nos escritos indianos por volta do século VI em invocações pedindo sua ajuda nas guerras. Nesses primeiros textos foi descrita como tento presas e usando uma guirlanda de cadáveres. Certos escritos registram que seus templos deveriam ser construídos longe das vilas e perto dos locais de cremação. Diversos séculos mais tarde, no Bhagavat-purana, ela e suas seguidoras, as dakinis, avançaram sobre um bando de ladrões, decapitaram-nos e embebedaram-se em seu sangue. No Devi-Mahatmya ela se juntou à deusa Durga, para lutar contra o espírito demoníaco Raktabija, que tinha a habilidade de se reproduzir com cada gota de sangue derramado. Kali resgatou Durga ao vampirizar Raktabija e ao comer suas duplicatas. Outros adotam-na como o aspecto irado de Durga. Ela se tornou a divindade dominante no hinduísmo tântrico, onde era louvada como a forma original das coisas e a origem de tudo o que existe.

 

No Tantra, o caminho da salvação se dava através das delicias sensuais do mundo – as coisas geralmente proibidas a um indiano devoto – tais como álcool e sexo. Kali representava as ultimas realidades proibidas e dessa forma deveria ser abrigada no íntimo e sobrepujada no que seria o ritual da salvação. Ensinava que a vida se alimentava da morte, que a morte era inevitável para todos os seres e que, na aceitação dessas verdades – confrontando Kali nos campos de cremação, demonstrando dessa forma coragem igual à sua terrível natureza – haveria libertação. Kali, como muitas divindades vampíricas, simbolizava a desordem que aparecia continuamente entre todas as tentativas de se criar a ordem. A vida era, em última instância, indomável e imprevisível.[35]

O mesmo povo que hoje se revolta ao saber que no ocidente sacrificam-se gado para o consumo alimentício tem em sua árvore genealógica ancestrais que não exultaram em verter sangue animal ou humano, adotando inclusive a prática do suicídio coletivo. Nas eras védicas — pelo ano 1200, atingindo a Idade Média — a prática de sacrifício de sangue era muito comum na Índia. As primeiras escrituras sagradas, Vedas e Brahmanas, são, de fato, um manual de sacrifícios de grande complexidade. Segundo Stanislas Guaita, ainda no século XIX a Índia abrigava a sociedade secreta dos Thuggs cujos adeptos chegavam a expatriar-se quando necessário “para atacar as vítimas, marcadas de antemão e que, prevenidas a tempo para tomar um navio, pretendem escapar a seu mau destino”.[[36] Durga, um famoso chefe capturado pela polícia inglesa e condenado à forca, resumiu sua doutrina na seguinte forma:

Nossos irmãos, — dizia o thugg a seus juízes — souberam que o estrangeiro de que vocês estão falando deveria partir com uma escolta de 50 homens. Formamos simplesmente uma tropa três vezes maior para espera-los na floresta, onde havia justamente uma imagem da deusa Khali. Como não é permitido por nossos sacerdotes entrar em combate, porque nossos sacrifícios só são agradáveis a Khali quando as vítimas são surpreendidas pela morte, demos boa acolhida aos viajantes oferecendo para caminhar juntos e preservar-nos mutuamente de qualquer perigo. Eles aceitaram, sem desconfiança; depois de três dias éramos amigos… Cada estrangeiro marchava com dois thuggs. A noite não estava completamente escura: à luz do crepúsculo estrelado, dei o sinal a meus irmãos. Imediatamente um dos thuggs que guardava cada vítima pôs no seu pescoço o laço corredio, enquanto o outro o puxava pelas pernas, para virar. Esse movimento foi executado em cada grupo com a rapidez do relâmpago. Arrastamos os cadáveres para o leito de um rio próximo, depois dispersamos. Só um homem escapou; mas a deusa Khali tem olhos abertos sobre ele: seu destino se cumprirá cedo ou tarde! Quanto a mim, eu era antes uma pérola no fundo do oceano, hoje sou cativo… A pobre pérola está acorrentada: receberá um furo para ser posta num fio e flutuará miseravelmente entre o céu e a terra. Assim quis a grande Khali para punir-me por não lhe ter oferecido o número de cadáveres que lhe pertencia. Ó deusa negra, vossas promessas não são jamais vãs, vós cujo nome favorito é Koun-Khali (a devoradora de homens), vós que bebeis sem cessar o sangue dos demônios e dos mortais. [37]

 

Atualmente os altares de sacrifício desapareceram e as oferendas são depositadas diretamente aos pés das imagens. Hoje as ofertas são geralmente de alimentos, comidas, flores e pó colorido, embora ainda haja sacrifícios de sangue em alguns templos da deusa Kali. O que era louvor transformou-se em horror e os espectros hematófagos, canibais, se multiplicaram. Os vetalās (cadáver reanimado por seu próprio espírito ou de outrem) e as dakinis (bruxas) possuem uma relação direta e necessária com o culto à Kali, devorando os restos de sacrifício humano deixados pela deusa; coisa que não impedia que um vetalā subordinado pudesse receber oferenda em nome próprio. Contudo, Kali e sua comitiva estão longe de serem os únicos consumidores de sangue e corpos vivos ou mortos.

 

 

 

 


[1] Jean-Paul Bourre. O Culto do Vampiro, p 47.

[2] EVANS-WENTZ, W. Y. (org.) O Livro Tibetano dos Mortos. São Paulo, 1994. Pensamento, p 127.

[3] HABERMAS, Gary R. e  MORELAND, J. P. Immortality: the other side of death. Nashville, 1992. Thomas Nelson Publishers, p 41. In: RAWLINGS, Dr. Maurice S. Eles Viram o Inferno. São Paulo, 1996. Multiletra, p 113.

[4] PRABHUPADA, A. C. Bhaktivedanta Swami. Pequeno Tratado Sobre Karma. Brasil, Fundação Bhaktivedanta, 1998, p 57.

[5] MACHADO, André. Vampiros de Carne e Osso. In: Incrível, nº 13, agosto de 1993, p 8-11.

[6] SHAH, Idries. Magia Oriental. Trd. ???. São Paulo, Editora Três, 1973, p 155-156.

[7] BUNSON, Matthew. The Vampire Encyclopedia. New York, Three Rivers Press, 1993, p 133.

[8] MELTON, J. Gordon. O Livro dos Vampiros: A Enciclopédia dos Mortos-Vivos. Trd. James F. Sunderlank Cook. São Paulo, Makron, 1996, p 403.

[9] TORRIGO, Marcos. Vampiros: Rituais de Sangue. São Paulo, Madras, 2002, p 9.

[10] EVANS-WENTZ, W. Y. O Livro Tibetano dos Mortos. São Paulo, 1994. Pensamento, p 18.

[11] BURTON, Isabel. Prefácio à edição comemorativa. In: BURTON, Richard Francis. Vikram e o Vampiro. São Paulo. Círculo do Livro, p. 7.

[12] ANÔNIMO. Contos do Vampiro. São Paulo, Martins Fontes, 1986, p. 186.

[13] Esta compilação é uma adaptação livre de uma obra anterior, provavelmente do século III, chamada Brhat-kathā  (A Grande História), atribuída a um certo Gunâdhya que viveu na região entre o Ujjayinî e o Kausâmbî. Esse último texto, hoje perdido, foi escrito em paisâcî, a “língua dos demônios”, dialeto meio-hindu derivado do sânscrito. Quando a tradição sânscrita se impôs, reduzindo os dialetos regionais a um papel secundário, o Brhatkatā tornou-se o primeiro objetivo de tradutores e adaptadores. Em conseqüência, a Vetālapancavimsatikā tornou-se uma das mais famosas compilações de narrativas da Índia Antiga (aparentemente, nenhuma das traduções ou adaptações que se conservam é anterior ao século XI).

[14] Entre a versão tibetana de Bhavabhuti e a indiana de Somadeva há mudança de personagens. O herói de Bhavabhuti é Vrikam, enquanto o de Somadeva é seu descendente Trivikramasena. Ao contrário de Vrikan que repreendia e batia no baital todo o tempo, aborrecido pelas histórias pornográficas e degradantes que despertavam a atenção de seu filho, Trivikramasena viajava só e fez com o vêtala um voto de silêncio. O vampiro é invariavelmente falante. Ele conta histórias e faz perguntas enquanto o rei o carrega. Quando o rei respondia suas perguntas quebrava o voto de silêncio e, conseqüentemente, o vampiro escapulia e retornava a seu refúgio na árvore simsapâ, “graças à sua força mágica” ou “poderes mágicos”. Todas as vezes o rei volta a captura-lo que ora deixava-se levar passivamente “caído na terra, gemendo” e ora relutava assumindo “as formas mais variadas”. Foram ao todo 23 fugas. Na vigésima Quarta prova o rei não soube responder a questão e permaneceu silencioso. Então, o Vampiro cumprimentou-o pela coragem, revelou que o monge mendigo Ksâtisîla/Shanta-Shil tinha maus propósitos a seu respeito e ensinou-o como vencer o inimigo.

[15] SOMADEVA. Obra citada, p. 13, 135.

[16] Os hindus atribuem cabelos castanhos aos homens de casta inferior, às feiticeiras e aos demônios.

[17] Nome popular anglo-indiano de uma espécie de morcego grande.

[18] BURTON, Richard Francis. Obra citada, p 48-49.

[19] BLAVATSK, Helena P. Glossário Teosófico. Trd. Silvia Sarzana. São Paulo, Ground, 1998, p 738.

[20] RENOU, Louis. In: Contos do Vampiro. São Paulo, 1986. Martins Fontes, p. X.

[21] “Vikrama” significa “valor”, “bravura’.

[22] ANÔNIMO. Vikram e a Dakini. In: HUSAIN, Shahrukh (comp). O Livro das Bruxas. Trd. ???? Rio de Janeiro, Objetiva, 1995, p. 221.

[23] ANÔNIMO. Vikram e a Dakini. In: HUSAIN, Shahrukh (comp). O Livro das Bruxas. Trd. ???? Rio de Janeiro, Objetiva, 1995, p. 221.

[24] ANÔNIMO. Vikram e o Dakini. Obra citada, p. 222.

[25]  ANÔNIMO. Vikram e o Dakini. Obra citada, p. 223.

[26] RENOU, Louis. Obra citada, p. X.

[27] RENOU, Louis. Obra citada. p. XI.

28] ANÔNIMO. Obra citada, p 183.

[29] BURTON, Richard Francis. Obra citada, 223.

[30] Vikram e o Dakini. In: HUSAIN, Shahrukh (comp). O Livro das Bruxas. Rio de Janeiro, Objetiva, 1995, p. 220-225.

[31] Vikram e o Dakini. In: HUSAIN, Shahrukh (comp). O Livro das Bruxas. Rio de Janeiro, Objetiva, 1995, p. 220-225.

[32] MELTON, J. Gordon. O Livro dos Vampiros: A Enciclopédia dos Mortos-Vivos. Trd. James F. Sunderlank Cook. São Paulo, Makron, 1996, p 403.

[33] MELTON, J. Gordon. O Livro dos Vampiros: A Enciclopédia dos Mortos-Vivos. Trd. James F. Sunderlank Cook. São Paulo, Makron, 1996, p 403.

[34] MELTON, J. Gordon. O Livro dos Vampiros: A Enciclopédia dos Mortos-Vivos. Trd. James F. Sunderlank Cook. São Paulo, Makron, 1996, p 428

[35] MELTON, J. Gordon. O Livro dos Vampiros: A Enciclopédia dos Mortos-Vivos. Trd. James F. Sunderlank Cook. São Paulo, Makron, 1996, p 428-429.

Shirlei Massapust

Postagem original feita no https://mortesubita.net/yoga-fire/em-busca-do-vampiro-indiano/

Mantras

No Mundo Ocidental só recentemente se fala em “mantra”, porém desde épocas remotas os orientais já utilizavam palavras e frases, na maioria das vezes sem sentido literal algum, com a finalidade de obterem certos resultados psíquicos e somáticos, constituindo-se assim os mantras.

No Ocidente, somente os iniciados “de algumas Doutrinas, como os Rosacruzes, utilizavam equivalente de mantra que são as vocalizações (emissão de sons de vogais)”.

Recentemente foi retirado o véu de mistérios que envolviam muitos conhecimentos de algumas doutrinas e com isto vários livros de ocultismo, de exercícios de mediação, de orientação para “relax”, etc. foram publicados e muitos deles inundaram o ocidente com uma série de mantas.

O termo mantra é de origem sânscrita, e de uma forma lata os mantras podem ser considerados versos de algumas obras védicas usados para encantamentos e feitiços, contudo num sentido mais profundo, significa muito mais do que isso. Em essência, não se trata propriamente de palavras de poder, e sim de combinações de sons capazes de funcionarem como suporte mágico para a mente.

A origem dos mantras é muito remota e a maior parte deles em uso atualmente foi retirado de alguns livros que os brahmanes mantiveram cuidadosamente guardados, pois cada mantra é capaz de produzir um determinado efeito físico ou psíquico imediato.

De uma certa forma os Mantras sempre foram usados na magia oriental, como se pode ver pelos MAMNTRA-TANTRA-ZASTRA, obras que se referem à magia em geral, e aos encantamentos “em particular”.

Dizem os mantra-vid (conhecimentos dos Mantras) que os mantras são mais invocações mágicas do que orações religiosas propriamente.

Um mantra também tem sentido não esotérico, tais como: linguagem sagrada, sentença, hino védico, salmo, conjuro, verso ou fórmula mística de encantamentos. Não nos interessa nesta palestra fixar com precisão o significado do termo, mas apenas analisar se eles funcionam e, se afirmativo, quais os princípios cientificamente comprovados a que estão ligados.

Nosso intento nesta palestra é explicar alguns detalhes importantes a respeito das razões dos mantras, das suas bases, desmistificando alguns aspetos e, de uma forma sucinta, advertir sobre as suas finalidades, sem esquecer de citar também as possibilidades negativas que eles podem oferecer e ainda sobre possíveis perigos que eles podem acarretar quando praticados de forma indiscriminada.

Como vimos antes, mantras, em essência, são vocalizações, são determinadas emissões sonoras com um certo ritmo, tom, e intensidade. Geralmente é constituído por palavras em significado aparente, mas cuja finalidade é proporcionar certos efeitos místicos e psíquicos. Por extensão podemos incluir nesse conceito algumas frases, palavras, ou até mesmo os sons das vogais.

Qual é, portanto, o “modus operandi” dos mantras? – Um som precisamente pronunciado pode despertar vibrações ressonantes nos mundos do hiper físico e com isso despertar reações, ativar comandos, e isso por certo se fazer sentir no mundo físico. Já vimos que uma vibração de uma determinada nota sonora ativa a vibração de todas as notas ressonantes no “Teclado Cósmico de Vibrações”.

Como citamos antes, uma vibração é suscetível de originar uma outra vibração em diferentes elementos. Quando uma nota musical é tocada num piano, mesmo que só uma corda seja golpeada, ainda assim outras cordas vibram também. Não são todas as outras cordas que vibram conjuntamente, apenas algumas. Isto é o que se chama ressonância e há leis físicas, que regem essa manifestação, sobre a qual há suficientes estudos efetuados pela ciência. Mas, não são somente outras cordas que entram em vibração, outros objetos também podem fazer isso como, por exemplos, cristais, vidros, até mesmo coisas grandes e pesadas podem vibrar quando uma nota musical é produzida.

Na verdade os sons podem ressoar até mesmo além do mundo físico, desde que no Universo tudo é integrado; no Cosmos todas as coisas se interligam. Por isto, um mantra adequado é capaz de provocar ressonância em muitos níveis cósmicos. A ressonância de um som necessariamente não se faz sentir apenas sobre a natureza física das coisas, mas também em níveis mais sutis da natureza humana. Assim é que sentimentos e emoções podem, de alguma forma, ser afetados pelos sons.

Para nós Ocidentais isto parece algo absurdo, uma tolice, tão somente uma perda de tempo, pura e simplesmente uma prática inócua, porém vejamos esse assunto com um tanto mais de profundidade, procurando estabelecer comparações com certos fenômenos acústicos conhecidos pela ciência atual.

O que é uma vogal? O que é uma palavra ou uma frase senão um som ou um conjunto de sons…? – Quando um som é emitido ele tem como fonte alguma coisa que vibra, quer seja uma corda vocal do laringe; quer seja uma corda, uma palheta, ou uma membrana de um instrumento musical, sem esquecer que até mesmo o atrito de duas superfícies podem emitir sons. Uma coisa, porém é certa, quando um som é emitido sempre deve haver algo vibrando para produzi-lo, pois se trata de uma manifestação essencialmente vibratória regida, portanto, pelas leis comuns da mecânica ondulatória, por esta razão um mantra é mais do que simplesmente uma oração religiosa. Em essência é uma forma de invocação mágica poderosa.

Eis o primeiro ponto que temos que fixar em mente: Para que possa ocorrer um efeito de um som ele deve ter vibrações precisas, pois, assim como uma nota musical de um piano não faz vibrar todas as cordas, um determinado som pode não ser ressonante com aquilo sobre o que se pretende atuar. Assim, um mantra deve ser entoado com precisão para que um determinado fim possa ser atingido.

O canto também, quando devidamente composto, tem uma finalidade esotérica precisa, bem assim como a vocalização de determinadas sílabas. Quando usadas com precisão, as vocalizações podem determinar a liberação de várias forças sobre quem canta e sobre quem escuta. Cada som tem uma freqüência vibratória própria e que ao ser entoada, cantada, ou mesmo pronunciada, pelo já citado efeito da ressonância, algum órgão do corpo começa a sofrer alterações, passando a funcionar mais ou menos ativamente. As glândulas de secreções internas que regulam muitas funções importantes do organismo respondem à ação vibratória dos sons, eis o porquê das vacas produzirem mais leite quando escutam determinadas músicas, e das galinhas botarem mais ovos em cada período de postura, com foi citado em outra palestra desta série. Não restam dúvidas de que os sons causam efeitos tanto na área somática quanto na psíquica do indivíduo e disto não se poder dizer que os mantras sejam algo sem sentido válido.

No organismo a atuação dos mantras não se faz apenas sobe as glândulas de secreções internas, também se faz sobre o próprio cérebro de uma forma bem definida. No tema O PODER DOS SONS, nós vimos como as condições emocionais podem ser afetadas pelos sons.

Já podemos compreender que os mantras atuando sobre as glândulas podem ser utilizadas para melhorar a saúde da pessoa, e mesmo para curar certas afecções, contudo não é bom esquecer que toda moeda tem duas faces, eles também podem prejudicar, por isto é vital que o discípulo seja assistido por um competente “guru” ou, mais precisamente, por um mantra-vidyâ (conhecedor dos mantras).

Afirmamos que é lícito utilizar os sons para as necessidades pessoais, mas não de modo indiscriminado. Não se deve utilizar tudo aquilo que se vai encontrando pelo mundo à fora, há necessidade de “se separar o joio do trigo”. A sensatez requer que seja investigada também a origem de um mantra antes que a pessoa passe a utilizá-lo. Do manancial de mantras que existem por aí citados em inúmeros livros e ensinados por pessoas não devidamente qualificados, perguntamos, então, se todos são capazes de desenvolver uma ação efetiva, sutil, e benéfica. Por acaso não pode alguns deles haver sido manipulados e adulterados pela “conjura”? Por acaso eles seriam imunes à ingerência de certas forças que sempre procuraram influir em todas as atividades humanas? – Evidentemente não, por isto se torna difícil se saber exatamente o que um determinado mantra é capaz de provocar numa pessoa.

Conhecemos casos de pessoas que após o uso de certos mantras, mesmo visando um fim aparentemente válido, sofreram distúrbios orgânicos sérios, ocorreram sintomas que desapareceram apenas com a suspensão dos exercícios. Por isto não se deve tentar essa prática, quando oferecida sem que haja alguma garantia dada por uma fonte idônea. Assim, podemos dizer que há mantras cuja finalidade é exatamente causar prejuízo aos seres humanos. As mãos dos “magos negros” sempre se estenderam até onde puderam e, por certo, não pouparam os mantras.

Também, podem existir mantas criados por algum incompetente e que na realidade não provocam efeito algum restando, apenas, a perda de tempo precioso que poderia ser usado para outras finalidades.

Sobre os mantras, diz a Doutrina Secreta: “É o mais eficaz e poderoso agente mágico e a primeira das chaves para se abrir a porta da comunicação entre os mortais e os imortais”.

Por meio de um mantra a mente pode entrar em “alfa”, o cérebro pode passar a vibrar numa freqüência adequada para que ocorra uma precisa expansão da consciência e assim outros planos e universos relativos possam ser abandonados”.

Tal como acontece com os símbolos e rituais, assim também determinados sons quando devidamente entoados podem servir de linguagem entre o mundo material e o de outros planos de existência.

Independentemente desta ação direta, o mantra serve também para fortalecer a vontade da pessoa, condicionando a mente para a consecução de algo que se visa obter, como aquela inerente aos símbolos e aos rituais.

Autor: José Laércio do Egito – F.R.C.

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Postagem original feita no https://www.projetomayhem.com.br/mantras